A economia política de Gramsci
Vale a dizer: não tentem encontrar nesses textos nada que possa lembrar um texto “acadêmico” de economia política. E, efetivamente, nada disso pode ser encontrado: a “crítica da economia política” marxiana, aliás, não é tanto uma “correção das lacunas (ou erros) da economia clássica; como nota Gramsci, ela, na verdade, “abre um caminho completamente novo, isto é, renova, em sua totalidade, o modo de conceber a própria filosofia”. O novo conceito de “imanência” que dela emana, se constitui no “momento sintético unitário”, no qual se fundem entre si os produtos da “filosofia clássica alemã”, da “economia política inglesa” e da “literatura e prática política francesas”, ela representa, ao mesmo tempo, o ponto fulcral de uma nova ciência da “objetividade”, capaz de captar a “relação entre o homem e a realidade, com a mediação da tecnologia”.
Também há um credo disseminado de que a consideração da “critica da economia política” por parte de Gramsci não tenha sido decisiva no sentido da elaboração dos pontos fundamentais de seu pensamento; aliás, mais de uma acusação, nesse sentido, foi levantada contra ele. O objetivo deste trabalho é demonstrar, ao contrário, como as categorias constitutivas do discurso gramsciano ressentem-se profundamente do conceito que Marx põe no centro da revolução teórica e que é a “crítica da economia política”, isto é, o conceito de modo de produção, e de tornar claro como todos os nós temáticos mais importantes desenvolvidos nos Cadernos – a partir daquele, realmente central, da hegemonia – não podem ser pensados através do “modo de produção”.
Com efeito, é a partir desse conceito – que, como veremos, assume uma outra denominação, a de “mercado determinado” – que Gramsci esboça nas páginas dos Cadernos aparentemente dedicadas à economia política, o que, a meu ver, parece-me o núcleo central de seu pensamento: vale a dizer, uma teoria da transição que, rompendo definitivamente com o determinismo mecanicista próprio da Segunda Internacional, seja capaz de pensar coerentemente “o velho que morre e o novo que ainda não nasceu”, dando conta, precisa-mente no plano puramente teórico, dos “fenômenos mórbidos mais diversos” que necessariamente acompanham aquele “interregno”.
Mercado determinado e lei de tendência
O meu ponto de partida – escreve Gramsci à Tânia em 30 de maio de 1932 – são os dois conceitos fundamentais para a ciência econômica, de “mercado determinado” e “lei de tendência”, que me parecem ser de Ricardo, e continuo assim: não é talvez nesses dois conceitos que se encontrou o motivo para reduzir a concepção “imanente” da história, expressa através da linguagem idealista e especulativa da filosofia clássica alemã, em uma “imanência” realista imediatamente histórica, na qual a lei de causalidade das ciências naturais tem sido depurada de seu mecanicismo e sistematicamente identificada com o pensamento dialético de Hegel?
Essa “conexão de idéias”, que na carta à Tânia “aparece ainda um pouco obscura” torna-se clara em uma das notas dedicadas à refutação das contestações de Croce sobre a lei da queda tendencial da taxa de lucro; é ali, com efeito, que Gramsci desenvolve com sucesso o que para ele parece ser o “valor gnoseológico” da “descoberta do princípio lógico formal da “lei de tendência”, que leva a definir os conceitos fundamentais na economia de homo oeconomicus e de “mercado determinado”. Isto é, trata-se de isolar, para cada momento histórico, aquelas “forças relativamente permanentes” que operam com uma certa regularidade e automatismo, e concebê-las, por meio de um procedimento lógico, que as coloque como “abstratas” — “mas sem que a abstração deixe de ser historicamente determinada” — no plano de um “todo que determina, naquela determinada medida, aquele automatismo e conjunto de identidades e regularidades que a ciência econômica busca descrever com a máxima exatidão, precisão e exaustão”.
O avanço da atividade social, portanto, é fixado em leis tendenciais que, apesar de tudo, não são expressão da relação causa-efeito, própria do mecanicismo natural; mais ainda, a identificação dessas leis é fruto de uma abstração que, mesmo que “historicamente determinada”, nada tem a ver com a realidade histórica: é precisamente por causa disso que, por exemplo, isolar a lei da queda tendencial da taxa de lucro, em quanto modalidade especifica de manifestação de progresso na produtividade do trabalho social, própria do modo capitalista de produção, não somente não comporta “nada de automático e tanto menos de iminente” a respeito do fim da sociedade capitalista, mas também é preciso acrescentar que essa lei, na realidade, não pode dizer nada à respeito da queda efetiva dos lucros das empresas. A lei é tendencial no sentido de que se limita a “indicar esse processo dialético pelo qual o impulso molecular progressivo leva a um resultado tendencialmente catastrófico no todo social, resultado do qual partem outros impulsos individuais que progridem em um processo de contínua superação, que, porém, não pode ser considerado infinito”, porque característico (somente) de uma determinada formação histórica.
Uma vez isolada “a atividade solidária e coordenada de um grupo social que opera segundo determinados princípios aceitos por convicção (livremente) e com vista a determinados objetivos”, passamos a possuir o primeiro elemento para começar a esclarecer o objeto dessa teoria, isto é, a “transição”; ela somente pode ser definida como alteração dos automatismos pré-existentes e aparecimento de novas “leis tendenciais”, inicialmente sob a forma de “arbítrios individuais”, depois sob a forma de “deslocamento da base do automatismo, novas racionalidades”.
Esta definição não seria ainda completa na medida em que não se considerasse a importância que Gramsci atribui ao famoso passo do “Prefácio” da Crítica da economia política, onde está escrito que “uma formação social não morre até que não se desenvolvam todas as forças produtivas a que ela pode dar curso; relações de produção novas e superiores nunca surgirão antes que tenham amadurecido no seio da velha sociedade as condições materiais de sua existência”. É aqui, com efeito, que mais se capta o sentido da inovação tecnológica gramsciana, já que – em contraste com as visões que representavam a história como alternância, mais ou menos pacífica, de “mercados determinados” diversos, cada um superando e englobando o outro – Gramsci funda uma teoria da imanência capaz de avistar, no presente histórico, a coexistência de “mercados determinados”, de modos de produção diferentes, cada um em luta contra o outro para conseguir a hegemonia. Compreende-se, então, porque Gramsci considera que “a tese segundo a qual os homens adquirem consciência dos conflitos fundamentais no terreno das ideologias não é de caráter psicológico ou moral, mas possui um caráter orgânico gnoseológico”: porque o presente, sob o aspecto de tensão conflitual perene, pode ser concebido somente após a delimitação conceitual dos “blocos históricos” que lhe dão vida, cada um com o seu próprio automatismo, sua própria racionalidade, sua própria necessidade.
Daí surge a importância do papel dos intelectuais. Com efeito,
o homem ativo de massa age praticamente, mas não possui uma consciência teórica clara de seu agir, apesar do agir ser um conhecer de mundo na medida que a ação transforma o conhecimento. A consciência teórica do homem, aliás, pode estar em contradição com o seu agir. Pode-se quase dizer que ele tem duas consciências teóricas (ou uma consciência contraditória), uma implícita em seu operar e que o une realmente a todos os seus colabo-radores na transformação prática da realidade e outra, superficialmente explícita ou verbal, que herdou do passado e acolheu sem críticas. Apesar disso, esta concepção “verbal” não se dá sem conseqüências: ela se liga a um grupo social determinado, influi na conduta moral, no endereçamento da vontade, de modo mais ou menos enérgico, e isso pode chegar até a um ponto no qual a contraditoriedade da consciência não permite nenhuma ação […] e pro-duz um estado de passividade moral e política.
Trata-se de um passo realmente central para compreender alguns comportamentos presentes entre as massas nos períodos de crises. Os “automatismos” que tornam concreto um determinado homo oeconomicus, com efeito, implicam que — perante os problemas que surgem no funcionamento da estrutura social, causados pelas “atividades solidárias e coordenadas” dos grupos sociais que compõem a sociedade — se manifeste a tendência a repetir obsessivamente, com base a experiência passada, atividades já experimentadas cujo atendimento é a razão do próprio automatismo. Mas sendo que a dificuldade nasce precisamente do fato de que a consolidação da prática social modificou a estrutura, determinando o surgimento de problemas novos, a impossibilidade de resolve-los, reiterando as velhas práticas sociais, determina uma verdadeira e própria interrupção do processo reprodutivo. Ora, é importante salientar que a causa dessa interrupção não é imediatamente visível, justamente porque a estrutura não é “visível” diretamente, mas somente através da produção de seu conceito, o “bloco histórico”. O que equivale a dizer que se essa “produção” não intervém – e pode intervir somente através dos intelectuais na função de “funcionários das superestruturas” — disso só pode derivar a “ruína comum das classes em luta”.
De tudo isso, Gramsci não extrai a conseqüência que todo impasse econômico é significativo em termos de modificações estruturais; ele, aliás, diferencia “movimentos orgânicos” de “movimentos que podem ser chamados de conjuntura” e salienta que o erro em que se incorre freqüentemente […] consiste em não saber encontrar a justa relação entre o que é orgânico e o que é ocasional: desta forma, consegue-se apresentar como imediatamente operantes causas que na realidade são operantes mediatamente, ou a afirmar que as causas imediatas são as únicas eficientes; em um caso, se tem excesso de economicismo, […] de outro, excesso de ideologismo. Em um caso, são supervalorizadas as causas mecânicas, de outro, se exalta o elemento voluntarista individual. Cuidado, porém, para não supervalorizar o aspecto “mecânico” ou “material”: a crise, diz Gramsci, se torna orgânica quando for crise de hegemonia, portanto, incapacidade do sistema estrutural de elaborar significativamente o próprio impasse, de modo a apresentá-lo como conseqüência “não necessária” da lei de tendência imanente ao funcionamento da estrutura. Vem disso o caráter peculiar da relação entre momento estrutural e superestrutural: o impasse reprodutivo de um mercado determinado é necessário para que possa amadurecer uma nova hegemonia, mas não é suficiente por si só se falta a elaboração superestrutural; e, de outro lado, essa elaboração pode já existir, mas se tornar historicamente inoperante se falta o necessário impasse estrutural. Como escreve Gramsci:
verifica-se uma crise que, as vezes, se prolonga por dezenas de anos. Esta duração excepcional significa que na estrutura surgiram (amadureceram) contradições insanáveis e que as forças políticas que operam no sentido da conservação e defesa da própria estrutura se esforçam, contudo, de resolve-las entre certos limites e supera-las. Estes esforços incessantes e perseverantes (dado que nenhuma forma social vai querer confessar de ter sido superada) formam o terreno do “ocasional” sobre o qual se organizam as forças antagonistas que tendem a demostrar (demonstração que, em última análise é bem sucedida e é “verdadeira” se se torna nova realidade, se as forças antagônicas triunfam, mas imediatamente ela se desenvolve em uma série de polemicas ideológicas, religiosas, filosóficas, políticas, jurídicas, etc., cuja consistência depende da credibilidade e capacidade destas forças antagônicas de deslocar o alinhamento pre-existente de forças sociais) que já existem as condições necessárias e suficientes para que determinadas tarefas possam e, portanto, devam ser re-solvidas historicamente (devam, porque toda ausência ao devir histórico aumenta a desordem necessária e prepara catástrofes mais graves).
É evidente o distanciamento teórico em relação ao mecanicismo típico da Segunda Internacional: no trecho acima exposto, a “crise que às vezes se prolonga por dezenas de anos” é somente o “ocasional” que por si só não produz nada se faltar um momento superestrutural capaz de delimitar conceitualmente o bloco histórico (que, por enquanto, é somente uma idéia de sociedade) capaz de deslocar o “alinhamento pré-existente das forças sociais”. Mas, por outro lado, é somente sobre esse “terreno” ocasional que “as forças antagônicas, que tendem a demonstrar que já existem as condições necessárias e suficientes para que determinadas tarefas possam e, portanto, devam ser resolvidas historicamente”, podem se organizar de maneira apropriada. Ao contrário, a Comuna de Paris fracassa precisamente porque a burguesia consegue impor os automatismos e a racionalidade dos quais é portadora sobre os “grupos novíssimos que consideram já superada a nova estrutura surgida da revo-lução que se iniciou em 1789, demostrando assim ser vital em relação ao velho e em con-frontação com o novíssimo”.
Gramsci sintetiza tudo isso no conhecido parágrafo sobre o conceito de “catarse”: (25): somente a elaboração superior da estrutura em superestrutura, vale a dizer, a produção do conceito de bloco histórico correspondente à nova situação, permite a passagem do objetivo ao subjetivo, “da necessidade à liberdade”.
Estado e hegemonia
Isso, porém, não é suficiente. A delimitação conceitual do novo “bloco histórico” é somente um momento (preliminar) para que se possa desenvolver a “luta entre hegemonias”. “A consciência de fazer parte de uma determinada força hegemônica (isto é, a consciência política) é a primeira fase para uma ulterior e progressiva auto-consciência na qual teoria e prática finalmente se unificam.” A teoria, portanto, deve desembocar em práxis, o que significa a necessidade de agir sobre o Estado que é o
instrumento que vai adaptar a sociedade civil à estrutura econômica […]. Esperar que, pelo caminho da propaganda e persuasão, a sociedade civil se adapte à nova estrutura, que o velho “homo oeconomicus” desapareça sem ser sepultado com todas as honras que merece, é uma nova forma de retórica econômica, uma nova forma de moralismo econômico vazio e inconcludente. .
A demonstração “que já existem as condições necessárias e suficientes para que determinadas tarefas possam e, portanto, devam ser resolvidas historicamente” se realiza somente “se se torna nova realidade”. É por isso que a “formula em moda em 1848 da “revolução permanente” é desenvolvida e superada na ciência política na fórmula de “hegemonia civil”. Acontece na arte política o que acontece na arte militar: a guerra de movimento se torna sempre mais guerra de posição e se pode dizer que um Estado vence uma guerra na medida em que a prepare detalhada e tecnicamente em tempo de paz. A estrutura maciça das democracias modernas, seja como organizações estatais seja como conjunto de associações da vida civil, são, para a arte política, como as “trincheiras” e as fortificações permanentes da frente na guerra de posição. Elas tornam somente “parcial” o elemento do movimento que antes era “toda” a guerra, etc.
Mas atenção: a conquista dessas “trincheiras” e desses “abrigos fortificados”, a partir dos quais originar novos “automatismos” é essencial para a própria hegemonia, dado que, justamente “pelo caminho da propaganda e persuasão” o velho homo oeconomicus absolutamente não desaparece. E é por causa disso, a meu ver, que toda a problemática da hegemonia deve se relacionar, para ser tematizada de maneira inteira, não somente ao episódio do choque entre classes sociais no interior de um determinado modo de produção, mas também àquele muito mais complexo e consistente do conflito entre modos de produção; alias, se a essência da crise “orgânica” na qual se precipita um certo modo de produção consiste na crise de hegemonia da classe dirigente, que acontece ou porque a classe dirigente fracassou em algum de seu grande empreendimento político, para o qual pediu ou impôs com a força o consenso das grandes massas (como a guerra), ou porque grandes massas (…) passaram de repente da passividade política a uma determinada atividade e põem reivindicações que, em seu conjunto desorgánico, constituem a revolução, é até demasiado evidente que a luta pela hegemonia só pode passar pela construção de novos automatismos, de novas racionalidades, que permitam a reprodução do conjunto social no novo nível imposto pelo surgimento das novas necessidades. Explica-se, portanto, a centralidade do Estado e do direito na transição. Gramsci a tematiza expressamente à propósito da polemica entre Einaudi e Ugo Spirito sobre o papel do Estado no modo de produção capitalista:
Estão errados os dois contendores […] a intervenção estatal […] é uma condição econômica preliminar de qualquer atividade econômica coletiva, é um elemento do mercado determinado, se não é até o próprio mercado determinado, dado que é a própria expressão político-juridica do fato pelo qual uma determinada mercadoria (o trabalho) […] é colocada em condições de inferioridade competitiva […].
Trata-se, enfim, do mesmo papel decisivo que Marx atribui ao poder de Estado no capítulo XX do Livro I de O capital, a propósito da assim chamada “acumulação originária”, o que confirma como os “fenômenos mórbidos”, próprios de um “interregno” no qual se desenvolve uma luta pela hegemonia, devem se relacionar com o fato de que nenhum dos mercados determinados, que disputam o papel de “produção que decide o nível e a influência de todas as outras produções e cujas relações decidem, portanto, o nível e influência sobre todas as outras relações” conseguiu ainda prevalecer, impor seu próprio automatismo e sua própria racionalidade no contexto da “iluminação geral na qual todas as outras relações são submetidas e modificadas em sua particularidade”.
Uma teoria da transição
Vou tentar recapitular, agora, a argumentação. Na “atividade coordenada e solidária de um grupo social”, Gramsci considera que é possível individualizar algumas “forças relativamente permanentes, que operam com uma certa regularidade e automatismo” em um determinado momento histórico e as constrói como um “todo que determina” o próprio automatismo. É preciso insistir que a eficácia, própria dessas “leis”, não apresenta elementos comuns com o mecanicismo naturalista e que se trata de leis “abstratas” no sentido de fazerem parte do funcionamento da estrutura do mercado determinado: como produtos do pensamento, elas, como tais, nada podem nos dizer sobre a realidade histórica concreta, na qual aquela estrutura nunca se apresenta em seu “estado puro” mas sempre prenhe de sua complexidade multiforme, induzida pela eficácia que é própria do funcionamento de outras estruturas contemporaneamente presentes e das superestruturas políticas, jurídicas, ideológicas, religiosas, etc., correspondentes a cada uma delas. (Incidentemente: tinha razão Sraffa, portanto, quando – a propósito da lei da queda tendencial da taxa de lucro – observava que “em cada sociedade capitalista determinada, tanto a taxa de mais-valia como a taxa de lucro são extraordinariamente estáveis no tempo” e que “a queda tendencial obriga os capitalistas a evitarem revoluções técnicas contínuas para evitar a queda da taxa de lucro”. Mas, ao mesmo tempo, estava errado, porque isso não significa negar o “caráter histórico” da lei: a lei é “histórica”, diz Gramsci, sob o aspecto de abstração relativa a um mercado determinado).
Ora, na medida em que a reprodução avança, o organismo social, que Gramsci denomina “mercado determinado”, sofre estímulos internos e externos que tendem a alterar seu funcionamento normal. Pode-se dizer que sua capacidade de se manter como organismo, garantindo a reprodução dos indivíduos subsumidos nele, depende da permeabilidade aos estímulos e da capacidade de ativar mecanismos de realimentação, metabolicamente possíveis, sem que venha a ser alterada significativamente sua “lei de tendência”. Mas pode acontecer que a capacidade de metabolizar o “intruso” venha a faltar: quando isso acontece, o mercado determinado entra em crise. A crise se expressa, precisamente, na incapacidade do sistema superestrutural subsumir a alteração dentro da lei tendencial, imanente ao funciona-mento do mercado determinado.
Perante essa crise existem (pelo menos) duas alternativas: se a alteração procede da atividade coordenada e solidária de um grupo que cresceu (qualitativa ou quantitativamente) no interior do mercado determinado e que elaborou, através de seus próprios intelectuais, um novo bloco histórico (isto é, delimitando conceitualmente a nova racionalidade e os novos automatismos que devem dirigir o funcionamento diverso do conjunto social) então se abre a luta pela hegemonia; no caso oposto, o organismo entra em decadência. A luta pela hegemonia, portanto, marca a transição que consiste na alteração dos automatismos pré-existentes e na aparição de novas racionalidades (que inicialmente aparecem como “arbítrios individuais”) e passa pela conquista dos espaços a partir dos quais impõe as novas racionalidades como hegemônicas. “O velho morre e o novo não pode nascer” quando um não consegue prevalecer sobre o outro. Mas prevalecer só pode significar ser hegemônico: o presente histórico é sempre atravessado por diversos mercados determinados.
Da teoria à interpretação: americanismo e fordismo
É essa concepção complexa da transição que Gramsci põe à prova em “Americanismo e fordismo”. Ele compreende que “a americanização requer um ambiente determinado, uma estrutura social determinada […] e um determinado tipo de Estado […] O desaparecimento do tipo semifeudal do rendeiro, na Itália, é uma das condições mais importantes da revolução industrial”, já que a indústria fordista somente poderia decolar se libertando da ditadura da renda financeira. Vem daí a atenção em relação à tese da “autarquia financeira da industria”, segundo a qual a
produção de poupança deveria se tornar uma função interna (com o objetivo um mercado maior) do próprio bloco produtivo, através de um desenvolvimento da produção baseado em custos decrescentes que permita, além de um maior volume de mais-valia, salários mais altos, com a conseqüência de um mercado interno mais capaz, com alguma poupança ope-rária e lucros mais altos.
Se isso pudesse se realizar, observa Gramsci, as empresas poderiam dispor da liquidez financeira necessária para financiar os processos de acumulação sem passar “através do intermediário dos produtores de poupança que, na realidade, são devoradores de mais-valia”. Entretanto, para que essa solução se imponha, é preciso impedir a “desconfiança dos poupadores em relação aos industriais”, desconfiança agravada, a seu tempo, pelas re-percussões da queda de Wall Street sobre as bolsas européias. “A massa dos poupadores busca se desfazer completamente de ações de qualquer tipo, desvalorizadas além de qual-quer previsão [e] prefere os títulos de Estado à qualquer outra forma de investimento.” Desse modo, porém, o Estado passa a assumir uma função de primeiro plano no sistema capitalista: “concentra a poupança destinada à industria e à atividade privada, como investi-dor de médio e longo prazo”.
Observo, de passagem, que Gramsci interpreta a crise de 29 nos mesmos termos em que a interpretavam os economistas ortodoxos de sua época: excesso de consumo, redução a zero da poupança, e, conseqüentemente, queda da acumulação de capital; permaneceu-lhe completamente estranha – não obstante um explícito “convite à leitura” a ele dirigido por Sraffa — a análise keynesiana que, ao contrário, tendia a reconhecer no excesso de poupança sobre os investimentos a causa desencadeadora das quedas industriais e financeiras que naqueles anos se arremessavam umas contra outras. É significativo, apesar de tudo, que ele relevasse, no plano prático, a realização daquilo que Keynes propunha no plano teórico: a função decisiva para o processo capitalista que o Estado vinha a assumir sob a roupagem de criador de liquidez (anos depois, Joan Robinson teria lembrado o ar de frustração que dominou em Cambridge “o pequeno grupo de keynesianos”, ao mesmo tempo que Hitler e Mussolini demostravam que “Keynes tinha razão”).
Precisamente o reconhecimento da importância da criação da liquidez colocava Gramsci em condições de perguntar se “uma vez assumida essa função”, o Estado pudesse “se desinteressar da organização da produção e da troca”, deixando-as, como antes, nas mãos da iniciativa privada. E dava uma resposta decididamente negativa:
[..] se isso acontecesse, a desconfiança que hoje atinge a industria e o comércio privado arrastaria também o Estado; o surgimento de uma situação que obrigasse o Estado a desvalorizar seus títulos (através da inflação ou por outra forma), como a desvalorização das ações do setor privado, seria uma catástrofe […]. Por causa disso, o Estado é obrigado necessariamente a intervir para controlar se os investimentos, feitos através dele, são bem administrados […]. Mas o mero controle não é suficiente. Com efeito, não se trata somente de conservar o parque produtivo assim como é num determinado momento; trata-se de reorganizá-lo para desenvolvê-lo paralelamente ao aumento da população e das demandas coletivas.
Um novo mercado determinado?
Não é absolutamente fora de propósito verificar, nessa compreensão do papel decisivo do Estado, o processo de mudança profunda do “mercado determinado”, isto é, da transformação do pré-existente bloco histórico do capitalismo do laissez-faire, provocada pelas “tentativas sucessivas por parte da industria de superar a lei tendencial da queda da taxa de lucro”. Hoje, escreve Gramsci, a crise da sociedade burguesa é orgânica e isso significa que aquelas “forças privadas” que podiam permitir ao Estado se apresentar exclusivamente como “veilleur de nuit”, cessaram de operar; a burguesia deixou de ser uma classe capaz de colocar a si mesma “como um organismo em movimento contínuo, capaz de absorver toda a sociedade, assimilando-a a seu nível cultural e econômico” e tende a se desagregar; “não somente não assimila elementos novos, mas desassimila uma parte de si mesma”. Desse colapso da sociedade civil “nasce a justificativa histórica das assim chamadas tendências corporativas, que se manifestam, de maneira preponderante, como exaltação do Estado em geral, concebido como algo de absoluto e como desconfiança e aversão às formas tradicionais de capitalismo”, tendências perante as quais aparecem como “argúcias de molenga” as de quem “reedita trechos de economistas do século passado e não percebe que o ‘mercado’ mudou”.
O problema de fundo com o qual se medem as sociedades capitalistas é constituído pela “passagem […] do velho individualismo econômico para a economia programática”. Os intelectuais mais lúcidos percebem, com efeito, que os mecanismos de mercado não são mais idôneos para a garantia da reprodução social e que os indivíduos deveriam experimentar modalidades de constituição do “conjunto” diversas da troca de mercadorias contra dinheiro, sob pena de sua própria decadência como organismo coletivo. Alguns anos antes, Walther Rathenau (então presidente do truste AEG, empresário não desprovido de ambições teóricas e políticas) tinha explicitamente afirmado que a economia não podia mais ser considerada um negocio privado mas “um negocio da coletividade” e, naqueles mesmos anos, Keynes proclamava o “fim do lassaiz-faire” e a necessidade de “distinguir entre o que Bentham, em sua esquecida porém útil nomenclatura, usava chamar de agenda e não agenda […] sem o pressuposto prévio de Bentham de que a interferência [do Estado] é, ao mesmo tempo, geralmente inútil e geralmente danosa”.
É importante esclarecer que o Estado, nessa passagem difícil, assume na Europa uma dupla relevância: sob a veste de “condição econômica preliminar de toda atividade econômica coletiva” ele é utilizado como instrumento de coerção para impor mais uma vez automatismos que parecem ter fracassado; sob a veste (ainda incerta) da própria coletividade, ele é chamado a intervir no próprio processo econômico, dando assim curso (nem que seja de forma prática) à exigência de não considerar mais o processo produtivo e reprodutivo social como nexo meramente material, e de experimentar uma aproximação grosseiramente consciente com ele.
Ora, entre os “problemas mais importantes”, característicos desse período, Gramsci registra a “questão de se o desenvolvimento deva ter seu ponto de partida no âmago do mundo industrial e produtivo, ou possa acontecer a partir de fora através da construção cuidadosa e sólida de uma armação formal que possa dirigir, de fora, as transformações necessárias do parque produtivo”. A primeira alternativa corresponde à experiência norte-americana. Ali, não existindo classes numerosas sem funções essenciais no processo produtivo, foi relativamente fácil “racionalizar a produção e o trabalho, combinando de forma hábil, a força (destruição do sindicalismo operário de base territorial) com a persuasão (altos salários, benefícios sociais diversos…), conseguindo-se, dessa forma, a arregimentação de toda a vida do país em volta da produção”. Mas o fordismo americano, além de ser um fenômeno interno à dinâmica do modo de produção capitalista, um “termo dialético de um processo orgânico mais amplo” sustentado pela lei da queda tendencial da taxa de lucro (Gramsci o reafirma inúmeras vezes) é, por demais, um fenômeno próprio de uma sociedade que ainda não superou a fase econômico-corporativa e na qual o elemento superestrutural não assumiu a importância que tem na Europa: a hegemonia nasce a partir da fábrica e se impõe “naturalmente” ao restante da sociedade, sem a necessidade de intermediários profissionais da política e da ideologia.
Mais densa de conseqüências, paradoxalmente, é a outra alternativa, oferecida pelo corporativismo que abre caminho na “estrutura sólida das democracias européias” Nesse caso, o discurso é mais complexo. Para quem enxerga no corporativismo “a premissa para a introdução, na Itália, dos sistemas americanos mais avançados na maneira de produzir e trabalhar”, Gramsci retruca que o corporativismo, na verdade, se origina não tanto “das exigências de uma transformação radical das condições técnicas da industria e nem daquelas de uma nova política econômica, mas, mais precisamente, das exigências de uma polícia econômica, exigências, essas, agravadas pela crise de 1929 ainda em curso”. Também é verdade que no quadro concreto das relações sociais italianas, essa [isto é, a alternativa corporativista] poderia ser a única solução para desenvolver as forças produtivas da industria, sob a direção das classes dirigentes tradicionais, em competição com as formações industriais mais avançadas de países que monopolizam as matérias-primas e que têm acumulado capitais imponentes.
E é precisamente nesse ponto que, a meu ver, Gramsci capta a ambivalência potencial da intervenção estatal na economia capitalista, através da função decisiva, como se falou antes, da criação da liquidez. Com certeza,
ter-se-ia uma revolução passiva pelo fato de que através da intervenção legislativa do Estado e através da organização corporativa seriam introduzidas na estrutura econômica do país modificações mais ou menos profundas para acentuar o elemento “plano de produção”, isto é, se acentuaria a socialização e a cooperação da produção, sem por isso tocar (ou se limitando somente a regular e controlar) a apropriação individual e grupal do lucro.
Mas se o Estado se propusesse impor uma direção econômica pela qual a produção da poupança […] fosse se tornar função do próprio organismo produtivo, esses desdobramentos hipotéticos seriam progressivos […]: seria preciso, então, promover uma reforma agrária […] e uma reforma industrial para reconduzir todas as rendas às necessidades funcionais técnico-industriais e não mais à conseqüências jurídicas do mero direito de propriedade.
A analogia com a “eutanásia do rendeiro” prevista por Keynes no capítulo XXV da General Theory não poderia ser mais perfeita, também porque Gramsci (mesmo se “escondendo” atrás da comparação com a França) evidenciava como essas possibilidades, vindas à luz no contexto do Estado corporativista fascista, viessem sistematicamente a ser frustradas: conforme teria demonstrado analiticamente Pietro Grifone em seu estudo sobre o capital financeiro na Itália, o Estado fascista, para além das proclamações contra a plutocracia, tinha a sua próprias força determinante no consenso dos rendeiros e tinha sua “massa de manobra” na multidão dos pequenos poupadores, “povo dos Bot”, como são chamados hoje.*
Por fim, enquanto o fordismo, como tal, se movimenta no interior da dinâmica da lei tendencial da queda da taxa de lucro – portanto, no interior do “mercado determinado” pelas relações de produção capitalistas –, os processos de intervenção estatal na economia, que na Europa o próprio fordismo em certa medida pressupõe e exige, abrem potencialmente uma linha de ruptura com relação ao mercado determinado pré-existente. Isto é, a maneira através da qual o Estado intervém pode representar uma variante reacionária ou progressista em razão de sua capacidade de se refletir sobre a apropriação de classe do excedente. Parece-me este o sentido do legado gramsciano, explicitado pelo fato de que a ideologia corporativa longe de ser um fenômeno transitório, teria representado o elemento (conservador) de “uma “guerra de posições” no campo econômico”, à qual – parece sugerir Gramsci – deveria ter se contraposto, para evitar uma revolução passiva, a construção do conceito de bloco histórico progressivo, capaz de localizar as posições fortificadas e as trincheiras a partir das quais se movimentar para afirmar os automatismos e as racionalidades próprias de um novo modo de produção.
Do corporativismo ao Welfare State
Para compreender como o esquecimento desse aspecto da reflexão gramsciana pode ter pesado negativamente no debate teórico e na prática da esquerda italiana, é suficiente lembrar as mirabolantes construções conceituais de muitos “marxistas simplórios” (como os definiu Joan Robinson) que criticaram ferozmente o Estado social porque instrumento de integração de uma “aristocracia operária” nos fluxos da affluent society e consideraram Keynes culpado de ter salvo o capitalismo da autodestruição, imaginando os capitalistas como estúpidos que, sem a “explicação de Keynes, não teriam conseguido apreender a experiência feita durante a guerra de que a despesa pública mantém os lucros. Presa a um marxismo oscilante entre o determinismo vulgar e o hipersubjetivismo, a cultura política “de esquerda” ignorou que a forma da intervenção estatal era a verdadeira aposta em jogo e não foi capaz, salvo raras exceções, de captar, em tempo necessário, a inovação no terreno das relações de produção causada pela chegada do Welfare State beveridigano; nada há de estranho que tenha se perfilado, com os seus tristes epígonos, ao lado dos defensores de seu desmantelamento em nome de um “retorno ao mercado” que – para citar ainda Gramsci – não é mais “abstrato”, mas “genérico” ou “indeterminado”, isto é, fruto não de um processo de abstração historicamente determinada, mas de uma abstração “pela qual a hipótese de homogeneidade se transforma em homem biológico”.
Nessa ótica, não seria errado, talvez, dar novo fôlego ao Gramsci “crítico da economia política”: talvez, quem sabe, poderiam encontrar nele as chaves interpretativas para compreender o significado da atual “transição ao pós-fordismo”, antes que as conversas sociológicas sobre o argumento nos façam submergir definitivamente.
Luigi Cavallaro
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*Traduzido de Critica Marxista, Roma, nº 3-4, 1997. Tradução de Giovanni Menegóz.
Giorgio Lunghini, ““Introduzione a Antonio Gramsci. Gramsci, critico dell’economia politica”, em Antonio Gramsci, Scritti di economia politica (Turim: Bollati Borighieri, 1994), pp. VII-XXXIII.
Antonio Gramsci, Quaderni del carcere, Valentino Gerretana (Org.) (Turim: Einaudi), p. 1.436 (daqui para frente Quaderni).
Ibid. p. 1.247.
Ibid., p. 1.456.
Ibid., p. 1.457.
Antonio Gramsci, Lettere dal carcere (Turim: Einaudi, 1954), pp. 190-191.
Quaderni, cit. p. 1.247. “Mercado determinado eqüivale […] a dizer “determinada relação de forças sociais em uma determinada estrutura do aparelho produtivo”, relação assegurada (isto é, tornada permanente) por uma determinada superestrutura política, moral, jurídica” (Ibidem, p. 1.477).
Ibidem, p.1.479.
Ibid., p. 1.277.
Ibid., p. 1.269. É o “método do “posto que” da premissa que produz uma certa conseqüência, a qual “parece que deva ser identificada como um dos pontos de partida (dos estímulos intelectuais) das experiências filosóficas dos fundadores da filosofia da praxis” (Ibidem, p. 1.479).
Com efeito, Gramsci precisa que “não se trata de “descobrir” uma lei metafísica de “determinismo” e nem de estabelecer uma lei “geral” de causalidade. Trata-se de relevar como forças relativamente “permanentes”, que operam com uma certa regularidade e automatismo, se constituam no desenvolvimento histórico” (Ibidem). É preciso notar que ele não pensa nessa distinção, isto é, não produz um conceito adequado ao novo sujeito que isolou, vale a dizer, uma relação de causalidade, que não seja aquela transitiva, própria das ciências naturais de inspiração newtoniana.
Quaderni, cit., p. 1.283.
Ibid., p. 1.283.
Ibid., p. 1.246.
Ibid., p. 1.246.
Cfr. Karl Marx, Prefazione a Per la critica dell’ economia politica (Roma: Editori Riuniti, 1984), p. 5. O prefácio, como é claro, foi traduzido por Gramsci na cadeia (cfr. Quaderni, cit., pp.2.358-2.360).
Quaderni, cit., p. 1.595. A tese é apresentada por Marx no Prefacio citado.
“A estrutura e as superestruturas formam um “bloco histórico”, isto é, o conjunto complexo e discorde (contraditório) das superestruturas são o reflexo do conjunto das relações sociais de produção” (cfr. Quaderni, cit., p. 1.051).
Ibid., p. 1.385.
“O indivíduo espera que o organismo agisse, mesmo que não faça algo e não reflita que precisamente, por causa de seu comportamento muito difuso, o organismo é necessariamente inoperante” (Quaderni, cit., p. 1.770).
Ibid., p. 1.518.
Ibid., pp. 1.579-1.580.
Ibid., pp. 1.579-1.580.
Ibid., pp. 1.581-1.582.
Ibid., pp. 1.244-1.245.
Ibid., p. 1.385.
Ibid., p. 1.254.
Ibid., pp. 1.566-1.567.
Ibid., p. 1.603.
“Na realidade, o Estado deve ser concebido como ‘educador’ na medida em que tende, precisamente, a criar um novo tipo ou nível de civilização […] O direito é o aspecto repressivo e negativo de toda a atividade não-civilizatória desenvolvida pelo Estado. Na concepção do direito, deveriam ser incorporadas também as atividades ‘gratificantes’ de indivíduos, grupos, etc. (Quaderni, cit., pp. 1.570-1.571).
Ibid., pp. 1.257-1.258.
“Na medida em que a produção capitalista avança, desenvolve-se uma classe operária que, por educação, tradição, costume reconhece como leis naturais óbvias as exigências daquele modo de produção […] Não é a mesma coisa no caso da gênese histórica da produção capitalista. A burguesia, quando surge, precisa do poder do Estado e o usa para ‘regular’ o salário, isto é, para obrigá-lo a permanecer entre limites convenientes àqueles que quer obter mais-valia, para prolongar a jornada de trabalho e para manter o próprio operário a um grau normal de dependência. Esse é um momento essencial da assim chamada acumulação originária” (K. Marx, Il capitale.Critica dell’economia politica, Livro 1 (Roma: Editori Riuniti,1989), pp. 800-801).
K. Marx, Lineamenti fondamentali della critica dell’economia politica (Florença: La Nuova Italia, 1978), I, p. 34. Ibidem.
Um claro exemplo desse modo de proceder, no qual a identificação da lei tendencial constitui um momento da compreensão da estrutura não transferível imediatamente à realidade efetiva, Gramsci mostra a propósito das considerações sobre a crise de 29: “Será preciso combater todos os que querem dar a esses acontecimentos uma definição única, ou, o que é o mesmo, encontrar uma causa única ou uma origem única. Trata-se de um processo que tem muitas manifestações e no qual outras causas e outros efeitos se complicam e se sobrepõem. Portanto: processo complexo, como em muitos fenômenos, e não “fato” único que se repete de maneiras diversas a partir de uma causa de origem única” (Quaderni, cit., p. 1.755).
Cfr. N. Badaloni, Due manoscritti inediti di Sraffa su Gramsci, em Crítica Marxista, nº 6, 1992, p. 49.
Quaderni, cit., p. 2.157.
Ibid., pp. 2.153 e ss.
Ibid., p. 2.155.
Ibidem.
Ibid., p. 2.175.
Ibid., pp. 2.175-2.176.
Naturalmente, Gramsci rejeitava as “conclusões puramente tendenciosas e, em parte, imbecis” dos que defendiam que o excesso de consumo fosse devido ao aumento da cota dos salários sobre o total do produto social (“Pode-se provar que […] a relação entre salários e lucros se tornou catastrófica para os lucros? Uma estatística não poderia provar isso nem na América” (Quaderni, cit., p. 793) e considerava, mais precisamente, que o excesso de consumo, especialmente nos países europeus, estava ligado ao peso excessivo assumido pelas classes parasitárias do comércio e da especulação.
Na carta endereçada à Tânia Schucht, de 9 de setembro 1931 (citado. em G. Lunghini, “Introduzione a Antonio Gramsci”, cit., cit., p. VIII, nota 2).
J. Robinson, “Che ne é stato della rivoluzione keynesiana?”, em Occupazione, distribuzione e crescita (Bolonha: Il Mulino, 1991), p. 107.
J. Robinson, “Recessione e inflazione”, Ibid., p. 133.
Quaderni, cit., p. 2.176.
Ibidem.
Ibid., p. 2.140.
Ibid., p. 937.
Ibidem.
Ibid., p. 2.177.
Ibid., p. 1.077. A referência diz respeito aos escritos de Einaudi dedicados à crise econômica, publicados na revista Riforma sociale, janeiro-fevereiro, 1932.
Quaderni, cit., p. 2.139.
Cfr. W. Rathenau, L’economia nuova (Turim: Einaudi, 1976), p. 3.
J. M. Keynes, “La fine del laissez-faire” em La fine del lassaiz-faire e altri scritti (Turim: Bollati Boringhieri, 1991), p. 37.
Quaderni, cit., p. 2.140.
Ibid., pp. 2.145-2.146.
Ibid., p. 1.283.
“Toda a atividade industrial de Henry Ford pode ser estudada deste ponto de vista: uma luta contínua, incessante, para fugir à lei da queda da taxa de lucro, mantendo uma posição de superioridade sobre os concorrentes” (Ibid., pp. 1.281-1.282). Racionalização da produção e taylorização do trabalho, com efeito, são inovações através das quais “a industria passa de um período de custos crescentes (isto é, de queda da taxa de lucro) para um período de custos decrescentes, na medida em que passa a gozar de um monopólio de iniciativa que pode durar bastante tempo (relativamente)” (Ibid., p. 1.312); os próprios “salários altos”, pagos pela industria fordista, devem ser considerados somente “uma forma transitória de retribuição”, motivados pela compreensão dos industriais norte-americanos de que “a adaptação aos novos métodos de produção e trabalho não pode se dar somente através da coação social” e que “a coerção […] deve ser sabiamente combinada com a persuasão e o consenso […] Mas depois que os novos métodos de trabalho e produção passarem a ser generalizados e disseminados, logo que o novo tipo de operário for criado universalmente e o aparelho de produção material for aperfeiçoado mais ainda, o turn-over excessivo automaticamente passará a ser limitado por um desemprego extenso e os salários altos desaparecerão” (Ibid., p. 2.172). Precisamente por causa disso, Gramsci salienta no fordismo principalmente o papel seguramente decisivo que este último pode ter tido ao criar um novo “tipo” humano, no qual a “memória da profissão, reduzida a gestos simples repetidos com um ritmo intenso, ‘aninhou-se’ nos feixes musculares e nervosos que deixaram o cérebro livre e vazio para outras ocupações” (Ibid., pp. 2.170-2.171).
Ibid., p. 692.
Ibid., pp. 2.170-2.171.
Ibid., p. 2.153. A referência diz respeito a N. Massimo Fovel, Economia e corporativismo (Ferrara; Sate, 1929).
Quaderni, cit., p. 2.156.
Ibid., p. 1.228.
Ibidem.
Ibid., pp. 2.176-2.177.
Ibidem.
P. Grifone, Il capitale finanziario in Italia (Turim: Einaudi, 1971).
*Bot é uma espécie de Letras do Tesouro Nacional (Nota do tradutor).
Cf. Quaderni, p. 1.228.
Cfr. J. Robinson, “Che ne è stato della rivoluzione keynesiana?”, cit., p. 113.
Para uma reflexão estimulante sobre esse tema ver G. Mazzetti, Quel pane da spartire (Turim: Bollati Boringhieri, 1997), pp. 112 e ss.; 273 e ss.
Quaderni, cit., p. 1.276.
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Fonte: CAVALLARO, LUIGI. "A economia política de Gramsci". Trad. Giovanni Menegóz. Novos Rumos. São Paulo, Instituto Astrojildo Pereira, n. 38, 2002, p. 4-14.