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    Direitos Humanos

    PL Antifacção, PL do Terrorismo e PEC da Segurança: conheça as propostas em disputa

    Após a chacina no Rio, projetos na Câmara dos Deputados contra o crime organizado estão no centro da disputa entre o governo e a extrema-direita sobre o rumo da segurança pública

    POR: Leandro Melito

    8 min de leitura

    Lula assina o Projeto de Lei Anti-Facção, ao lado dos ministros Ricardo Lewandowski e Rui Costa, no Palácio do Planalto. Foto: Ricardo Stuckert/PR
    Lula assina o Projeto de Lei Anti-Facção, ao lado dos ministros Ricardo Lewandowski e Rui Costa, no Palácio do Planalto. Foto: Ricardo Stuckert/PR

    A megaoperação policial que resultou na morte de pelo menos 121 pessoas — sendo quatro policiais — nos Complexos do Alemão e da Penha, na zona norte do Rio de Janeiro (RJ), no dia 28 de outubro, mobilizou o tema da segurança pública no país, com movimentações no Executivo e no Congresso Nacional.

    Na terça-feira (4), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou que o foco do governo federal será “nos cabeças do crime — quem financia e comanda as facções”. Em mensagem na rede social X, Lula enumerou avanços de sua gestão na área da segurança pública e defendeu empenho na aprovação de dois projetos do Executivo em tramitação no Congresso Nacional: o Projeto de Lei Antifacção e a PEC da Segurança Pública.

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    “Para sustentar esses avanços, o governo enviou ao Congresso o PL Antifacção, que endurece as penas e asfixia financeiramente as facções; e a PEC da Segurança Pública, que moderniza e integra as forças policiais, incorpora as Guardas Municipais e garante recursos permanentes para estados e municípios. Essas medidas completam o ciclo da segurança: investigação mais eficaz, integração institucional e base legal sólida — uma combinação que consolida o enfrentamento ao crime no Brasil”, escreveu Lula em seu perfil no X.

    Enviado ao Congresso Nacional na sexta-feira (31) em regime de urgência, o PL Antifacção endurece as medidas contra organizações criminosas e estabelece  penas que poderão chegar a 30 anos de prisão para aqueles que forem condenados por “organização criminosa qualificada”, novo tipo penal previsto na proposta.

    O projeto eleva para entre 12 e 20 anos as penas para homicídios ligados a organizações criminosas e passa para de 8 a 15 anos de prisão quando os crimes cometidos por essas organizações tiverem como objetivo o controle de territórios ou atividades econômicas, mediante o uso de violência, coação ou ameaça. A pena pode aumentar em caso de conexão com outras organizações, comprovação de transnacionalidade e também nos casos de morte ou lesão corporal de agente de segurança pública.

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    O PL prevê o fortalecimento das técnicas e instrumentos de investigação, com a possibilidade de infiltração de policiais e de colaboradores em facções, e autoriza a Justiça a determinar que provedores de internet, telefonia e empresas de tecnologia garantam o acesso a dados de geolocalização em casos de ameaça à vida ou integridade de pessoas.

    Proposta de Emenda Constitucional 18/2025, a PEC da Segurança Pública, foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara e está em discussão em uma comissão especial da Casa, sob relatoria do deputado Mendonça Filho (União Brasil – PE).

    A PEC propõe uma reorganização e explicitação das competências em matéria de segurança pública entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, com o objetivo principal de fortalecer a coordenação nacional, especialmente no combate ao crime organizado, e formalizar a atuação dos municípios.

    Para fortalecer a função de coordenação e planejamento da União sobre segurança pública, a PEC propõe a criação do Sistema Único de Segurança Pública (Susp), que funcionaria nos moldes do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Sistema Único de Assistência Social (SUAS).

    A justificativa do Ministério da Justiça, que acompanha o texto enviado ao Congresso, destaca a necessidade de um planejamento estratégico nacional para combater o crime organizado, garantindo que as competências e a subordinação das polícias estaduais aos respectivos governos sejam mantidas. A PEC também prevê a criação de corregedorias e ouvidorias autônomas para fiscalizar os profissionais de segurança, e sugere a criação de um Fundo Nacional de Segurança Pública e de um Fundo Penitenciário.

    “O governo tomou a iniciativa em torno dessa questão de criar um sistema nacional de segurança pública, que é a proposta adequada para formular a política nacional de segurança pública, mas isso evidentemente cria uma limitação para o exercício da repressão nos estados, e os governadores de extrema-direita procuram se contrapor. A extrema-direita procura se utilizar desses eventos no Rio de Janeiro para colocar no centro do debate a questão da segurança pública”, aponta o advogado Aldo Arantes, integrante da Associação Nacional de Advogados e Advogadas pela Democracia, Justiça e Cidadania (ADJC).

    A PEC enfrenta resistência de parlamentares ligados à extrema direita no Congresso Nacional, entre eles o relator da proposta, deputado Mendonça Filho (União-PE), assim como o presidente da comissão especial que analisa a proposta, Aluisio Mendes (Republicanos-MA) e o deputado Alberto Fraga (PL-DF), que defenderam publicamente a operação policial comandada pelo governador Cláudio Castro no Rio de Janeiro.

    Durante a discussão da comissão especial que analisa a PEC na segunda-feira (3), o relator da proposta se posicionou contra transferir a coordenação da segurança pública para o governo federal, por retirar autonomia dos estados, posicionamento que classificou como uma “divergência de fundo, por ser da oposição”.

    Para Aldo Arantes, essa articulação da extrema direita no período que antecede as eleições de 2026 faz parte da lógica da extrema-direita para reverter o quadro favorável ao governo Lula:

    “Há uma concepção que eu chamo de irracionalismo político ideológico, que surge diante da crise do capitalismo, ou de uma situação em que a extrema direita se vê em dificuldade e procura confundir o quadro: nega a ciência, a história, a verdade e os fatos para criar uma narrativa alternativa que a coloca em uma situação favorável.”

    Na sessão de segunda-feira (3), o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, ressaltou que a PEC pretende estimular a participação e a integração de todo o sistema e reforçou que o texto não prevê a transferência das atribuições das polícias civis para a PF. Segundo Rodrigues, a PEC deve  “fomentar e definitivamente consolidar” o processo de integração entre as polícias.

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    Ataques da extrema direita

    Uma articulação da extrema direita bolsonarista busca impulsionar na Câmara dos Deputados o projeto de lei do deputado Danilo Forte (União-CE), conhecido como PL do Terrorismo, com o objetivo de equiparar crimes cometidos por facções e milícias ao terrorismo, por meio da atualização da Lei Antiterrorismo.

    “Eles levantam uma bandeira extremamente perigosa, que procura equiparar a criminalidade com o terrorismo. É uma tentativa de estarem sintonizados com a perspectiva do Trump, que tem utilizado esse argumento para atacar e matar pessoas sob a justificativa de combate ao tráfico na Venezuela”, aponta Arantes.

    A medida tem recebido apoio de governadores da extrema-direita em apoio a Cláudio Castro (PL-RJ): Tarcísio de Freitas (Republicanos – SP),  Ibaneis Rocha (MDB-DF), Romeu Zema (Novo-MG), Jorginho Mello (PL-SC), Ronaldo Caiado (União-GO) e Eduardo Riedel (PP-MS).

    Na segunda-feira (3), o governador de São Paulo declarou que um dos objetivos do grupo é aprovar o PL do Terrorismo e liberou o secretário de Segurança Pública do estado, Guilherme Derrite (PP), para ser o relator do projeto no Congresso Nacional.

    Para fazer frente ao posicionamento da extrema-direita sobre essa questão, Aldo Arantes defende que a esquerda precisa avançar na discussão sobre a temática da segurança pública:

    “O PCdoB está em um processo de reflexão, à esquerda, porque nós precisamos compreender que é necessário tomar medidas enérgicas de repressão à criminalidade, mas não podemos confundir criminalidade com terrorismo.”

    “É preciso ver que há problemas estruturais. Se, por um lado, existe a necessidade de combater a criminalidade, também temos que criar as condições para impedir a ampliação da criminalidade junto às camadas pobres da população, com educação, saúde e cultura, de tal maneira que você atraia a juventude, ao invés de ela ser atraída para o crime”, conclui Arantes.

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