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    Política e Estado

    Como o crime desorganizado aumenta a sensação de insegurança no Brasil

    Análise das diferenças entre crime organizado e desorganizado, seus efeitos no Brasil e propostas para reduzir a insegurança

    POR: José Carlos Pires

    8 min de leitura

    Foto: Maxim Hopman / Unsplash
    Foto: Maxim Hopman / Unsplash

    A violência na sociedade brasileira é resultado, entre outros fatores, da ação do crime organizado por meio das diversas organizações criminosas. Entre elas o Primeiro Comando da Capital (PCC), o Comando Vermelho (CV) e, muitas vezes, pela ação do crime desorganizado. O crime organizado e o crime desorganizado têm natureza diversas. Contudo, em determinado contexto, existem conexões entre ambos, principalmente nos territórios das periferias das cidades brasileiras ocupados pelo crime organizado.

    O que diferencia o crime desorganizado do crime organizado

    O termo “crime organizado” refere-se a atividades criminosas planejadas, estruturadas e realizadas por grupos com uma hierarquia clara e divisão de tarefas, que geralmente envolvem atividades como tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e outras situações. Essas organizações atuam com planejamento, uso de inteligência, controle de territórios. Por possuírem uma estrutura complexa, são mais difíceis de desmantelar.

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    Já o termo “crime desorganizado” refere-se a atos criminosos que não seguem uma estrutura hierárquica ou planejada, muitas vezes, são realizados de forma impulsiva e violenta, por indivíduos isolados ou em pequenos grupos. Essa forma de criminalidade cria diretamente a sensação de insegurança pública, pois gera um ambiente de imprevisibilidade, medo e insegurança na população.

    Entre os principais tipos de crimes desorganizados destacam-se o homicídio doloso, homicídio culposo em decorrência do trânsito, roubos e furtos diversos (celulares, residência, carga de pequeno monte), roubos e furtos de veículos, estelionato, violência contra as mulheres (física, psicológica, patrimonial), homofobia, racismo estrutural, perturbação do sossego. Essas ações, muitas vezes rotineiras, criam um ambiente de imprevisibilidade, medo, insegurança, que afasta a convivência pacífica e aumenta o medo na população.

    Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2025, relativo ao ano de 2024 do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), ocorreram 44.127 mortes violentas intencionais, representando uma taxa de 20,8 por 100 mil habitantes, 1.492 vítimas de feminicídios e 3.870 vítimas de tentativa de feminicídios, 87.545 vítimas de estupro, sendo que 76,8% das vítimas de estupro eram de vulneráveis. Além disso, houve 917.748 roubos e furtos de aparelhos de celulares no Brasil.

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    Estratégias para reduzir a violência causada pelo crime desorganizado

    Por isso, para o enfrentamento do crime desorganizado de forma eficaz e efetiva é necessário adotar uma abordagem sistêmica, integrada e perene que envolve ações dos entes federados – União, Estados, Distrito Federal e os Municípios – por meio da atuação dos órgãos de Segurança Pública, Polícia Federal, Polícias Militar e Civil, Guarda Municipal, os órgãos de Poder de Polícia Administrativa, fiscalização de trânsito, comércio, postura, vigilância sanitária, do uso de tecnologia para a produção de dados, conhecimento e informações para o trabalho de inteligência na prevenção e repressão à criminalidade, a implementação de políticas sociais de prevenção à violência, trabalho de zeladoria, a garantia de iluminação pública de qualidade e o fomento à participação da sociedade.

    Dentre as várias medidas para a prevenção e o enfrentamento do crime desorganizado, o fortalecimento do sistema de inteligência policial é fundamental para antecipar ações criminosas e identificar os fatores que aumentam a explosão no números de atos impulsivos. Além disso, a implementação de políticas públicas de prevenção social específicas nas áreas de educação, cultura, esporte, lazer, qualificação profissional, geração de emprego e renda para os grupos de maior vulnerabilidade social é decisiva para reduzir fatores que impulsionam o crime desorganizado.

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    Outro aspecto importante é o fortalecimento das redes de proteção às vítimas, especialmente jovens, mulheres, grupos LGBTQIA+ e comunidades das periferias das cidades, além da adoção de políticas de combate a qualquer tipo de discriminação. Os programas de mediação de conflitos, ações educativas e promoção de ambientes de convivência também contribuem para a prevenção e o enfrentamento da violência e do crime desorganizado. Por isso, a intervenção social e o diálogo com lideranças locais são estratégias essenciais para a formação de um ambiente mais justo e sustentável.

    A implementação de políticas sociais de prevenção a violência deve estar articulada a iluminação pública de qualidade, atuação dos órgãos de Segurança Pública no patrulhamento ostensivo preventivo com relação de proximidade com a comunidade – realizando a ronda escolar, a Patrulha Maria da Penha –, a proteção sistêmica do patrimônio ambiental e cultural na prevenção e repressão à violência e à criminalidade a partir do planejamento operacional.

    Por que o enfrentamento do crime desorganizado exige políticas amplas e sociais

    O enfrentamento da violência e da criminalidade é desafio complexo, multifatorial, que depende da atuação coordenada, integrada, sistêmica e perene dos entes federados, bem como a participação efetiva da sociedade visando a defesa dos Direitos Humanos, a garantia do pleno exercício da cidadania, a ordem pública e a construção da paz social. Tudo isso já está contemplado na Lei Federal nº 13.675/2018, que instituiu o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) e dispõe, em seu artigo 2º, que: “A segurança pública é dever do Estado e responsabilidade de todos, compreendendo a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no âmbito das competências e atribuições legais de cada um”.

    Segurança Pública exige integração, participação social e tecnologia

    A construção da paz social nos territórios urbanos e rurais das cidades brasileiras está vinculada a realização de ações que vão além da repressão policial e do Direito Penal. É preciso promover o desenvolvimento territorial, melhorar as condições de moradia, saúde, educação e oportunidades econômicas, criando uma rede de proteção social que minimize as razões de conflito e violência.

    A prevenção e o enfrentamento do crime desorganizado são fundamentais para garantir a segurança pública efetiva nos territórios dos municípios brasileiros e contribuir para o pleno funcionamento das funções sociais das cidades, para o desenvolvimento econômico, social e ambiental do Brasil. Para tanto, são necessárias ações estratégicas, como a elaboração de um Plano de Segurança Pública, como instrumento de governança da Política de Segurança Pública e de implementação do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), constituído por um diagnóstico situacional destinado a identificar as causas e os tipos de crimes desorganizados presentes nos diversos territórios municipais, além da definição de diretrizes, objetivos, metas e ações adequadas, visando à construção da paz social.

    José Carlos Pires é advogado, membro da efetivo da Comissão Especial de Segurança Pública da OAB/SP, da Coordenação Estadual da ADJC-SP, mestre em Desenvolvimento de Negócios e Inovação; especialista em Gestão Pública Municipal; consultor em Segurança Pública; autor dos livros Segurança Pública Uma Inovação na Gestão, Sistema Único de Segurança Pública no âmbito municipal e Organizador dos Livros Violência, criminalidade, Segurança Pública e Segurança Pública; Integração, Inteligência e Prevenção; Gestor de Segurança Pública no Município de Jundiaí – SP de 2013/2016.

    Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial dFMG


    Referências bibliográficas

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    BRASIL. Lei Federal nº 13.675, de 11 de junho de 2018. Institui o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) e a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS). Disponível em:
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    KOPITTKE, A. Manual de Segurança Pública Baseada em Evidências. Passo Fundo: Conhecer, 2023.

    MARIANO, B. Segurança Pública: o calcanhar de Aquiles da esquerda e do campo democrático. Avaré: Editora Contracorrente, 2024.

    NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL – ONU BR. Agenda 2030. 2015. Disponível em:
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    LOZANO, A.; PIRES, J. C.; SCÁRDUA, M. Segurança Pública: integração, inteligência e prevenção. Jundiaí: Editora Fibra & Edições Brasil, 2025.

    PIRES, J. C. Violência, criminalidade e segurança pública: estratégias para garantir a ordem pública, o pleno exercício da cidadania e a construção da paz social. Jundiaí: Editora Fibra & Edições Brasil, 2023.