“Os meus dados mostram que as economias mais avançadas estão já a entrar em recessão. Já não estamos numa retoma anémica, não estamos num impasse de crescimento. Estamos no início de uma contracção. Acho que já estamos perante essa contracção na maioria da Zona Euro, nos EUA e no Reino Unido. Esse é o primeiro ponto”, declarou o professor de Economia.

O segundo ponto, na sua opinião, é que “estamos a ficar sem armas políticas – monetárias e orçamentais – para sustentar o sistema financeiro”.

Em terceiro lugar, “a Zona Euro é uma fonte de risco sistémico. Se observarmos uma situação desordenada na Zona Euro, vai ser pior do que o Lehman”, disse o economista.

“Nesta altura, já não se trata apenas da Grécia, Irlanda ou Portugal. O contágio estendeu-se a Itália e Espanha, (…) que perderam credibilidade nos mercados. Vão precisar de pelo menos um ano para recuperar essa credibilidade”, afirmou Roubini na entrevista ao “Emerging Markets”.

Assim sendo, segundo Roubini, é necessário que haja um credor de último recurso que sustente a dívida soberana até que volte a haver credibilidade suficiente para evitar que os juros disparem no mercado obrigacionista. “E há poucas opções”, advertiu.

Uma dessas opções está nas eurobonds, mas o economista salienta que vão ser precisos pelo menos dois anos até que sejam aprovadas.

A segunda opção, no seu entender, “é o BCE fazer o trabalho sujo”. “No entanto, constitucionalmente, juridicamente, não lhe é permitido ser um credor sistémico de último recurso para a dívida soberana”.

A terceira opção consiste em triplicar o Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF), instrumento de financiamento que é gerido pelos governos da Zona Euro. Contudo, Roubini sublinha as dificuldades desta medida, uma vez que não foi ainda sequer aprovada a actual extensão do FEEF que tem estado a ser debatida (e que se espera estar resolvida em meados de Outubro).

“Assim, o meu receio é que o FEEF fique sem dinheiro e não vai haver um credor de último recurso para sustentar Itália e Espanha. E isso poderá ser uma fonte de desmoronamento sistémico da Zona Euro, com consequências financeiras globais piores do que as do Lehman”, referiu Roubini, que é também “chairman” da empresa de consultoria RGE Monitor.

Na sua opinião, as pessoas vão ver, quando o FEEF for aprovado, que não há dinheiro suficiente, pois a capacidade efectiva deste instrumento será de 440 mil milhões de euros (com os 60 mil milhões do outro instrumento da UE, o MEEF, ascenderá a 500 mil milhões).

O economista reiterou também a necessidade de se estabelecer um plano com oito pontos, conforme defendeu recentemente.

1. Muito mais flexibilização monetária e quantitativa. E isso inclui flexibilização do crédito.

2. Estímulos orçamentais de curto prazo nos países que ainda o podem fazer, como os EUA, Reino Unido, Alemanha, núcleo da Zona Euro e Japão. É a periferia da Zona Euro que está a realizar um aperto orçamental. Os restantes devem adiar a austeridade, pois no curto prazo precisamos de estímulos.

3. Fornecer significativos apoios de credor de último recurso a Itália e Espanha para garantir que estes países soberanos, ilíquidos mas solventes, não descarrilam.

4. Reestruturar de forma ordenada a dívida dos governos, dos bancos, das famílias que estão insolventes.

5. Forte recapitalização dos bancos europeus através de um programa ao estilo do norte-americano TARP (compra de activos tóxicos por parte do governo).

6. Apoiar os mercados emergentes, providenciando ajuda monetária e orçamental aos países que vão entrar em apuros, ajuda essa que deve ser dada através do FMI e de outras instituições financeiras internacionais.

7. Conceder crédito a pequenas e médias empresas e às famílias que estão com aperto de liquidez.

8. Saída ordenada dos países que não vão conseguir recuperar a competitividade na Zona Euro, como a Grécia e, potencialmente, também Portugal.

“Receio que os políticos norte-americanos e britânicos não tenham vontade política para o fazerem nos seus próprios países, quanto mais coordenar este esforço a nível internacional”, afirmou.

Na sua opinião, nesta altura o debate não está em saber se vai haver ou não uma nova recessão (‘double dip’, recessão em forma de W). “O ‘double dip’ já começou. A única questão que se coloca é a seguinte: vamos ter uma recessão suave que durará três trimestres nas economias avançadas, ou vamos ter uma recessão severa e outra crise financeira global? A resposta a esta pergunta depende de se conseguir ou não manter Itália e Espanha. Já nem tem nada a ver com a Grécia”.

Se isso não acontecer, avisa, “vai ocorrer um desmoronamento desordenado da Zona Euro”. “Por isso, temos de caminhar rumo a uma quase-união orçamental no sentido de providenciar liquidez de apoio aos países ilíquidos mas solventes que são demasiado grandes para cair e demasiado grandes para salvar. Essa é a questão principal”.

Assim, defende, é preciso chegar-se a um compromisso no sentido de haver um mecanismo europeu que apoie Itália e Espanha e que seja três ou quatro vezes superior aos 440 mil milhões de euros do FEEF.

Roubini reitera que são necessários mais estímulos orçamentais e monetários na Zona Euro, mas considera que é difícil. “Não creio que lá cheguemos. Timothy Geithner [secretário norte-americano do Tesouro] defendeu isso no último Ecofin e disseram-lhe: ‘não nos venha dizer o que temos de fazer; queremos austeridade orçamental e não queremos recapitalizar os bancos, não queremos uma expansão monetária’. Por isso, estamos perante um desacordo entre os EUA, Europa, Reino Unido e Japão, mesmo no que diz respeito às políticas necessárias. É aí que está o impasse”.

No seu entender, os EUA, que também estão sob tensão política e financeira, já não podem impor a sua vontade. Por isso, sublinha, a liderança tem agora de vir da Alemanha. Ou a Alemanha aceita o risco de crédito de ajudar Itália e Espanha e salva a Zona Euro, ou não se mostra disposta a fazê-lo e teremos a destruição da Zona Euro, referiu.

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Fonte: Jornal de Negócios