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    Política e Estado

    Entenda o Mapa da Fome e como o Brasil saiu pela segunda vez

    No período de 2022 a 2024, o Brasil ficou abaixo do índice de 2,5% de insegurança alimentar crônica e foi considerado fora do Mapa da Fome

    POR: Leandro Melito

    8 min de leitura

    Confira a linha do tempo do Brasil no Mapa da Fome: Dados: FAO/ONU Gráfico: Fundação Maurício Grabois
    Confira a linha do tempo do Brasil no Mapa da Fome: Dados: FAO/ONU Gráfico: Fundação Maurício Grabois

    A Plenária do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) realizada neste mês, com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, marcou um momento histórico da retomada do combate à fome no país. O Brasil deixou pela segunda vez o Mapa da Fome da ONU, indicador mantido pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) que identifica países onde mais de 2,5% da população sofre de subalimentação grave (insegurança alimentar crônica).

    “Combater a fome e a desigualdade é uma escolha política”, destacou Lula durante o evento.

    Em seu perfil nas redes sociais, Lula publicou:

    “Este encontro foi uma oportunidade para comemorarmos a saída do Brasil do Mapa da Fome. Este marco não é fruto do acaso. É resultado de decisões políticas do nosso governo, que priorizaram a redução da pobreza, o estímulo à geração de emprego e renda, o apoio à agricultura familiar, o fortalecimento da alimentação escolar e o acesso à alimentação saudável.”

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    Lula participa da Plenária do Consea após o Brasil deixar o Mapa da Fome da ONU pela segunda vez. Foto: Ricardo Stuckert

    O Relatório Estado de Segurança Alimentar e Nutricional no Mundo 2025 (SOFI 2025), lançado no dia 28 de julho, apresenta as estimativas da insegurança alimentar e fome para o período de 2022 a 2024 e reforça a tendência de queda de ambos indicadores no Brasil, com importante redução da prevalência de subalimentação.

    O documento demonstra que, no período de 2022 a 2024, o Brasil ficou abaixo do índice de 2,5% de insegurança alimentar crônica, valor de referência utilizado como linha de corte pela FAO. Desta forma, o país foi considerado fora do Mapa da Fome.

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    Essa é a segunda vez que o Brasil consegue atingir essa meta por meio de políticas públicas voltadas à segurança alimentar de sua população. A primeira vez que o país deixou o Mapa da Fome foi em 2014, durante o governo de Dilma Rousseff.

    O Consea destacou em nota a “dedicação e compromisso do governo Lula para alcançarmos estes resultados, pois no triênio 2019-2021, o indicador alcançou o valor de 4,1%, e no período de 2020-2022 4,7% da população, ou seja, 10,1 milhões de pessoas, nos colocando novamente no Mapa da Fome”, diz o comunicado do colegiado presidido por Elizabetta Recine.

    “Nossos resultados comprovam, mais uma vez, o quanto a resposta articulada do Governo Federal com a retomada das políticas públicas, associada ao fortalecimento da participação social, são condições fundamentais”, destacou o Consea.

    Agricultores do Quilombo Dona Bilina, em Campo Grande, Rio de Janeiro, preparam sua produção para entrega ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

    Entre as políticas retomadas ou implementadas pelo governo Lula que contribuíram para tirar o Brasil novamente do Mapa da Fome, são apontadas no documento do Consea:

    • Plano Brasil sem Fome
    • 6ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional
    • Política e Plano de Abastecimento Alimentar
    • Plano de Agroecologia e Produção Orgânica
    • Alimenta Cidades
    • Programa Cozinha Solidária
    • Retomada do Programa de Aquisição de Alimentos e do Programa Cisternas
    • Atualização do per capita do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae)
    • Financiamento da Agricultura Familiar
    • Valorização do salário mínimo
    • Aprimoramento do Bolsa Família
    • Aprovação da reforma tributária para que alimentos saudáveis sejam mais baratos

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    O presidente do Instituto Fome Zero (IFZ), José Graziano, diretor-geral da FAO entre 2012 e 2019, recordou em um artigo as memórias de setembro de 2014, quando entregou à presidente Dilma Rousseff, durante a Assembleia Geral da ONU, o reconhecimento oficial de que o Brasil havia erradicado a fome, de acordo com os critérios internacionais vigentes.

    “O país cumpria ali, com dois anos de antecedência, a meta de reduzir à metade a fome estabelecida pelos Objetivos do Milênio (ODM). Era o auge de uma década virtuosa: o Fome Zero havia se tornado política de Estado, o Programa Bolsa Família consolidava-se como modelo internacional de transferência de renda condicionada, e o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) havia retomado seu protagonismo participativo”, destacou.

    O Relatório SOFI 2014, que anunciou a saída do Brasil pela primeira vez do Mapa da Fome, destacou as iniciativas implementadas desde 2003 no primeiro mandato de Lula como responsáveis pela redução da insegurança alimentar no país, entre elas a recriação do Consea – implementado pela primeira vez no governo de Itamar Franco, e os programas PAA e Cisternas.

    O PAA e o Programa Cisternas ajudaram a consolidar o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan), criado em 2006 pela Lei nº 11.346 com o objetivo de assegurar o direito à alimentação adequada de toda a população residente no território nacional. A partir de 2010, por meio da Emenda Constitucional nº 64, o direito à alimentação passou a figurar entre os direitos constitucionais previstos no artigo 6º da Constituição Federal.

    Brasil volta ao Mapa da Fome com Bolsonaro

    De acordo com os indicadores da FAO divulgados em julho, o Brasil retornou ao Mapa da Fome durante o período de 2019 a 2021, no governo de extrema-direta de Jair Bolsonaro, que promoveu o desmonte das políticas de segurança alimentar e combate à fome implementadas durante os governos petistas de Luiz Inácio Lula da Silva (2003 – 2010) e Dilma Rousseff (2011-2016).

    Já no primeiro dia de seu governo, Bolsonaro extinguiu o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), colegiado ligado à Presidência da República, com participação de organizações da sociedade civil que atua na elaboração de políticas públicas de segurança alimentar e combate à fome.

    “O fechamento do Consea em 2019 foi mais do que um ato simbólico: foi a tentativa explícita de apagar da institucionalidade brasileira o princípio de que comer é um direito de todos — e não uma dádiva. Vieram ainda os cortes no orçamento do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), o desmonte da merenda escolar em meio à pandemia, e o desmantelamento das redes de apoio à agricultura familiar. O resultado? O Brasil voltou ao Mapa da Fome antes mesmo da pandemia — um retrocesso trágico!”, destaca o artigo de José Graziano.

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    Em sua volta ao governo em 2023, Lula recriou o Consea e retomou as políticas de combate à fome no país, responsáveis por tirar novamente o Brasil do Mapa da Fome. Graziano destaca em seu texto que a eleição do novo governo Lula “reabriu a janela de oportunidade de reconstruir políticas públicas baseadas em direitos” e destaca, além da reinauguração do Consea, a reestruturação do Bolsa Família, o relançamento do PAA, a volta do Plano Brasil Sem Fome ao centro da estratégia do governo federal e o lançamento da nova Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, proposta do Brasil apoiada pelos países do G20. “Com isso, conseguimos, em apenas dois anos, inverter a curva de crescimento da fome e sair novamente do Mapa”, escreveu Graziano.

    Entenda o Mapa da Fome

    O Mapa da Fome é uma representação visual utilizada pela FAO para identificar países com níveis elevados de subalimentação crônica com base no indicador Prevalência de Subnutrição (Prevalence of undernourishment – PoU) no âmbito da Agenda 2030 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.

    O PoU identifica, em cada país, o percentual da população em risco de subnutrição: aquela sem acesso regular a alimentos em quantidade suficiente para uma vida saudável.

    Período 2021-2023: governo Bolsonaro marcou o retorno do Brasil ao Mapa da Fome. Fonte: FAO-ONU / Fundação Maurício Grabois

     

    Mapa da Fome da ONU para o período 2022-2024: Brasil ficou abaixo dos 2,5%. Fonte: FAO-ONU / Fundação Maurício Grabois

    Como a FAO calcula o indicador

    O PoU é calculado a partir de três variáveis: quantidade de alimentos disponíveis no país, consumo de alimentos pela população e a quantidade adequada de calorias/dia, definida para um “indivíduo médio” representativo da população.

    A partir da quantidade total de alimentos disponíveis em um determinado país, a PoU calcula como essa quantidade seria distribuída entre a população, de acordo com a renda dos indivíduos para adquirir alimentos. A partir desta distribuição, calculada com base na desigualdade de renda daquele país, esse indicador determina o percentual da população que não teria acesso a alimentos em quantidades suficientes (kcal/dias) para uma vida saudável. Se esse percentual ficar acima de 2,5%, o país está no Mapa da Fome.