Com a pata quebrada,
rastejando na avenida,
o pêlo sujo de barro e sangue.
Animal agonizante,
alvo da inútil
e fútil
comiseração pública.

Os imensos olhos,
duas lagoas baças
poluídas de dor
e tristeza.
(Até que alguém chega
e diz:
– A pata partiu-se,
é preciso poupá-lo…)

O ciúme, a vingança, a mesquinhez,
dançando e se despindo,
esplêndidas odaliscas
ovulando sedução.
Saberá o meu coração resistir?

A serpente
fita fita fita fita fita
sibila sibila sibila sibila sibila
hipnotiza
o meu gigante coração
que se vê reduzido
a um animalzinho trêmulo.
O mundo da corrupção
corromperá também meu coração?
Mas mesmo pulsando
dentro de um animal
inutilizado,
ele se recusa a bombear fel.

Aconselham-me armadilhas
para capturar e infelicitar,
o meu coração vem
e desativa as engrenagens do ódio
e diz:
– Que ela seja feliz!
E das arquibancadas,
alguém grita:
– Teu coração é bobo.

Pode até ser,
mas é o único
que tenho.

Verbos do Amor & Outros Versos – Adalberto Monteiro
Goiânia – 1997

Adalberto Monteiro, Jornalista e poeta. É da direção nacional do PCdoB. Presidente da Fundação Maurício Grabois. Editor da Revista Princípios. Publicou três livros de poemas: Os Sonhos e os Séculos(1991); Os Verbos do Amor &outros versos(1997) e As delícias do amargo & uma homenagem(2007).