Clube de Leitura
O marxismo no mercado editorial brasileiro em 2025
Por: Theófilo Rodrigues
22 de dezembro de 2025
Já se tornou uma tradição desta coluna a retrospectiva literária marxista publicada ao final de cada ano. A iniciativa teve início em 2023, quando apresentei dez livros de autores marxistas lançados no Brasil ao longo daquele ano. O balanço reunia tanto obras de intelectuais estrangeiros – como G. A. Cohen, Marcello Musto, Mario Mieli e Étienne Balibar – quanto contribuições de autores brasileiros, entre eles Fábio Palácio, José Paulo Netto, Diego Pautasso e João Quartim de Moraes. Os clássicos do marxismo, como Marx, Engels e Gramsci, também marcaram presença.
Em 2024, a experiência foi retomada e ampliada. Naquela ocasião, foram resenhados onze livros de autores marxistas publicados no Brasil, compondo um painel que articulava tradição e renovação teórica. Figuravam na lista nomes como Marx, Lênin e Gramsci, ao lado de pensadores contemporâneos como Nancy Fraser, bem como intelectuais e militantes brasileiros, entre eles Aldo Arantes, Dani Balbi, Theófilo Rodrigues, Thiago Rodrigues, João Quartim de Moraes, Aloísio Sérgio Barroso e Osvaldo Bertolino.
Agora, em 2025, voltamos mais uma vez ao exercício de balanço crítico. A seguir, apresento uma seleção de dez livros de autores marxistas publicados no Brasil neste ano que merecem especial atenção dos leitores – seja pela relevância teórica, pela atualidade política ou pela contribuição ao debate intelectual contemporâneo.
Esquerdismo, doença infantil do comunismo, de Lenin (Ed. Boitempo)
Publicado pela editora Boitempo em parceria com a Fundação Maurício Grabois, Esquerdismo, doença infantil do comunismo é o oitavo livro da coleção Arsenal Lenin. Escrito em 1920, o livro trata da relação entre tática e estratégia mediadas pela correlação de forças. Trata-se de um combate direto de Lênin contra o dogmatismo que ignora a análise concreta da realidade concreta.
Teorias do mais-valor, de Marx (Ed. Boitempo)
No processo de produção de sua grande obra, O Capital, Marx redigiu um conjunto enorme de textos, mas sem publicá-los. Basta dizer que Livros 2 e 3 do Capital só foram publicados após a sua morte, com edição de Engels. Uma outra parte desses textos constitui o que no Brasil conhecemos como Teorias da Mais-Valia, livro editado por Kautsky no início do século XX e que chegou ao país em 1980 pela editora Difel, com tradução de Reginaldo Sant’Anna. Considerado por muitos como “o Livro 4 de ‘O Capital'”, esse livro examina de forma crítica o desenvolvimento da economia política até o momento em que Marx redigiu O Capital. Agora, a editora Boitempo traz para a língua portuguesa uma nova tradução, com o título Teorias do Mais-Valor. Diferentemente da anterior, essa nova tradução não foi feita a partir da edição de Kautsky, mas sim do trabalho da MEGA.
Entrevistas (Ed. Boitempo)
Neste ano, a coleção Marx-Engels da editora Boitempo trouxe mais uma novidade para a literatura marxista. De certo modo, os leitores já tinham certa familiaridade com a maior parte das obras da coleção. Agora, algo inédito – ou pouco conhecido – na língua portuguesa parece chegar às livrarias. Trata-se de Entrevistas, livro que reúne entrevistas e relatos que mostram Marx e Engels em diálogo com jornalistas, militantes, intelectuais e figuras políticas do século XIX.
Capital fóssil, de Andreas Malm (Ed. Elefante)
Durante a COP30 realizada no Brasil, o presidente Lula apresentou uma ousada proposta para a política internacional: a criação de um Mapa do Caminho capaz de auxiliar todos os países do mundo a abandonar os combustíveis fósseis nas próximas décadas. A proposta foi ousada na medida em que desafiou justamente o coração do capitalismo global. Capital fóssil: a ascensão do motor a vapor e as raízes do aquecimento global, do professor de ecologia humana na Universidade de Lund, Andreas Malm, é uma das principais contribuições teóricas para compreendermos essa relação entre o capitalismo e os combustíveis fósseis nos últimos dois séculos. Marxista, Malm não tem dúvida em afirmar que a única chance de deter o colapso climático é abandonar definitivamente o capitalismo.
Clóvis Moura: pensamento negro radical e formação do Brasil (Ed. Autonomia Literária)
Organizado por Petrônio Domingues e Márcio Farias, o livro reúne 16 capítulos escritos por diferentes autores sobre aspectos distintos do pensamento de Clóvis Moura. Marxista preocupado com a questão racial, Moura buscou interpretar o Brasil em diálogo com as mais diversas disciplinas, como a história, a sociologia e a economia. Esses múltiplos diálogos podem ser vistos ao longo dos 16 capítulos da coletânea.
Maurício Grabois – Textos reunidos (Ed. Anita Garibaldi)
Organizado por Igor Grabois, Katiane de Souza Almeida e Klaus Scarmeloto, esse livro reúne uma parte relevante da obra do revolucionário comunista Maurício Grabois. Deputado constituinte em 1946 e líder da Guerrilha do Araguaia, Grabois foi um dos grandes nomes do pensamento marxista brasileiro. O livro foi publicado pela editora Anita Garibaldi com apoio da Fundação Maurício Grabois.
Renato Rabelo – Vida, ideias e rumos, de Osvaldo Bertolino (Ed. Anita Garibaldi)

Renato Rabelo e Osvaldo Bertolino na sessão de autógrafos do lançamento nacional da biografia Renato Rabelo – Vida, Ideias e Rumos, em São Paulo, no dia 7 de abril de 2025. Foto: Daniel Leon/FMG/Divulgação
A biografia de Renato Rabelo, escrita pelo jornalista e historiador Osvaldo Bertolino, não apresenta apenas a trajetória de um dirigente comunista; trata-se, principalmente, de uma história do Brasil vista pelos olhos de um incansável marxista. Em 847 páginas, Bertolino percorre lembranças de fatos relevantes de organizações políticas como a Ação Popular e o Partido Comunista do Brasil (PCdoB). O livro, que foi publicado pela Fundação Maurício Grabois em parceria com a Editora Anita Garibaldi, conta com textos de apresentação redigidos pelos presidentes Lula e Dilma Rousseff.
Cultura é poder, de Jandira Feghali (Ed. Oficina Raquel)
No mundo da política, ninguém conhece mais de cultura do que Jandira Feghali. Deputada federal em seu 8º mandato, Jandira acumulou ao longo das últimas três décadas uma série de experiências que agora aparecem em Cultura é Poder: Reflexões sobre o papel da cultura no processo emancipatório da sociedade brasileira. Demonstrando seu enorme prestígio no setor, o livro conta com prefácio da ministra da Cultura, Margareth Menezes. O livro está dividido em duas partes. Na primeira, a autora discute o seu referencial teórico. Ali aparecem nomes do pensamento social brasileiro como Darcy Ribeiro, Celso Furtado e Carlos Lessa, mas também outros intelectuais da América Latina como Álvaro Garcia Linera, Néstor García Canclini e Alberto Acosta, além de marxistas como Gramsci, Raymond Williams e Eric Hobsbawm. A segunda parte do livro é voltada para as políticas públicas de cultura, muitas delas formuladas pela própria Jandira. Vale lembrar que, entre um mandato e outro como deputada federal pelo PCdoB, Jandira foi Secretária Municipal de Cultura do Rio de Janeiro. Já como parlamentar, foi a responsável pela elaboração da Lei da Política Nacional Aldir Blanc.

Capa do livro Cultura é Poder – Reflexões sobre o papel da Cultura no processo emancipatório brasileiro, de Jandira Feghali. Editora: Oficina Raquel. Imagem: Reprodução
Florestan Fernandes: do protesto negro à revolução brasileira (Ed. Expressão Popular)
Organizado por Marcio Farias, Florestan Fernandes: do protesto negro à revolução brasileira é uma coletânea composta por 11 textos de Florestan Fernandes, entre artigos, prefácio e capítulos de livros. Autor fundamental da sociologia marxista brasileira, Fernandes escreveu sobre temas inescapáveis como a revolução burguesa no Brasil, a questão racial e o pensamento latino-americano.
Sementeira, de Célio Turino (Ed. Autonomia Literária)
Sementeira: grãos para transformar radicalmente a sociedade via políticas culturais é o novo livro do historiador Célio Turino. Secretário da cidadania cultural no Ministério da Cultura durante os dois primeiros governos Lula (2004-2010), Turino foi o responsável por idealizar e implantar o programa Cultura Viva, uma das principais políticas culturais do país. Por meio de uma conexão entre política e cultura, o livro de Turino lança no ar uma série de sementes com ideias inovadoras para a construção de um novo mundo. Sementeira, que conta com prefácio de Dennis de Oliveira, não é exatamente um livro marxista; talvez Turino fosse melhor identificado como um pós-marxista. Mas a sua capacidade de inovar o pensamento subalterno e arejar a teoria revolucionária fazem com que faça sentido listá-lo por aqui.
Theófilo Rodrigues é professor do Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da UCAM e coordenador do Grupo de Pesquisa da FMG sobre a Sociedade Brasileira.
Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial da FMG.