Boitempo lança “Lutas de classes na Alemanha”
Os documentos incluídos nesse pequeno volume – “Glosas críticas ao artigo ‘O rei da Prússia e a reforma social. De um prussiano’”; “Reivindicações do Partido Comunista da Alemanha” e “Mensagem do Comitê Central à Liga [dos Comunistas]” – são bastante distintos, mas se caracterizam todos por uma formidável lucidez política. O fio condutor dos três é o mesmo: a luta de classes na Alemanha entre explorados e exploradores, oprimidos e opressores, a dialética entre revolução social e política.
O livro é composto de textos raramente publicados, selecionados com o auxílio do filósofo Michael Löwy e nunca antes reunidos em uma mesma edição. A exemplo da obra Lutas de classes na França: 1848 a 1850, no qual Marx reuniu escritos sobre os combates franceses, esse volume contempla análises suas e de Engels acerca da experiência alemã. São textos produzidos no calor da hora, conclamando os leitores de então a participar ativamente das transformações sociais em curso, e foram escritos por Marx e Engels na juventude, quando ambos contavam com 25 a 30 e poucos anos.
Como afirma na orelha Ivo Tonet, professor do departamento de Filosofia da Universidade Federal de Alagoas, “as ideias fundamentais expressas nesses textos – a centralidade do proletariado como sujeito ativo e fundamental da revolução, a necessidade da articulação das lutas democráticas com a perspectiva de uma revolução socialista, a diferença radical entre revolução com alma política e revolução com alma social, a natureza essencial do Estado como expressão e condição de reprodução da desigualdade social, a impotência do Estado face aos problemas sociais e, portanto, a limitação intrínseca das políticas públicas, a limitação essencial da cientificidade burguesa (o intelecto político) por causa de seu viés particular e a superioridade da perspectiva do proletariado (intelecto social) por causa de seu viés de totalidade – continuam de uma atualidade inquestionável até os dias de hoje”.
Para enriquecer esta edição, foi incluído o poema “Os tecelões da Silésia”, escrito por Heinrich Heine em 1844 com base no levante ocorrido no mesmo ano, e que também inspirou Marx a publicar o primeiro dos artigos apresentados neste volume, como aponta Löwy em seu “Prefácio”.
Trecho
Um dos trechos da obra coloca:
“A existência do Estado e a existência da escravidão são inseparáveis. A fusão do Estado antigo com a escravidão antiga – antíteses clássicas declaradas – não era mais íntima do que a do Estado moderno com o moderno mundo da barganha – antíteses cristãs dissimuladas. Se quisesse eliminar a impotência de sua administração, o Estado moderno teria de eliminar a atual vida privada. Se ele quisesse eliminar a vida privada, teria de eliminar a si mesmo, porque ele existe tão-somente como antítese a ela. Porém, nenhum vivente julgará que as deficiências de sua existência estejam fundadas no princípio de sua vida, na essência de sua vida, mas sempre em circunstâncias exteriores à sua vida. O suicídio é antinatural. O Estado não pode, portanto, acreditar que a impotência seja inerente à sua administração, ou seja, a si mesmo. Ele pode tão-somente admitir deficiências formais e casuais na mesma e tentar corrigi-las. Se essas modificações não surtem efeito, a mazela social é uma imperfeição natural que independe do ser humano, uma lei divina, ou a vontade das pessoas particulares está corrompida demais para vir ao encontro dos bons propósitos da administração. E como são pervertidas essas pessoas particulares! Eles reclamam do governo toda vez que este limita sua liberdade, mas exigem do governo que este impeça as conseqüências necessárias dessa liberdade!”
Coleção Marx-Engels
Este volume faz parte da coleção Marx-Engels, por meio da qual a Boitempo vem publicando as obras dos fundadores do marxismo em traduções diretas do alemão e sempre com a participação de intelectuais renomados. A coleção teve início com a edição comemorativa dos 150 anos do Manifesto Comunista, em 1998, contendo uma introdução de Osvaldo Coggiola e textos de especialistas – como Antonio Labriola, Jean Jaurés, Harold Laski – a respeito de suas múltiplas facetas. Em seguida, publicou-se A sagrada família – traduzida por Marcelo Backes, em 2003 –, obra polêmica que assinala o rompimento definitivo de Marx e Engels com a esquerda hegeliana. Os Manuscritos econômico-filosóficos (ou Manuscritos de Paris) vieram na sequência, traduzidos por Jesus Ranieri, ao qual se seguiram os lançamentos de Crítica da filosofia do direito de Hegel, traduzido por Rubens Enderle e Leonardo de Deus; Sobre o suicídio, traduzido por Rubens Enderle e Francisco Fontanella, com ensaio de Michael Löwy intitulado “Um Marx insólito”; A ideologia alemã (completa), traduzida por Rubens Enderle, Nélio Schneider, Luciano Martorano, com supervisão de Leandro Konder e apresentação de Emir Sader; A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, de Engels, traduzido por B. A. Schumann e supervisionado por José Paulo Netto, autor também do prefácio à obra; e, por último, Sobre a questão judaica, traduzido por Nélio Schneider e com apresentação e posfácio de Daniel Bensaïd, traduzidos do francês por Wanda Brant.
Os volumes dessa coleção vêm ainda acompanhados de um índice onomástico das personagens citadas e de uma cronobiografia resumida de Marx e Engels – que contém aspectos fundamentais da vida pessoal, da militância política e da obra teórica de ambos –, com informações úteis ao leitor, iniciado ou não na obra marxiana.
Fonte: Editora Boitempo