Somado às promessas anteriores da China de construção de uma estação espacial e de levar um astronauta à Lua, o anúncio trouxe lembranças da corrida especial entre os Estados Unidos e a União Soviética na época da Guerra Fria. Os Estados Unidos, que reduziram a ênfase no voo espacial tripulado nos últimos anos, atualmente depende da Rússia para transporte de seus astronautas à Estação Espacial Internacional. A Rússia, por sua vez, sofreu uma série embaraçosa de lançamentos fracassados de satélite.

A China tem procurado formas de exercer sua crescente força econômica e demonstrar que seu domínio de tecnologia e seus feitos científicos se aproximam de qualquer potência global. O plano anunciado na quinta-feira pede pelo lançamento de um laboratório espacial e coleta de amostras da Lua, tudo até 2016, junto a uma espaçonave tripulada mais poderosa e cargueiros espaciais.

Nos últimos anos, a China também tem buscado construir capacidade militar de acordo com seu poderio econômico, construindo sua frota de submarinos e, neste ano, testando seu primeiro porta-aviões, um modelo soviético reformado. Segundo o novo plano espacial, ela expandiria vastamente sua versão de um Sistema de Posicionamento Global, que teria uso tanto militar quanto civil.

O plano mostra como o governo pretende empregar tanto recursos militares quanto civis para atingir suas metas, que o governo está apostando que também produzirá benefícios para a economia chinesa. “Esta abordagem oferece lições para outras potências espaciais avançadas, incluindo os Estados Unidos, que precisa assegurar um investimento sustentado de alto nível em vários aspectos do desenvolvimento espacial”, disse o professo Andrew S. Erickson, do Colégio de Guerra Naval dos Estados Unidos, que estudou o programa espacial chinês.

Apesar de líder no ramo privado de lançamento de satélites, a China ainda está anos atrás dos Estados Unidos no espaço. Suas realizações de voo espacial tripulado até o momento a colocam onde os Estados Unidos e a União Soviética estavam em meados dos anos 60. Mas a China tem seguido consistentemente um cronograma de desenvolvimento para seu programa e atingido as metas realistas de seus planos de cinco anos, que são a base do sistema do Partido Comunista.

Para voos espaciais humanos, o plano estabelece uma continuação dos esforços constantes da China no desenvolvimento de tecnologias e ampliação de suas capacidades. Ele diz que a China começará a trabalhar no envio de astronautas à Lua. “Acho que é um programa abrangente, de ritmo moderado”, disse John M. Logsdon, ex-diretor do Instituto de Política Espacial da Universidade George Washington. “Não é um programa intensivo.”

Em comparação, a direção da Nasa tende a mudar a cada mudança de presidência. O presidente George W. Bush pediu à Nasa que retornasse à Lua até 2020. Já o presidente Barack Obama cancelou o programa e agora quer que a agência envie astronautas a um asteroide. A Nasa encerrou o programa do ônibus espacial de 30 anos após um voo final em julho.

“O que é admirável no programa deles é que não é intermitente”, disse Joseph R. Fragola, um especialista em segurança espacial que visitou as instalações na China. “O programa deles tem uma verba baixa, mas é definido, e eles o seguem de modo ordenado. Nós não fazemos isso.”

Especialistas dizem que Pequim está abordando seu programa espacial da forma como promoveu sua modernização militar. Além do porta-aviões, que comprou da Ucrânia, a China também fez progresso em um míssil balístico antinavios, que poderia ser empregado para repelir navios de guerra estrangeiros. Em janeiro, os militares chineses testaram um caça stealth horas antes de Robert M. Gates, o secretário de Defesa na época, se encontrar em Pequim com o presidente Hu Jintao.

Diferentemente dos Estados Unidos – onde há um programa espacial civil e um militar separados –, na China o Exército de Libertação Popular é a força motriz por trás do desenvolvimento do programa espacial. Instituições civis, incluindo universidades e laboratórios, fazem parte dos esforços liderados pelos militares.

No documento que estabelece o plano, divulgado pelo Conselho de Estado, o Gabinete chinês, os autores não medem esforços para dizer que Pequim não está buscando desafiar qualquer nação militarmente com seu programa espacial. “A China sempre aderiu ao uso do espaço exterior para fins pacíficos, e é contra uma militarização ou qualquer corrida armamentista no espaço exterior”, aponta o documento.

Segundo analistas, uma das metas mais notáveis da estratégia é o desenvolvimento do Sistema Beidou de Navegação por Satélite, que na terça-feira começou a fornecer dados de navegação e posicionamento para a China e arredores. O documento diz que a China pretende ter um sistema global até 2020, com 35 satélites em órbita. Se cumprir essa meta, a China se juntaria à Rússia tendo um sistema que rivaliza com o americano. A China já lançou dez satélites para o sistema Beidou e planeja lançar mais seis em 2012.

O Beidou não é tão avançado quanto seu par americano, mas deverá superar o sistema russo e fornecer às forças armadas chinesas uma alternativa para a dependência de uma versão civil da rede americana. O Beidou também seria usado para fins civis, como fornecer aos motoristas uma ferramenta de navegação. “Isso tem grandes implicações comerciais e de segurança”, disse Erickson. “Para ser uma grande potência espacial e militar, é importante ter seu próprio sistema de navegação por satélite.”

O documento – que segue relatórios semelhantes divulgados em 2000 e 2006 – também disse que a China desenvolveria novos veículos de lançamento Longa Marcha para pôr cargas mais pesadas em órbita e melhorar as condições para um voo espacial humano.  Para isso, disse o documento, a China “lançará laboratórios espaciais, uma espaçonave tripulada e cargueiros espaciais; promoverá avanços e dominará tecnologias-chave para uma estação espacial, incluindo estadia de médio prazo para astronautas, suporte de vida regenerativo e reabastecimento; conduzirá experiências espaciais até certo ponto e fará preparativos tecnológicos para a construção de estações espaciais”.

Na exploração do espaço profundo, o documento disse que a China planeja lançar módulos orbitais que realizariam pouso lunar suave, percorreriam sua superfície e realizariam levantamento. Depois disso, disse o documento, a China recolheria amostras da superfície da Lua e as traria de volta para análise.

O documento também disse que a China planeja executar um plano abrangente de atualização de sua tecnologia de satélites e ampliar o uso deles. “No agregado, isso claramente conduzirá significativamente a China ainda mais ao espaço”, disse Erickson. “Há um progresso constante em todas as áreas.”

Em 2003, a China se tornou o terceiro país a enviar um ser humano ao espaço, depois dos Estados Unidos e da União Soviética, quando colocou Yang Liwei em órbita ao redor da Terra. Ela lançou uma sonda lunar em 2007, que orbitou a Lua e tirou fotos, e no ano seguinte completou sua primeira caminhada no espaço quando Zhai Zhigang permaneceu por 13 minutos do lado de fora da espaçonave Shenzhou 7.

O foguete Longa Marcha 5 da China, atualmente em desenvolvimento, seria o primeiro a levar cerca de 25 toneladas para uma órbita baixa da Terra, comparável ao Delta 4 Heavy e muito menor do que o foguete Saturno 5, que lançou a espaçonave Apollo à Lua quatro décadas atrás. Mas seriasuficiente para a China chegar à Lua, ao lançar sua espaçonave lunar em partes e montá-la na órbita da Terra.

Com informações do The New York Times