FST 2014: Assembleia dos Movimentos convoca mobilização para 1º de abril
O Fórum Social Temático 2014 terminou na tarde do sábado (25) com sua tradicional Assembleia dos Movimentos Sociais e o lançamento estadual da Campanha pelo Plebiscito da Constituinte Exclusiva para a Reforma Política. Na ocasião, os movimentos deliberaram por convocar uma agenda de mobilização nacional no dia 1º de abril, que tem entre suas reivindicações uma reforma política. A data foi escolhida por marcar os 50 anos do golpe civil-militar de 1964, quando “descomemorações” serão realizadas por todo o país.
No contexto das manifestações de junho, dentre os pactos que a presidenta Dilma Rousseff fez os manifestantes, houve a proposta de uma assembleia constituinte exclusiva para tratar da reforma política, iniciativa que não avançou pela resistência parlamentar. Agora, os movimentos sociais e sindicais aderiram à pauta e querem pressionar o Congresso a implementar a constituinte.
Para exemplificar a falta de representação, vários representantes dos movimentos lembraram os números da sub-representação do Congresso Brasileiro. Edson França, da Unegro, mencionou o fato do parlamento ser composto basicamente por homens brancos, quando as mulheres ocupam apenas 9% das vagas do Congresso, os negros têm 8% de afirmação no Congresso e a juventude representam 3% das vagas, ainda que mulheres e negros sejam a maioria da população brasileira.
Aldo Arantes representou a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) no lançamento da Campanha pelo Plebiscito da Constituinte Exclusiva do Sistema Político, quando avaliou que entre os principais entraves para um sistema político mais democrático está o financiamento privado de campanhas eleitorais.
Segundo Arantes, as duas propostas, o plebiscito e o projeto de iniciativa popular, não são antagônicas. Para ele, o plebiscito a ser realizado entre 1º. e 7 de setembro, se junta ao Projeto de Iniciativa Popular para Reforma Política, como estratégias para conscientizar a população sobre esse tema. A questão para o plebiscito popular será: “Você é a favor de uma constituinte exclusiva e soberana sobre o sistema político?”
“Há uma sintonia completa entre o plebiscito pela reforma política e o Projeto de Lei proposto pela coalizão. O plebiscito propõe elevação de consciência política. A proposta da coalizão é mais imediata, uma resposta urgente às indignações populares com a situação da política”, destaca.
Para o advogado, o Brasil vive um momento delicado. Diante das manifestações de junho e da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que considera inconstitucional o financiamento privado de campanha, os movimentos populares precisam ter uma resposta à sociedade. A ação do STF cria um vazio político e obriga o Congresso Nacional a legislar sobre o tema. “Precisamos aproveitar a oportunidade e usar a favor do povo”, afirma Aldo.
Confira a cartilha “Plebiscito Por Um Novo Sistema Político” (CLIQUE PARA DOWNLOAD)
O documento oficial da assembleia, intitulado “Declaração da assembleia dos movimentos sociais”, reafirma o compromisso histórico com a construção de um outro mundo possível e com a definição de lutas comuns contra o capitalismo, o patriarcado, o machismo, o racismo e todo tipo de injustiça.
Leia a íntegra da Declaração da Assembleia dos Movimentos Sociais:
FÓRUM SOCIAL TEMÁTICO: CRISE CAPITALISTA, DEMOCRACIA, JUSTIÇA SOCIAL E AMBIENTAL
DECLARAÇÃO DA ASSEMBLEIA DOS MOVIMENTOS SOCIAIS
1. Os diversos movimentos sociais reunidos no Fórum Social Temático, realizado na cidade de Porto Alegre nos dias 21 a 26 de janeiro de 2014, renovam o seu compromisso histórico com a construção de um outro mundo possível e com a definição coletiva de lutas comuns contra o capitalismo, o patriarcado, o machismo, o racismo e todo tipo de injustiça e discriminação.
2. Em todos os nossos documentos, afirmamos que o modelo capitalista serve tão somente para enriquecer uma pequena elite – tanto nos países do Norte como nos do Sul – em detrimento da grande maioria da população. A crise do capitalismo continua forte e retirando direitos sociais. E a evidência de que esse sistema conduz a humanidade em direção a um precipício é cada vez mais percebida por milhões e milhões de pessoas em todos os continentes. É hora de afirmar que os povos não devem pagar pela crise e que não há saída dentro dos marcos do capitalismo.
3. A defesa da soberania, da autodeterminação dos povos, dos bens comuns, da justiça social, econômica, ambiental e de gênero, e o combate a todo tipo de discriminação, são a chave para o enfrentamento e a superação da crise, fortalecendo o protagonismo popular e um Estado cada vez mais democrático, livre das corporações e a serviço dos povos.
4. Lutamos contra as transnacionais porque elas sustentam o sistema capitalista, privatizam a vida, os serviços públicos e os bens comuns, como a água, o ar, a terra, as sementes e os recursos minerais. Elas também financiam as guerras através da contratação de empresas militares e mercenárias e da produção de armamentos. Reproduzem práticas extrativistas insustentáveis para a vida, tomam de assalto nossas terras e desenvolvem alimentos transgênicos que tiram dos povos o direito à alimentação saudável e eliminam a biodiversidade.
5. Comprometidos com nossas lutas históricas, defendemos a valorização do trabalho e o combate ao desemprego e a toda forma de flexibilização de direitos. Defendemos a reforma agrária como caminho para dar impulso à agricultura familiar, camponesa e indígena; ela é passo central para alcançarmos a soberania alimentar. Reafirmamos nosso compromisso com a luta pela reforma urbana como instrumento fundamental na construção de cidades justas e com espaços participativos e democráticos.
6. Apontamos a economia solidária, que se concretiza no aprofundamento das cadeias produtivas solidárias, como vital para democratizar a economia.
7. As forças progressistas avançam na América Latina, impulsionando conquistas democráticas. Essa onda transformadora atrai os olhos de todo o mundo. O imperialismo tenta a todo o momento desestabilizar o nosso continente com diferentes intervenções. Como exemplo, citamos as recentes espionagens patrocinadas pelos EUA, as quais repudiamos. Solidarizamo-nos com a luta pela paz do povo colombiano e nos comprometemos em realizar ações pela libertação dos presos políticos deste País. Por isso, o grande desafio colocado para os movimentos sociais é consolidar as conquistas e aprofundar as mudanças, fortalecendo uma integração solidária na América Latina e entre todos os povos do mundo.
8. Exigimos políticas que protejam as produções locais, dignifiquem as práticas no campo e conservem os valores ancestrais da vida. Por isso, reivindicamos a aceleração do reconhecimento dos territórios ocupados por quilombolas e povos tradicionais.
9. Denunciamos os tratados neoliberais de livre comércio e exigimos a livre circulação de seres humanos.
10. Seguimos nos mobilizando pelo cancelamento incondicional da dívida pública de todos os países do Sul. Denunciamos, igualmente, nos países do Norte, a utilização da dívida pública para impor aos povos políticas injustas e antissociais.
11. O aquecimento global é resultado do sistema capitalista de produção, distribuição e consumo. As transnacionais, as instituições financeiras internacionais – e os governos a seu serviço – não querem reduzir suas emissões de gases de efeito estufa. Convocamos os povos de todos os países a participar da COP 20 (Conferência sobre Mudanças Climáticas a ser realizada em novembro de 2014, no Peru), para que manifestemos nossa indignação diante da falta de compromisso das nações do Norte com as reduções de emissão de gases.
12. Denunciamos o “capitalismo verde” e rechaçamos as falsas soluções à crise climática, como os agrocombustíveis, os transgênicos e os mecanismos de mercado de carbono, como o REDD. As falsas soluções iludem as populações empobrecidas com a ideia de “progresso” enquanto privatizam e mercantilizam os bosques e territórios onde elas vivem há milhares de anos.
13. Defendemos a soberania alimentar e o acordo alcançado na Cúpula dos Povos Contra as Mudanças Climáticas e pelos Direitos da Mãe Terra, realizada em Cochabamba, onde verdadeiras alternativas à crise climática foram construídas com movimentos e organizações sociais e populares de todo o mundo.
14. Denunciamos a violência contra a mulher – sobretudo contra a mulher negra – exercida regularmente como ferramenta de controle de suas vidas e de seus corpos. Denunciamos o aumento da superexploração de seu trabalho. Defendemos um estado laico para avançarmos no debate sobre os direitos sexuais e reprodutivos. Seguimos lutando pela plena emancipação da mulher, sendo esta emancipação econômica, social, política e sexual. Lutamos contra o tráfico de mulheres e de crianças e o preconceito racial. Defendemos a diversidade sexual, o direito à autodeterminação de gênero e lutamos contra a homofobia, lesbofobia, transfobia e a violência sexista.
15. Defendemos os direitos humanos das populações vítimas de racismo, povos indígenas, negros e quilombolas.
16. O avanço das guerras civis e genocídios exige um esforço dos movimentos sociais para estabelecermos uma cultura de paz e o combate à intolerância religiosa.
17. Lutamos pela paz e contra a guerra, o colonialismo, as ocupações e a militarização de nossos territórios. As potências imperialistas utilizam bases militares estrangeiras para fomentar conflitos, controlar e saquear os recursos naturais e promover ditaduras em vários países. Denunciamos o falso discurso de defesa dos Direitos Humanos, que muitas vezes justifica as ocupações militares. Rechaçamos o processo de neocolonização e militarização sob o qual vive o continente africano. Nossa luta também é pela eliminação de todas as armas nucleares e contra a OTAN.
18. Lutamos pelo fortalecimento da Educação, da Ciência e da tecnologia pública a serviço dos povos e da construção de um outro mundo, assim como a defesa dos saberes tradicionais. Consideramos que a Educação é fundamental para soberania dos povos. Nesse sentido, denunciamos a sua mercantilização e a entrada do capital estrangeiro.
19. Intensifiquemos a luta contra a repressão dos povos e a criminalização dos protestos e dos movimentos sociais pelo mundo afora. Fortaleçamos ferramentas de solidariedade entre os povos, como o movimento global de boicote, desinvestimentos e sanções contra Israel e a imediata criação de um estado livre palestino.
20. A juventude de todo o mundo levantou-se na construção de alternativas ao capitalismo, contra as formas de repressão e exigindo liberdade de expressão. Nesse sentido, afirmamos a necessidade de fortalecer o protagonismo da juventude, a criação de mais políticas públicas e de ampliação da democracia para que a juventude participe plenamente.
21. Cada uma destas lutas implica uma batalha de ideias, na qual não poderemosavançar sem democratizar a Comunicação. Nesse sentido, consideramos como estratégica a derrubada do monopólio dos meios de comunicação, por meio de regulamentações que provoquem mais acesso e controle por parte do povo.
22. Os movimentos sociais presentes no Fórum Social Temático convocam os povosdo mundo para ocupar as ruas no dia Primeiro de Abril, data em que protestaremos contra o capitalismo, a crise do mundo, pela soberania e autonomia dos povos, contra a guerra e pela paz.
Porto Alegre, 25 de janeiro de 2014.