Cientistas de China, Brasil e EUA debatem mudanças climáticas
A primeira intervenção foi proferida pelo professor doutor Jiang Tong, do Centro Nacional do Clima da China. Ele falou sobre as ações para mitigar os impactos da mudança climática na vida humana. Na China, explicou Tong, cada província trabalha uma estratégia em relação à mudança climática, levando em consideração as diferenças e particularidades das regiões e microrregiões.
Tong acredita que os impactos das mudanças climáticas são provocados pela ação da própria natureza. Em grande medida, porém (em torno de 60 a 70%), as mudanças climáticas são fruto da ação humana através do tempo. O cientista chinês afirmou que as consequências do aquecimento global são praticamente as mesmas nos países em desenvolvimento e nos desenvolvidos. Contudo, entre os países em desenvolvimento, em particular os de menor porte, os impactos tendem a ser maiores.
Jiang Tong defendeu, ainda, que as avaliações a respeito da mudança climática devem se basear em artigos e estudos revisados por outros cientistas para evitar equívocos que desacreditem o trabalho dos pesquisadores da área. Sobre a complexidade da pesquisa científica, contou que seu foco são os recursos hídricos e que, mesmo nesse tema específico, várias pesquisas são desenvolvidas em subgrupos, que analisam questões como quantidade e qualidade da água.
O segundo conferencista a fazer uso da palavra foi o diretor de programas marinhos da Nacional Science Foundation (EUA), Prof. Dr. Bilal Haq, que abordou principalmente o fenômeno conhecido como efeito estufa. Ele situou os presentes sobre o papel do efeito estufa no equilíbrio do planeta e sobre as pesquisas desenvolvidas a respeito.
Haq acredita que os gases de efeito estufa estão aumentando e disse que esse aumento pode ter causas antrópicas (oriundas da ação humana) ou naturais. Afirmou ainda que entre os pesquisadores já há certo consenso no assunto e que as controvérsias maiores estão principalmente sobre quando (e se) desaparecerão completamente as geleiras do planeta.
O cientista abordou ainda os fatores que causam o aquecimento global e adicionou vários exemplos, desde morte de corais até o degelo de geleiras importantes, passando pela elevação do nível e da temperatura dos oceanos. Haq finalizou enfatizando que a comunidade cientifica tem se ocupado em estudar as mudanças climáticas e que muitos cientistas têm investido no estudo dessas questões.
A última intervenção da mesa foi realizada por Carlos Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, coordenador da Rede Brasileira de Pesquisas Climáticas e do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas. Em sua intervenção Nobre explicou que a ciência sempre está evoluindo e buscando respostas para suas questões. Ele defendeu que nos últimos 150 anos o planeta aqueceu 0,2º por década, 50 vezes mais rápido que no período interglacial.
Nobre acredita que a maior incerteza da comunidade científica é não saber qual a trajetória do aquecimento global. Ele defendeu uma maior integração da ciência com a sociedade. “O cientista não pode se furtar a esse encontro com a sociedade e deve levar sempre em conta o seu objetivo principal: a busca da verdade científica.”
Teorias divergentes marcam segundo momento do debate
Coordenada pelo ex-deputado federal Aldo Arantes, a segunda mesa do Seminário aprofundou o debate sobre os fundamentos científicos das mudanças climáticas. A primeira intervenção foi proferida pelo professor Luiz Carlos Molion, membro do grupo gestor da Comissão de Climatologia da Organização Meteorológica Mundial, representando a América do Sul.
Defensor da corrente teórica conhecida como “cética” – por descrer dos modelos que propugnam a existência do aquecimento global –, Molion afirmou que as variações do clima são naturais e que o CO² não interfere no clima global. “O carbono emitido pelo homem é insignificante face às fontes naturais”, enfatizou.
O cientista apresentou cálculos físicos e exemplos para basear sua teoria. Ele disse que as mudanças globais existem e são naturais. Asseverou ainda que, ao contrário do que pregam os cientistas do IPCC (sigla inglesa para Painel Intergovernamental sobre Mudanças do Clima), a Terra está esfriando e não aquecendo. Isso acontece, segundo Molion, devido à perda de atividade do sol e ao resfriamento dos oceanos.
O professor da UFRJ e coordenador do Centro de Estudos Integrados sobre Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, Emilio Lèbre La Rovere, fez a segunda intervenção da tarde. Ele falou sobre os cenários projetados pelo IPCC para o fim do século e assegurou ter havido, na segunda metade do século XX, uma tendência ao aumento de fenômenos catastróficos ligados ao clima.
Referindo-se à palestra anterior, salientou não haver muitas teorias céticas com as quais possua pontos de convergência, e que essas teorias não resistem a uma análise epistemológica. No entanto, como seu antecessor no debate, La Rovere assegurou que existem divergências, mas também convergências. O cientista ressaltou ainda que há uma série de benefícios na luta contra o aquecimento global e inúmeras vantagens a serem auferidas com o cuidado ambiental.
Luis Fernandes, presidente da Finep, identificou conexões históricas entre a revolução industrial e a questão ambiental. Ele defendeu o livre debate para o avanço do conhecimento e disse que o grande desafio do método científico é sua possibilidade de autonegação. Referindo-se também ao primeiro debatedor, Luiz Carlos Molion, afirmou que há mais divergências entre as teorias céticas do que dos céticos com o IPCC.
Em sua intervenção Fernandes comentou a crença, corrente entre os cientistas ditos “céticos”, no “mito” do aquecimento global como uma invenção dos países ricos para tolher o desenvolvimento das nações pobres. “Seria uma espécie de conspiração entre os países e os cientistas do IPCC”, brincou. Para ele, contudo, esse discurso não leva em consideração os tratados políticos estabelecidos a partir da ECO Rio 92, que firmaram o princípio das “responsabilidades comuns, mas diferenciadas”. Tal assertiva reflete o entendimento comum de que deve caber aos países desenvolvidos a responsabilidade principal pelo combate ao aquecimento global. Nesse contexto político, em que os países ricos são pressionados a assumir a parte central dos esforços antiaquecimento, “o que interessa a eles é exatamente questionar as teorias do aquecimento, reforçando as correntes céticas, e não o contrário”, garantiu Fernandes.
O presidente da Finep reforçou, contudo, não ser possível aceitar que a justa preocupação com o desenvolvimento sustentável e o meio ambiente seja manipulada para negar o direito ao desenvolvimento por países que foram subjugadas historicamente.
Aquecimento global e políticas públicas
A última atividade do dia abordou a questão das políticas públicas relacionadas às mudanças do clima. A mesa foi coordenada por Nilmário Miranda, presidente da Fundação Perseu Abramo, que procurou avaliar o programa brasileiro de combate e enfrentamento às mudanças climáticas, além de analisar metas e ações dos órgãos participantes.
Luiz Pinguelli Rosa, do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, foi o primeiro expositor e começou sua intervenção fazendo referência à apresentação de Luiz Carlos Molion. Ele defendeu que o debate é interessante e que a posição de Molion não pode ser desconsiderada. Mas ponderou, por outro lado, que as teorias céticas não podem servir à desarticulação das políticas públicas atualmente implementadas.
Pinguelli Rosa ponderou também que há muita política envolvida na discussão sobre o papel do CO² no aquecimento global. Lembrou que o Brasil propôs a criação de um fundo de desenvolvimento limpo, o qual — por pressão política e forte oposição dos Estados Unidos — não foi aprovado.
Ele defendeu que deve haver políticas públicas e medidas restritivas, além de forte intervenção da política de mudança climática em âmbito nacional e internacional, para dar resposta às questões relativas à mudança climática. Pinguelli finalizou afirmando que, apesar de eventuais erros, o Brasil está no caminho certo no que se refere à condução política do setor.
Miguel Rosseto, da empresa Petrobras Biocombustível, dissertou sobre o papel dos biocombustíveis para a sustentabilidade. Ele ressaltou que o país tem padrões diferenciados de consumo energético e defendeu o conceito de “responsabilidades comuns, mas diferenciadas” como condição essencial para o debate do tema.
Afirmou que o princípio da precaução exige atitude responsável e lúcida na contenção da emissão de gases do efeito estufa, e expôs algumas iniciativas que podem ser incentivadas. Como exemplo citou o uso de tecnologia na exploração da cana-de-açúcar, responsável por um aumento de produtividade da ordem de 40%.
Rosseto argumentou que o mundo entrou num século de transição com condições tecnológicas para ampliar e diversificar sua matriz energética. Para ele, o país precisa aproveitar o momento fazendo com que os recursos financiem o que se pretende para o futuro. “Há um equilíbrio a ser construído, baseado no direito à qualidade de vida por parte de todas as nações”, concluiu.
O gerente de mudanças climáticas da Secretaria do Meio Ambiente do Rio de Janeiro, Nelson Moreira Franco, começou sua intervenção falando dos compromissos relacionados ao legado de megaeventos como a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Face ao desafio de realizar esse eventos, ele defendeu a adoção, pelo Brasil, de metas para os próximos 20 anos, e destacou a importância de incentivos legais para ações ambientais e de combate ao desmatamento.
Franco relatou investimentos e metas para coleta seletiva de lixo, transporte público, reflorestamento, recuperação e ampliação da cobertura vegetal e adaptação às mudanças climáticas, enfatizando a sinergia que deve ser buscada entre pesquisa científica, investimento em defesa civil e treinamento e capacitação da população.
O cenário de combustíveis para as próximas décadas foi o foco da apresentação de Alan Kardec Duailibe, diretor da Agencia Nacional do Petróleo. Segundo Duailibe, o petróleo continuará sendo a principal fonte de energia nos próximos anos e o Brasil permanecerá como ator central na seara dos biocombustíveis. O executivo da ANP acredita que, mesmo com a forte oposição ideológica, o uso dos biocombustíveis continuará crescendo, devendo o país preocupar-se com a elaboração e aprovação de nova legislação para o setor.
Último palestrante da noite, Marcos Aurélio Vasconcelos de Freitas, da Rede Brasileira de Pesquisas das Mudanças Climáticas, defendeu a existência de avanços nas políticas de mitigação. Ele afirmou que, malgrado a existência de incertezas com relação aos eventos futuros, é preciso estar preparado para as mudanças climáticas, estimulando os governantes a serem mais incisivos em políticas de mitigação e, sobretudo, de adaptação nas regiões em expansão.
O Seminário Internacional segue por todo o dia de hoje. Pela manhã terá lugar nova mesa sobre políticas públicas. À tarde ocorrem momentos de debate sobre “políticas governamentais sobre as mudanças climáticas – COP 16” e “mudanças climáticas sob a ótica dos movimentos sociais”. No final da tarde acontece o encerramento do evento, com coquetel de lançamento e apresentação da primeira diretoria do Instituto Nacional de Pesquisas e Defesa do Meio Ambiente – Inma.
Atualizada às 16:00 h para o acréscimo de informações.