Logo Grabois Logo Grabois

Leia a última edição Logo Grabois

Inscreva-se para receber nossa Newsletter

    Comunicação

    Fernando de Noronha

    Fernando de Noronha. Arquipélago. Ilha. Plantada no mar como um pedaço de carvão boiando nas águas do Atlântico. O Pico se elevando como o Pão de Açúcar, o Espinhaço do Cavalo, o Morro dos Remédios com o Forte no alto, e na Praça dos Remédios a igrejinha caiada. A vegetação rastejante, quase à flor do […]

    POR: Carlos Marighella

    Fernando de Noronha. Arquipélago. Ilha.
    Plantada no mar
    como um pedaço de carvão boiando nas águas do Atlântico.
    O Pico se elevando como o Pão de Açúcar,
    o Espinhaço do Cavalo,
    o Morro dos Remédios com o Forte no alto,
    e na Praça dos Remédios a igrejinha caiada.

    A vegetação rastejante, quase à flor do terreno,
    o mata-pasto e a burra-leiteira,
    de cujos talos quebrados
    goteja um leite cáustico, violento,
    que queima os olhos e provoca cegueira.
    E o cabo-de-raposa e as cactáceas
    que infestam o solo com os espinhos remosos.

    E lá para o Sul, para a Sapata espalmada,
    a pequena floresta de árvores linheiras,
    sugadas de parasitas, os cipós pendurados,
    com as pontas tocando no chão escaldante.

    E os mulungus e as bananeiras de folhas ao vento,
    subindo as encostas escarpadas do Pico.
    Os cajueiros carregados de frutos vermelhos,
    mamoeiros, pinhais e coqueiros
    de palmas verdes tremulando sobre o branco das praias.

    A praia do Cachorro, que o mar esburaca,
    carregando a areia para a praia vizinha,
    Santo Antônio chamada,
    onde as balsas aportam para carga e descarga.

    Fernando de Noronha,
    com seus peixes e pássaros.
    A guarajuba, a cioba, o cangulo,
    a venenosa urubaiana e a albacora do alto-mar.
    O mumbebo que mergulha para fisgar a sardinda,
    e o alcatraz que a arrebata às bicadas ao mumbebo.

    Ilha sem rios, com águas amargas
    arrancadas às entranhas da terra
    em poços profundos e cacimbas famosas
    – Cacimba de Mulungu, Cacimba do Padre.

    Fernando de Noronha com suas lendas ingênuas
    – a lenda da Alamoa,
    os amores proibidos no Açude do Gato,
    as estórias dos bigodetes,
    as vinganças dos presos traídos no amor,
    as mãos dos sedutores amputadas a golpes de foice.

    As estórias de fugas,
    fugitivos tragados por vorazes tubarões…

    E os prisioneiros seminus,
    sob o sol abrasante,
    carregando o munício
    vergados ao peso de caixas enormes.

     

    Carlos Marighella
    Poemas – Rondó da Liberdade
    Editora Brasiliense, 1994

    Notícias Relacionadas