A Teoria Darwinista da Evolução

No relatório que apresentou à Academia de Ciências Agronômicas da URSS, Lysenko lembra em primeiro lugar que foi o aparecimento da doutrina de Darwin que marcou o início da biologia científica.

Com efeito, apesar das tentativas de Lamarck, Goethe e Geoffroy Saint-Hilaire, que sustentaram a idéia de que as espécies não são imutáveis, mas se transformam, a crença na fixação das espécies dominou até que surgiu Darwin.

No século XIX, a idéia sustentada por Lineu e Cuvier de que existem tantas espécies diferentes quantas o Criador quis pôr no mundo e que essas espécies continuam imutáveis, era quase unanimemente admitida.

Não foi senão em 1859, com a publicação de seu famoso livro “A Origem das Espécies”, que Darwin deu à hipótese de Lamarck, segundo a qual as espécies animais e vegetais descendem de formas primitivas muito simples, a base sólida que lhe faltava. Fez isto, desenvolvendo-a mais amplamente e mostrando, por sua teoria da seleção natural, como essa transformação primitiva das espécies pôde se efetuar e prosseguir com uma diversidade sempre crescente de animais e plantas.

Darwin verificou antes de tudo que, se as plantas e os animais selvagens transformam-se muito lentamente, o que deu origem a esse dogma errôneo da fixação das espécies, os animais domésticos e as plantas cultivadas, ao contrário, em muito pouco anos, sofrem uma transformação muito grande.

Depois de algumas gerações, procedendo sistematicamente a escolha dos indivíduos que possuem particularidades vantajosas, o cultivador ou criador chega a obter espécies novas que diferem da forma primitiva mais do que se diferenciam entre si as espécies selvagens.

Por exemplo, Darwin estudou especialmente as múltiplas variedades de pombos domésticos e demonstrou, muito claramente, que todas as raças de pombos descendem, sem exceção de uma única espécie, do pombo azul das Rochas, o pombo bravo.

Até então, os criadores eram já unânimes em pensar que cada raça particular de pombos descendia de uma espécie particular selvagem.

Da mesma forma, Darwin demonstrou que todas as raças e variedades de coelhos provêm do coelho selvagem e, em consequência, de uma espécie única.

Ora, é preciso observar, há mais diferença entre certas raças de coelhos do que entre os coelhos comuns e a lebre, que se considera como uma espécie diferente do coelho.

Por consequência, não há razão para não se admitir que o coelho e a lebre tenham um ancestral comum.

Assim, o estudo do desenvolvimento das plantas cultivadas e dos animais domésticos demonstra que as espécies vivas evoluem e, ao evoluir, dão origem a novas espécies.

Entretanto, a questão está em saber se, no estágio selvagem e sem a intervenção do homem, pode se operar uma certa seleção que explicaria a passagem, no decorrer de períodos geológicos sucessivos, a formas vivas sempre mais numerosas e diversificadas.

Segundo Darwin, a condição, o fator essencial que, na natureza, seleciona e modifica, em determinadas direções as formas vegetais e animais, é a luta pela existência.

As coisas se passariam da seguinte forma: os seres vivos se multiplicam com uma rapidez tal que se um grande número dentre eles não desaparecesse quando ainda em gérmen ou logo no início da vida, a terra não poderia mais alimentá-los, travando-se uma luta pela vida contra as condições dos meios físicos entre os seres de espécies diferentes e entre os indivíduos da mesma espécie.

Nesta luta pela existência, alguns combatentes são favorecidos enquanto outros são lesados.

Os indivíduos favorecidos prevalecem sobre seus rivais que desaparecem mais ou menos depressa sem deixar atrás de si antepassados, enquanto os primeiros sobrevivem sozinhos e chegam a se perpetuar.

Produz-se assim uma seleção natural graças à qual sobrevivem os mais aptos.

Na seleção artificial, a vontade do homem efetua uma escolha, uma triagem, segundo uma idéia preconcebida, enquanto que na seleção natural é a luta pela existência que, sem a intervenção do homem, age e alcança, contudo um resultado idêntico, isto é, uma triagem, uma seleção dos indivíduos.

Isto constitui uma explicação racional do aspecto relativamente ordenado que apresenta o mundo vivo, essa aparente finalidade nada mais sendo que a expressão da adaptação contínua da estrutura dos organismos às condições de vida e ao meio.

Hoje, com exceção de alguns espíritos cegos pelo obscurantismo religioso, todos os sábios aceitam o princípio da evolução das espécies, constituindo os materiais acumulados pelas ciências, geologia e paleontologia, além disso, outras provas a favor do transformismo. 

                                            Erros e Lacunas do Darwinismo

Engels, apreciando em seu justo valor a obra de Darwin, mostra que este

“soube, pela primeira vez, colher a prova sistemática de que os organismos que nos envolvem hoje, sem excetuar o homem, são o resultado do longo processo evolutivo de alguns embriões monocelulares primitivos e de que esses mesmos embriões se formaram de um protoplasma ou albumina surgidos por via de organização química”.
Contudo, colocando bem alto essa teoria, Engels mostrou ao mesmo tempo os erros cometidos por Darwin.

Um dos principais erros, para o qual Lysenko chama a atenção, é o de ter introduzido em sua teoria da evolução as idéias reacionárias de Malthus sobre as leis da população.

Malthus, num livro publicado em 1798 e intitulado “Ensaio sobre o princípio da população”, pretendeu que a sociedade humana era regida por uma lei natural, imutável. Diz Malthus:

“Esta lei consiste na tendência de que dão prova todos os seres vivos de se multiplicarem mais depressa do que o permitem as quantidades de alimentos postos à sua disposição”.
Daí, um excesso de população e a existência inevitável do pauperismo.

Ora, é evidente que uma tal lei, no que diz respeito à sociedade humana, é uma pura invenção.

Invenção do economista burguês Malthus, que tem por fim justificar a exploração e as rapinas coloniais dos capitalistas e dos grandes proprietários de terra ingleses, comprovando a opinião de que, se há pobres e ricos, isto não depende de modo algum do regime econômico vigente, mas de uma pretensa lei natural.

O engano de Darwin foi aceitar esses pontos de vista de Malthus e admitir que as leis que regem a sociedade humana são as mesmas que se encontram no domínio da natureza orgânica.

Mais tarde, o próprio Darwin, sob a pressão de um grande número de fatos biológicos acumulados por ele, foi obrigado a mudar, numa série de casos, sua concepção da luta pela vida. Entretanto, nunca pôde se desembaraçar completamente desse erro teórico.

Por exemplo, partindo da concepção geral de Malthus, da luta de todos contra todos, sustentou que a luta no seio da espécie era tão viva, senão mais viva do que a luta entre as espécies. Ora, essa afirmação é extremamente contestável, conforme o demonstraremos em seguida.

Darwin retomou também por sua conta a idéia de que “a natureza não dá saltos” e de que se encontra exclusivamente em presença de um desenvolvimento evolutivo, gradual e sem saltos, do mundo orgânico.

Apesar desses defeitos, conclui-se que o Darwinismo, como indica Lênin,

“colocou pela primeira vez a biologia sobre um terreno científico proclamando a variabilidade das espécies e sua origem comum”;
Entretanto, o darwinismo não explica tudo.

Com efeito, se é verdade que a seleção natural descoberta por Darwin pode conservar e favorecer o desenvolvimento dos indivíduos, que sofreram variações vantajosas, convém notar que ela não produz a própria variação.

Darwin ressaltou isto expressamente.

Em outros termos, a seleção natural pode explicar por que tais espécies, tais indivíduos, se multiplicaram mais depressa do que outros, mas essa seleção não explica por que os seres vivos têm a particularidade de se modificar e de evoluir e quais são enfim as leis desta evolução.

É esta explicação que os biologistas do período post-darwiniano e os de hoje se esforçaram e se esforçam por dar.


O Weismanismo e o Mendelismo—Morganismo

Na verdade, em lugar de continuar a desenvolver a teoria de Darwin no que ela tem de essencial, de fecundo e de materialista, a maior parte dos biologistas sufocaram, ao contrário, a sua base científica.

Diz Lysenko que a encarnação mais evidente dessa degradação foi dada por Weismann, assim como por Mendel e Morgan, fundadores da genética clássica. As principais teses do weismanismo, que os adeptos do mendelismo morganismo retomam no essencial, são as seguintes:

— Os seres vivos, vegetais e animais, seriam compostos de duas matérias absolutamente diferentes, irredutíveis uma a outra:

— A matéria que constitui o corpo vivo, chamada “plasma vegetativo” ou “soma”;
— A matéria hereditária, que se acha nos cromossomas dos núcleos celulares, os quais cromossomas se subdividem em partículas chamadas genes.
— A matéria que constitui o corpo vivo ou “soma” seria uma matéria perecível, que não tem a propriedade de se reproduzir e cujas transformações, ou seja, as qualidades adquiridas no decorrer de sua vida, não podem se transmitir hereditariamente.

— Só a matéria hereditária, por via das células germinais ou sexuais, teria a propriedade de transmitir a vida e os caracteres hereditários da espécie considerada.

— Esta matéria hereditária, formada dos cromossomas e dos genes, seria imutável, ou seja eterna, e os caracteres que ele transmite seriam independentes do meio em que vive o ser considerado e não poderiam, por consequência, refletir em nada as condições desse meio.

— Os cromossomas e os genes da célula germinal (ou sexual) conteriam em potência tudo o que determina posteriormente e, em todos os estágios de seu desenvolvimento, os caracteres do indivíduo, quer se trate da forma do nariz, da cor dos olhos ou dos caracteres psíquicos, estando ligada, com efeito, a cada gene, uma qualidade particular fixada uma vez por todas.

Afinal de contas, o corpo vivo e as células somáticas não seriam, de certo modo, senão o receptáculo e o meio nutriente da matéria hereditária e não poderiam jamais produzir e dar origem a células germinais, diz Weismann.

Assim, de acordo com o weismanismo e o mendelismo—morganismo que é o seu prolongamento, a matéria hereditária toma a propriedade de uma existência ininterrupta, não conhecendo evolução e, ao mesmo tempo, dirigindo o desenvolvimento do corpo perecível.

Certamente, os adeptos do weismanismo e do mendelismo—morganismo não podem negar que as plantas e animais sofreram variações no curso dos milênios e que sofrem ainda, mas eles sustentam que tais variações decorrem exclusivamente da pretendida matéria hereditária, isto é, do germe, e que são devidos ao acaso, que se produzem sob a forma de “mutações” em qualquer sentido, de maneira indeterminada, sem nenhuma ligação com as condições de vida. 

                                  A Doutrina Mitchuriniana da Hereditariedade

Os mitchurinistas sustentam e dão a demonstração de que as posições do mendelismo—morganismo não refletem a realidade da natureza viva e são apenas um exemplo de metafísica e idealismo.

Certamente, eles não negam a existência dos cromossomas. Sabem que eles existem. O que se chama cromossomas, são, com efeito, partículas de matéria, pequenos bastonetes móveis que se distinguem, ao microscópio, nos núcleos das células vivas.

O número desses bastonetes, desses cromossomas, varia segundo a espécie: por exemplo, as células comuns da espécie humana possuem quarenta e oito.

Mas se os mitchurinistas admitem a existência dos cromossomas, se admitem que eles transmitem efetivamente a hereditariedade, o que não admitem, por outro lado, é a teoria cromossômica da hereditariedade, é o papel exclusivo, como único veículo da hereditariedade, que se atribui a esses cromossomas e aos genes que os cercam.

— Os mitchurinistas negam que haja separação radical entre as células germinais e o corpo e afirmam que toda a matéria do ser vivo, e não somente os cromossomas, contribui para a formação dos descendentes da espécie.

— Afirmam que os caracteres adquiridos pelos seres vivos, sob a influência das condições de vida e do meio, podem se transmitir hereditariamente.

— Afirmam que o organismo e as condições de vida que lhe são necesrárias são um todo indivisível, indissociável, que não há corpo vivo sem hereditariedade e não há hereditariedade sem o corpo vivo. Diz Lysenko:

“A hereditariedade é a propriedade do corpo vivo de exigir condições definidas para viver e se desenvolver e de reagir, de maneira definida, a tal ou qual condição”.
Ou ainda:

“A hereditariedade é o efeito da concentração das influências, das condições do meio ambiente, assimiladas pelos organismos numa série de gerações precedentes”.
E Lysenko indica as causas fundamentais da estabilidade relativa dos organismos, assim como das transformações que estes sofrem:

— No caso em que o organismo encontra no meio ambiente condições que correspondem à sua hereditariedade, o desenvolvimento do organismo prossegue de uma maneira idêntica à das gerações precedentes;
— No caso em que os organismos não encontram as condições que lhes são necessárias, são obrigados a se adaptar ou morrem. Se se adaptam, resulta que eles se diferenciarão mais ou menos da geração precedente e darão dessa forma origem a novas espécies.
As modificações que se produzem são, portanto, os resultados das condições de vida sobre esses indivíduos, condições de vida que influenciam particularmente os órgãos sexuais e vegetativos do organismo.

Tais são os princípios básicos da doutrina mitchuriníana que concordam perfeitamente com a concepção dialética da natureza.

                                      A Experiência dá Razão aos Mitchurinistas

É certo, nesta matéria, como em qualquer outra, que a experiência, isto é, os fatos é que decidem.

Ora, os fatos provam que os mitchurinistas têm razão.

Antes de tudo, convém lembrar que quando os adeptos do weismanismo e do morganismo nos falam duma separação radical entre as células sexuais e as demais partes do corpo, esta separação só existe em sua imaginação.

Com efeito, todo o mundo sabe que as células sexuais (ou germes) não existem no recém-nascido, mas se formam somente no período da adolescência, o que quer dizer que essas células nascem do próprio corpo, num determinado momento de seu desenvolvimento.

Diz Lisenko que basta recordar esse fato, universalmente conhecido, para que toda a teoria cromossômica, fundada sobre a separação radical das células sexuais e do corpo, se esboroe.

Mas o que prova que os mitchurinistas têm razão, é sobretudo o fato de que eles conseguiram praticamente transformar, sob a influência das modificações do meio, os caracteres das plantas e dos animais.

Por exemplo, fazendo atuar o frio sobre as sementes de trigo após a germinação, Lysenko conseguiu modificar a duração vegetativa dessa planta e transformar, por esse processo, chamado “primaverização”, um grande número de variedades de trigo de primavera em trigo de outono.

Conseguiu mesmo transformar espécies de trigo duro de primavera com 28 cromossomas, em trigo mole de outono com 42 cromossomas, isto depois de duas, três, quatro gerações.

As experiências sobre a hibridação vegetativa não são menos concludentes.

Entende-se por híbridos vegetativos as espécies novas obtidas por meio de enxerto. Depois de ter enxertado uma variedade frutífera em uma outra, Mitchurin constatou que, por meio do contacto dos tecidos e da circulação da seiva, alguns caracteres do enxertador passam para o enxertado e vice-versa.

Por exemplo, deixando produzir frutos de um ramo do enxertador ou do enxertado e semeado as sementes desses frutos, observa-se o aparecimento na descendência de caracteres particulares de cada uma das variedades.

Em tal caso, é evidente que não houve modificação, inicialmente, entre os cromossomas da espécie representada pelo enxertado e da representada pelo enxertador.

Se, entretanto, por esse meio, se obtêm híbridos, isto é, novas espécies, tendo seus caracteres hereditários próprios, isto significa que todas as matérias que compõem o organismo e que foram elaborados por ele, e não somente pelos cromossomas, contribuem, numa certa medida, para a formação da espécie e para a transmissão dos caracteres hereditários.

Ora, numerosas experiências práticas a respeito da batata, do tomate e duma série de outras plantas, levam à conclusão de que os híbridos vegetativos não se distinguem, em princípio, dos híbridos obtidos por via sexual.

Foi assim que entre as 350 variedades de frutas ou de plantas que Mitchurin criou durante sua vida, toda uma série entre elas foi criada sem hibridação sexual.

               O Papel Determinante das Condições de Vida e de Meio

Se se trata de animais, entretanto, é forçoso operar por via sexual. Todo o mundo sabe, que, pelo cruzamento de espécies diferenciadas, obtêm-se igualmente novas raças de animais.

E mesmo nesse caso o grande mérito dos mitchurinistas foi o de mostrar que as condições de vida e de meio desempenham um papel determinante.

Durante mais de vinte anos, por exemplo, o rebanho de vacas do sovkoze de Karavaevo foi alimentado de modo abundante e variado. Nos melhores anos, a despesa de alimentação atingia até 6 mil unidades nutritivos por ano. Graças a cruzamentos cuidadosos, atendendo a essas condições, as qualidades leiteiras da raça e seu formato físico foram rapidamente melhorados. O rebanho de Karavaevo deu a quantidade de leite “record” de 6.310 quilos por ano e por vaca. Algumas vacas dão até 50 e 60 litros de leite por dia.

Verificou-se que o peso dos órgãos de digestão, do coração, do fígado, dos pulmões e do baço, das vacas de Karavaevo, da raça de Kostroma, era mais de uma vez e meia superior ao das outras vacas e que esses caracteres adquiridos sob a influência de uma alimentação intensiva, se transmitem hereditariamente.

Tais são os fatos.

Esses resultados não podem absolutamente ser explicados pela teoria morgonista da hereditariedade, porquanto eles a contradizem violentamente.

Ao contrário, eles constituem uma prova decisiva da justeza da doutrina mitchuriníana e não apenas desta, mas da concepção dialética e materialista da natureza.

Os adeptos do mendelismo—morganismo, antes de tudo ligados a um modo de pensar metafísico e idealista, fecham contudo os olhos a esses fatos, negam-se a tomá-los em conta ou o deturpam.

Que se pode concluir daí? Simplesmente que a metafísica e o idealismo filosófico são um entrave ao desenvolvimento da ciência, enquanto o materialismo dialético é um instrumento poderoso para fazê-la avançar.

                                       O Homem Pode Criar Novas Espécies

Contudo, a doutrina mitchuriniana não tem apenas uma grande importância teórica, mas tem igualmente uma importância prática considerável.

Porque, baseando-se na teoria mitchuriniana pode-se modificar a hereditariedade em

“plena concordância com a ação efetiva das condições de vida. Por outras palavras, pode-se criar espécies tendo a hereditariedade por nós desejada”.
É o que exprimia Mitchurin quando escrevia:

“Não podemos esperar as boas graças da natureza, é preciso arrancá-las, eis a nossa tarefa”.
E acrescentava:

“Graças a intervenção humana, torna-se possível obrigar cada uma variedade de animais e de vegetais a se desenvolver mais rapidamente e no sentido desejado pelo homem”.
Lysenko fornece, em seu relatório, uma série de indicações relativas às possibilidades de criar espécies novas.

Assim, numerosas experiências demonstram que depois de ter obtido a liquidação de uma propriedade hereditária antes já estabelecida, não se obtém imediatamente uma nova hereditariedade estável, reforçada. Consegue-se mais frequentemente organismos de natureza plástica, chamados por
Mitchurin “natureza abalada”. Esse resultado tem uma importância muito grande, pois cultivando ou criando gerações e gerações desses organismos instáveis de “natureza abalada”, nas condições que permitem adaptá-los definitivamente ao fim desejado, obtem-se novas espécies úteis à agricultura.

Esses organismos instáveis, de “natureza abalada”, obtem-se:

— Por meio de enxerto, isto é, hibridação vegetativa;
— Pela ação das condições ambientes, em tal ou qual momento do desenvolvimento do organismo (“primaverização” do trigo);
— Por meio do cruzamento entre espécies nitidamente diferenciadas.
De uma maneira geral, é importante acentuar que, dirigindo as condições do meio ambiente, as condições de vida dos organismos vegetais ou animais, pode-se transformar de modo dirigido, criar as espécies que desejemos.

De fato, vimos que cada raça exige condições de vida para si, condições que contribuíram para sua formação.

Desses dados resulta que, quanto maior a diferença entre as propriedades biológicas das raças e as condições de vida que lhe são oferecidas, será tanto menos vantajosa, economicamente, tal ou qual raça, porquanto em tal caso não há adaptação entre a raça e o meio.

Por exemplo, existem raças de vacas que dão pouco leite. Mesmo que elas sejam bem alimentadas, continuarão a dar pouco leite. Se se quer obter um melhor rendimento em leite dessas vacas que, noutros lugares, podem possuir certas qualidades, é preciso melhorá-las por meio da mestiçagem, ou seja, pelo cruzamento com as raças grandes leiteiras, de maneira que correspondam às condições de alimentação e trato, permitindo um melhor rendimento em leite.

Ao contrário, as vacas grandes leiteiras, caindo em más condições de alimentação e trato, suportarão mal essas condições. Se se quer que elas dêem os resultados esperados, deve-se criar condições de alimentação e tratamento correspondente a raça.

Partindo de todos esses dados, os mitchurinistas obtiveram, tanto para as espécies animais como vegetais, resultados notáveis.

Foi assim que, entre as 350 variedades de plantas e de frutas que Mitchurin obteve durante sue vida, 54 foram vulgarizadas e ocupam na URSS dezenas de milhares de hectares. E depois de Mitchurin novos progressos se registraram; ao lado da vaca de Kostroma, pode-se citar, por exemplo, o trigo em ramos que dá até 100 quintais por hectare.

Esta é a prova da fecundidade da doutrina mitchuriniana.

                                    A Esterilidade dos Métodos Morganistas

Ao contrário, recorrendo aos processos dos morganistas, não se pode obter senão resultados estéreis.

Seus processos essenciais consistem em agir sobre a pretendida matéria hereditária por intermédio daquilo que eles chamem as matérias mutógenas.

Por exemplo, agem sobre o germe com ajuda de Raios X ou ainda de uma solução de colchicina que é um veneno violente. Provocam dessa maneira um grande numero de modificações, “mutações”, e, aguardando oportunidade, esperam que sobre 1.000 ou 10.000 modificações produzidas ao acaso, uma ou outra dentre elas será, por acaso, interessante.

Certamente, com tais processos, pode-se obter, de tempos em tempos, de longe em longe, alguns resultados, e os mitchurinistas não negam uma tal ação, uma tal, possibilidade.

Mas, no conjunto, os resultados podem apenas ser estéreis do ponto de vista prático, sobretudo se as experiências se efetuam sobre a mosca drosófila, que fornece o campo de experiência da maior parte dos morganistas, inclusive daqueles que trabalham na União Soviética.

Por que os resultados do método morganista são estéreis?

Porque, quando se tratam os germes com os Raios X ou com venenos violentos, como a colchicina, provocam-se variações que são antes acidentes, no sentido de que as espécies modificadas que se obtêm pelo acaso são geralmente monstros inutilizáveis para a agricultura, principalmente, porque não sofreram modificações

“em correlação com as condições de vida e o meio ambiente que serão os seus quando se quiser cultivá-los ou criá-los, com um fim prático e útil”.
Diz Lysenko:

“Ora, a ciência que não abre perspectivas diante da prática, que não lhe dá forma de orientação nem confiança na orientação para os fins práticos, uma semelhante ciência não é digna do nome de ciência”.
E acrescenta que as ciências, tais como a física e a química, se desembaraçaram do acaso e é por essa razão que elas se tornaram ciências exatas. É preciso igualmente desembaraçar a biologia dos “acasos” do mendelismo—morganismo.

A natureza viva se desenvolve na base de leis definidas. Para avançar, é preciso pesquisar essas leis, o único que nos permite agir e obter resultados de acordo com os objetivos desejados.

                                          A Passagem de uma Espécie para Outra

Relativamente à pesquisa dessas leis, Lysenko mostra que numa série de questões a teoria de Darwin é insuficiente e contém erros.

Ele indica que chegou o momento de reexaminar a questão da constituição da espécie, isto é, as condições da passagem de uma espécie para outra.

Sabe-se que Darwin concebeu o desenvolvimento das espécies como uma evolução lenta, se efetuando unicamente por variações lentas, isto é, pela acumulação de pequenas modificações quantitativas, insensíveis, somando-se umas às outras.

No começo haveria organismos da mesma espécie se diferenciando muito pouco uns dos outros. Progressivamente, por pequenas variações insensíveis, esses organismos se diferenciariam cada vez mais uns dos outros. Com o tempo, essas diferenças se tornariam bastante grandes para que os diversos organismos merecessem ser considerados não mais como simples variedade pertencentes a mesma espécie, mas como espécies novas.

Lysenko mostra que esta teoria da evolução é errônea e que a formação de uma espécie nova é uma passagem de transformação quantitativa em transformação qualitativo.

Em apoio de sua opinião, ele cita principalmente as experiências de transformação de trigo duro em trigo mole.

Por exemplo, a espécie trigo duro, que não pode ser semeada nos países de inverno rigoroso, a não ser na primavera, é composta de células que têm 28 cromossomas, enquanto que a espécie trigo mole, que pode ser semeada no outono nas regiões de inverno rigoroso, possui 42 cromossomas.

Com uma finalidade prática, os mitchurinistas procuram transformar o trigo duro de primavera em trigo mole de outono.

Eles o conseguiram, mas a experiência mostrou que, ao cabo do processo de transformação, isto é, depois de ter cultivado duas, três, ou quatro gerações sucessivas de sementes, o trigo duro de primavera com 24 cromossomas se tinha transformado em trigo mole de 42 cromossomas, sem passar por formas intermediárias.

Este fenômeno prova que a passagem de uma espécie para outra se faz por salto.

Esses resultados são de uma grande importância teórica: eles mostram que a natureza viva não se transforma seguindo uma evolução igual e sem saltos, mas que, ao contrário, as espécies são nós, elos que existem na cadeia geral biológica.

Esta é uma nova confirmação da justeza da concepção dialética do desenvolvimento dos fenômenos da natureza, concepção que Stálin, definiu brilhantemente nestes termos:

“Ao contrário da metafísica, a dialética não examina o processo de desenvolvimento dos fenômenos como simples processo de crescimento, em que as mudanças quantitativas não se traduzem em mudanças qualitativos; e sim como processo em que se passa, das mudanças quantitativas insignificantes e ocultas, às mudanças evidentes, às mudanças radicais, às mudanças qualitativas; em que estas se produzem, não de modo gradual, e sim de acordo com as leis, como resultado da acumulação de uma série de mudanças quantitativas inadvertidas e graduais.”(2)
Mas, como o sublinha Lysenko, uma tal concepção, aplicando-se à passagem de uma espécie para outra, tem igualmente uma grande importância prática, porque dá aos biologistas uma arma poderosa para dirigir suas pesquisas e para obter a formação de espécies novas.

                           As Relações no Seio da Mesma Espécie e Entre Espécies Diferentes

Sempre que trata das leis da evolução das espécies, Lysenko propõe um reexame da teoria darwinista sobre as relações entre os seres vivos, principalmente a luta no seio da mesma espécie e entre as espécies diferentes.

Lysenko, opondo-se à maioria dos adeptos do mendelismo—morganismo, não somente não dá a luta no interior da espécie o principal papel na seleção e na evolução, como sustenta, ao contrário, que os indivíduos da mesma espécie e cujas necessidades são as mesmas, não entram em luta uns contra os outros.

Entram em luta uns contra os outros, esclarece ele, os organismos de espécies diferentes e sobretudo se esses animais ou essas plantas de espécies diferentes têm necessidades semelhantes.

Por exemplo, as lebres não entram em luta umas contra as outras e, segundo um velho ditado, acrescentamos, os lobos não se entre devoram.

Em troca, os carnívoros de espécies diferentes lutam ferozmente entre si para conquistar seu alimento.

Observa-se também que o trigo mais ralo e disperso não se comporta melhor do que o trigo denso e duro, mas, ao contrário, é mais rapidamente atacado pelas ervas daninhas, isto é, por outras espécies de plantas que o cercam.

Deve-se esclarecer que esse é talvez o ponto em que Lysenko é mais contestado, combatido por seus adversários.

Entretanto, salvo melhor juízo, conclui-se que a opinião de Lysenko corresponde à realidade das coisas.

Evidentemente, interpretando a tese de Lisenko de maneira falsa e deformando-a, pode-se torná-la inverossímil, ou talvez mesmo ridícula.

Por exemplo, é evidente que se sendo semeadas 10.000 sementes de cenoura num metro quadrado de terra não teremos 10.000 cenouras que virão à maturidade, pois numa extensão tão pequena não há bastante alimento, espaço e luz para nutrir as 10.000 cenouras.

E claro que Lysenko não ignora de nenhum modo esse fato.

Mas nesse caso o que é preciso dizer é que há cenouras que não se desenvolvem e que fenecem, o que é simplesmente o efeito da falta de espaço e luz e não se pode portanto tirar a conclusão de que as cenouras possuem caracteres naturais, particulares, para fazer concorrência e lutar umas contra as outras.

Querer utilizar tais exemplos para afirmar que as relações que existem entre os organismos de uma mesma espécie biológica são dominadas pela luta e pela concorrência, da mesma forma e nas mesmas condições que as relações que existem entre as espécies diferentes, é se recusar a ver claro, é renunciar a pesquisar as leis verdadeiras da volução, é não saber distinguir o essencial do acessório.

Ora, é inegável — e isto é o que sustenta Lysenko — que as ligações e as relações entre os organismos de uma mesma espécie biológica são de outra ordem que as relações que existem entre as espécies diferentes.

As relações no seio da espécie são antes de tudo relações que determinam a conservação, a multiplicação e o melhoramento da espécie dada.

Enquanto as relações entre as espécies diferentes são relações que tendem em geral ao extermínio das espécies em luta, sem que todavia seja esse sempre o caso, pois ao lado de espécies que lutam entre si, existem também numerosos casos de colaboração das espécies.

A este respeito é interessante recordar que Engels compreendeu perfeitamente o que havia de exagerado e errôneo naqueles que não viam no darwinismo senão um único aspecto, a luta de todos contra todos. Ele demonstrou de fato,

“que as relações dos seres vivos compreendem, quer a colaboração consciente ou inconsciente, quer a luta, igualmente consciente ou inconsciente”.
O grande mérito de Lysenko e dos mitchurinistas foi o de ter desenvolvido o darwinismo, mostrando que as relações no seio da espécie não são do mesmo tipo que as que existem entre espécies diferentes.

Repetimos uma vez mais que a questão tem uma importância prática considerável para o desenvolvimento da agricultura.

Com efeito, conforme sejam baseadas suas experiências sobre a concorrência no seio da espécie ou, ao contrário, sobre a luta entre espécies diferentes, os resultados são bastante diversos.

Por exemplo, Lysenko mostra que houve um tempo em que se semeava na Ucrânia, “kok-saghiz” (planta de borracha) em linha reta: conseguiam-se geralmente três a quatro quintais por hectare e, em casos muito raros, dez a vinte quintais.

Com os conselhos dos mitchurinistas passou-se a semear em ninhos com intervalos regulares: a colheita é em média de 30 a 40 quintais e atinge excepcionalmente até 60 a 80 quintais.

Constatou-se que o “kok-saghiz” semeado em ninhos luta mais eficazmente contra as ervas más e se desenvolve muito melhor.

O fato mostra que o que prejudica o desenvolvimento dessa planta não é a concorrência no seio da espécie, mas as ervas daninhas, isto é, a concorrência de outras espécies de plantas.

Indico de passagem que todo lavrador pode constatar que isso se passa com certo número de plantas: por exemplo, os feijões, quando novos, crescem melhor quando semeados em ninho, em touceiras, do que em linha.

                                         O Grandioso Plano de Luta Contra a Seca

Assim pois o conhecimento das relações que existem no seio da espécie e entre as espécies é um elemento importante para dirigir a evolução das espécies e para se obter colheitas mais abundantes, graças a práticas apropriadas de cultura.

Na base desses progressos da ciência soviética — e considerando as possibilidades enormes que oferece o regime socialista com a coletivização da agriculta — é que o Partido Bolchevique e o Governo, por iniciativa de Stálin, adotaram um grandioso plano de luta contra a seca, pela plantação de milhões de hectares de árvores, pela introdução de afolhamentos complexos com plantas forrageiras, pela construção de lagos e reservatórios d’água, tudo para garantir colheitas abundantes e estáveis nas regiões das estepes da Rússia meridional que eram até aqui atingidas muitas vezes por secas devastadoras.

É claro que a realização de planos de Estado de semelhante amplitude não pode ser tentada a não ser por um Estado socialista, em que a coletivização da agricultura é realizada.

                                     Um Aspecto da Batalha Entre Dois Mundos

A discussão que teve lugar na Academia Lênin de Ciências Agronômicas fez aparecer no domínio da biologia duas tendências diametralmente opostas:

  1. — a tendência mitchuriniana que é uma tendência progressista, materialista, que “unindo a teoria e a prática” usa métodos científicos de modificação planificada da natureza das plantas e dos animais, permite o melhoramento das espécies existentes e a criação de novas espécies úteisà agricultura e à criação, e ajuda poderosamente a agricultura socialista.
  2. — A tendência mendelista—morganista, que é uma tendência reacionária, que continua a doutrina idealista e metafísica de Weismann, que se desligou da vida e permanece estéril em suas pesquisas práticas.

Lysenko recorda que o choque das concepções materialista e idealista na ciência biológica perdura desde que essa existe.

Salienta que atualmente, na época da luta entre os dois mundos, as duas posições antagônicas se opõem com uma particular nitidez.

Essa luta é, no plano ideológico, um aspecto da luta entre os dois mundos. A maneira barulhenta, unilateral e muitas vezes desonesta, com que a imprensa e a literatura do partido americano acolheram o relatório de Lysenko e as medidas tomadas pela Academia de Ciências da URSS, é uma prova.

Pode-se dizer que não estamos em presença apenas de uma questão de interesse científico, mas também de uma batalha ideológica e política.

Por isso é que é nosso dever divulgar, defender e fazer triunfar, contra seus detratores, a doutrina mitchuriniana.
                                      ***************************************** 

Notas de rodepé:
(1) Membro do Bureau Político do Partido Comunista Francês 
(2) J. Stálin — “História do Partido Comunista (b) da URSS” — Pág. 45 – Edições Horizonte — Rio.