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    Democracia

    Anistia aos golpistas de 8 de janeiro é ilegal e inconstitucional

    Aldo Arantes critica o Projeto de Lei 2858/22, que tenta conceder perdão a Bolsonaro e aos envolvidos nos atos golpistas, e alerta para os riscos à democracia

    POR: Aldo Arantes

    6 min de leitura

    A cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, que pichou a frase “Perdeu, mané” na estátua A Justiça, em frente ao STF, em Brasília, durante os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, foi condenada pela Primeira Turma da Corte a 14 anos de prisão, nesta sexta-feira (25/04/2025). Foto: Joédson Alves/Agência Brasil
    A cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, que pichou a frase “Perdeu, mané” na estátua A Justiça, em frente ao STF, em Brasília, durante os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, foi condenada pela Primeira Turma da Corte a 14 anos de prisão, nesta sexta-feira (25/04/2025). Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

    O Projeto de Lei nº 2858, de 2022, anistia os manifestantes das portas dos quartéis, os caminhoneiros que apoiaram a tentativa golpista e os empresários que a financiaram. Anula as multas aplicadas pela Justiça Eleitoral e anistia os crimes cometidos “ao se ingressar em juízo e as consequentes condenações”. Ou seja, tal dispositivo anistia aqueles que estão sendo julgados no Supremo Tribunal Federal (STF), mesmo antes do fim do julgamento. Visa anistiar Bolsonaro e a cúpula militar golpista.

    Assim, a proposta busca anistia a todos os envolvidos na tentativa golpista de 8 de janeiro de 2023 — desde os manifestantes até os organizadores e financiadores. Proposta indecorosa e inaceitável! 

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    Na justificativa do antidemocrático projeto, afirma-se que “as manifestações que têm ocorrido no país após o segundo turno das eleições presidenciais de outubro de 2022 são legítimas e conduzidas espontaneamente por cidadãos indignados pela forma como se deu o processo eleitoral”.

    Clique aqui para acessar a íntegra do PL 2858/2022

    E que “não se trata de ações antidemocráticas ou crime de qualquer natureza”, afirmando cinicamente que os acusados “são aqueles que lutam pacificamente pela democracia brasileira”.

    O projeto é uma afronta à democracia e ao povo brasileiro.

    É ilegal e inconstitucional.

    Ilegal, pois a Lei de Defesa da Democracia, incorporada ao Código Penal, estabelece que “tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais” implica pena de reclusão de 4 (quatro) a 8 (oito) anos.

    Sobre o golpe de Estado, a lei prevê pena de reclusão de 4 (quatro) a 12 (doze) anos para a tentativa de depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído.

    Portanto, a proposta é ilegal. Afronta a Lei de Defesa do Estado.

    É inconstitucional porque o artigo 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal estabelece que “a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos (…). Constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático”.

    Os ministros do STF consideram que as condutas dos envolvidos nos ataques de 8 de janeiro se enquadram como terrorismo e atentado à ordem constitucional, o que impede qualquer tentativa de perdão institucional.

    Segundo o constitucionalista Lênio Streck, o projeto, além de inconstitucional, representa um ataque direto à democracia: 

    “Uma democracia jamais comete o suicídio. É incompatível com a democracia que você tenha um perdão para quem tentou destruí-la; um aluno de primeiro ano de Direito já saberia disso.”

    A justificativa do projeto revela a clara conivência de seu autor e de seus apoiadores com o golpismo. Revela seu caráter antidemocrático e negacionista. Vai contra todas as evidências comprovadas pela Polícia Federal, pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e pelo fato de o Supremo Tribunal Federal ter transformado em réus os cabeças da tentativa golpista. E tem como objetivo principal livrar Bolsonaro e os demais líderes do golpe da prisão.

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    Movimentos sociais e sindicais realizaram ato contra a anistia em São Paulo (SP), em 30/03/2025. Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil

    Todavia, embora a maioria do povo brasileiro se manifeste contra a anistia aos golpistas, a bancada bolsonarista conseguiu, no dia 10 de abril, reunir 262 assinaturas para requerer a votação em regime de urgência. Tal fato se deve ao perfil profundamente antidemocrático de boa parte dos deputados, com a força das bancadas da Bala, da Bíblia e do Boi.

    Nota da Redação: O que é o regime de urgência e qual a situação atual do PL 2858/22, que propõe anistia aos golpistas de 8 de janeiro

    De acordo com o Regimento da Câmara, uma proposta pode ter a urgência solicitada pela maioria absoluta da Casa (257 deputados). Projetos com urgência podem ser votados diretamente no Plenário, sem necessidade de passar antes pelas comissões.
    No entanto, a pauta de votações do Plenário é definida em reunião dos líderes partidários com o presidente da Câmara.
    Mesmo com as assinaturas, o PL 2858/22 segue fora da pauta — pelo menos até o início de maio. Nessa quinta-feira (24), o presidente da Casa, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), anunciou, após reunião de líderes, que o projeto que concede anistia aos acusados de tentativa de golpe de Estado, não será incluído na pauta de votações da próxima semana, de 28/04 a 02/05.
    Fonte: Agência Câmara de Notícias

    Aos deputados que assinaram a urgência, cabem as seguintes perguntas:

    1. As manifestações foram legítimas? E a Lei de Defesa do Estado?
    2. Elas não são ações antidemocráticas? E as conclusões da Polícia Federal e da Procuradoria-Geral da República?
    3. Os que serão beneficiados com a anistia são os que lutam pacificamente? E a bomba no aeroporto, a depredação do patrimônio público, a tentativa de assassinato do presidente Lula, do vice-presidente Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes?

    Em sendo aprovada a urgência, haverá votação. Caso aprovado na Câmara, o projeto seguirá para o Senado.

    Pela gravidade dessa iniciativa, que pretende justificar a tentativa golpista, é indispensável que todas as forças democráticas se manifestem de forma enérgica contra tal projeto.

    Leia também: Do golpe de 1964 aos desafios de 2025 – a memória que não se apaga

    A falta de iniciativas contra o golpismo no passado permitiu que ele continuasse vivo no país.

    Chegou a hora de dar um basta!

    Nas eleições de 2026, as forças democráticas e progressistas devem ter como objetivo não só a vitória do presidente Lula, mas também a eleição de uma maioria democrática e progressista no Senado e na Câmara.

    Esse projeto é uma afronta à democracia. Um estímulo ao golpismo.

    Ditadura nunca mais!
    Anistia aos golpistas, jamais!

    Aldo Arantes é ex-deputado constituinte, coordenador nacional da Associação dos Advogados e Advogadas pela Democracia, Justiça e Cidadania (ADJC) e membro da Direção Nacional do PCdoB.

    *Artigo publicado originalmente no site da ADJC, em 15/04/2025, com o título Anistia para os golpistas é ilegal e inconstitucional.

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