Para não esquecer
Enquanto Luiz ganha eleição, Carlos faz cem anos. Ou faria, tivesse aqui, sentado neste banco de praia, ou praça – o que vem a dar no mesmo, porque do mesmo vem e dá (plaza, playa, paisagem, país).
Enquanto Luiz, sobre um palanque, comemora um povo inteiro, Carlos mal é lembrado nas faculdades de Letras. Sai em jornais e portais e revistas e que tais, é certo – comentários, análises, homenagens, lembranças, trechos do que disse, quis dizer e não pôde -, mas lembrar não é o mesmo que não esquecer.
Luiz é Inácio e é Silva. Carlos é Drummond e Andrade. Um, sem antepassado húngaro e casa nobre inglesa de Onda Alta no sangue, é ígneo, vulcânico, popular e, agora, presidente. O outro, sem o chão seco sob os pés e a fome e o torno que lhe comeu o dedo, é férreo e montes e itabirano e, sempre, poeta.
O que há entre o ferro e a lava? Poesia, povo – tudo é ferro quando em lava se fabrica.
Nos altos fornos desse chão tão nosso quanto estrangeiro, cozinham-se o pão e o verso na mesma massa: Carlos ou Luiz, ambos são Moacy, filho da mesma dor, do mesmo beliscão, dos mesmos negros tormentos das senzalas feitas quilombos, arraiais, colunas, destacamentos guerrilheiros e praças repletas de esperança.
Por isso, Luiz, nunca esqueça de Carlos (praça, casa, mundo, país).