Como sede da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP30), que acontece em novembro em Belém (PA), o Brasil tem a oportunidade de se colocar como uma liderança da discussão ambiental no mundo, a partir da perspectiva do Sul Global.
Para isso, é necessário que o país pense um modelo de preservação que contemple a sua realidade, levando em conta a necessidade de manter o desenvolvimento econômico e preservar a soberania do seu projeto de nação. Essa foi a avaliação da mesa Sul Global e Geopolítica Climática, que abriu na quarta-feira (10) o Ciclo de Debates preparatórios para a COP30: “Clima, Desenvolvimento e Transformação Ecológica Justa: Perspectivas do Sul Global”.
Os debates acontecem até sexta-feira (12), das 18h às 20h, com transmissão ao vivo pela TV Grabois, no YouTube.
O professor Euzébio Jorge trouxe para o debate a forma de pensar a assimetria da relação de poder econômico e poder político dos países, de forma que as escolhas sobre sustentabilidade adotadas no Sul Global por países como o Brasil não podem ser as mesmas que as adotadas por países do Norte Global como Noruega, França e Alemanha, entre outros, porque estão “em lugares distintos na relação de subordinação que existe entre os países, na relação simbiótica do sistema mundo em que os países periféricos não conseguiram solucionar elementos determinantes, fundamentais, da sua estrutura social e econômica”.
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Ele contextualiza que o desenvolvimento dos países do Sul Global no século XX foi marcado por uma industrialização “suja”, com grande impacto ambiental, mas o modelo chinês que está sendo implementado no século XXI aponta o uso da tecnologia no desenvolvimento de uma economia de baixo carbono, por meio do conceito de sociedade ecológica, que abre uma possibilidade para o Brasil implementar o seu desenvolvimento de forma ecológica.
“A gente passa a se inserir nessa outra cadeia podendo pensar uma estratégia de uma economia de baixo carbono, em que a gente já possui alguma dianteira em alguns setores de uma transição energética limpa, na produção de alguns bens que nos colocaria à frente para pensar esse novo modelo de desenvolvimento fundado no entendimento que a a gente ainda ocupa um lugar periférico dependente na dinâmica global”, destaca.
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Ele defende que essa transição deve ser feita aumentando o crescimento econômico, qualificando o tipo de produção setorialmente e garantindo que o país supere os problemas estruturais no mercado de trabalho e na estrutura social, e aponta que o Brasil, a exemplo da China, tem condições de resolver o problema ambiental com suas próprias características. “Eu acho que o Brasil deveria fazer o mesmo que é entender a diversidade do nosso país, entender quem é o nosso povo, produzir tecnologias compatíveis com nossa realidade econômica e social e parar de tentar importar soluções.”
Theófilo Rodrigues destaca que a discussão sobre o antropoceno, a era geológica que considera a ação do homem sobre o meio ambiente deve ser pensada a partir da visão marxista de que a sociedade é dividida em classes e, portanto pode-se falar em capitaloceno, termo adotado pelo sociólogo estadunidense Jason Moore para explicitar que a responsabilidade sobre a destruição do planeta está concentrada na classe dominante global.
“A culpa é do modelo de desenvolvimento predatório que tem sido levado adiante desde 1492, quando houve a colonização europeia na América. Essa ideia desenvolvimentista do capitalismo ocidental do Norte Global que venceu no mundo nos últimos séculos e promoveu desigualdade, concentração de riqueza, consumismo desenfreado e degradação ambiental”, destaca.
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Rodrigues defende a necessidade de olharmos para soluções ambientais que nascem no Sul Global, com destaque para a sociedade ecológica chinesa, que se consolida no 18º Congresso do Partido Comunista Chinês em 2012. “É a ideia de que o socialismo precisa também criar um desenvolvimento de novo tipo, não dá pra repetir as bases de desenvolvimento antigas. É preciso dentro do socialismo construir um desenvolvimento de novo tipo capaz de promover esse reencontro do homem com a natureza.”
Theófilo Rodrigues considera que a solução para o caso brasileiro precisa partir do Estado e defende que ela precisa avançar em relação às ações de adaptação e mitigação, para adotar um terceiro eixo baseado em restauração. “A gente precisa promover impacto positivo sobre o meio ambiente e uma forma de se fazer isso seria ter um grande Plano Nacional de Regeneração, quem sabe a ser apresentado na COP30.”
Para o financiamento desse plano, além dos recursos que devem ser cobrados dos países do Norte Global, Rodrigues aponta a necessidade de buscar uma fonte nacional que garanta a sua implementação. “Me parece que o recurso está onde tem mais dinheiro no Brasil, que é no petróleo. Me parece que a gente precisa hoje de um fundo socioambiental do pré-sal, pra financiar também a transformação ecológica.”
Assista à íntegra do debate: