Livro acusa Tuma de acobertar crimes da ditadura
Ao desnudar a “operação limpeza” que apagava os vestígios das mortes decorrentes de tortura em órgãos como os DOI/Codi, do Exército, o livro aponta o papel do DOPS e de seu chefe e diretor de 1966 a 1983, o falecido senador Romeu Tuma, na produção de atestados de óbito com nomes falsos, na simulação de “suicídios” e “tiroteios” em inquéritos, na ocultação dos fatos que levaram à morte de dezenas de desaparecidos e no sumiço de seus corpos, prova material do crime.
“Desde a entrega dos arquivos do DOPS ao governo de São Paulo, em 1991, sabíamos que Tuma era o agente de ocultação dos corpos da ditadura militar, mas o livro da Secretaria de Direitos Humanos é essencial porque oficializa as acusações e traz novas revelações”, diz Suzana Lisboa, do Comitê dos Familiares dos Mortos e Desaparecidos Políticos.
Os familiares dos desaparecidos foram percebendo a importância do papel desempenhado por Tuma durante as longas buscas pelos corpos e pelas histórias dos desaparecidos, como aconteceu com Suzana. Em 1979, ao descobrir a localização da ossada do marido Luiz Eurico Tejera Lisboa, desaparecido em 1972 e enterrado sob o falso nome de Nelson Bueno, ela entrou com um processo para retificar o registro de óbito do marido. Em 1980, o juiz pediu ao DOPS que localizasse cartas endereçadas a Luiz Eurico – com o nome verdadeiro ou “frio” – que haviam sido apreendidas com ele quando foi detido, em setembro de 1972. “Tuma respondeu que não constava nenhum documento em nome de Nelson Bueno nem de Luiz Eurico.”
Não era verdade. Suzana descobriria, ao ter acesso aos arquivos, papéis do próprio DOPS que informavam a morte de Nelson Bueno. Ele teria se ‘suicidado’ em uma pensão na Liberdade, em São Paulo, dizia o relatório “Retorno dos exilados”, de 1978, documento que se tornaria conhecido como o “listão do Tuma”. “Eles fizeram o documento para se preparar para a anistia e junto aos nomes dos alvos da ditadura havia anotações dizendo onde estavam. No caso de Luiz Eurico estava escrito ‘morreu em setembro de 1972’. Ou seja, Tuma mentiu para o juiz”, diz Suzana.
Novas acusações
O livro “Habeas Corpus” mostra a atuação de Tuma na ocultação de homicídios sob tortura e no falseamento de informações que poderiam levar à localização de corpos de desaparecidos em vários casos, entre eles o de Flávio de Carvalho Molina, Ruy Berbert, Márcio Beck e de Maria Augusta Thomaz – os dois últimos presos em Goiás. E traz pistas sobre a atuação do delegado na ocultação de cadáveres também fora do Estado de São Paulo.
“O DOPS documentava os casos de maneira a ocultar a verdadeira razão da morte e impossibilitar a localização dos restos mortais das vítimas”, confirmam os procuradores do Ministério Público Federal Eugenia Gonzaga e Marlon Weichert, que em novembro de 2009 entraram com uma ação civil pública para responsabilizar as autoridades “que contribuíram para a ocultação desses cadáveres, impedindo seu funeral e enterro por familiares e amigos, e promover a verdade no interesse de toda a sociedade brasileira”. Romeu Tuma, assim como Harry Shibata, o legista do Instituto Médico Legal (IML) que corroborava a versão do DOPS para os assassinatos com a confecção de laudos falsos, estão entre os réus da ação, que prossegue mesmo com a morte dele.
Com as histórias dos desaparecidos – e de seus algozes – consolidadas no livro da Secretaria de Direitos Humanos, a atuação do Ministério Público Federal e do Grupo de Trabalho Tocantins (GTT) do Ministério da Defesa, que busca os corpos de 70 desaparecidos no Araguaia.
A futura Comissão Nacional da Verdade – que depende da aprovação do Legislativo – terá material para restaurar a verdade dos fatos ocorridos nesse período ainda hoje traumático. As revelações mais importantes do livro também servirão de pauta para novas reportagens que serão publicadas em nosso site. Acompanhe.
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Fonte: Brasil Atual