As manifestações ocorridas no sábado passado e já marcadas para acontecer de novo no dia 15 de novembro, pedindo intervenção militar e impeachment de Dilma, fazem parte de uma narrativa maior. Do enredo desta novela constam ainda o pedido de recontagem de votos do PSDB, a transformação pelo discurso midiático do PT num partido de bandidos, a construção de uma Dilma e de um Lula que não respeitam a democracia, a tentativa de aprovar a PEC da Bengala que permitiria esticar o mandato dos ministros do STF, a fala de Gilmar Mendes sustentando que há uma bolivarianização do Supremo e a criação de uma frente para eleger um presidente do Congresso anti-Dilma. Tudo isso embalado numa recepção a Aécio no Congresso regada a manifestantes cantando o hino nacional e num discurso onde o candidato derrotado, certamente não de forma inocente, falou em “exército de oposição”. Essa novela tem um objetivo claro: criar um clima no país que justifique um golpe institucional se houver condições políticas.

Os golpes na América Latina nos últimos tempos têm tido uma característica comum. As Forças Armadas podem até participar deles, mas não assumem o poder de forma direta. Elas garantem que pelas vias congressuais ou jurídicas se processe a substituição do governante por outro que tenha relação com o estabilisment e, em geral, com os interesses americanos. Foi assim que tentaram apear Chávez do poder em 2001. E foi assim que Fernando Lugo, no Paraguai, e Manuel Zelaya, em Honduras, foram derrotados.

Há uma narrativa sendo construída que passa a ter essa saída como plano A depois da derrota de Aécio nas urnas. E ela vem sendo construída a partir de pontes  lançadas pelos setores midiáticos nacionais a grupos internacionais. Hoje não é incomum ver veículos, principalmente dos EUA, tratando o governo brasileiro de forma caricata. E o PT como um partido de bandidos.

O discurso do país dividido regado a uma suspeita de fraude eleitoral é excelente para dar mais amplitude a essa narrativa. Porque ele permite dizer que no Brasil não há respeito as regras democráticas. E a partir dai qualquer solução e intervenção é permitida.

É cedo para dizer que estamos no limiar deste cenário. Mas não é cedo para dizer que há claros contornos de que há uma construção neste sentido.

Mas para que haja uma solução de golpe institucional, que obviamente será chamado de outro nome, é preciso alimentar a radicalização. E por isso que há no PSDB gente dando pérolas aos porcos da turma do Banana’s Party.

O discurso radical permite criar uma alternativa de centro. Em breve haverá gente dizendo que Dilma não tem legitimidade para continuar à frente da presidência e que o Brasil corre o risco de um golpe se o PT insistir em se manter no poder.

É essa gente que ao mesmo tempo planta o golpe que vai aparecer como solução para que o golpe militar não aconteça. Mas para que se realize uma operação congressual que permita “afastar o partido mais corrupto da história do Brasil continue subjugando os homens de bem do país”.

Segundo o Diap, entre outras aberrações, o próximo Congresso terá 55 deputados policiais ou próximos desse segmento. Será o Congresso mais conservador desde a redemocratização. Ou seja, se já era difícil garantir apoio parlamentar para teses populares no quadriênio que se encerra no final deste ano, será muito pior a partir do ano que vem.

Mas o governo vai ter que operar com essa realidade. E terá que construir uma base de apoio que lhe permita não viver de sobressaltos. Para isso, o primeiro grande desafio é derrotar a candidatura de Eduardo Cunha para a presidência da Câmara.

Na política há espaço para tudo, menos para a ingenuidade. Cunha eleito vai lutar todos os dias do seu mandato à frente do Congresso para derrubar Dilma. Será parte do seu acordo com a oposição.

A eleição do presidente da Câmara dos Deputados passa a ter importância tão grande quanto a de 26 de outubro. Ao que parece, muita gente já se deu conta disso, mas nunca é demais revelar quais as verdadeiras intenções do lado de lá. É preciso tratá-los de vez em quando com humor, porque senão a gente fica tão doente quanto alguns deles, mas o fato é que essa gente não está de brincadeira.