Vinicius de Moraes nasceu em 19 de outubro de 1913, na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Filho de Lydia Cruz de Moraes e Clodoaldo Pereira da Silva Moraes, Vinicius foi o segundo de quatro irmãos – Lygia, Letícia e Helius completam a família.

  Em 1917, Vinicius começa o ensino primário na Escola Afrânio Peixoto. Em 1924, ingressa no ensino secundário no Colégio Santo Inácio, de onde sai em 1929 com o diploma de Bacharel em Letras.

  Em 1928, com os irmãos Paulo e Haroldo Tapajós, compõe suas duas primeiras canções, “Loura ou Morena” e “Canção da Noite”, que alcançam grande sucesso.

  Na Faculdade de Direito da Rua do Catete, onde ingressa em 1930, Vinicius irá conhecer aqueles que serão os grandes incentivadores da primeira fase de sua poesia, marcada por um forte sentimento religioso e metafísico: Otávio de Faria, San Thiago Dantas, Hélio Viana, Plínio Doyle, entre outros – todos ligados à corrente católica da literatura de então. Alguns não escondiam sua simpatia pelo integralismo, versão brasileira do movimento fascista internacional.

  Os primeiros livros de Vinicius saem em rápida sucessão, e o alçam logo à categoria dos mais importantes poetas brasileiros. Em 1933, ano em que se forma em Direito, publica “O Caminho para a Distância”. Em 1935, com o segundo livro, “Forma e Exegese”, vence o Prêmio Nacional de Literatura Felipe d’Oliveira. Em 1936 publica, em forma de separata, o poema “Ariana, a mulher”, e trabalha por algum tempo no departamento de Censura Cinematográfica, como representante do Ministério da Educação. Aí se consolida o seu amor pelo cinema. Nesse mesmo ano conhece Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade, que seriam seus amigos por toda a vida.

  Em 1938, ano de publicação do livro “Novos Poemas”, Vinicius é agraciado com uma bolsa do Conselho Britânico para estudar língua e literatura inglesas na Universidade de Oxford. Permanecerá na Inglaterra até o final de 1939, quando se inicia a Segunda Guerra Mundial.

  De volta ao Brasil, trabalha como jornalista e crítico cinematográfico, antes de ingressar na carreira diplomática, por concurso público, em 1943, mesmo ano de publicação de mais um livro, “Cinco Elegias”.

  Em 1942, acompanhando o escritor americano e militante socialista Waldo Frank, Vinicius faz uma grande viagem pelo interior do Brasil. Essa viagem acarretará uma guinada no seu pensamento estético, social e político. Dirá Vinicius mais tarde: “Comecei a viagem como um homem de direita e terminei como um homem de esquerda. Era um mundo novo que se abria. (…) No plano político, principalmente. Comecei a ver as coisas. Vi a miséria do Nordeste, os mocambos do Recife, as palafitas do Amazonas, as casas de habitação coletiva da Bahia, a lama, a podridão, o abandono. Aquilo me escandalizou, precipitou uma tomada de consciência.”

  Em 1946, Vinicius será designado para o seu primeiro posto diplomático no exterior, atuando como vice-cônsul em Los Angeles, nos Estados Unidos. Muitos outros postos e viagens virão. Em 1953, Vinícius será nomeado Segundo Secretário da Embaixada Brasileira em Paris, cargo que exercerá até 1957, quando será transferido para a Delegação Brasileira junto à Unesco. No final de 57, será removido para a Embaixada Brasileira em Montevidéu, onde permanecerá lotado até 1960. Em 63, retomará o seu posto junto à Delegação da Unesco, em Paris, retornando definitivamente ao Brasil em 1964.

  Ainda em 1946 Vinicius publica, em edição de luxo, aquele que é considerado, inclusive por ele mesmo, um dos seus melhores livros, “Poemas, Sonetos e Baladas”, onde alcança uma síntese das várias vertentes de sua poesia e se aproxima definitivamente de uma posição estética mais voltada para o cotidiano e a vida comum. Nesse livro se encontram alguns dos seus poemas mais conhecidos, como “O Dia da Criação”, “Soneto de Fidelidade”, “Balada do Mangue”, “Poema de Natal”, “Soneto de Separação”, entre outros.

  Em 1949, João Cabral de Melo Neto produz, em sua prensa manual em Barcelona, uma edição de cinquenta exemplares do poema “Pátria Minha”.

  Os seguintes livros de autoria de Vinicius de Moraes foram publicados a partir de 1950: “Antologia Poética” (1954); “Livro de Sonetos” (1957); “Novos Poemas II” (1959); “Para Viver um Grande Amor – crônicas e poemas” (1962); “Para uma Menina com uma Flor – crônicas” (1966); “O Mergulhador” (1968); “A Arca de Noé – poemas infantis” (1970); “Poesia Completa e Prosa” (organização de Alexei Bueno – 1998).

  Vinicius escreveu ainda as peças teatrais “Orfeu da Conceição” (1956), “As Feras” (1961), “Procura-se uma Rosa” (1961 – em colaboração com Pedro Bloch e Gláucio Gil) e “Cordélia e o Peregrino” (1965).

  Em 1956, Vinicius lançará aquele que é seguramente um dos mais contundentes poemas políticos já escritos em nossa língua, “O Operário em Construção”.

  Ainda em 1956, durante a montagem de sua peça “Orfeu da Conceição”, Vinicius começará a trabalhar com um músico ainda desconhecido do grande público: Antonio Carlos Jobim. Nasce aí uma das maiores parcerias da música brasileira – e, não tenho medo de dizer, da música internacional.

  Da parceria com Tom Jobim, cito apenas alguns clássicos, que já formam parte da memória artística e sentimental do povo brasileiro: “Eu sei que vou te amar”; “Se todos fossem iguais a você”; “Insensatez”; “Água de beber”; “A felicidade”; “Chega de Saudade”; “Caminho de Pedra”; “Eu não existo sem você”; “O morro não tem vez”; “Derradeira primavera”; e, claro, a “Garota de Ipanema”, uma das músicas mais gravadas em todo o mundo.

  Em 1958, os dois parceiros gravam um disco só com músicas suas, interpretadas por Elizeth Cardoso com acompanhamento de João Gilberto. Os versos arrojados de Vinicius, os arranjos inovadores de Tom Jobim e a batida inconfundível do violão de João Gilberto marcam o nascimento da Bossa Nova, que em poucos anos conquistará o mercado internacional e se estabelecerá como um dos movimentos musicais mais influentes do século passado – ainda inovadora e influente no início deste.

  Mas Vinicius não era de se estabilizar, de se contentar com aquilo que já foi alcançado, e logo estará participando, com o próprio Jobim e com outros parceiros, da abertura de novos caminhos para a música brasileira. Atendendo a convite do Presidente Juscelino Kubitschek, assina, com Jobim, a “Sinfonia da Alvorada”, épico musical que homenageia a nova Capital e os trabalhadores que a construíram.

  Com Baden Powell, compõe a série extraordinária dos afro-sambas, que incluem, entre outras, as músicas “Berimbau”, “Consolação”, “Canto de Ossanha”, “Tristeza e Solidão”, “Canto de Iemanjá”, “Canto de Xangô” – todos clássicos indiscutíveis da nossa música, e que marcam um dos momentos mais altos da valorização da cultura de origem africana em nosso país. Além dos afro-sambas, Baden e Vinicius nos legaram muitas outras obras-primas inesquecíveis.

  Carlos Lyra completa o trio dos mais importantes parceiros de Vinicius nesse tempo. Mais uma vez, vêm à luz uma sequência estonteante de composições de altíssima qualidade: “Você e eu”, “Minha namorada”, “Samba do carioca”, “Pau-de-arara”, “Sabe você”, “Primavera”, para citar apenas algumas. Com Carlos Lyra, ativo militante do CPC – o Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes – Vinicius compõe, em 1963, o “Hino da UNE”, marcando para sempre sua presença nas lutas da juventude brasileira.

  Outras canções viriam, com uma lista impressionante de parceiros que vai de Pixinguinha e Ary Barroso a Edu Lobo e Francis Hime, de Garoto e Adoniran Barbosa a Moacir Santos e Chico Buarque. Sem contar as músicas que compôs sozinho, letra e música de Vinicius de Moraes: “Valsa de Eurídice”, “Serenata do Adeus”, “Pela luz dos olhos teus”, entre outras.

  Em 1969, Vinicius seria diretamente atingido pela truculência da ditadura militar, que, por um ato infame determinado pelo ditador de plantão – cujo nome não merece ser lembrado nesta cerimônia –, o exonerou do Itamaraty. Essa infâmia só seria reparada 41 anos depois, por iniciativa do Chanceler Celso Amorim e do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, por meio da Lei nº 12.265, de 21 de junho de 2010, promoveram Vinicius de Moraes, post mortem, ao cargo de Ministro de Primeira Classe da Carreira de Diplomata do Itamaraty. Cito trecho da Exposição de Motivos que acompanhou o Projeto de Lei:

  “Pode-se afirmar, sem qualquer dúvida, que o extraordinário trabalho artístico desenvolvido por Vinícius de Moraes durante décadas fez dele, mais do que divulgador ímpar do Brasil, um verdadeiro embaixador da cultura brasileira. Nada mais justo do que prestar-lhe o devido reconhecimento, elevando-o, também como servidor público e diplomata, à posição que merece ocupar.”

  Em 1970, Vinicius conhece o seu último grande parceiro, aquele que o acompanharia até o final da vida, e que dividiria com ele o enorme sucesso popular que o poeta alcançará nos seus dez últimos anos: Antonio Pecci Filho, o Toquinho. Da vasta obra da dupla, cito apenas algumas, sem pretensão de abarcar as mais emblemáticas: “Tarde em Itapoã”, “A terra prometida”, “O filho que eu quero ter”, “Aquarela”, “A vida tem sempre razão”, “São demais os perigos desta vida”, “O velho e a flor”, “Como dizia o poeta”, “Carta ao Tom 74”, “Testamento”. Paro por aqui.

  Vinicius morreu em 9 de julho de 1980, três meses antes de completar 67 anos de idade. Poucos viveram tão intensamente o tempo que lhes foi dado.

  Hoje, por ocasião do seu centenário, homenageamos o autor de tantos versos que serão guardados para sempre no coração do povo brasileiro, como um dos tesouros da língua portuguesa.

  Homenageamos o filho de dona Lydia e seu Clodoaldo.

  Homenageamos o marido de Beatriz, Regina, Lila, Maria Lúcia, Nelita, Cristina, Gesse, Marta e Gilda.

  Homenageamos o pai de Susana, Pedro, Georgiana, Luciana e Maria.

  Homenageamos o amigo de tantos amigos, o parceiro de tantos parceiros, o irmão de todos nós.

  Ao longo da sua obra, Vinicius nos forneceu algumas definições exemplares de si mesmo, e é com elas que encerro este pronunciamento:

  “Este é o homem da mulher, o homem da carne, o homem da terra”

  “Amo na vida as coisas que têm sumo
  E oferecem matéria onde pegar”

  “Poeta e diplomata. O branco mais preto do Brasil, na linha direta de Xangô.”

  Acrescento: um legítimo filho do povo brasileiro.

  Saravá, Vinicius de Moraes. Muito obrigado.