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    Política e Estado

    Plano Brasil Soberano move placas políticas e reforça defesa nacional

    Medida injeta R$ 30 bi na economia e provoca rearranjos políticos. PCdoB propugna ampla composição para isolar a extrema-direita.

    POR: Luciano Siqueira

    6 min de leitura

    Presidente Lula assina a Medida Provisória “Brasil Soberano”, ao lado do ministro da Economia, Fernando Haddad; do presidente da Câmara, Hugo Mota; do presidente do Senado, Davi Alcolumbre; do ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira; e da ministra da Secretaria das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann. Palácio do Planalto, Brasília, 13/08/2025. Foto: Ricardo Stuckert / PR.
    Presidente Lula assina a Medida Provisória “Brasil Soberano”, ao lado do ministro da Economia, Fernando Haddad; do presidente da Câmara, Hugo Mota; do presidente do Senado, Davi Alcolumbre; do ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira; e da ministra da Secretaria das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann. Palácio do Planalto, Brasília, 13/08/2025. Foto: Ricardo Stuckert / PR.

    Convergência necessária e possível

    Em cenário de profunda crise — econômica, política, institucional —, tensões se expressam em todas as esferas da vida.

    Mundo afora e cá em Pindorama. Na cena política, sobretudo.

    O confronto de ideias divergentes se faz tão intenso quanto a complexidade da situação. Tão natural quanto a luz do sol. O conflito é a força dinâmica da sociedade humana.

    Que se cotejem ideias divergentes nos marcos da convivência democrática, do respeito mútuo e da busca de alternativas consistentes. 

    No Brasil dos nossos dias, entretanto, ocorre um indigesto rebaixamento do debate, inspirado em formulações sectárias e em agressões verbais, sobretudo através das redes sociais. 

    Pouco se esclarece e muito se estimulam os instintos mais primários do ser humano — a frustração, o medo, o ódio, a intolerância.

    Conscientemente ou não, muitos dos que se perfilam na extrema direita navegam num universo imaginário paralelo, inscrito no conceito da pós-verdade, blindado a qualquer ideia destoante.  

    Composições necessárias e possíveis

    Do lado de cá, no polo oposto, concomitante com a reafirmação da agenda da reconstrução nacional, impõe-se a absoluta necessidade da convergência política entre correntes divergentes, mas situadas na esfera democrática.

    Mais ainda agora, quando a sanha tarifária dos EUA recoloca a bandeira da soberania nacional no pódio

    Este é um crivo que possibilita que se desgarrem do campo oposto, ainda que momentaneamente, segmentos situados na oposição ao governo Lula.

    Fazem-se acordos temporários de variados matizes, à semelhança de muitas outras situações conjunturais. 

    A agenda de socorro aos segmentos econômicos atingidos pelo tarifaço de Trump é um exemplo. Estima-se que a tarifa de 50% sobre produtos brasileiros importados pelos norte-americanos pode custar US$ 5,8 bilhões ao setor agroexportador, que se expandiu 93% nos EUA entre 2015 e 2024. Agora, sob novas condições, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) avalia que o agronegócio deixará de exportar US$ 5,8 bilhões aos Estados Unidos neste ano. (1)

    A Medida Provisória destinada a implantar o “Plano Brasil Soberano” viabiliza iniciativas que, no seu conjunto, alcançam R$ 30 bilhões em linhas de financiamentos via recursos do superávit financeiro do Fundo Garantidor de Exportação (FGE). 

    Um gesto que contribui para uma espécie de “movimento de placas tectônicas”, ainda não plenamente visíveis, no sentido da ampliação do arco de alianças em torno do governo — ainda que setoriais, circunstanciais e momentâneas. 

    Veja os detalhes do Plano Brasil Soberano, apresentado nesta quarta-feira (13)

    Alianças amplas e diversificadas são da tradição da luta transformadora. Aconteceram, inclusive, em situações de ruptura institucional. Por exemplo, na primeira revolução de caráter socialista da História, na velha Rússia, como bem descreve Lênin em sua obra clássica Esquerdismo, doença infantil do comunismo (2).

    Para que o movimento fosse adiante e, posteriormente, o novo poder viesse a se afirmar, celebraram-se inúmeros compromissos e acordos, de variada natureza.

    Assim, em circunstâncias próprias de uma conjuntura caleidoscópica e ainda adversa, há que se praticar a máxima amplitude, sem perder entretanto o sentido essencial da luta.

    Leia também: “Tarifa Bolsonaro” de Trump pode reorganizar Frente Ampla e fortalecer Lula em 2026

    A defesa da soberania nacional deve motivar diferentes correntes políticas e segmentos sociais, inclusive dentre os que não a compreendem em sua magnitude, mas objetivamente se vêm na contingência de defendê-la.

    Quanto maior a amplitude, mais chances de êxito; quanto mais hábil, flexível e, ao mesmo tempo, firme a conduta do governo Lula e das forças à esquerda que o compõem, mais consistente pode ser a ação comum.

    Nenhuma corrente política ou agrupamento social renuncia às suas concepções fundamentais sobre o Brasil atual e a perspectiva de futuro. A pluralidade não desbota o colorido do arco-íris; antes, o acentua e viabiliza o necessário passo adiante.

    Papel do PCdoB

    O PCdoB, longe de ser corrente das mais fortes organicamente, ostenta larga experiência no âmbito de frentes amplas. “Quando não consegue ser tijolo é a argamassa que os une”, disse certa vez o então presidente da Câmara dos Deputados, Ibsen Pinheiro, em sessão solene em homenagem ao Partido.

    Coincidentemente, realiza seu 16º Congresso propugnando a ingente necessidade de uma nova vitória eleitoral em 2026, assentada em conjugação de forças capaz de pugnar por mudanças estruturais na sociedade brasileira.

    Acompanhe: Ciclo de debates para o 16º Congresso do PCdoB discute desafios brasileiros num mundo em transição

    No Projeto de Resolução (3), ora em debate, propõe que se construa, desde já, “a mais ampla composição política, social, econômica, cultural, abarcando centro, centro-direita e esquerda, isolando e combatendo a extrema-direita e a direita” como condição sine qua non do desejado êxito eleitoral.

    Isto implica, inclusive, em ajustes na plataforma de reconstrução nacional que deu conteúdo à frente ampla vitoriosa no pleito passado.

    Para além da comunicação digital

    Tal concepção tática há que ser assimilada por variados agrupamentos, formais ou informais, que concretizam hoje a luta na base da sociedade.

    No caso particular do PCdoB, urge a dinamização das suas Organizações de Base, convertendo-as em renovados espaços de convivência solidária, de troca de ideias, experiências e de articulação para a ação concreta.

    Onde há contradição ocorrem lutas, mesmo espontaneamente. Seja pelo salário e por melhores condições de trabalho, seja pela melhoria da infraestrutura e da segurança no bairro, seja ainda pelo emaranhado de questões concretas que envolvem a qualidade do ensino nas escolas de nível médio e superior, etc. 

    Nesse sentido, persiste a necessidade de ação comum em qualquer ambiente onde as pessoas se aglomerem e desejem satisfazer suas necessidades e aspirações.  

    Mesmo quando “espontâneos” esses movimentos podem (e devem) se conectar com a luta política geral, em variados níveis, mediante interferência militante consciente.

    Para dar objetividade e consequência à ampla conjugação de forças “por cima”, indispensável é lastrear o movimento “pela base”.

    No que concerne especificamente ao PCdoB, significa disseminar milhares de Organizações de Base inseridas na vida do proletariado, da juventude, das mulheres e da intelectualidade. Feito a água da chuva, que cai sobre o solo e se espalha por toda parte.

    Luciano Siqueira foi vice-prefeito do Recife (PE) por quatro mandatos. É membro do Comitê Central do PCdoB e coordenador do Grupo de Pesquisa Cultura & Sociedade da Fundação Maurício Grabois. Autor do Blog de Luciano Siqueira


    Referências

    1. Forbes: Tarifaço Americano Ameaça Quebrar Década Dourada do Agro Brasileiro 
    2. Lênin: Esquerdismo, doença infantil do comunismo
    3. Projeto de Resolução do 16º Congresso do PCdoB