Para onde caminha a França?
A Secretária Nacional de Relações Internacionais do PCdoB, Ana Prestes, escreve sobre os rumos da França.
O mês de julho de 2024 mal começou e já é tido como um dos mais tensos e importantes para a política francesa contemporânea. Eleições parlamentares inesperadas podem fazer o país dar uma guinada significativa à direita e, ao mesmo tempo, ter o campo da esquerda fortalecido e o centro esmagado. São eleições que trarão muito impacto também para os rumos da comunidade e da União Europeia, em tempos de guerra e ascensão da Eurásia como um novo polo dinâmico da economia mundial. No próximo domingo, 7 de julho, o mundo vai parar para acompanhar a apuração eleitoral que pode revelar uma Assembleia da República completamente adversa aos mais caros valores da democracia francesa.
Caso a tendência se cumpra, a provável única saída para o presidente Macron será o governo de coabitação, que acontece quando o presidente em exercício precisa dividir o poder com seus adversários políticos. No fechar das urnas do primeiro turno em 30 de junho, a extrema direita alcançou 33%, a frente de esquerda 28% e os governistas centristas de Macron ficaram com 21%. A situação terminou por promover uma aliança tácita entre a esquerda e o centro em um movimento de contenção de danos para tentar mitigar a crescente onda da extrema direita do Rassemblement Nacional de Le Pen e Bardella. Com muito mais predisposição da esquerda para abrir mão de posições do que dos macronistas, diga-se de passagem. Ocorre que mesmo com essa movimentação quase instintiva contra a extrema-direita, que já foi mais forte no passado, Macron não conseguirá escapar da posição que cavou para si próprio de modo arrogante ao se dizer superior aos “extremos” da direita e da esquerda. Ele foi capaz de sugerir, de forma absurda, que a extrema direita e a esquerda trazem ameaças civilizatórias similares.
O que angustia a todos que acompanharam os seguidos anos de empáfia e arrogância de Macron, que impôs ao povo francês reveses importantes, sobretudo ao subtrair direitos dos trabalhadores e aposentados, de apostar na pauta belicista, é que a população francesa tenha encontrado majoritariamente na extrema direita e não na esquerda o desaguadouro de votos que transformará em morto-vivo o ainda vigente mandato macronista. Há quem diga que entre o liquidacionismo e belicismo de Macron e a limitada resistência de uma esquerda fragmentada avançou silenciosamente uma aglutinação de forças em torno de uma falsamente moderada Le Pen, cujas máscaras usadas na eleição de 2022 caíram uma a uma nas recentes campanhas para os parlamentos europeu e francês.
O retrocesso parece vir a galope e são assustadores os números que indicam uma imensa quantidade de jovens identificada com o jovem tiktoker Bardella. Impossível não pensar no massivo apoio dos jovens argentinos à Milei nas últimas eleições. Jovens cativados pela imposição do medo de perder uma pretensa identidade francesa e de terem cada vez mais alto seu custo de vida. Frente ao movimento semelhante a um já velho conhecido “que se vayan todos”, espera-se que a Nova Frente Popular consiga fortalecer essa barreira vermelha que no primeiro turno foi capaz de evitar que a grande onda da extrema direita se transformasse em um verdadeiro tsunami sobre o parlamento francês.