TV Brasil, afinal qual a sua missão?
A constituição do campo das TVs públicas, formado por TVs educativas e universitárias nos anos 1960 foi responsável pela manutenção da ideia de uma emissora de TV capaz de ser um serviço social de relevância nacional e cultural e de acesso à informação e aos temas de caráter educativo.
A expectativa gerada com a criação da TV Brasil apoiou-se na possibilidade de novos conteúdos para a programação televisiva brasileira. Bourdieu (1997) em seu texto sobre a televisão, diz que há a necessidade de uma “revolução simbólica” no modo atual de fazer televisão, notadamente uma crítica às TVs comerciais e aos conteúdos por elas exibidos que primam pelos interesses do mercado em primeiro plano.
A EBC passou a gerir três canais de televisão: a TV Brasil, a NBR, canal do governo federal, um serviço prestado pela empresa e a TV Brasil Canal Integración.
A TV Brasil é a junção da antiga TVE Brasil, do Rio de Janeiro e do Maranhão e da TV Nacional de Brasília. Ainda há um complexo composto por oito estações de rádio e a agência de notícias, que chega a ter 1 milhão de acessos no mês.
O ano de 2011 coincide com o fim do mandato da atual presidente da EBC, Tereza Cruvinel. Qual o balanço que podemos fazer das ações da TV Brasil nestes quase três anos?
Poderíamos dividir a avaliação em três partes: 1) sobre a programação; 2) sobre a tecnologia e a constituição da Rede Pública; 3) e o alcance da emissora no Brasil.
A programação precisa ousar e fazer experimentações
Em relação à programação, as premissas que balizaram os debates foram inspiradas na necessidade de uma programação de qualidade que pudesse apoiar-se em outros paradigmas para a produção dos seus conteúdos, que não fossem os referenciais do mercado, ou da indústria cultural e sua ideologia. Um dos desafios apontados pelo I Fórum das TVs públicas foi o da constituição de uma Rede Pública de TVs capaz de produzir conteúdos. Um dos objetivos era o de possibilitar a concentração dos recursos existentes na produção de conteúdos diversificados evitando a repetição na produção de gêneros e programas nas emissoras que compõem a Rede Pública. Os debates apontaram para a necessidade de se produzir conteúdos regionais em equilíbrio com os conteúdos gerais produzidos a partir de um centro, como ocorre na Rede Globo, por exemplo.
Ao observarmos a grade da programação, percebemos que a programação infantil, de qualidade quase indiscutível, permanece sendo o carro-chefe da emissora, ocupando a grade matinal e do meio da tarde. Esta programação já existia antes da configuração da TV Brasil.
A Rede Pública
Uma forma de ampliar a abrangência dos conteúdos da TV Brasil é formando uma rede com as emissoras do campo público locais. Hoje, 22 estados participam da rede, que ocupa 10 horas do tempo diário de cada uma. Desse tempo, 4 horas são de conteúdos das próprias associadas, 4 horas de produção da TV Brasil e 2 horas (no mínimo) de programas infantis, independente de onde sejam feitos.
Uma boa programação com o tema África e Copa do Mundo
A TV Brasil ao entrar no clima da Copa do Mundo da África do Sul, em 2010, apresentou uma programação especial dedicada ao evento. Entre as principais novidades inseridas na grade, apareceu o “Repórter África, Copa 2010″, uma revista eletrônica na qual os convidados falaram sobre suas visões diferenciadas acerca do futebol. Também foram exibidos documentários, como 1958, o ano em que o mundo descobriu o Brasil, do jornalista José Carlos Asbeg, exibido nos cinemas em 2008, ano que o Brasil comemorou os 50 anos da conquista da Copa do Mundo de 1958, na Suécia.
A multiprogramação ainda está no papel
A multiprogramação é o recurso mais interessante no processo de migração da tecnologia analógica para a tecnologia digital. Isto é possível porque o sinal digital é mais compacto, o que permite transmitir até quatro programas em um só canal, quando não são transmitidos em alta definição (HD), mas em definição standard (SD). Essa potencialidade da TV digital é interessante para a multiplicação de conteúdo e para sua democratização.
Uma iniciativa importante, foi a proibição às redes comerciais e às TVs educativas explorarem a multiprogramação. O Ministério das Comunicações delegou à TV Brasil a operação da rede pública digital, cumprindo a prerrogativa do poder público em regulamentar a exploração dos serviços digitais de radiodifusão.
Jacson Segundo, do Observatório do Direito à Comunicação, faz apontamentos interessantes sobre a atual situação da TV Brasil. Ele aponta que, ao mesmo tempo em que a EBC é responsável pelo processo de conversão e utilização da tecnologia digital, ela tem se ocupado nesse começo de vida com muitos problemas técnicos e administrativos. A qualidade do sinal das transmissões de suas rádios e de seu carro-chefe, a TV Brasil, por exemplo, ainda é motivo de muitas reclamações dos usuários. E, pior que isso, muitos sequer têm acesso aos canais, constata Segundo.
A conversão digital abriu grandes possibilidades para a rede pública de televisão brasileira, centralizada pela TV Brasil, efetivamente inovar utilizando-se da tecnologia para um bom projeto exibição de conteúdos na televisão pública.
A interatividade muito utilizada nas experiências pela internet é outra importante inovação que surge com a conversão, abrindo ainda mais possibilidades dentro da multiprogramação. Este recurso ainda é muito pouco explorado pela TV Brasil, mesmo se tratando de sua transmissão no sistema fechado, que facilita por razões tecnológicas, a inclusão de conteúdos extras vinculados com a programação da grade.
Os sinais de TV chegam às casas de três maneiras: 1) por uma antena comum; 2) por cabo ou antena de microondas; e 3) por uma parabólica apontada para um satélite. As duas últimas formas de transmissão são pagas. A primeira, gratuita – daí seu nome: TV aberta. Na TV paga, o número de canais foi multiplicado em dez anos com o crescimento do setor. Enquanto a TV aberta comercial obtém 100% de suas receitas com anúncios, na TV paga mais de 80% vêm das assinaturas. Enquanto os Estados Unidos possuem quase 100 milhões de assinantes, a TV paga no Brasil só conseguiu chegar a 5 milhões de residências (Telaviva, 2008) contra 43 milhões alcançadas pela aberta. A migração do sistema analógico para o digital, no Brasil, tem prazo para ocorrer até 2016, prevê o decreto 5.820/ 2006, que trata da implantação do Sistema Brasileiro de Televisão Digital Terrestre – SBTVD-T.
Ele ainda estabelece as diretrizes para a transição do sistema de transmissão analógica para o digital, sendo que o período de migração de uma tecnologia para outra é de dez anos, com fim previsto para 2016. Mas, determina que, a partir de 1º de julho de 2013, o Ministério das Comunicações somente outorgará a exploração do serviço de radiodifusão de sons e imagens para a transmissão em tecnologia digital.
Além disso, obriga as emissoras, no período de transição, a veicularem simultaneamente as programações nas duas tecnologias. Diz ainda que os canais utilizados para transmissão analógica serão devolvidos à União após o prazo de transição.
A emissora ainda não está disponível em todas as regiões da cidade São Paulo. O sinal digital é praticamente impossível de ser sintonizado e o sinal analógico situa-se em um canal muito alto, canal 62. Se pensarmos que ela é uma emissora aberta como é a Globo, no canal 5; o SBT, no canal 4; a Record, no canal 7; RedeTV, canal 9;Band, canal 13 e a TV Cultura, canal 2, por que uma emissora pública deve permanecer em um canal tão alto como o canal 62?
Ela poderia e deveria estar acessível em um canal baixo e de boa qualidade de transmissão. Há problemas tecnológicos no sinal gerado a partir da sede da antiga TVE, no Rio de Janeiro, e que ainda não foram solucionados.
É muito comum as pessoas pelo interior sintonizarem a emissora, porém com a ausência de áudio. Este problema existe há alguns anos e ainda não foi solucionado.
A TV Brasil vive a contradição de ter a conversão digital a seu favor e ao mesmo tempo não consegue resolver problemas na transmissão analógica.
Ficaremos na torcida para que a emissora consiga retomar a ousadia para nos brindar com uma programação de alta qualidade, tanto no conteúdo quanto na forma.