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    Comunicação

    papo de busão

          Estou num ônibus especial. Noto um povo de cara fechada; ouço o diálogo de dois passageiros, que estão ali, do meu lado:       – E ai Bró?.       – Como é vagaba?.       – Tudo limpo na vida louca!.       – Sabe do mano Brown?.       – Dizem que foi o caveirão que pegou ele!.       – Como […]

    POR: ACAS

    5 min de leitura

          Estou num ônibus especial. Noto um povo de cara fechada; ouço o diálogo de dois passageiros, que estão ali, do meu lado:

          – E ai Bró?.

          – Como é vagaba?.

          – Tudo limpo na vida louca!.

          – Sabe do mano Brown?.

          – Dizem que foi o caveirão que pegou ele!.

          – Como foi?

          – Foi vacilão!

          – E os manos, o quê fizeram?

          – Sacumé, macho não chora!.

          – Mas devia; ele é da perifa, como nós!.

          – Sei!.

          – Como foi?

          – Vendia farinha e não deu retorno na boca!.

          – Quanto ele devia?

          – Dizem que era um mil!.

          – Qual a idade dele?.

          – Quinze!.

          – Onde ele está? Na Febem?.

          – Não!. No necrotério do H.C.!.

          – Vamos lá?

          – Não!. Têm umas minas de campana lá!.

          – E a família dele?.

          – A velha está um trapo!.

          – E o velho?.

          – Se mandou quando ele era menino. É sangue ruim!.

          – Mas ele é menino!.

          – É, mas tem filho com uma mina da zona leste!.

          – E ela?

          – Não sabe de nada!. Ela cheirava a mercadoria dele; estava sempre fora da real!.

          – Onde está ela?

          – No depósito do Tatuapé; o filho ficou com a velha dela!.

          – Oh vida louca, Bró!.

          – É isso ai, vagaba!.

          – E domingo?

          – Vou num hip hop no Capão Redondo, e você?

          – Vou no enterro de um truta meu!.

          – Quantos anos?

          – Dezesseis!.

          – Como foi?

          – Tomava um goró com uns chegados; meia noite chegou um carro com cinco manos armados. Queimaram todos!.

          – Quantos?

          – Cinco!. Um deles tinha doze anos!.

          – É nóis na fita, né bró!

          – Pois é!

          – Pois é!.

          – Vou nessa, tchau!.

          – Tchau; a gente se vê nas quebradas!.

          – É, a gente se fala!.

          E o ônibus da era globalizada, que vai para lugar nenhum, sacoleja nas estradas da vida, da vila, da capital, da periferia.

          Nós todos vemos pela TV: os manos e as minas das periferias e dos guetos espalhados pelo mundo todo descem cada vez mais nas classes sociais e no despreparo para a era atual!. Lá fora há uma discussão acirrada. Olho pela janela o tumulto. Fico parado, olho arregalado, mudo, sem iniciativa. Ali, ao alcance de minha mão, o povo da periferia profere seu grito. Não adianta taparmos os ouvidos, nem nos escondermos.

          Não é tão necessário falar de política ou da quebra de bancos americanos. Talvez seja o caso de acreditar que uma guerra está em curso e que é preciso acordar; os políticos e a sociedade!

     Antônio Carlos Affonso dos Santos – ACAS. É natural de Cravinhos-SP. É Físico, poeta e contista. Tem textos publicados em 7 livros, sendo 4 “solos e entre eles, o Pequeno Dicionário de Caipirês e o livro infantil “A Sementinha” além de três outros publicados em antologias junto a outros escritores.