Longo, sinuoso e árduo tem sido o caminho para fazer do Brasil uma nação progressista – luta que teve um marco importante na Proclamação da República e na Abolição da Escravatura ainda no apagar das luzes do século XIX, ganhando um impulso extraordinário com a Revolução de 1930, que se renovou a partir da redemocratização em meados dos anos 1980 e que adquiriu uma nova perspectiva com a vitória de Lula em 2002. Não foram poucos nem pequenos os obstáculos enfrentados para a consecução do desenvolvimento nas condições de domínio do sistema imperialista, aos quais se soma uma série de dificuldades internas. O processo econômico do desenvolvimento capitalista brasileiro foi marcado por ser tardio, desigual e associado entre capitais nacionais e forâneos. O processo político se deu através de uma série de rupturas parciais seguidas de recomposições entre forças heterogêneas, avançadas e atrasadas. Da década de 1940 até meados dos anos 1980 as Forças Armadas intervieram intensamente na cena política – a partir do alinhamento brasileiro com os EUA num mundo então bipolar –, a maioria das vezes truncando a democracia. Em pelo menos duas ocasiões, na deposição de Vargas em 1954 e na preparação do golpe militar de 1964, houve clara ingerência dos EUA na vida política brasileira.

Mais recentemente o país passou a sofrer grave ameaça de recolonização a partir da proposta norte-americana da Alca. Do ponto de vista social, amplos movimentos de massas, de âmbito nacional e caráter patriótico e democrático, foram em momentos marcantes a base de impulso para as maiores transformações. A estrutura das classes sociais brasileira passou por importantes mudanças. A situação de vida e as condições de trabalho dos trabalhadores e do povo brasileiro foram marcadas por crescentes disparidades com concentração de renda e de riqueza no pólo das tradicionais elites brasileiras.

Durante os três primeiros quartos do século XX o Brasil teve as mais altas taxas médias decenais de crescimento capitalista do mundo. Emergiu deste processo um país de capitalismo dependente medianamente desenvolvido, com projeção entre os países em desenvolvimento, o que pode ser expresso na avaliação de que no mundo o Brasil ocupava o patamar do 8º PIB. O Estado burguês brasileiro foi o principal instrumento da obra levada a cabo durante a maior parte do século passado, quer na planificação e na regulação econômicas quer como protagonista da construção de empresas produtivas estratégicas, do sistema financeiro público – nacional e regional – e da infra-estrutura, sobretudo energética e de comunicações. Além disso, foram construídos ao longo desses anos centros públicos de produção de ciência, tecnologia e ensino, um aparato (agências e órgãos) e um corpo técnico-burocrático estatais capazes de conduzir os assuntos brasileiros na perspectiva do interesse nacional. Após o fim do regime militar foram dados passos significativos na construção de um arcabouço institucional, jurídico e político mais democrático e estável com a promulgação da nova
Constituição brasileira em 1988 que incorporou também importantes conquistas sociais. Exatamente esse Estado passou a ser o alvo central da alternativa neoliberal. Obviamente, suas formas de financiamento pela via inflacionária ou pela via do pesado endividamento externo davam claras mostras de esgotamento. A predominância dos interesses de fundo e das concepções antidemocráticas e reacionárias da maior parte das elites brasileiras condicionou o processo de desenvolvimento com características constrangedoras: o crescente agravamento da situação social, onde se deve considerar, sobretudo, um dos índices mais altos de concentração de renda e riqueza do mundo. A luta do povo pela transformação social sempre esbarrou na intolerância conservadora e reacionária das classes dominantes, que nunca vacilaram em recorrer ao autoritarismo para impedir as mudanças e preservar seus interesses.

Porém, o caminho adotado entre 1989 e 2002 levou a um alto grau de desnacionalização do aparato econômico brasileiro, numa situação de quase paralisia do crescimento intercalado por crises, com destaque para a de meados de 2002 às vésperas do pleito presidencial, com maior dependência e vulnerabilidade externas pela forma com que foi dirigida a inserção do Brasil no novo contexto de globalização neoliberal imperialista e pelos novos padrões de financiamento adotados, com maior endividamento público, com muito maiores dificuldades impostas aos trabalhadores, com desemprego, precarização do trabalho e marginalização de setores crescentes da população. Além disso, o Estado teve suas funções gravemente alteradas tendo sido colocado a serviço da oligarquia financeira. O sistema de defesa nacional foi fragilizado, assim como foram feitas investidas no sentido de limitar o grau de democracia alcançado. Com a vigência do neoliberalismo o Brasil perdeu espaço relativo na cena internacional, tanto econômica quanto politicamente.

As duas últimas décadas do século XX legaram uma série de impasses à construção de um Brasil desenvolvido, soberano, democrático e de bem-estar para seu povo – que passam a se constituir nos grandes desafios a serem enfrentados neste início de século. Nos anos 1980 se condensaram os problemas do período do nacional-desenvolvimentismo e evidenciou-se a incapacidade da elite burguesa em promover transformações que pudessem superá-los. Na década de 1990, o neoliberalismo, em nome da modernização, ao tentar superar aqueles impasses pela via da desregulamentação, abertura, privatizações e flexibilizações trabalhistas indiscriminadas, levou o país a uma forte regressão.

Porém, o Brasil é um país de grande extensão territorial com recursos naturais abundantes e variados, com fronteira com quase todos os países sul-americanos e uma costa marítima de 8698 km. No século passado, sob inspiração do nacional-desenvolvimentismo, cujo marco inicial está na revolução de 1930, o país passou por grandes transformações. A industrialização brasileira adquiriu dimensões importantes na comparação internacional ao efetivar a construção de um parque relativamente completo e diversificado e a grande produção agropecuária mecanizada passou a jogar um papel econômico maior e, além disso, os serviços se desenvolveram e se industrializaram; tudo isto resultou na passagem de uma economia agrário-exportadora baseada na monocultura do café para um país industrial-agrário.

No Brasil de hoje vivem cerca de 185 milhões de pessoas – a maior parte delas em grandes
conglomerados urbanos com enormes e carentes periferias. Um povo único, miscigenado e original, constituído em sua maioria por proletários, semiproletários e trabalhadores explorados de uma forma geral nas cidades, aos quais se somam os assalariados rurais, camponeses e trabalhadores rurais que desejam terra para nela trabalhar. A assim chamada classe média – constituída, sobretudo, por empresários de pequeno porte em atividades industriais, comerciais e agrícolas, bem como por assalariados não operários e melhor remunerados –, também adquiriu porte e influência política. A intelectualidade brasileira ganhou destaque pela sua produção acadêmica em diversos ramos da ciência, inclusive nas ciências sociais, por sua fecunda produção artística e cultural e também pela sua predominante postura política progressista. Estas classes e setores de classe formam a base social das transformações e a força de trabalho capacitada, elemento essencial para a retomada da construção do país. O estrato financeiro-rentista da grande burguesia brasileira, maior beneficiário da aplicação do projeto neoliberal, substituiu a burguesia industrial na hegemonia de classes, condição que havia adquirido ao cabo da revolução burguesa. Sobrepôs-se igualmente à burguesia agrária e dos serviços, que se desenvolveram mais recentemente, e se constitui em grave entrave ao desenvolvimento. Toda essa transformação econômica e social teve inequivocamente suas repercussões no terreno político. O proletariado passou a ter uma presença política destacada na vida nacional e se constitui objetivamente na força mais interessada na consecução de um projeto de desenvolvimento soberano, democrático e com valorização do trabalho e, além disso, é a classe que pode verdadeiramente se interessar na superação do capitalismo.

Dessa forma, partindo dessa base, configuraram-se historicamente a necessidade e o desafio da construção de um novo projeto de nação que pudesse representar a superação tanto do esgotamento dos problemas do período nacional-desenvolvimentista (da década de 1930 à de 1980) quanto dos impasses originados do modelo neoliberal; que, dirigido por forças políticas e sociais mais avançadas, pudesse satisfazer os interesses nacionais, democráticos e sociais dos trabalhadores e do povo brasileiro. Um projeto que significasse um caminho próprio para a superação do neoliberalismo que, por seus objetivos, projetar-se-ia em dimensão estratégica, que na visão dos comunistas significasse a passagem para uma sociedade mais avançada: de transição do capitalismo ao socialismo.

(veja a íntegra da resolução em: "http://www.vermelho.org.br/pcdob/11congresso/").

EDIÇÃO 80, AGO/SET, 2005, PÁGINAS 10, 11