O Seminário reuniu militantes e lideranças políticas, dos movimentos sociais e populares, da frente institucional, além de intelectuais e especialistas em temas ligados ao Rio de Janeiro.

O evento foi aberto pelo representante da Fundação Maurício Grabois, Caíque Tibiriçá que apresentou os nomes que compuseram a mesa, passando a palavra para o presidente estadual do PCdoB, João Batista Lemos, que mediou a discussão.

Participaram da mesa Mauro Osório, especialista em desenvolvimento econômico do Rio de Janeiro e professor da Faculdade Nacional de Direito, Fernando Macdowel, um dos maiores especialistas em Transporte e Mobilidade Urbana do país, José Noronha, que já foi Secretário Estadual de Saúde e faz parte da Fiocruz; o professor de História da Ufrj, Francisco Carlos Teixeira. E, obviamente, a deputada federal Jandira Feghali.

João Batista Lemos iniciou a fala saudando todos os presentes e enfatizando a importância da elaboração coletiva: “Convocamos os presidentes dos Comitês Municipais do Partido, os presidentes de entidades dos movimentos sociais, trabalhadores e trabalhadoras, para dialogarmos com a nossa pré-candidata. Para transformar a realidade é preciso conhecer a realidade. Nosso objetivo aqui é discutir programa de governo para o estado do Rio, discutir diretrizes programáticas. E é só o início, pois pretendemos fazer também outros seminários abordando temas importantes para o povo carioca e fluminense. Agradecemos muito a contribuição de quem conhece e estuda. Precisamos trabalhar uma elaboração coletiva, é preciso ouvir e debater muito. A nossa ideia é tirar daqui alguns pontos para traduzirmos em um jornal e levar nossas ideias às ruas, visando a construção de uma frente, um campo de esquerda para disputar o governo estadual do Rio de Janeiro”, destacou Batista.

Rio bom não pode assorear

Em seguida, Jandira fez uso da palavra rapidamente para falar sobre a proposta do Seminário, antes de passar à exposição dos especialistas convidados: “Um Rio de Ideias, definimos esse nome para o Seminário porque rio bom não pode assorear. Vamos iniciar hoje um processo de debate, buscando conhecer melhor o estado em seu plano econômico e social, e a relação democrático-social da sociedade fluminense. Essas pessoas que estão aqui vieram pensando em olhar o Rio de Janeiro de um ponto avançado, à esquerda; para darmos um salto de qualidade no Rio de Janeiro. Estamos buscando contribuição para construirmos um projeto de esquerda avançado, em que estruturalmente consigamos marcar a diferença no processo, pois nosso compromisso é com o povo, com estado e com o país”, salientou a pré-candidata a governadora pelo PCdoB.

Na sequência, Batista passou a palavra ao professor Mauro Osório, que fez considerações valiosas sobre a realidade do Rio de Janeiro. “O Rio tem muito pouca reflexão regional, somos muito mais craques em pensar Brasil, mas pensamos muito pouco regionalmente (…) O Rio foi o estado que mais perdeu participação na economia nacional de 1970 a 2011. Perdemos o dobro em relação a São Paulo (…) O Rio agora está crescendo mais, teve algumas melhorias no período recente, mas ainda tem muitos desafios. Somos o estado que menos diminui desigualdade, a nossa periferia é muito mais desestruturada do que a de São Paulo e Belo Horizonte (…) No Brasil, um dos maiores percentuais de pessoas morando em favelas é no estado do Rio de Janeiro (…) 1/4 dos jovens da cidade do Rio de Janeiro não trabalham nem estudam, na Baixada Fluminense esse número chega a 1/3 (…) Não há nenhum município do estado onde a nota do IDEB esteja entre as 500 melhores do Brasil. Os 14 piores resultados no IDEB entre as cidades com mais de 50 mil habitantes são da região metropolitana do Rio de Janeiro”, expôs o professor.

Mauro Osório ainda apresentou um prospecção de futuro para o Rio de Janeiro com algumas propostas:

– É preciso reestruturar o setor público, discutir onde falta gente e estruturar isso;
– Estratégia e coordenação política, precisamos retomar essa ideia como absolutamente central;
– Política Territorializada para a cidade e Regiões de Governo, levar mais recursos para onde de fato é necessário para diminuirmos a desigualdade. O planejamento deve ser rotina;
– Estímulo à valorização, planejamento e modernização da gestão do estado Rio de Janeiro;
– As Olimpíadas a serviço da cidade;
– Política de transporte de massas;
– Política Habitacional, Favelas e UPPs: temos que defender as UPPs, defender que elas tem que ir além disso, e defender UPP também na periferia, não pode ficar mais restrito à Zona Sul;
– Governança Metropolitana;
– Nova territorialização do estado;
– Dinamismo no interior Fluminense;
– Política de adensamento e Complexos Produtivos (Complexo de Turismo, Cultura, Mídia, Esporte) – (Complexo de Petróleo e Gás) – (Complexo da Saúde) – (Complexo vinculado à Construção Civil) – (Complexo da Inovação e Economia de Defesa).

Em seguida, o professor de História da UFRJ, Francisco Carlos Teixeira, falou, entre outras coisas, sobre Estado e Democracia e governo efetivamente democrático, dando grande destaque às políticas relacionadas à educação: “Posso resumir a situação do Rio hoje como um espaço de luta profunda e cruel sendo travado pelo controle do espaço, dos recursos e dos serviços no interior do estado e da cidade (…) Os municípios no Rio de Janeiro não são sustentáveis em educação, não conseguem sozinhos cuidar do ensino das primeiras séries, o que é uma obrigação constitucional. O estado é distante e não quer cumprir uma função que constitucionalmente não é dele, então o estado repassa uma verba para o município e deixa a administração dessa verba na mão do município. Precisamos de um plano estadual de educação, os municípios tem sua autonomia, mas precisam de ajuda. Enquanto não tivermos esse plano, metas estabelecidas ano a ano, enquanto não tivermos educação de qualidade real sendo dada aqui não teremos avanço nessa área. Precisamos de uma escola que ocupe, forme, e que seja inventiva e criativa (…) Precisamos trazer à sala de aula a tecnologia, os novos meios, as novas mídias. Várias disciplinas podem utilizar recursos múltiplos com mecanismos de tutoria em rede, que podem ter um efeito lúdico e contribuir para que o menino ou menina se interessem mais pela aula (…) As crianças nas séries iniciais precisam intensamente de ter aula de português, matemática e uma língua estrangeira. Temos que fazer um plano estadual de educação revolucionário, dialogar com o SEPE. O plano apresentado agora (pelo governo municipal do Rio de Janeiro) é ruim do começo ao fim”, salientou Francisco Carlos.

Na sequência, o especialista em Transporte e Mobilidade Urbana, Fernando MacDowel, fez o uso da palavra, destacando as grandes dificuldades enfrentadas pela população do Rio de Janeiro nesse ponto fundamental: “Temos uma região metropolitana absolutamente esquecida com uma renda per capita extremamente baixa, e normalmente sempre é esquecida também na área de transporte e mobilidade, está sempre isolada (…) Em qualquer sistema de transporte temos que trabalhar em três grandes grupos: 1) equilíbrio social, econômico, ambiental e urbanístico; 2) equilíbrio técnico e operacional; 3) equilíbrio financeiro. É preciso satisfazer todos esses elementos. Se não acoplamos o sistema de transporte ao problema urbanístico, temos um grande insucesso. Outro problema grande é o preço da tarifa, em 1983 a Linha 1 do metrô, por exemplo, transportava a mesma coisa que em 2010; e em 1983 com o valor do salário mínimo era possível realizar 577 viagens, já em 2010 apenas o salário mínimo pagava apenas 189 viagens (ou seja, o preço da passagem de metrô aumentou de forma absurda, até porque o salário minímo, a partir de 2003, contou com uma política de valorização).

Mac Dowel ainda apresentou um série de possíveis e interessantes alternativas para combater o drástico problema do transporte público no estado, como o Aero Móvel e o Pré-Metrô, destacando que o Rio conta com um sistema de 200km de rede ferroviária mas não aproveita essa infraestrutura adequadamente.

O doutor Noronha foi o último dos especialistas a se pronunciar, e iniciou saudando a ideia da construção de um projeto de esquerda: “A proposta de construir um campo de ideias à esquerda realmente me seduz e eu gosto muito de trabalhar com a Jandira, somos parceiros há muitos anos na área da saúde”.

Noronha continuou a fala salientando: “As condições de saúde da população dependem fundamentalmente de fatores que não estão inicialmente no campo da saúde; como água, abastecimento, mobilidade urbana, saneamento, coleta, educação, nutrição adequada, aumento da renda média; a falta desses fatores tem um efeito gigantesco e afasta as pessoas daquilo que são os cuidados de saúde (…) O Rio é um estado onde a taxa de envelhecimento demográfico é muito grande, quando as pessoas ficam mais velhas aumentam os problemas de saúde. Uma população mais envelhecida requer um cuidado mais permanente (…) No Rio somos recordistas em casos de tuberculose, 10 mil novos casos de tuberculose ano. Muitos casos de sífilis congênita. No Rio, 180 mulheres ainda morrem a cada ano devido ao parto (…) É preciso integrar o programa da Saúde da Família até o hospital de pronto socorro. O PAC comunidade da Rocinha, Alemão e Manguinhos, foi onde se conseguiu esboçar uma articulação entre as famílias, as UPAS, e a integração com outras políticas, uma integração com os serviços de assistência social. A saúde e os programas de assistência social caminhando juntos. Começou-se a esboçar isso, mas não evoluiu (…) Os maiores problemas estão na Baixada Fluminense e na região de São Gonçalo. As piores coberturas do Brasil em termos da saúde da família estão nas periferias da região metropolitana do Rio de Janeiro e Niterói (…) A saúde é um sistema que emprega, ativa a economia local, dinamiza essa economia. Saúde também emprega gente. Precisamos inovar também na saúde, e o Rio tem universidades para isso”, destacou o Doutor Noronha.

Em seguida, o presidente do PCdoB-RJ, João Batista Lemos, abriu o microfone para algumas intervenções. Fizeram uso da palavra o professor de economia da UFRJ, Luiz Martins, a Secretária Municipal de Políticas para as Mulheres do Rio de Janeiro, Ana Rocha, o presidente estadual da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Ronaldo Leite, o ator e diretor teatral Alexandre Santini, a deputada estadual do PCdoB, Enfermeira Rejane, o presidente do SintSama, Humberto Lemos, o presidente estadual da UJS e ex-presidente da UNE, Daniel Iliescu, o representante do Conselho Federal de Medicina (CFM) Doutor Aluísio Tibiriçá, o diretor de comunicação da FAMERJ, Paulo César (PC) e o Secretário-Executivo do Ministério dos Esportes, Luiz Fernandes. Vários outros oradores, previamente inscritos, não puderam falar pois o tempo para o Seminário estava se esgotando e faltava ouvir ainda a intervenção da pré-candidata ao Governo, Jandira Feghali.

Ouvir, Planejar, Integrar

Ao final, Jandira Feghali retomou a palavra, agradeceu a participação e o empenho de todos e destacou: Aqui foram marcadas pontos transversais a todos os temas: o não diálogo do governo, afinal os que vivenciam os problemas precisam ser ouvidos, precisamos ver quais as formas de democratização da gestão. A segunda é a inexistência de planejamento e quando não se planeja não se integra, estamos numa cidade e num estado fragmentado. Há uma fragmentação, uma falta de integração do territorial, das populações, do centro para periferia, da capital para a região metropolitana, e da metropolitana para o interior. Temos que fortalecer as economias regionais. Isso vale para todas as áreas. Precisamos pensar o estado. Outro aspecto muito importante é o da ética, a gente tem que impedir a promiscuidade do estado com o setor privado, fornecedores, e processos licitatórios. Precisamos marcar a diferença. Uma recente pesquisa de opinião sobre a sucessão estadual em 2014 demonstra a necessidade do novo, de alternativas que correspondam as mudanças estruturais qualificadas que superem as que temos hoje. Esse Seminário aponta para a fomentação de um campo político de esquerda, já que não cabe mais um comando de Centro, o comando deve ser à esquerda. Pois se não for assim não adianta, só faz sentido esse esforço para construir um projeto de governo com um olhar mais avançado, estruturado, qualificado e à esquerda. Devemos trabalhar pelo comando dessa política.

Unidade na diversidade

A deputada federal, Jandira Feghali, ainda salientou: “Todo esse trabalho vai nos enriquecer demais, vamos aprender com opiniões diferentes e com a vivência real das pessoas e, sobretudo, aprender mais sobre o Rio de Janeiro (..) Devemos iniciar uma nova fase do processo civilizatório no Rio de Janeiro. (…) Vamos tentar o tempo todo buscar um Campo Popular que possibilite de fato uma mudança à esquerda”, finalizou a comunista e pré-candidata a Governadora do Rio de Janeiro.

Compareceram também ao Seminário o presidente nacional da CTB, Adilson Araújo; Nelson Nahon (CREMERJ); Adolfo Konder; Carlos Henrique de Carvalho (OAB); Maria Lúcia Werneck (UFRJ); o presidente do SindMetal, Alex Santos; a pesquisadora Maria Tereza Monteiro; a Secretária de Ciência e Tecnologia de Belford Roxo, Dilceia Quintela; Zuleide Aguiar; Glória Maria e Maria da Luz, do COREN-RJ; Waldermar de Souza, presidente do PCdoB capital, além de presidentes e vereadores do PCdoB de diversas outras cidades , entre outros importantes dirigentes partidários e quadros da política do Rio de Janeiro.

Da redação do Rio de Janeiro,
Wevergton Brito