As informações econômicas e a movimentação de capitais ocupam um espaço crescente nos noticiários. São as aplicações nas Bolsas de Valores das principais cidades do mundo, as compras, vendas e cotações de todo tipo de títulos, as infindáveis negociações em torno do problema das dívidas externas. Os círculos dominantes dos países dependentes manifestam a vontade insaciável de atrair o capital estrangeiro “para promover o desenvolvimento” e a oligarquia financeira internacional, exigem mais liberdade para ceder seu precioso capital. A imprensa fala com insistência em siglas como FMI, Banco Mundial, BIRD e outras, com suas metas, taxas de juros, seus prazos, missões fiscalizadoras, etc.

Durante muitas décadas prevaleceu no movimento operário, e mesmo em camadas intermediárias da sociedade de vários países dependentes, o ponto de vista formulado por Lênin no começo do século, segundo o qual a exportação de capitais se constitui numa “sólida base para o jugo e exploração imperialista da maioria dos países e nações do mundo, para o parasitismo capitalista de um punhado de estados riquíssimos” (1). Mas, agora, com a crise do socialismo e a ofensiva imperialista em toda a linha – numa época que guarda certa semelhança com a crise da II Internacional em que Lênin dizia: “as palavras são esquecidas, os princípios se perdem, as concepções se desmoronam e as resoluções e promessas solenes são postas de lado” (2) – está “fora de moda” opor-se e denunciar o caráter espoliador da exportação de capital imperialistas. Tudo o que se coloca em defesa da soberania nacional e do desenvolvimento independente, é logo taxado de “nacionalismo retrógrado”.

É enorme a pressão política e ideológica para embelezar o capitalismo e ressaltar os “benefícios” do capital estrangeiro. É nesse contexto que se explica toda a vacilação pequeno-burguesa de setores do movimento operário mais preocupados em mostrarem-se mansos e confiáveis do que em combater a dependência e a pobreza das nações e povos inteiros, consequência da exportação de capitais dos monopólios e dos países imperialistas. Ainda recentemente o jornalista Getúlio Bittencourt assim descreveu a visita do deputado federal Aloizio Mercadante a Nova Iorque: “Normalmente um representante de um partido brasileiro de esquerda, do PT, deveria deixar preocupada uma platéia de investidores internacionais (…), mas com a palestra de Mercadante, aconteceu o contrário. Veja por que ‘Fernando Collor não foi afastado por causa de seu programa de governo (…) o programa de modernização e integração do Brasil na economia internacional não é dele. Faz parte de um consenso no Congresso e na sociedade brasileira, que não pretende abrir mão dessa abertura’. Assim que Mercadante foi traduzido vieram os aplausos” (Gazeta Mercantil, 03-12-1992).

“No início deste século o domínio dos monopólios permitiu gigantesca acumulação de capital”.

Mas os fatos são teimosos e vão no sentido de desmentir essa falácia neoliberal de “esquerda”. A essência do problema da exportação de capitais não mudou. É um fenômeno típico, “uma das bases econômicas mais essenciais” da etapa imperialista do capitalismo, que determina as tendências principais da economia mundial, “intimamente ligado à divisão econômica e política territorial do mundo” (3). Evidencia a correlação de forças entre as potências imperialistas e a disputa entre elas por áreas de investimentos. Leva o desenvolvimento do capitalismo aos mais remotos rincões do planeta, dividindo em um punhado de países credores e uma grande maioria de Estados devedores.

Gráfico 1 (p. 37)

Já no início do século XX o domínio dos monopólios nos países capitalistas desenvolvidos possibilitou-lhes uma acumulação gigantesca de capital monetário. Esse “excedente de capital” relativo nas mãos de grupos monopolistas e dos países imperialistas é que passa a ser exportado a outros países já incorporados à circulação de capitalismo mundial, em busca de lucros maiores e para reforçar as posições econômicas e políticas dos monopólios. Eram essas, segundo Lênin, a possibilidade e a necessidade da exportação de capitais que, ao serem realizadas, em certa medida diminuem a tendência decrescente da taxa de lucro nos países exportadores, além do que possibilita-lhes multiplicar riquezas à base de fluxo constante de mais-valia vinda dos países “tomadores”, em forma de juros pelos empréstimos concedidos ou de lucros de empresas instaladas no exterior.

Particularmente após a Segunda Guerra Mundial vêm se dando modificações importantes no que diz respeito ao volume de capital exportado, à direção dos fluxos, às formas, aos principais centros exportadores de capitais. Acompanhar essas modificações e atualizar os dados é absolutamente indispensável não só para quem se interessa por economia, mas para toda a estratégia socialista da classe operária.

Uma das modificações de maior importância verificada no curso dos últimos quarenta anos, de forma crescente, é que a exportação de capitais passou a ser feita predominantemente entre países de capitalismo desenvolvido. Lênin ao escrever o seu famoso Imperialismo, fase superior do capitalismo, em 1916, havia constatado que o excedente de capital dos países avançados é exportado aos países atrasados, onde o lucro é em geral elevado, os capitais escassos, o preço da terra e dos salários relativamente baixos e as matérias-primas baratas. Sem dúvida, essas condições não se modificaram e a capital continua a ser exportado para esses tipos de países, mas o pós-guerra marca uma inversão no sentido principal dos fluxos.

Se antes da Segunda Guerra Mundial correspondiam aos países capitalistas desenvolvidos 30% de todo o capital exportado e 70% aos países atrasados, hoje a situação é exatamente inversa. Em 1929, 45% dos investimentos externos norte-americanos destinavam-se às regiões capitalistas desenvolvidas (Europa Ocidental e Canadá). Ao final dos anos 1960, início dos anos 1970, essas mesmas áreas recebiam 70% dos investimentos americanos. A América do Norte e a Europa juntas, em 1989, acumulavam 62% (US$ 150 bilhões) de todo o investimento direto japonês no exterior. Como se pode observar no gráfico nº 1, os investimento diretos estrangeiros feitos nos EUA passaram de cerca de US$ 80 bilhões para US$ 450 bilhões, entre 1980 e 1990, dos quais mais de 90% feitos por outros países capitalistas desenvolvidos.

O relatório anual do Banco de Compensações Internacionais (BIS), divulgado em meados de 1992 dá bem uma idéia da distribuição geográfica dos países exportadores no mundo na modalidade de investimentos diretos. Constata uma pequena modificação no que diz respeito à direção dos fluxos, um crescimento de investimentos nos países dependentes que não altera no fundamental a grave concentração entre países ricos, os números estão na tabela nº 2.
Entre outros fatores que podem explicar essa particularidade atual estão:

1- A diferença nacional da taxa média de lucro, que deriva do nível mais alto ou mais baixo da composição orgânica do capital**. Tal foi o caso da Alemanha e do Japão imediatamente após a guerra com baixa composição orgânica do capital e dos EUA a partir de 1982*** onde não há tendência de crescimento da composição orgânica do capital e, portanto, as taxas de lucro são mais elevadas. Em virtude disso ganham importância as diferenças nacionais de salários. O país de mais alto nível de salários exporta capitais para os países desenvolvidos de salários mais baixos. Um exemplo disso está na comparação entre os salários médios na Alemanha, US$ 25,41 por hora trabalhada, ante US$ 15,88 dos EUA. Isso tem levado grandes monopólios alemães a buscarem transferir parte da sua produção para os EUA.

Tabela 2 (p. 38)

2- Desigualdades no nível de desenvolvimento técnico e científico entre os monopólios e países imperialistas. Os que estão à frente em tecnologias e com métodos de produção “mais eficientes” investem com mais competitividade nos que vão se atrasando. O Japão, por exemplo, já tem vantagem nesse aspecto em vários ramos da produção em relação aos EUA.

3- Crise crônica e estrutural que se abateu sobre os EUA a partir dos anos 1970. O déficit público, dívida interna e externa, déficit na balança comercial e de pagamentos fizeram com que um grande número de empresas e o governo dos EUA atraísse capitais externos. A tabela nº 3 dá uma idéia do montante líquido das transferências de recursos do mundo para a economia norte-americana, uma parte do qual pode ser considerada exportação de capitais para os EUA.

“Desenvolvimento desigual do capitalismo modifica posição relativa entre os países imperialistas”

Fruto do desenvolvimento desigual do capitalismo houve nos últimos anos uma modificação importante quanto à posição relativa dos principais países exportadores de capital. Hoje o Japão é o país que mais exporta capital no mundo, em proporções verdadeiramente gigantescas, posição que ocupa desde 1985. Ao final de 1991 o total dos investimentos japoneses no exterior, de curto e de longo prazos, envolvendo investimentos diretos (fábricas e equipamentos industriais), investimentos em títulos estrangeiros e empréstimos atingiu a soma de US$ 2.006,5 bilhões, 8% a mais que no ano anterior que, comparados aos US$ 1.623,4 bilhões de investimentos estrangeiros feitos no Japão, apontam uma posição líquida exterior de US$383,1 bilhões. Os investimentos japoneses diretos no exterior (fábricas e equipamentos) durante 1990 atingiram US$ 67,5 bilhões (4).

Tabela 3 (p. 39)

Não é que os EUA tenham deixado de exportar capitais, quer sob forma de investimentos diretos ou de empréstimos bancários e governamentais, mas a situação modificou-se bastante desde 1972 conforme mostra a tabela nº 4 na qual sequer figurava o Japão. Os EUA hoje em dia importam mais capitais e mercadorias do que exportam, têm uma posição líquida externa deficitária de algo em torno de US$ 1 trilhão. Foi superado neste indicador também pela Alemanha que teve em 1990 uma posição líquida externa superavitária de US$ 345,4 bilhões e que desde os meados dos anos 1970 já haviam superado a Grã-Bretanha e a França quanto à exportação de capitais. Mesmo o perfil da dívida com os credores privados dos países latino-americanos (considerados o quintal dos EUA) há modificações importantes nesses últimos dez anos. Os bancos dos EUA e Canadá não são mais os principais credores do Brasil, México, Argentina, Venezuela, Chile, Colômbia, Peru e Uruguai e sim os bancos europeus e japoneses como se pode observar na tabela nº 5.

Tabela 4 (p. 39)

Nessas circunstâncias de perda contínua de posições do imperialismo norte-americano e de expansão da exportação de capitais japoneses e alemães é que se dá um acirramento enorme das contradições e disputas entre tais potências imperialistas. Há uma tendência em curso para a formação de blocos econômicos fechados, onde cada potência líder assegura condições mais favoráveis para a exportação de seus capitais e mercados monopolistas (ou zonas de “livre-comércio” como têm sido chamadas) que estejam a salvo das contingências da concorrência internacional. Tabela 5 (p. 40)

A partir dos anos 1990 o Japão tem se voltado mais para a Ásia; de 1986 a 1991 investiram em fábricas e equipamentos na região US$ 27 bilhões, contra US$ 7 bilhões dos EUA. Utilizam os recursos e a mão-de-obra desses países para produzir mercadorias destinadas aos EUA e à Europa. Os EUA voltam-se um pouco mais para as Américas. Surgem mesmo problemas novos como o da defesa do meio ambiente que influenciam a exportação de capitais. Uma reunião realizada em fins do ano de 1992 com a participação de 3.500 representantes do setor de mineração dos EUA e do Canadá concluiu que diante dos rígidos regulamentos ambientais e de jazidas minerais cada vez mais exauridas, as empresas norte-americanas de mineração devem se dirigir para a América Latina em busca de incentivos fiscais oficiais e de legislações ambientais mais flexíveis. Enquanto nos EUA pode-se ter que esperar mais de cinco anos para receber a autorização dos órgãos responsáveis pelo meio ambiente, no Chile a aprovação pode demorar seis meses apenas. Assim é que muitas indústrias poluentes têm se transferido para os países dependentes no que se poderia chamar de exportação suja de capitais.

“Crise dos EUA afeta modelo de capitalismo dependente vigente na América Latina”.

A América Latina como área de maior influência econômica e política do imperialismo norte-americano vive as consequências da crise da metrópole. O período, de 1980 a 1990, que ficou conhecido como a década perdida, mostrou um esgotamento do modelo de capitalismo dependente que precisa sempre de mais investimentos externos para se reproduzir. Só que quase toda a acumulação da região foi transferida para o exterior, por causa da carência de capitais nos EUA. Nesse quadro, as exigências dos monopólios e do governo dos EUA e de outros países imperialistas para exportar seu capital, ou melhor, as sobras de seu capital excedente, são muito grandes. O marco do Estado-nacional dos países de capitalismo dependente se transformou num obstáculo para o desenvolvimento das forças produtivas do imperialismo. Aí é que entra o discurso neoliberal da “maior abertura da economia”, da “desregulamentação”, da privatização das estatais. O capital imperialista só pode ser exportado nessas novas condições tão bem assimiladas por uma parte considerável das classes dominantes dos países dependentes e seus representantes do tipo Collor, Menem, Fujimore, Lacalle, Carlos Andrés Perez e outros.

À medida que começam a ser satisfeitas essas exigências, ou que se dê a “melhoria do ambiente” segundo o Banco Mundial, aparece novamente o capital estrangeiro e vão se reproduzindo as relações de dependência prolongada e profunda entre os países devedores e os países credores. O relatório do Banco Mundial “Tabelas da dívida mundial 1992-93”, divulgado em dezembro de 1992, calcula que a dívida externa total, fruto da exportação de capital como empréstimos, dos “países em desenvolvimento”, incluindo os países que compunham a URSS, passou de US$ 1,608 trilhão em 1991 para US$ 1,703 trilhão em 1992. A ONU no seu “Relatório sobre o Desenvolvimento Humano – 1992” afirma que os juros pagos pelas “nações em desenvolvimento” sobre empréstimos feitos no exterior são 4 vezes mais altos que os cobrados dos países ricos e que, na transferência de recursos entre o Norte e o Sul, no período de 1983 a 1990, os países mais pobres perderam, anualmente, US$ 21 bilhões para as nações industrializadas.

As tão festejadas novas entradas de capitais externos para a América Latina, para a Ásia ou para o Leste europeu que vêm se dando a partir de 1990, cantadas como vitórias dos ajustes neoliberais, vão na realidade piorar ainda mais a situação. Em primeiro lugar são pequenos os volumes de capital e essas regiões continuam a pagar mais que receber; depois, se dão em condições extremamente desvantajosas: quer transformando dívida externa em investimento, ou seja, transferindo patrimônio sem ônus, quer porque parte substancial dos empréstimos se dá através da compra de títulos de curto prazo a juros exorbitantes, ou ainda porque o investimento se dá na aquisição de estatais, muitas das quais estratégicas para a soberania dos países em questão e vendidas geralmente por um preço subavaliado.

A tendência real que se deve ter em consideração é que há uma concentração brutal de capitais nos países ricos que, ao exportar seus excedentes, levam à miséria milhões de pessoas em todo o mundo. Ainda de acordo com o relatório da ONU acima citado, os países industrializados, vale dizer os países imperialistas, com apenas 23% da população mundial, detêm 85% da renda global do planeta. A desigualdade de renda entre os países mais ricos do mundo e os mais pobres dobrou de tamanho entre 1960 e 1990. Há 30 anos os rendimentos da população mais abastada do planeta era 30 vezes maior que os ganhos da fatia mais pobre. Agora a diferença já chega a 60 vezes e a tendência é de se ampliar ainda mais. Ver o gráfico nº 6.

Gráfico 6 (p. 41)

Não há exportação de capitais “bem intencionada”, mesmo quando denominada marotamente de “ajuda”. Os monopólios quando investem, os bancos ou governos quando emprestam buscam superlucros, sobretudo agora quando a economia dos países capitalistas mais desenvolvidos se acha em recessão. A poderosa empresa petrolífera norte-americana Exxon, por exemplo, registrou em 1991 quase US$ 7 bilhões de lucros no exterior (antes dos impostos) contra US$ 1,6 bilhão em suas operações nos EUA. A Reynolds que fabrica as latinhas de cerveja e de refrigerantes no Brasil, uma das maiores do ramo do alumínio, aufere 40% de seus lucros no exterior.

“Banco Mundial funciona como uma empresa: divide seus lucros entre os maiores acionistas”.

Após a guerra, os governos dos EUA, da Inglaterra e de outras potências imperialistas criaram o Banco Mundial (Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento, BIRD) e o Fundo Monetário Internacional, FMI, com a finalidade de controlar ainda mais a economia dos países dependentes e facilitar a exportação de capitais.

O Banco Mundial funciona como uma empresa e divide seus lucros entre os maiores acionistas, financia a juros projetos voltados prioritariamente para os países dependentes nas áreas de infra-estrutura – estradas, energia, comunicações, portos – criando assim as pré-condições para o desenvolvimento do capitalismo e para exportação de capital dos monopólios privados. O capital atual do Banco Mundial é de US$ 180 bilhões aproximadamente. Nos dois últimos exercícios (1990-91 e 1991-92) o total dos financiamentos do Banco Mundial foi de US$ 22,93 bilhões e US$ 21,7 bilhões respectivamente, sendo que deste último valor, US$ 5,84 bilhões (27%) do total foram para o financiamento do ajuste estrutural dos países dependentes. Esse capital é muitas vezes exportado junto (projetos combinados) com capital dos bancos privados.

Para se ter uma idéia do tipo de relação de dependência que é criada entre os países tomadores de empréstimos e o Banco Mundial é ilustrativo o caso do Brasil (também poderiam ser citados o México, a Argentina e muitos outros países). Desde 1987 o Brasil vem pagando mais do que recebendo do Banco Mundial num total que nos últimos 5 anos chega a US$ 4,65 bilhões de transferências líquidas, o que equivale a uma média de US$ 930 milhões por ano (US$ 1,23 bilhão só no exercício de 1990-91). A América Latina, nesse mesmo exercício, também transferiu US$ 2,06 bilhões líquidos ao Banco Mundial. O gráfico nº 7 expõe a situação brasileira.

O FMI exporta bem menos capital sob a forma de empréstimos que o Banco Mundial. Funciona como um mecanismo controlador, papel que foi ganhando cada vez mais importância a partir da década de 1960. Hoje o FMI pesa sobre tudo e sobre todos, como se fosse um Ministério da Economia e Planejamento do imperialismo. Qualquer renegociação de dívida externa tem que passar obrigatoriamente pelos mecanismos do FMI que, para tanto, exige uma política econômica de total atrelamento aos interesses do capital monopolista internacional. Os países dependentes perdem sua autonomia de planejamento econômico, pois o FMI monitora o desempenho econômico segundo os seus critérios, aplica sanções, estabelece metas, pressiona no sentido de que as leis dos países sejam modificadas no interesse do imperialismo. O FMI dessa maneira faz a ponte entre os banqueiros internacionais e os governos dos países dependentes e joga um papel fundamental nas condições e no volume em que o capital é exportado para eles.

Durante o ano de 1992 o FMI desenvolveu esforços – inúteis, diga-se de passagem – no sentido de unificar uma política econômica para os países imperialistas que possibilitasse uma saída para a crise em que vivem; por outro lado, procura orientar a economia dos países do Leste europeu e da ex-URSS à “economia de mercado”.

Uma outra face dos mecanismos de controle da exportação de capitais que surgiu relativamente há pouco tempo foram os bancos regionais de desenvolvimento – Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID, o Banco para o Desenvolvimento da África, o Banco de Desenvolvimento da Ásia e mais recentemente o BERD dedicado à “reconstrução” dos países do Leste europeu. Esses bancos têm papel complementar no esquema geral de dominação. Alguns deles surgiram com a intenção de promover um desenvolvimento regional mais independente, mas acabaram por cair nas malhas do BIRD e do FMI.

“Exportação de capitais diretamente pelos Estados ricos é fato novo na conjuntura mundial”.

Gráfico 7 (p. 42)

Os capitais exportados diretamente pelos Estados ricos ou por instituições oficiais por eles controlados representam um fato novo na exportação de capitais. Criam relações de dependência muito mais profundas. Atualmente nada menos que 50% da dívida externa dos países dependentes são para com os governos dos países imperialistas e seus organismos financeiros. A palavra-de-ordem “Fora daqui o FMI”, que se popularizou em várias partes do mundo, surge como uma reação dos setores patrióticos e populares ao perigo que esse esquema representa para a soberania nacional dos países dominados.

Com relação à exportação de capitais privados, alguns registros:
1- Da metade da década de 1950 até os anos 1970 os investimentos diretos ganharam grande importância sob a forma de empresas transnacionais (a denominação empresas multinacionais é imprecisa, pois dá a entender que o capital tem origem ou pertence a vários países), que são os monopólios que acumularam um grande capital e tiveram a necessidade de investir no exterior através da montagem de filiais. As empresas transnacionais não são a mesma coisa que os supermonopólios descritos por Lênin – acordos entre monopólios de diferentes países para a produção e comercialização. As transnacionais produzem no exterior; parte da produção é consumida no país-base e parte é exportada. Os investimentos diretos atuais se dão mais sob a forma de aquisições de fábricas já existentes do que na implantação de novas indústrias. Isto é o que ocorre, por exemplo, quando capitalistas estrangeiros compram as estatais dos países dependentes.

2- Os monopólios desenvolveram em um nível muito mais elevado a venda de tecnologia, comercializando patentes e licenças. Essas vendas ou aluguéis (leasing) são feitas por variadas formas e condições constituindo-se numa modalidade peculiar da exportação de capitais, como se fosse algo invisível. O Brasil, nos últimos 10 anos, a cada ano, importou US$ 200 milhões em tecnologia. Estima-se que em 1990 os EUA tiveram um saldo externo positivo de US$ 8 bilhões no item tecnologia.

3- A partir dos anos 1980 ganham uma grande importância os chamados investimentos de portifólio – títulos e ações. Os títulos dos mais variados tipos são emitidos por empresas e por governos, com juros e prazos variáveis. O governo norte-americano busca financiar grande parte de seu déficit público vendendo títulos. O volume do déficit desses empréstimos contraídos pelos EUA já em 1989 era de US$ 600 bilhões aproximadamente. Nos países dependentes, empresas e governos vêm também lançando mão desse expediente, de forma crescente a fim de atrair o capital estrangeiro, conforme se pode observar no gráfico nº 8. Isso ocorre simultaneamente a uma grande queda no volume dos empréstimos bancários tradicionais. Por esse tipo de operação normalmente se pagam juros altíssimos e os prazos são curtos. Em seu conjunto, o crescimento dos investimentos em portifólio representam a elevação do caráter parasitário do imperialismo em um nível superior.

“No mundo de hoje começa a se esboçar nova partilha segundo a força econômica”.

O que se pode esperar em termos de tendências de todo esse quadro? No seu Imperialismo, fase superior do capitalismo, Lênin observa: a “passagem do capitalismo à fase do capitalismo monopolista, ao capital financeiro, se encontra relacionada (grifo de Lênin) com a exacerbação da luta pela partilha do mundo”, pois “faz parte da própria essência do imperialismo a rivalidade de várias grandes potências nas suas aspirações à hegemonia” e que os capitalistas repartem o mundo “segundo o capital” e “segundo a força”. No mundo de hoje começa a se esboçar uma nova partilha segundo a força econômica. A Alemanha avança sobre a região do Leste europeu e da ex-URSS, investindo capital e fomentando divisões, há um novo desenho das fronteiras.

O Japão supera em muito os EUA em influência econômica na Ásia. Os EUA, por sua vez, através da força militar procuram manter posições e garantir o petróleo no Oriente Médio, uma zona conflagrada inclusive pela presença agressiva do Estado de Israel. Existiria outra maneira de os EUA não perderem o status de potência capitalista nº 1, estando em ritmo de desenvolvimento econômico muito mais lento que o Japão e a Alemanha, a não ser pelo uso cada vez mais intenso de sua supremacia militar? A tendência é para o acirramento das disputas imperialistas por áreas de exportação de capitais e de mercadorias. A luta pacífica que hoje se dá no GATT (Acordo Geral para Tarifas e Comércio) ou no protecionismo crescente das grandes potências pode se transformar, mais ou menos dia, em luta não pacífica.

Por outro lado, o sistema imperialista enfrenta a maior crise econômica desde o fim da Segunda Guerra Mundial, de natureza estrutural que se combina com uma crise cíclica iniciada em 1990. A economia dos países capitalistas mais desenvolvidos cresce com o passar do tempo a taxas cada vez menores, quando não negativas, e o capital que é exportado tem cada vez mais caráter especulativo, usuário, em detrimento do investimento em empresas industriais. Tudo isso deverá desembocar num agravamento da crise como um todo. O capitalismo dependente encontrará maiores dificuldades de se reproduzir. As condições para a exportação de capitais se tornarão mais apertadas ainda, as diferenças entre os credores e os devedores irão aumentar, o fosso entre os bilhões de seres humanos pobres e miseráveis e uma minoria de ricos se aprofundará. Por aí também aumentarão os confrontos.

Gráfico 8 (p. 43)

O quadro, porém, ainda não está completo. Lênin constatou no início do século que “a exportação de capitais repercute no desenvolvimento do capitalismo dentro dos países em que são investidos, acelerando-o extraordinariamente” (grifo do autor). Desenvolvimento distorcido e dependente, voltado para os interesses dos grandes monopólios, mas que trouxe um crescimento da classe operária em todo o mundo. Hoje em dia, na América Latina e na Ásia existe uma série de países de desenvolvimento capitalista médio. O que ocorreu no Brasil, que conhecemos mais de perto, também se deu no México, na Argentina, na Venezuela, no Chile, Malásia, Taiwan, Indonésia, Filipinas, Índia, Tailândia, Coréia do Sul e em alguns países do Oriente Médio à base da indústria petrolífera. Na Malásia, por exemplo, nas últimas duas décadas, a proporção dos produtos industrializados nas exportações passou de 11,9% para 64,9%. Nos chamados países em desenvolvimento, entre 1970 e 1990 o consumo de fertilizantes cresceu em 360%, ou seja, cerca de 40% da produção total.

Se houve um estancamento no crescimento da classe operária nos países capitalistas desenvolvidos (nos EUA houve diminuição), houve, por outro lado, um crescimento acentuado em muitos países capitalistas dependentes. O número de camponeses diminuiu significativamente em todo o mundo. A intensificação da internacionalização do capital quer dizer socialização da produção em escala mundial em nível mais elevado.

As condições objetivas para a revolução socialista mundial aumentaram em muito. Para além da ofensiva neoliberal do imperialismo é preciso ver que vão se criando condições para que as tentativas de ruptura com o status quo se multipliquem. Nesse sentido é preciso reafirmar a idéia leninista de que na época atual, a tarefa dos comunistas e da classe operária “deve estar orientada, não contra capitais financeiros isolados, e sim contra o capital financeiro internacional” (5).

* Jornalista.

** O capital se expressa em sua forma física e material como também em valor. Em sua forma física e material consta de uma certa quantidade de meios de produção – construções, máquinas, equipamentos, matéria-prima, combustíveis etc. – e determinado número de operários trabalhando.
A proporção entre a quantidade de meios de produção e o número de operários ocupados em acioná-los denomina-se composição técnica do capital. A composição orgânica do capital é a proporção entre o valor dos meios de produção (capital constante) e o valor da força de trabalho (capital variável) (CV).

O aumento da composição orgânica do capital ou da produtividade do trabalho se dá com o emprego de máquinas modernas e tecnologias cada vez mais avançadas, ou combustíveis mais baratos, no processo de produção, com a utilização de um número menor e “mais produtivo” de operários. Quanto maior a composição orgânica do capital mais diminui a proporção entre o capital constante e o capital variável que é a parte do capital que cria valor, cria mais-valia. Portanto, diminuindo-se a parte do capital variável reduz-se a taxa de lucro, que depende em primeiro lugar da taxa de mais-valia.
*** Quanto à tendência ao não crescimento da produtividade do trabalho nos EUA a partir de 1982 ver gráfico publicado na revista Princípios, nº 21, p. 9.

Notas
(1) LÊNIN, V. I. O imperialismo, fase superior do capitalismo.
(2) LÊNIN, V. I. “Prólogo” para o folheto de N. Bukharin, A economia mundial e o imperialismo.
(3) LÊNIN, V. I. O imperialismo e a divisão do socialismo.
(4) Dados veiculados nas edições da Gazeta Mercantil dos dias 08-04 e 25-05 de 1992.
(5) LÊNIN, V. I. Sob uma bandeira alheia.

EDIÇÃO 28, FEV/MAR/ABR, 1993, PÁGINAS 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43