A transição energética brasileira deve ser baseada em ciência e tecnologia, com investimento do Estado, e deve ser pensada a partir da Petrobras. Essa foi a avaliação da mesa Tecnologia e Transição Energética Justa, que abriu na quinta-feira (11) o Ciclo de Debates preparatórios para a COP30: “Clima, Desenvolvimento e Transformação Ecológica Justa: Perspectivas do Sul Global”.
Ticiana Alvares, diretora técnica do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis Zé Eduardo Dutra (Ineep) destaca que a transição energética e a Revolução 4.0 são uma etapa da disputa entre as grandes potências capitalistas e defende que o Brasil precisa pensar a sua inserção nesse cenário com base na autossuficiência das suas cadeias produtivas.
“A gente não pode abrir mão do nosso papel enquanto quinto país que mais emite gás de efeito estufa”, aponta.
Com quase 90% de sua matriz elétrica renovável e quase 50% da matriz energética renovável, Ticiana destaca que as emissões vêm “sobretudo do desmatamento, do uso da terra e do agronegócio”, que somam cerca de 76%. Ela defende que a transição do país deve ser feita levando em conta a importância do petróleo para o desenvolvimento do país, setor responsável por 13% do PIB industrial, que gera mais de 600 mil empregos com salários maiores do que a média nacional.
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“Isso inclui o setor de óleo e gás, inclui a renda petroleira e a maior empresa do Brasil, que é a Petrobras, que podem ser capazes de alavancar, de fato, a transição energética, revertendo a Petrobras para uma empresa integrada de energia, mas isso planejado ao longo do tempo, sem abrir mão da nossa soberania e da nossa segurança energética, porque senão a gente se enfraquece dentro das nossas riquezas, a gente se enfraquece dentro do próprio sistema internacional”, defende.
Para a diretora do Ineep, a transição energética do Brasil deve ser vista principalmente como uma oportunidade de desenvolvimento de novas forças produtivas. “A transição justa só vai ser possível se houver, de fato, um projeto nacional de desenvolvimento de uma nova indústria verde, que a gente pode chamar de neoindustrialização, associado a esse projeto de transição justa”.
O engenheiro agrônomo Luiz Rodrigues, consultor legislativo do Senado Federal e ex-secretário executivo adjunto do Ministério da Agricultura e Pecuária, aponta que o Brasil já obteve avanços importantes com o uso do etanol e da biomassa para diversificação da produção de energia e destaca a importância dos investimentos estatais em ciência e tecnologia.
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“Sem pesquisa e desenvolvimento, o Brasil não teria se tornado um grande produtor mundial de etanol, nem sempre o setor reconhece essa importância do Estado, que foi um dos principais alocadores não só para pesquisa e desenvolvimento, mas também para criação de escala”, pontua.
Rodrigues destaca a necessidade de coordenação entre o Estado e as empresas que atuam no setor, tanto públicas quanto empresas privadas. “A gente não pode perder de vista o papel do Estado, não só atuando diretamente, como ele faz magistralmente, como uma empresa tal como a Petrobras, mas também criando regulação e pesquisa, mesmo quando a empresa não é diretamente controlada pelo Estado. O papel do Estado ali também é fundamental.”
O professor do Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Allan Kardec, destaca que frequentemente a Amazônia é tratada como um clichê, ora como um lugar periférico, ora como um lugar exótico e afirma que a discussão sobre a margem equatorial envolve o desconhecimento estratégico que existe sobre a Amazônia em nível nacional e internacional.
“A gente tem que ter a margem equatorial para o desenvolvimento da Amazônia. A gente nunca teve uma oportunidade tão grande para o Brasil e para a Amazônia como é a margem equatorial, como foi para Rio de Janeiro, São Paulo e Espírito Santo a margem leste do Brasil.”
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Kardec considera que a margem equatorial pode contribuir para uma transição energética justa na região da Amazônia. “Se a gente incorpora isso numa produção, substituindo esse sistema de estações de produção a diesel, com sistemas utilizando biomassa ou também energia solar, fazendo ali um sistema híbrido de produção, principalmente para as áreas remotas, possivelmente esse valor que é pago, utilizado para manter o sistema de geração de produção na Amazônia, nós podemos garantir talvez uma transição justa também para a Amazônia.”
José Bertotti, professor e pesquisador em inovação, e sócio-fundador do Instituto Toró, Clima, Tecnologia e Cultura, defende que o debate não deve ser sobre transformação energética, mas transformação ecológica com vistas à neutralidade das emissões de gases de efeito estufa.
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“O problema das emissões inclusive de gases de efeito estufa no Brasil não está na energia, por um problema básico: a indústria brasileira é pequeníssima para o tamanho das necessidades do Brasil. Agora as oportunidades que surgem para o Brasil são imensas quando a gente sabe que metade da nossa matriz energética é limpa”, defende.
Bertotti chama a atenção para a discussão sobre os créditos de carbono que, na sua opinião, não resolvem o problema:
“Se nós entrarmos na balela do crédito de carbono, para vender crédito de carbono, nós vamos vender o nosso futuro.”
“A transformação ecológica, com segurança energética, aproveitando as potencialidades do Brasil, ela precisa ter em questão que, partindo do pressuposto que eu concordo e a maioria dos cientistas concordam, é que nós vivemos num momento de aquecimento global causado pelo efeito estufa e que sim, a queima dos combustíveis fósseis a junto com a perda da biodiversidade que é causada também por queimadas e aí você tá emitindo CO2, é um dos principais causadores do aquecimento global.”
Assista à íntegra do debate: