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    México arrisca economia e soberania ao mirar tarifas na China

    Claudia Sheinbaum anunciou em 10/09 pacote que prevê aumento de tarifas para países sem acordo comercial com os mexicanos, sob pressão dos EUA. Análise de como a medida pode prejudicar o país

    POR: Jiang Shixue

    8 min de leitura

    Presidente da China Xi Jinping reúne-se com a presidente mexicana Claudia Sheinbaum Pardo à margem da cúpula do G20, no Rio de Janeiro (RJ), em 18/11/2024. Foto: Li Xueren/Xinhua
    Presidente da China Xi Jinping reúne-se com a presidente mexicana Claudia Sheinbaum Pardo à margem da cúpula do G20, no Rio de Janeiro (RJ), em 18/11/2024. Foto: Li Xueren/Xinhua

    O México precisa pensar duas vezes antes de impor tarifas à China

    Relatos recentes indicam que o México, aparentemente sob pressão dos Estados Unidos, está considerando impor tarifas adicionais sobre exportações chinesas. Essa medida não apenas prejudicaria o próprio desenvolvimento econômico do México, mas também comprometeria o dinamismo das relações China-México e afetaria a manutenção de uma ordem de comércio internacional justa e razoável. Esse episódio revela claramente os dilemas enfrentados por países pequenos e médios em meio à rivalidade entre grandes potências, bem como os graves danos que o unilateralismo e o protecionismo causam às relações econômicas e comerciais internacionais.

    I. Prejuízo para a própria economia do México

    Do ponto de vista econômico, a decisão mexicana aumentará diretamente os custos de importação e elevará os preços ao consumidor no mercado interno. Como um país com base manufatureira relativamente frágil e uma estrutura econômica ainda dependente de mercados externos, o México necessita de importações substanciais de bens intermediários, componentes e produtos de consumo para manter o funcionamento de suas cadeias industriais e a estabilidade do bem-estar social.

    Os produtos chineses, conhecidos por sua boa qualidade e preços baixos, já estão profundamente inseridos no mercado mexicano em setores como eletrônicos, máquinas e equipamentos, têxteis e bens de consumo diário. Uma vez impostas tarifas sobre esses produtos, é previsível que as empresas mexicanas enfrentem custos de produção mais altos, o que enfraquecerá sua competitividade exportadora e, em última instância, prejudicará o desenvolvimento de seu próprio setor manufatureiro.

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    As tarifas se traduzirão em aumento de preços. A longo prazo, isso agravará os níveis de inflação no México e aumentará o descontentamento social. Particularmente para os grupos de baixa renda, que dependem de produtos chineses acessíveis, a implementação de políticas tarifárias elevará significativamente o custo de vida, afetando a equidade social.

    Além disso, tributar produtos chineses não fortalecerá genuinamente as indústrias domésticas mexicanas. Na realidade, desenvolver a competitividade industrial do México exige mais investimentos em tecnologia, capacitação de mão de obra e melhoria da infraestrutura — e não a elevação artificial de barreiras a produtos estrangeiros por meios administrativos. Esse modelo de protecionismo, com frequência, deixa as indústrias locais sem pressão competitiva, levando à ineficiência e, assim, enfraquecendo a vitalidade econômica geral.

    II. Prejudicial para as relações China-México

    A cooperação entre China e México tem se desenvolvido rapidamente nas últimas duas ou três décadas em áreas como comércio, investimento e intercâmbio cultural. A China já é o segundo maior parceiro comercial do México. Essa cooperação não apenas impulsionou o crescimento das exportações mexicanas, mas também trouxe financiamento e apoio técnico para sua infraestrutura e desenvolvimento energético, entre outros setores. Se o México adotar medidas tarifárias contra a China sob pressão dos EUA, inevitavelmente enviará um sinal político hostil, prejudicando a confiança bilateral.

    Do ponto de vista diplomático, as relações sino-mexicanas sempre enfatizaram o benefício mútuo e a tomada de decisão independente. Caso o México ceda à pressão norte-americana e adote medidas comerciais discriminatórias contra a China, será visto como carente de autonomia estratégica. Isso não apenas reduzirá a disposição chinesa de investir no México, mas também poderá diminuir a confiança da China na posição mexicana em fóruns multilaterais. Para uma economia de porte médio, dependente de mercados externos, uma política externa vacilante e dependente apenas enfraquecerá sua voz no cenário internacional.

    Mais importante ainda, a cooperação entre México e China não se limita ao nível bilateral, mas faz parte do padrão mais amplo de colaboração da China com a América Latina. Se o México for o primeiro a impor tarifas à China, poderá criar um precedente negativo para outros países, afetando a estabilidade das relações globais da China com a região. Essa medida faria o México perder o papel construtivo que poderia desempenhar na diplomacia regional.

    III. Dano às regras do comércio internacional

    A imposição de tarifas mexicanas sobre produtos importados da China não se baseia em necessidades próprias de comércio justo, mas sim em uma atitude passiva frente à coerção dos EUA. Essa ação viola os princípios de não discriminação, livre e justo comércio defendidos pela Organização Mundial do Comércio (OMC) e enfraquece a posição unida do mundo em desenvolvimento contra o protecionismo.

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    Nos últimos anos, os Estados Unidos têm recorrido com frequência a tarifas unilaterais, jurisdição extraterritorial e outros meios para forçar países a escolher lados, essencialmente politizando questões econômicas a serviço de sua estratégia geopolítica. Se o México seguir esse caminho, não apenas prejudicará sua imagem como defensor do multilateralismo, mas também contribuirá objetivamente para a fragmentação da ordem econômica e comercial internacional. Essa prática levará à “fragmentação das regras”, tornando as cadeias globais de valor e suprimento mais vulneráveis.

    Atualmente, a economia mundial enfrenta desafios generalizados, como baixo crescimento, inflação, instabilidade nas cadeias globais de valor e unilateralismo, exigindo urgentemente que os países cooperem para promover a liberalização comercial e a globalização econômica — e não que adotem mentalidade de soma zero e medidas protecionistas. Se o México insistir em elevar tarifas, será visto como alinhado ao movimento antiglobalização, perdendo não apenas a autoridade moral de defender os interesses dos países em desenvolvimento no cenário internacional, mas também enfrentando críticas da opinião pública global.

    IV. Pensar duas vezes antes de agir

    A China espera que o México seja extremamente cauteloso e pense duas vezes antes de agir. De fato, a competição entre EUA e China afeta a política externa mexicana. Diante da coerção norte-americana, o México tem opções. Como Estado soberano independente, o país é plenamente capaz de manter sua relação com os Estados Unidos, ao mesmo tempo em que insiste em uma política externa diversificada e autônoma, sem tomar partido.

    Na realidade, ao fortalecer a cooperação com a China e outros parceiros, o México pode reduzir sua dependência excessiva dos EUA e aumentar sua resiliência. Ao aproveitar as diferenças de mercado entre China e EUA, o México pode desempenhar um papel de ponte em áreas como cadeias globais de valor, centros logísticos e investimentos transfronteiriços, conquistando assim mais espaço de desenvolvimento em meio à rivalidade das grandes potências.

    É verdade que o México está “tão longe de Deus e tão perto dos Estados Unidos”. Mas a experiência histórica mostra que a dependência excessiva de um único mercado leva apenas à passividade, enquanto a diversificação e a autonomia são fundamentais para o desenvolvimento sustentável. A China oferece ao México a possibilidade de diversificar suas relações econômicas externas. Se o México conseguir enxergar sua relação econômica com a China de forma estratégica, poderá ser um bom parceiro tanto dos Estados Unidos quanto de outros países, mesmo diante do complexo cenário internacional.

    Em resumo, impor novas tarifas a produtos chineses importados sob coerção dos EUA não apenas prejudicará o desenvolvimento econômico do México, como também afetará as relações China-México e enfraquecerá a justiça da ordem comercial internacional. O México precisa reconhecer que o caminho que realmente serve a seus interesses nacionais não está em ceder à pressão externa, mas sim em insistir na independência, autonomia e aprofundamento da cooperação multilateral. Somente assim o México poderá encontrar sua posição no processo de globalização e alcançar prosperidade de longo prazo.

    Jiang Shixue é professor da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau.

    Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial da FMG.