As declarações tiveram repercussão aqui no exterior, inclusive no FMI, embora alguns tenham notado certa desproporção entre a retórica brasileira e as providências tomadas nessa área pelo governo. Talvez a escalada retórica seja prenúncio de novas medidas para conter a entrada de capitais e a valorização exagerada da moeda brasileira (esperemos que sim).

O problema apontado pela equipe econômica brasileira decorre, em larga medida, do quadro global, em especial da situação das economias emissoras de moeda de liquidez internacional. Os bancos centrais dessas economias – a Reserva Federal, o Banco Central Europeu e o Banco do Japão – vêm adotando políticas monetárias extremamente expansivas, com juros básicos próximos de zero e grande ampliação da oferta de moeda. Isso estimula grandes movimentos de capital para países como o Brasil. A razão dessas políticas monetárias está no legado da crise de 2008-2009. As principais economias estão se recuperando com grande dificuldade.

O crescimento tem sido lento e hesitante. Os níveis de desemprego continuam elevados. Não há risco perceptível de inflação nos EUA, na União Europeia e, menos ainda, no Japão.

Além disso, em muitos países desenvolvidos – por uma combinação de fatores políticos e econômicos -, a política fiscal ficou mais ou menos congelada.

Por limitações de natureza financeira (déficits e dívidas muito elevados e pressão dos mercados contra países mais vulneráveis) e/ou de natureza política (resistências dos Parlamentos e da opinião pública a novas medidas de estímulo via orçamento público), ficou difícil continuar fazendo o que foi feito em 2008-2009: impulsionar a economia com um grande aumento dos gastos governamentais ou diminuição de impostos.

Vários países estão sendo levados a fazer o contrário e já começaram a apertar as suas políticas fiscais.

Resultado: sobrou a política monetária.

O que se espera, por um lado, é que a expansão monetária consiga estimular a demanda doméstica de consumo e investimento. Por outro – e aqui começa a “guerra cambial” -, que ela também leve a uma depreciação do dólar e das outras moedas de liquidez internacional, favorecendo a recuperação das economias centrais via aumento das exportações e substituição de importações por produção local. Em outras palavras, as economias centrais querem sair da crise exportando, com apoio de moedas depreciadas. Isso implica, evidentemente, que outros países, principalmente os emergentes, aceitem apreciação das suas moedas, perda de competitividade internacional e déficits nas suas contas externas.

Diversos países vêm dando indicações de que não concordam com esse roteiro. O caso mais célebre é o da China, que resiste a qualquer apreciação mais significativa da sua moeda. Mas a China está longe de ser um caso único.

A Suíça, por exemplo, vem há tempos atuando para conter a valorização do franco suíço. O Japão interveio recentemente para conter a subida do iene.

Outros países asiáticos estão seguindo o mesmo caminho.

O Brasil tem que se cuidar, portanto.

Não há, a meu ver, possibilidade de contar com uma solução baseada em cooperação internacional no âmbito do G-20 ou do FMI. No horizonte visível, é basicamente cada um por si.

O que pode fazer o Brasil? As políticas macroeconômicas tradicionais têm efeitos limitados ou ambíguos. Parece difícil enfrentar a superabundância de liquidez internacional sem tomar medidas diretas e específicas de controle do ingresso de capital e de caráter prudencial na área financeira.

O economista americano James Tobin costumava dizer, desde os anos 70, que era preciso colocar areia nas rodas das finanças internacionais. Hoje, iria mais longe: areia, tijolos e cimento.

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Fonte: jornal O Globo