Nessa empreitada demográfica, a América Latina sai na frente: a sua população jovem permite aos países diminuir o contingente de dependentes formado por crianças e idosos. O “bônus demográfico”, como é chamado esse fenômeno populacional, vem acompanhado do crescimento econômico forte de países da América do Sul, como Brasil e Peru, que tem nas mãos uma população grande em idade ativa (de 15 a 65 anos). O número maior de trabalhadores no mercado, se bem aproveitado, é um estímulo à expansão econômica.

No Brasil, o ponto de partida do censo demográfico é o próximo dia 1 de agosto, quando 190 mil recenseadores e 32 mil supervisores começam a redescobrir o país. Enquanto conta cada um dos brasileiros, o Brasil estará vivendo um momento único. Pelos cálculos do estatístico Eustáquio Diniz, professor titular da Escola Nacional de Ciências Estatísticas, do IBGE, essa situação – uma grande parte da população apta para trabalhar – se manterá até 2050, quando o número de dependentes começa a crescer. Este ano, 67,6% da população brasileira estão entre 15 e 65 anos:

– No início dos anos 1970, um brasileiro trabalhava para sustentar mais uma pessoa. Hoje, essa razão caiu para meia pessoa.

Dois fenômenos explicam o fato de o meio da pirâmide etária brasileira – e latino-americana – estar mais gordo. O primeiro foi a queda forte na taxa de fecundidade das mulheres. A pílula e a entrada forte delas no mercado de trabalho causaram a diminuição da quantidade de filhos por mulher. Hoje, estamos abaixo do que os especialistas chamam de taxa de reposição, ou seja, a quantidade de filhos suficiente para a população continuar crescendo. Está em 1,8 por mulher, uma das mais baixas da América Latina. Outro fenômeno foi a queda na mortalidade infantil e dos jovens:

– Para aproveitar esse bônus, educação e emprego são fundamentais. A demografia está dando boa condição ao crescimento do país.

A crise econômica com a hiperinflação dos anos 80 e a pouca criação de empregos na década seguinte foram momentos em que esse bônus oferecido pelas características da população foi desperdiçado. Mas nem todos concordam que há bônus a ser aproveitado pelo país, como a demógrafa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Ana Amélia Camarano:

– É como se houvesse uma parte da população que é a salvação e a outra, vilã. A economia brasileira cresceu muito quando tínhamos muitas crianças. Nossa História não mostra que existe esse bônus.

Para ela, a onda jovem já passou e é preciso pensar no envelhecimento acelerado da população. Nesse caminho, ela crê que é importante investir na faixa mais idosa, que “está vivendo mais e em melhores condições”.

– Adiar a aposentadoria, reduzir o preconceito no mercado de trabalho com os mais idosos, investir em saúde ocupacional e treinamento e qualificação. Precisamos preparar a população em idade ativa para chegar bem lá na frente.

ONU alerta que é preciso reforçar ensino de jovens

A redução do número de crianças criará um espaço nas escolas de ensino fundamental, que poderá ser usado para o ensino médio. Além disso, haverá mais recursos por aluno, diz Naercio Menezes Filho, professor do Insper e da USP:

– O importante é encontrar uma maneira eficiente de gerir os recursos. É preciso reduzir o abandono de jovens no ensino médio. Em 2008, 16% dos jovens de 15 a 17 anos estavam fora da escola, gerando alta vulnerabilidade.

Com tanta gente em idade de trabalhar, mais de 130 milhões numa população de 193 milhões, como há queixas de falta de mão de obra? Para Menezes Filho, o jovem brasileiro está mais escolarizado, e o diferencial de salário no ensino médio e superior se reduziu nos últimos anos:

– Não temos um problema educacional geral no Brasil. Estamos atrasados em relação à Coreia e aos Estados Unidos, mas a situação no Brasil não se agravou. A questão é localizada, como na construção civil.

O ensino médio, técnico e profissionalizante seria um caminho para formar essa mão de obra disponível:

– Investimento em capital humano é o melhor investimento que o Brasil pode fazer. Aumenta produtividade da economia, as pessoas votam melhor, cuidam mais do meio ambiente e adoecem menos.

Esse caminho já foi trilhado nos anos 80 pelos tigres asiáticos. Há 40 anos, a renda per capita da Coreia do Sul era a metade da brasileira. Eles investiram forte em educação e hoje, a nossa renda representa só um terço da sul-coreana:

– Tem que reforçar a educação dos jovens. Os países asiáticos já estão reforçando a qualidade das escolas secundárias. Aí está a riqueza do futuro – afirmou, em Lima, Carlos Ellis, assessor regional do Fundo de População das Nações Unidas.

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Com agências