Seis Meses de Ações e Lutas de Guerrilhas na Espanha
A resistência ao regime franquista aumenta e se desenvolve de um extremo a outro da Espanha. Essa resistência mostra, fielmente, não só o ardor combativo do nosso povo em suas ações contra Franco e a Falange, como também é uma demonstração da impossibilidade em que se encontra o fascismo espanhol para deter a marcha dos acontecimentos que se encaminham para a queda inevitável do franquismo.
O incremento da resistência popular mostra-nos o profundo sentimento republicano das massas, sua disposição de enfrentar o regime hitlerista que impera na Espanha, para a libertação do povo espanhol.
A resistência está adquirindo particular importância nos campos da Espanha. A expressão mais alta da resistência ao franquismo nos campos é a luta guerrilheira.
A luta de guerrilhas se estende e se firma nos campos e nas montanhas, porque na consciência de milhares de camponeses cada dia se fixa com mais força a idéia e a necessidade de reforçar o movimento guerrilheiro para combater o fascismo espanhol até a vitória.
O movimento de guerrilhas nos campos espanhóis é uma das formas de luta das massas, principalmente camponesas, para contra-balançar, em grande parte, a atuação terrorista dos mercenários franquistas que roubam e assassinam os camponeses.
E é preciso dizer, referindo-se à luta guerrilheira, que os seis primeiros meses do ano de 1947 são muito alentadores, pois (segundo os dados em nosso poder) registraram-se 427 ações e combates. Estas cifras superam em muito às registradas no mesmo período de 1946.
Estes 427 combates e ações registraram-se em condições particularmente difíceis, pondo-se à prova a capacidade, a consciência e o heroísmo dos patriotas que lutam nas unidades e destacamentos de guerrilheiros; provou-se também a ligação dos guerrilheiros com o povo, principalmente com as massas camponesas. Daí se originam os seus êxitos e suas possibilidades de desenvolvimento. É graças a esta ligação do movimento guerrilheiro com o povo, de cujas entranhas surgiu, que tem sabido resistir e sobreviver com êxito, até hoje, afrontando todas as situações em sua luta exemplar.
A luta guerrilheira, sua importância, o caráter que está tomando, principalmente nas regiões agrárias do nosso país, é uma realidade tão forte, que salta aos olhos não só pelas suas ações e combates, como também se comprova diante das medidas tomadas pelo franquismo para combatê-la. Estas medidas mostram que a luta guerrilheira é hoje uma das preocupações principais do regime de Franco.
Para o combate ao movimento guerrilheiro empregam-se grandes recursos do Estado franquista e utilizam-se numerosas forças armadas.
Como principal força de choque está sendo utilizada a Guardo Civil. Essa instituição, feudal por origem, fascista pela sua mentalidade, equipada com todos os elementos materiais e técnicos para fazer a guerra ao povo, dispondo de muitos meios para a organização e montagem da provocação no seu aspecto mais amplo e variado, com carta branca para a realização de toda a classe de crimes, com escolas regionais para amestrar seus cães, atendida e mimada de forma especial pelo regime franquista, carrega o peso dos combates contra o movimento guerrilheiro. Seus colaboradores mais aproximados são os grupos de especialistas da Polícia Armada, milicianos e falangistas.
Também estão sendo utilizadas unidades do Exército contra os guerrilheiros. Nas províncias de Córdoba, Málaga, Granada, Badajós, Caceres, Toledo, Ciudad Real, Valência, Castellon, etc., encontram-se batalhões em pé de guerra que são empregados em combates contra o movimento guerrilheiro.
Não é a primeira vez que se empregam as forças do Exército para dar combate ao movimento guerrilheiro. Mas a utilização que se faz das referidas forças atualmente difere muito da forma como se fazia anteriormente.
Anteriormente, utilizavam-se as grandes unidades do Exército, em sua composição orgânica, bem íntegras ou destacando bom número de suas pequenas unidades (em alguns casos reforçadas com soldados de outras armas) mas sempre subordinadas ao comando de suas unidades e inclusive atuando independentemente e sem nenhuma relação tática com as forças da Guarda Civil. Assim foi empregada, por exemplo, a 71.a Divisão em Astúrias no verão e outono do ano passado.
Hoje, as unidades do Exército são empregadas de forma diferente. As grandes unidades destacam seus batalhões para diversas comarcas ou províncias, de acordo com as ordens recebidas — em algumas províncias até dois batalhões. Uma vez instalados no novo local continuam dependendo organicamente de suas unidades de origem. Mas tàticamente estão subordinados aos comandos ou às chefaturas dos facínoras da Guarda Civil.
Os objetivos perseguidos por Franco e seu regime ao utilizar os forças do Exército desta nova forma são vários. Entre, eles: dobrar e triplicar as forças repressivas sem repercussão prejudicial para o seu prestígio dentro e fora da Espanha. Pretendem, ao ligá-las com a Guarda Civil, sacar o máximo de rendimento no papel particular que é o destinado a estas forças.
Recentemente, o regime franquista estimulou o armamento dos milicianos em diferentes lugares da Espanha. Uma prova disto temos nos 1.500 fuzis entregues aos milicianos em Teruel, em princípios de junho; os 327 entregues em Burgos, com o mesmo fim, assim como tantos outros que foram enviados para grande número de províncias.
Os milicianos são utilizados pêlo regime franco-falangista como forças auxiliares, e realizam diversas tarefas. Em alguns casos são aproveitados para reforçar as forças mercenárias em suas batidas contra os guerrilheiros; também são empregados em funções de vigilância nos povoados e cidades para suprir as forças da Guarda Civil quando estas saem a cumprir missões. São-lhes confiados também os chamados serviços de ordem nas concentrações voluntárias ou forças organizadas pelos sequazes de Franco. Têm ainda a responsabilidade da custódia de edifícios ou instituições franquistas em determinados momentos.
Além do emprego das forças mercenárias já assinaladas, utilizadas pelo franquismo contra os guerrilheiros, existem muitas “leis” e disposições ditadas pelos franquistas segundo as quais são tomadas medidas de guerra contra os guerrilheiros e as pessoas acusadas de relações com eles.
A Guarda Civil tem poderes “para disparar sem prévio aviso contra os que fogem”. Esta disposição foi solicitada pelos chefes da Guarda Civil na reunião que realizaram em Madri, em 24 de dezembro de 1946. Posteriormente, foi concedida por Franco. Suas conseqüências foram o incremento dos crimes que já se realizavam nos campos contra os camponeses, agora assassinados pela Guarda Civil, que dispara contra eles sem aviso prévio, ou em outros casos, aplicando a “lei de fugas”.
Mais recentemente, o decreto-lei de 18 de abril — “Lei Contra o Terrorismo” — posto em vigor especialmente contra os guerrilheiros e outras atividades anti-franquistas. Nessa lei dispõe-se que sejam julgados pela jurisdição militar e de modo sumário os atos de protesto e de luta que em justa defesa se realizam contra os falangistas e demais verdugos do povo.
Impõe-se a pena de morte a quase todos os que são julgados péla referida “lei”. Foi promulgada para assassinar “legalmente” aqueles que não podiam assassinar a esmo.
Apesar dos grandes efetivos de forças empregados contra os guerrilheiros, apesar dessas “leis” draconianas para atemorizar os patriotas, passando por cima de todos os esforços de Franco e do seu regime, o movimento guerrilheiro prossegue firme e indestrutível, marchando com passo certo pelas planícies e montanhas da Espanha, constituindo estímulo para a resistência e clarim de chamada para o combate contra Franco e a Falange.
Analisando o caráter dos 427 combates e ações guerrilheiras havidas, segundo os nossos informes, no primeiro semestre de 1947, podem ser assim classificadas:
Ao examinar o caráter dessas ações e combates e as condições em que se desenrolaram vemos que o movimento guerrilheiro se torna mais audaz, mais combativo. Encontra maior apoio nas massas populares, principalmente entre os camponeses. Precisamente ao contar com esta grande ajuda o movimento guerrilheiro pode superar com êxito as conseqüências de diversas ofensivas franquistas realizadas contra ele nestes últimos tempos.
Por isto, apesar dos duros golpes assestados pelos franquistas contra algumas unidades guerrilheiras, a luta não decai porque os grupos, unidades e destacamentos se refazem com rapidez e continuam a luta em cumprimento de sua missão de defesa do povo.
Que executam bem sua tarefa indicam-nos as 77 ações realizadas contra próceres falangistas para castigar assim desmandos cometidos pelos falangistas contra os camponeses. Outro exemplo está nas 24 ações de castigo levadas a efeito contra delatores, para que se fixe o exemplo e saibam os falangistas que os crimes contra o povo ou a denúncia contra os guerrilheiros receberão o castigo correspondente.
É muito intensa a atividade dos guerrilheiros; eles levam a intranqüilidade às forças repressivas do franquismo, intimidando-as num local, golpeando-as noutro. Em alguns casos, a Guarda Civil, em setores isolados, mostra sintomas desmoralizadores e se prepara, em seus próprios acampamentos, dos quais não tem coragem de sair, para combater os guerrilheiros, como ocorreu em 31 de maio em Viles, quando foram desafiados por estes, ou como em 21 de junho em Guijar Alto e Pinos dei Valle (Granada).
Examinando o número de baixas dos guerrilheiros e as formas como estas se produziram salta aos olhos imediatamente que existe a possibilidade de reduzir em muito as baixas dos guerrilheiros, desde que sejam obedecidas certas normas. Contribuirá grandemente para isto o desenvolvimento da vigilância nos grupos e destacamentos, impedindo o acesso aos mesmos de pessoas não comprovadas ou com insuficientes credenciais políticas. Está provado que em campo aberto, em face das forças inimigas, independentemente de sua maior ou menor quantidade, é conveniente que os guerrilheiros apliquem a tática dos golpes, para concentrá-los onde o inimigo é mais débil ou onde não o esperam.
O guerrilheiro não deve esquecer nunca que luta num terreno conquistado e ocupado militarmente pelo inimigo e por mais que encontre apoio no meio das populações deve desconfiar sempre das pessoas pouco provadas, de vez que em seu meio podem estar servidores do inimigo.
Evitar a dispersão dos grupos ou o movimento descontrolado da alguns dos seus elementos que na ânsia de rever seus parentes ou suas noivas e amigos podem ser vítimas das emboscada fascistas, perdendo suas vidas e levando também grandes transtornos aos seus parentes e amigos. Em outros casos, podem, contra sua vontade, levar os agentes do inimigo às bases dos guerrilheiros. Somente melhorando a consciência política dos guerrilheiros e reforçando a disciplina nas unidades podem ser evitados fatos que revelam sintomas de imprudência e temeridade e que importam em grandes prejuízos em vidas e materiais.
Não aceitar os fatos, sem discussão; examinar e criticar cada caso para extrair os ensinamentos correspondentes e na base do estudo das debilidades e erros, assim como também dos êxitos, melhorar o trabalho futuro. Ter sempre a preocupação de aprender em cada combate, melhorar, tirar todo o proveito político dos combates travados. Continuar cuidando e melhorando o caráter de suas ações para que as massas populares continuem vendo neles os seus protetores e os cerquem de toda solidariedade e entusiasmo.
É aconselhável do ponto de vista tático não se reunir em grandes grupos porque assim se tornam menos vulneráveis ao inimigo. Só em raros casos, para a realização de ações concretas, compreende-se que se reúnam vários grupos que imediatamente depois de terminada a operação devem se separar.
É preciso uma constante vigilância e tomar as medidas de segurança correspondentes a cada situação a fim de evitar surpresas que podem importar no aniquilamento ou na dispersão da unidade surpreendida.
É uma experiência muito importante a de reforçar e ampliar a rede de pontos de apoio e com isto evitar a concentração sobre um, que poderia ser localizado com os prejuízos conseqüentes. E sobretudo utilizar os pontos de apoio somente para as necessidades que foram criadas.
Por muitos amigos que se tenham nos povoados, aldeias, arruados, não entrar jamais nos mesmos — combatente ou grupo — sem tomar toda a espécie de precauções. Não confiar de boa fé e procurar os povoados somente quando tiver missões a realizar.
Em todos os seus movimentos, seguir o princípio de ver tudo nos arredores sem ser visto por ninguém.
Vamos encontrar as melhores experiências nos grupos de guerrilheiros cujos chefes estão sempre com os seus grupos, para dirigi-los. E onde os chefes de destacamento encontram-se sempre com o mais forte dos seus grupos, o mais numeroso e melhor equipado, a fim de conduzir sua unidade ao combate sem sair do que podemos chamar de seus domínios, para estar sempre a par da situação e viver integralmente a vida de sua unidade.
Resulta sempre em imprudência não se levar em conta que as casas e os povoados devem ser utilizados para descanso pelas unidades guerrilheiras de uma forma justa, não permanecendo neles mais do que o tempo necessário para a preparação ou realização das missões. Não esquecer que um descanso mais prolongado pode dar lugar a que o guerrilheiro ou a unidade sejam surpreendidos ou alcançados pelo inimigo, impedindo a realização da ação programada em sua preparação ou desenvolvimento.
Uma das maiores ajudas que podem encontrar os guerrilheiros para facilitar o seu trabalho está no aperfeiçoamento da informação, tanto política como militar. Somente com informações reais e a tempo, os chefes e as unidades guerrilheiras podem se preparar para vencer ou evitar o inimigo de acordo com as circunstâncias.
Conhecer bem e como pensa a gente dos arredores, aprofundando este conhecimento para saber sempre como atuar em todos os momentos, como ganhar todos os elementos simpatizantes para a causa da República, objetivo político dos guerrilheiros, e para conhecer bem e saber onde se encontram os inimigos do povo.
No que se refere aos combates, temos visto os resultados obtidos com o princípio de não enfrentar o inimigo quando este procura, escapando para surpreendê-lo, ainda que seja várias vezes superior, e depois de surpreendê-lo, quando ele se prepara para desenvolver a ação, tornar a escapar por lugares previstos antes de iniciar-se o combate.
As medidas tomadas por Franco e seu regime contra o movimento guerrilheiro estão em pleno desenvolvimento; o caminho da luta continua cheio de dificuldades e asperezas, mas o movimento guerrilheiro, que superou com heroísmo a primavera e a metade do verão mostrando sua solidez, sem nenhuma dúvida há de superar nos meses próximos a todas as manobras de provocação fascista, levando com suas ações e combates uma ajuda inestimável à causa da conquista da República.
As forças franquistas e os esbirros da Falange continuarão, não resta dúvida, desenvolvendo sua luta de morte contra os guerrilheiros, mas estes responderão com sua fidelidade à causa da liberdade e da independência da Espanha, melhorando no combate sua atuação; continuarão cada vez mais ativos, melhorando seu preparo político. E todos os esforços de Franco e seu regime não conseguirão abater sua firmeza e heroísmo exemplares.
O movimento guerrilheiro, com raízes profundas no campo e entre os camponeses, deve ligar-se muito mais à classe operária.
Devemos fazer todos os esforços para vincular mais e melhor a luta dos operários e dos guerrilheiros. Unificar a ação na cidade e no campo para que cada combate da classe operária seja correspondido por ações e combates dos guerrilheiros, assim como a luta guerrilheira no campo deve estar apoiada pelas lutas dos operários nas cidades.
É preciso conseguir que assim como hoje é uma preocupação à seu regime a importância da luta guerrilheira no interior da Espanha, seja também uma preocupação para os guerrilheiros o desenvolvimento da luta da classe operária, que será tanto maior. quanto maior for a correspondência entre as ações guerrilheiras e as lutas da classe operária.
Sincronizar as atividades dos trabalhadores e camponeses é um objetivo que devemos realizar para obrigar ao fascismo espanhol a dispersar forças e como estímulo para incrementar a luta popular anti-franquista.
Unificar, no combate contra Franco e seu regime, todas as forças anti-franquistas, entre elas a luta dos operários nas cidades e o movimento guerrilheiro e camponês, é uma tarefa na qual temos muito o que lucrar.
É preciso conseguir que a chama que arde nas regiões agrários do nosso país unifique-se com um movimento de lutas operárias poderoso e em constante desenvolvimento, para que o maldito regime franquista dos operários e guerrilheiros e das massas camponesas para ajudar a terminar com os sofrimentos do nosso povo, para a liquidação de Franco, para alcançar a liberdade, a independência da Espanha e a reconquista da República.
Uma Tarefa da Luta
“Desenvolver a democracia até suas últimas conseqüências, pesquisar as formas desse desenvolvimento, pô-las à prova na prática, etc., eis uma das tarefas essenciais da luta pela revolução social.”
Lénin (Do Estado e a Revolução).