Camaradas! Penso que não tem sentido analisarmos aqui, detalhadamente, as resoluções aprovadas pela XIV Conferência de nosso Partido(1). Isto exigiria muito tempo e não há necessidade de fazê-lo. Penso que poderíamos nos limitar a assinalar as linhas fundamentais que marcam estas resoluções. Isto nos daria a possibilidade de salientar as conclusões principais das resoluções aprovadas. E isto, por sua vez, facilitaria o estudo destas resoluções posteriormente.

Se examinarmos as resoluções constataremos que poderíamos reduzir as diferentes questões nelas tratadas a seis grupos principais de questões. O primeiro grupo de questões são as questões relativas à situação internacional. O segundo grupo de questões são as questões relativas às tarefas imediatas dos Partidos Comunistas dos países capitalistas. O terceiro grupo de questões são as questões que dizem respeito às tarefas imediatas dos elementos comunistas nos países coloniais e dependentes. O quarto grupo de questões são as questões relativas aos destinos do socialismo em nosso país em consequência da atual situação internacional. O quinto grupo de questões são as questões que dizem respeito à nossa política partidária no campo e às tarefas da direção partidária nas novas condições. E, finalmente, o sexto grupo são as questões que dizem respeito ao nervo principal de toda a nossa indústria e, particularmente, à indústria metalúrgica.

                                                               I – A Situação Internacional

O que há de novo e particular na situação internacional que determina no fundamental, o caráter do momento que atravessamos?

O elemento novo, que se revelou durante o último período e que apôs sua marca sobre a situação internacional, consiste em que teve início na Europa o refluxo da revolução, teve início uma certa calmaria, o que denominamos estabilização temporária do capitalismo, ao mesmo tempo em que se verifica a intensificação do desenvolvimento econômico e do poder político da União Soviética.

O que é o refluxo da revolução, a calmaria? Não é o princípio do fim da revolução mundial, o princípio da liquidação da revolução proletária mundial? Lênin afirmou que após à vitória do proletariado iniciou-se em nosso país uma nova época, a época da revolução mundial, uma época cheia de conflitos e de guerras, de ofensivas e recuos, de vitórias e derrotas, época que conduz à vitória do proletariado nos principais países do capitalismo. Se teve início o refluxo da revolução na Europa, isto não significa que a tese de Lênin sobre a nova época, sobre a época da revolução mundial, perde por isso mesmo a sua fôrça? Isso não significa que por isso mesmo foi abolida a revolução proletária no Ocidente?

Não, não significa.

A época da revolução mundial é uma nova etapa da revolução, todo um período estratégico que abrange toda uma série de anos e, talvez, uma série de dezenas de anos. No decorrer deste período podem e devem haver fluxos e refluxos da revolução.

A nossa revolução atravessou, no seu desenvolvimento, duas etapas, dois períodos estratégicos e ingressou, após Outubro, na terceira etapa, no terceiro período estratégico. A primeira etapa (1900—1917) durou mais de 15 anos. Teve por objetivo a derrocada do tsarismo, a vitória da revolução democrático-burguesa. No decorrer deste período tivemos toda uma série de fluxos e refluxos da revolução. Tivemos um fluxo em 1905. Este fluxo terminou por uma derrota temporária da revolução. Tivemos depois um refluxo que durou toda uma série de anos (1907—1912). Tivemos depois um novo fluxo que teve início com os acontecimentos do Lena (1912) e que foi substituído posteriormente por um novo refluxo por ocasião da guerra. O ano de 1917 (fevereiro) inaugurou um novo fluxo coroado pela vitória do povo sobre o tsarismo, pela vitória da revolução democrático-burguesa. Os liquidacionistas afirmavam, após cada um desses refluxos, que a revolução terminara. A revolução, porém, alcançou a vitória em fevereiro de 1917, após haver atravessado uma série de fluxos e refluxos.

A segunda etapa da revolução teve início em fevereiro de 1917. Tinha por objetivo a saída da guerra imperialista, a derrocada da burguesia e a vitória da ditadura do proletariado. Esta etapa ou este período estratégico se prolongou ao todo por oito meses. Mas foram oito meses da mais profunda crise revolucionária, quando a guerra e a ruína impulsionaram a revolução, acelerando extraordinariamente a sua marcha. É precisamente por isto que estes oito meses de crise revolucionária podem e devem valer no mínimo por oito anos de desenvolvimento constitucional comum. Este período estratégico, assim como o período estratégico precedente, não é caracterizado por um ascenso contínuo da revolução segundo uma linha reta ascendente, como imaginam habitualmente os filisteus da revolução, mas pela existência de momentos de fluxos e refluxos. Tivemos neste período um grandioso fluxo do movimento revolucionário nos dias da demonstração de julho. Tivemos, posteriormente, um refluxo da revolução após a derrota dos bolcheviques em julho. Este refluxo foi substituído por um novo fluxo imediatamente após a intentona de Kornilov, fluxo que terminou pela vitória da revolução de Outubro. Os liquidacionistas deste período tagarelaram sobre a liquidação total da revolução após à derrota de julho. A revolução, porém, passando por uma série de provas e de refluxos, foi coroada, como se sabe, pela vitória da ditadura proletária.

Após a vitória de Outubro ingressamos no terceiro período estratégico, na terceira etapa da revolução que tem por objetivo a superação da burguesia em escala mundial. Quanto tempo durará este período — é difícil dizê-lo. Está fora de dúvida, em todo caso, que será prolongado, como também não há dúvida de que terá os seus fluxos e os seus refluxos. O movimento revolucionário mundial ingressou no momento atual na fase de refluxo da revolução, sendo que este refluxo, por uma série de causas, sobre as quais falarei mais abaixo deve ser substituído por um fluxo que pode terminar pela vitória do proletariado, mas também pode não terminar pela vitória, mas ser substituído por um novo refluxo que, por sua vez, deve ser substituído por um novo fluxo da revolução. Os liquidacionistas do período que atravessamos afirmam que a calmaria que sobreveio é o fim da revolução mundial. Mas se enganam, tanto quanto se enganaram anteriormente, no período da primeira e da segunda etapas da nossa revolução, quando consideravam como derrota da revolução cada refluxo do movimento revolucionário.

Estas são as vacilações que se manifestam dentro de cada etapa da revolução e em cada período estratégico.

O que indicam estas vacilações? Indicam que a tese de Lênin sobre a nova época da revolução mundial perdeu ou pode perder a sua significação? Evidentemente não! Indicam apenas que a revolução se desenvolve habitualmente não segundo uma linha diretamente ascendente, na forma de um crescimento ininterrupto do ascenso, mas por meio de ziguezagues, por meio dos avanços e dos recuos, por meio dos fluxos e dos refluxos que, no processo de seu desenvolvimento, temperam as fôrças da revolução e preparam a sua vitória definitiva.

Tal é o sentido histórico do período atual de refluxo da revolução, o sentido histórico da calmaria que atravessamos.

Mas o refluxo constitui apenas um dos aspectos do problema. O outro aspecto do problema está em que, ao lado do refluxo da revolução na Europa, constatamos o crescimento tempestuoso do desenvolvimento econômico da União Soviética e o aumento do seu poder político. Em outras palavras, temos não só a estabilização do capitalismo. Temos, ao mesmo tempo, a estabilização do regime soviético. Temos, dessa forma, duas estabilizações: a estabilização temporária do capitalismo e a estabilização do regime soviético. A conquista, por algum tempo, do equilíbrio entre estas duas estabilizações — tal é o traço característico da situação internacional que atravessamos.

Mas e que é a estabilização? Será uma depressão, e, se a estabilização é uma depressão, pode-se aplicá-la ao regime soviético? Não. A estabilização não é uma depressão. A estabilização é o fortalecimento de uma determinada situação e o seu desenvolvimento ulterior. O capitalismo mundial não apenas se fortaleceu na base de uma dada situação. Avança e se desenvolve, ampliando a esfera de sua influência e multiplicando as suas riquezas. Não é verdade que o capitalismo não possa se desenvolver, que a teoria da decomposição do capitalismo, apresentada por Lênin na sua obra «O Imperialismo»(2), excluiria o desenvolvimento do capitalismo. Lênin demonstrou cabalmente, no seu livro sobre «O Imperialismo», que o crescimento do capitalismo não exclui, mas pressupõe e prepara a decomposição progressiva do capitalismo.

Temos, dessa forma, duas estabilizações. Num polo o capitalismo se estabiliza, consolidando a situação alcançada e continuando a se desenvolver. No outro estabiliza-se o regime soviético, consolidando as posições conquistadas e avançando no sentido da vitória.

Toda a essência do problema reside em se saber quem vencerá.

Por que uma estabilização marcha em sentido paralelo à outra, qual é a origem destes dois polos? Porque já não existe mais no mundo um capitalismo único que abranja tudo. Porque o mundo se dividiu em dois campos — o campo do capitalismo, à cuja frente se encontra o capital anglo-americano, e o campo do socialismo, à cuja frente se encontra a União Soviética. Porque a situarão internacional será determinada cada vez mais pela correlação de fôrças entre estes dois campos.

Dessa forma, o elemento característico do momento atual não é só o fato de que o capitalismo e o regime soviético se estabilizaram, mas o fato de que as fôrças destes dois campos avançaram um certo equilíbrio temporário, com alguma vantagem para o capital e, por conseguinte, com alguma desvantagem para o movimento revolucionário, uma vez que a calmaria que sobreveio constitui, em comparação com o ascenso revolucionário, uma inegável desvantagem, embora temporária, para o socialismo.

Qual é a diferença entre estas duas estabilizações? A que conduz uma estabilização e a que conduz a outra estabilização?

A estabilização nas condições do capitalismo, ao fortalecer temporariamente o capital, conduz ao mesmo tempo, obrigatoriamente, ao aguçamento das contradições do capitalismo:

                              a.entre os grupos imperialistas dos diferentes países;
                              b.entre os operários e os capitalistas de cada país;
                              c.entre o imperialismo e os povos de todos os países coloniais.

A estabilização, porém, nas condições do regime soviético conduz ao mesmo tempo, inevitavelmente, ao fortalecimento do regime soviético, à atenuação das contradições e ao melhoramento das relações recíprocas:

                             a. entre o proletariado e o campesinato de nosso país;
                             b.entre o proletariado e os povos coloniais dos países oprimidos;
                             c.entre a ditadura do proletariado e os operários de todos os países.

O problema está em que o capitalismo não pode se desenvolver sem intensificar a exploração da classe operária, sem condenar a maioria dos trabalhadores a uma existência semi-faminta, sem intensificar a opressão dos países coloniais e dependentes, sem conflitos e choques entre os diferentes grupos imperialistas da burguesia mundial, ao passo que o regime soviético e a ditadura do proletariado só podem se desenvolver nas condições de um firme ascenso da situação material e cultural da classe operária, nas condições de um firme melhoramento da situação de todos os trabalhadores do país soviético, nas condições de uma progressiva aproximação e unificação dos operários de todos os países, nas condições da firme união dos povos oprimidos dos países coloniais e dependentes em torno do movimento revolucionário do proletariado.

O caminho do desenvolvimento do capitalismo é o caminho da pauperização e da existência semi-faminta da imensa maioria dos trabalhadores e em que se verifica o suborno por meio do pagamento de salários mais altos a uma insignificante camada destes trabalhadores.

O caminho de desenvolvimento da ditadura do proletariado é, pelo contrário, o caminho de um inflexível ascenso do bem-estar da imensa maioria dos trabalhadores.

É precisamente por isso que o desenvolvimento do capitalismo não pode deixar de dar origem às condições que aguçam as contradições do capitalismo. É precisamente por isso que o capitalismo não tem fôrças para solucionar estas contradições.

É evidente que se não existisse a lei da desigualdade de desenvolvimento capitalista que conduz a conflitos e guerras entre os países capitalistas por causa das colônias; se o capitalismo pudesse se desenvolver sem a exportação de capitais para os países atrasados, para os países de matéria prima barata e de mão de obra barata; se os excessos da acumulação capitalista das «metrópoles» fossem destinados não à exportação de capitais, mas a um sério desenvolvimento da agricultura e melhoria da situação material do campesinato; se, finalmente, esses excessos fossem empregados para o levantamento do nível de vida de toda a massa da classe operária — então não haveria motivo para se falar da intensificação da exploração da classe operária, da Pauperização do campesinato nas condições do capitalismo, da intensificação da opressão nos países coloniais e dependentes e dos conflitos e guerras entre os capitalistas.

Mas então o capitalismo não seria o capitalismo.

Toda a questão está em que o capitalismo não pode se desenvolver sem deixar de aguçar todas estas contradições e sem com isso acumular as condições que facilitam, no final de contas, a queda do capitalismo.

Todo o problema está em que a ditadura do proletariado, pelo contrário, não pode se desenvolver sem criar as condições que elevam o movimento revolucionário de todos os países a um alto grau e que preparam a vitória definitiva do proletariado.

Tal é a diferença entre as duas estabilizações.

Eis porque a estabilização do capitalismo não pode ser nem prolongada nem estável.

Consideremos concretamente o problema da estabilização do capitalismo.

Em que se manifestou concretamente a estabilização do capitalismo?

Em primeiro lugar, no fato de que a América, a Inglaterra e a França conseguiram entrar num acordo temporário sobre os meios e proporções da pilhagem da Alemanha. Por outras palavras, conseguiram um acordo a que chamam de dawesização(3) da Alemanha. Pode-se considerar este acordo algo estável? Não, não se pode. Porque, em primeiro lugar, foi celebrado sem o dono, isto é, sem o povo alemão; em segundo lugar porque este acordo significa um duplo jugo sobre o povo alemão, o jugo da burguesia nacional e o jugo da burguesia estrangeira. Julgar que uma nação tão culta, como a Alemanha, e um proletariado tão culto, como o alemão, concordem em suportar uma canga dupla sem uma série de tentativas sérias de explosão revolucionária — significa acreditar em milagres. Até mesmo um fato tão reacionário em sua essência, como a eleição de Hindenburg para presidente(4) não deixa dúvida de que o acordo temporário da Entente contra a Alemanha não tem consistência e é ridiculamente fraco.

Em segundo lugar, a estabilização do capitalismo se manifestou no fato de que o capital inglês, americano e japonês conseguiram entrar num acordo temporário a respeito do estabelecimento das esferas de influência na China, no mais amplo mercado do capital internacional e a respeito dos meios de sua pilhagem. Pode-se considerar este acordo algo estável?

Não, evidentemente. Em primeiro lugar, pelo fato de que os participantes do acordo lutam e continuarão a lutar entre si até à morte pela sua parte na pilhagem; em segundo lugar, pelo fato de que este acordo se processou nas costas do povo chinês que não quer se submeter nem se submeterá às leis de salteadores estrangeiros. Não é verdade que a intensificação do movimento revolucionário na China atesta que as maquinações dos imperialistas estrangeiros estão condenadas ao fracasso?

Em terceiro lugar, a estabilização do capitalismo se manifestou no fato de que os grupos imperialistas dos países avançados conseguiram temporariamente entrar em acordo relativamente à não interferência reciproca na questão da pilhagem e da opressão de «suas» colônias. Pode-se considerar esse acordo ou essa tentativa de entrar em acordo como algo sólida? Não, não se pode.

Em primeiro lugar pelo fato de que cada um dos grupos imperialistas se esforça e continuará se esforçando por arrebatar para usufruto próprio um pedacinho das colônias alheias; em segundo lugar, pelo fato de que a pressão e a política de opressão posta em prática pelos grupos imperialistas nas colônias só servem para temperar e revolucionar estas colônias, aguçando nas mesmas a crise revolucionária. Os imperialistas tentam «pacificar» a Índia, refrear o Egito, domesticar o Marrocos, amarrar de pés e mãos a Indochina e a Indonésia e lançam mão de todas as espécies de ardis e maquinações. É possível que consigam, a esse respeito, alguns «resultados». Mas não há dúvida de que estas maquinações não são suficientes e não podem dar resultados duradouros.

Em quarto lugar, a estabilização do capitalismo pode se manifestar no fato de que os grupos imperialistas dos países avançados tentam entrar em acordo a respeito de uma frente única contra a União Soviética. Admitamos que consigam chegar a este acordo. Admitamos que possam elaborar algo no gênero de uma frente única, utilizando todas e quaisquer combinações. até os planos forjados em consequência das explosões verificadas em Sofia(5), etc.

Há motivos para se considerar que a conspiração contra o nosso país ou a estabilização neste setor possa ser algo sólida, e possa dar algum resultado? Penso que não há tais motivos. Por que? Em primeiro lugar, porque a ameaça de frente única e a ofensiva unificada dos capitalistas criaria um imenso arco que abrangeria todo o país, em torno do Poder Soviético como nunca antes e que o transformaria em fortaleza inexpugnável em grau ainda maior do que aconteceu, por exemplo, por ocasião da invasão das «quatorze potências».

Lembremo-nos da ameaça do célebre Churchill sobre a invasão das quatorze potências. Sabeis que bastou fazer esta ameaça para que todo o país se unisse em torno do Poder Soviético, contra as aves de rapina imperialistas. Em segundo lugar, porque a campanha contra o país Soviético desatará inevitavelmente toda uma série dos laços revolucionários na retaguarda dos adversários, decompondo e desmoralizando as fileiras do imperialismo. E que estes laços se acumularam nos últimos tempos numa grande quantidade e que não indicam ao imperialismo nada de bom — disto não se pode duvidar. Em terceiro lugar, pelo fato de que o nosso país já não se encontra sozinho porque tem como aliados os operários do Ocidente e os povos oprimidos do Oriente.

Não se pode duvidar de que a guerra contra a União Soviética significará a guerra do imperialismo contra os seus próprios operários e colônias. Não preciso demonstrar que se atacarem o nosso país não nos manteremos de braços cruzados e tomaremos todas as medidas no sentido de encilhar o leão revolucionário em todos os países do mundo. Os dirigentes dos países capitalistas não podem deixar de saber que possuímos alguma experiência a respeito.

Tais são os fatos e considerações que atestam que a estabilização do capitalismo não pode ser sólida e que esta estabilização significa o aparecimento de condições que conduzem à derrota do capitalismo e que a estabilização do regime soviético, significa, pelo contrário, uma firme acumulação de condições que conduzem ao fortalecimento da ditadura do proletariado e ao ascenso do movimento revolucionário de todos os países e à vitória do socialismo.

Esta contradição de princípios entre as duas estabilizações, a capitalista e a soviética, constitui uma expressão da contradição entre dois sistemas de economia e de governo, entre o sistema do capitalismo e o sistema do socialismo.

Quem não compreendeu esta contradição jamais compreenderá a essência básica da situação internacional do momento atual.

Tal é o quadro geral da situação internacional no momento presente.

                     II – As Tarefas Imediatas dos Partidos Comunistas dos Países Capitalistas

Passo ao segundo grupo de questões.

O que há de novo e particular na situação dos Partidos Comunistas dos países capitalistas no momento atual consiste em que o período de fluxo da revolução foi substituído pelo período de seu refluxo, polo período de calmaria. A tarefa consiste em se utilizar o período de calmaria que atravessamos para o fortalecimento dos Partidos Comunistas, para a sua bolchevização, para a sua transformação em Partidos realmente de massas que se apoiem nos sindicatos, para a união dos elementos trabalhadores das classes não proletárias e, em primeiro lugar, do campesinato, em torno do proletariado e, finalmente, para a preparação dos proletários no espírito da revolução e da ditadura do proletariado.

Não vou enumerar todas as tarefas imediatas colocadas ante os Partidos Comunistas do Ocidente. Se lermos as resoluções correspondentes e particularmente a resolução do pleno ampliado do Komintern sobre a bolchevização(6), não nos será difícil compreender em que precisamente consistem estas tarefas concretamente.

Desejaria examinar a tarefa fundamental, a tarefa dos Partidos Comunistas do Ocidente cuja explicação facilita a solução de todas as demais tarefas imediatas.

Que espécie de tarefa é esta?

Esta tarefa consiste em unir os Partidos Comunistas do Ocidente com os sindicatos. Esta tarefa consiste em desenvolver e levar até o fim a campanha de unidade do movimento sindical, que todos os comunistas ingressem obrigatória e incondicionalmente nos sindicatos para que nestes realizem um trabalho sistemático de unificação dos operários numa frente única contra o capital, criando, dessa forma, as condições que facultem aos Partidos Comunistas a possibilidade de se apoiarem nos sindicatos.

Sem a realização desta tarefa torna-se impossível tanto a transformação dos Partidos Comunistas em partidos realmente de massas quanto a preparação das condições indispensáveis à vitória do proletariado.

Os sindicatos e os Partidos do Ocidente não são iguais aos sindicatos e ao Partido existentes na Rússia. As relações recíprocas entre os sindicatos e os Partidos no Ocidente estão longe de coincidir com as relações recíprocas que se estabeleceram entre nós, na Rússia. Os sindicatos surgiram aqui depois do aparecimento do Partido e em torno do Partido da classe operária Ainda não havia sindicatos entre nós quando o Partido e suas organizações já dirigiam não apenas a luta política, mas também a luta econômica da classe operária, inclusive as greves pequenas e insignificantes. É isto, principalmente, o que explica a extraordinária autoridade de que gozava o nosso Partido entre os operários antes da revolução de fevereiro em comparação com os embriões dos sindicatos que existiam em nosso país aqui e ali naquela época. Sindicatos autênticos surgiram entre nós só depois de fevereiro de 1917. Já antes de Outubro possuíamos organizações sindicais formadas que gozavam de grande autoridade entre os operários. Já naquela época Lênin afirmava que sem o apoio representado pelos sindicatos é impossível tanto conquistar como manter a ditadura do proletariado. Um desenvolvimento maior tiveram aqui os sindicatos após a tomada do poder, particularmente nas condições da NEP. Evidentemente, hoje os nossos poderosos sindicatos constituem um dos esteios básicos da ditadura do proletariado. O elemento mais característico na história do desenvolvimento de nossos sindicatos está em que surgiram, desenvolveram-se e se fortaleceram após o aparecimento do Partido, em torno do Partido e em amizade com o Partido.

Foi numa situação inteiramente diversa que se desenvolveram os sindicatos no ocidente da Europa. Em primeiro lugar, ali eles surgiram e se fortaleceram muito antes do aparecimento do Partido da classe operária. Em segundo lugar, não foram os sindicatos que ali se desenvolveram em torno do Partido da classe operária, mas, pelo contrário, os próprios Partidos da classe operária saíram dos sindicatos. Em terceiro lugar, uma vez que o setor econômico da luta, o mais próximo da classe operária, já se encontrava, por assim dizer, conquistado pelos sindicatos, os Partidos tiveram então de se ocupar, principalmente, da luta politica parlamentar, o que não pôde deixar de se refletir no caráter de seu trabalho e do seu peso específico aos olhos da classe operária. E é precisamente pelo fato de que os Partidos ali surgiram após os sindicatos e precisamente pelo fato de que os sindicatos nasceram muito antes do Partido e constituíam, propriamente, as principais fortalezas do proletariado na sua luta contra o capital — é precisamente por isso que os Partidos, como fôrças independentes que não se apoiam nos sindicatos, foram relegados a um plano secundário.

Mas segue-se daí que se os Partidos Comunistas desejam se transformar numa fôrça realmente de massas, capaz de fazer a revolução avançar, devem unir-se aos sindicatos e se apoiarem nos mesmos.

Não levar em conta esta particularidade da situação no Ocidente significa prejudicar fatalmente a causa do movimento comunista.

Ali, no Ocidente, ainda há atualmente certos «comunistas» que não desejam compreender esta particularidade e que continuam a apregoar a palavra de ordem anti-proletária e antirrevolucionária de «fora dos sindicatos». É preciso dizer que ninguém pode* prejudicar tanto o movimento comunista no Ocidente como estes «comunistas» ou outros de sua espécie. Estes indivíduos pensam em «atacar» os sindicatos de fora, considerando-os como campo inimigo. Não compreendem que com tal politica os trabalhadores irão considerá-los justamente como inimigos. Não compreendem que, sejam os sindicatos bons ou maus, o operário de massa o considera como suas fortalezas que o ajudam a manter o seu salário, o seu horário de trabalho, etc. Não compreendem que tal política não facilita, mas mina a tarefa da penetração dos comunistas na massa de milhões da classe operária.

«Vocês atacam a minha fortaleza — pode dizer o operário médio de massa a esses «comunistas» — vocês querem destruir a obra que criei durante dezenas de anos, demonstrando-me que o comunismo é melhor do que o sindicalismo. Não sei, pode ser que vocês tenham razão nos seu pontos de vista teóricos a respeito do comunismo — como posso eu, simples operário, compreender as suas teorias? — mas sei de uma coisa, isto é, que possuo as minhas fortalezas sindicais, elas me guiam na luta, elas me defendem — bem ou mal — dos ataques desfechados pelos capitalistas e todo aquele que pensar em destruir estas fortalezas estará destruindo a minha própria obra operária. Deixem de atacar as minhas fortalezas, ingressem nos sindicatos, trabalhem neles uns cinco anos, ou mais, ajudem-nos a melhorá-los e a fortalecê-los e eu observarei que espécie de homens vocês são e se vocês se revelarem homens realmente capazes, eu, evidentemente, não deixarei de apoiá-los», etc.

É assim ou quase assim que o operário médio de massa do Ocidente considera atualmente os antissindicalistas.

Quem não compreende esta particularidade da psicologia do operário médio da Europa nada compreenderá da situação de nossos Partidos Comunistas no momento atual.

Em que reside a fôrça da social-democracia no Ocidente?

No fato de que se apoiam nos sindicatos.

Onde está a fraqueza dos nossos Partidos Comunistas do Ocidente?

No fato de que ainda não se uniram aos sindicatos e alguns elementos destes Partidos Comunistas não querem unir-se aos sindicatos.

É por isto que a tarefa fundamental dos Partidos Comunistas do Ocidente no momento atual está em desenvolver e levar até o fim a campanha da unidade do movimento sindical, em que todos os comunistas, sem exceção, ingressem nos sindicatos e realizem neles um trabalho paciente e sistemático de unificação da classe operária contra o capital e consigam, dessa forma, que os Partidos Comunistas possam se apoiar nos sindicatos.

Tal é o sentido das resoluções do pleno ampliado do Komintern sobre as tarefas imediatas dos Partidos Comunistas do Ocidente no momento atual.

 III – As Tarefas Imediatas dos Elementos Comunistas dos Países Coloniais e Dependentes

Passo ao terceiro grupo de questões.

O elemento novo neste setor consiste no seguinte:

a.  Em vista da intensificação da exportação do capital dos países avançados para os países atrasados, estimulada pela estabilização! do capitalismo, o capitalismo nos países coloniais se desenvolve e se desenvolverá a um ritmo rápido, quebrando as velhas formas de condições sociais e políticas e implantando novas;
b.  o proletariado destes países cresce e continuará crescendo a um ritmo acelerado;
c.  o movimento operário revolucionário e a crise revolucionária nas colônias cresce e crescerá;
d.  em consequência disto crescem e crescerão determinadas camadas da burguesia nacional, mais ricas e mais poderosas, que, temendo a revolução em seu país mais do que o imperialismo, preferem um acordo com o imperialismo, do que a causa de libertação do seu país do imperialismo, traindo dessa forma a sua própria pátria (Índia, Egito, etc );
f.  em vista de tudo isso a libertação destes países do imperialismo só pode ser realizada na luta contra a burguesia nacional conciliadora;
mas disto decorre que a questão da aliança dos operários e dos camponeses e da hegemonia do proletariado nas colônias industrialmente desenvolvidas ou que se desenvolvem industrialmente deve se tornar uma questão atual, da mesma forma que se tornou atual antes da primeira revolução na Rússia em 1905.

Até hoje a situação se caracteriza pelo fato de que frequentemente falam do Oriente como um todo uniforme. Hoje está claro para todos que não mais existe um Oriente único e uniforme e que há atualmente colônias desenvolvidas e que se desenvolvem no sentido capitalista, e colônias atrasadas e que se atrasam e em relação às quais não! pode haver nenhuma medida uniforme.

Até hoje tem-se apresentado o movimento de libertação nacional de forma a ser considerado como uma frente compacta de todas as forças nacionais dos países coloniais e dependentes, que vai dos burgueses extremamente reacionários até os proletários extremamente revolucionários. Atualmente, após a cisão da burguesia nacional numa ala revolucionária e numa ala antirrevolucionária, o quadro do movimento nacional assume um aspecto algo diferente. Ao lado dos elementos revolucionários do movimento nacional surgem da burguesia elementos conciliadores, reacionários, que preferem um acordo com o imperialismo à causa de libertação de seu país.

Daí decorre a tarefa dos elementos comunistas dos países coloniais: unirem-se estreitamente aos elementos revolucionários da burguesia e, em primeiro lugar, ao campesinato, contra o bloco do imperialismo e os elementos conciliadores de «sua» burguesia a fim de travarem, tendo à sua frente o proletariado, uma luta realmente revolucionária pela libertação em relação ao imperialismo.

A conclusão só pode ser uma: toda uma série de países coloniais se aproxima atualmente do seu 1905.

A tarefa consiste em se unir estreitamente os elementos de vanguarda dos operários dos países coloniais num Partido Comunista único, capaz de dirigir o ascenso da revolução.

Eis o que afirmou Lênin sobre o crescente movimento revolucionário nos países coloniais já em 1922:

«Os atuais «vencedores» da primeira guerra imperialista não têm fôrças para vencer até mesmo a pequena e diminuta Irlanda, não têm fôrças para vencer até mesmo a confusão que se formou entre eles próprios nas questões financeiras e cambiais. E a Índia e a China estão em efervescência. Representam mais de 700 milhões de pessoas. Representam, com o acréscimo dos países asiáticos e circunvizinhos, inteiramente idênticos, — mais da metade da população da terra. Ali se aproxima, irresistivelmente e com rapidez cada vez maior o ano de 1905 -— com a enorme e essencial diferença de que em 1905 a revolução na Rússia podia ainda se processar (pelo menos, a princípio) isoladamente, isto é, não arrastando de uma só vez outros países para a revolução. Mas a revolução que se desenvolve na Índia e na China já agora se transforma e se transformou em luta revolucionária, em movimento revolucionário, em revolução internacional»(7).
Os países coloniais se acham perante o seu ano 1905 — tal é a conclusão.

Esse é também o sentido das resoluções relativas à questão colonial, aprovadas pelo pleno ampliado do Komintern.

                                   IV – Sobre os Destinos do Socialismo na União Soviética

Passo ao quarto grupo de questões.

Até agora falei sobre a resoluções de nossa conferência partidária que trataram das questões que dizem respeito diretamente ao Komintern. Agora passamos às questões que têm relação direta tanto com o Komintern quanto com o PC(b) da Rússia e que constituem, dessa forma, o elo de ligação entre as questões externas e internas.

Como a estabilização temporária do capitalismo deve se refletir sobre os destinos do socialismo em nosso país? Não constitui esta estabilização o fim ou o principio do fim da construção socialista em nosso país ?

Pode-se em geral construir, com as nossas próprias fôrças, o socialismo em nosso país, atrasado no sentido técnico-econômico, sob as condições da manutenção do capitalismo nos outros países, por um período mais ou menos prolongado?

Pode-se criar uma garantia total contra os perigos da intervenção e, por conseguinte, da restauração da, Velha ordem em nosso país na vigência do cerco capitalista, além do mais estabilizado, no momento atual ?

Tudo isto representa os problemas que inevitavelmente se levantam diante de nós em consequência da nova situação no domínio das relações internacionais e sobre os quais não podemos passar, sem haver I dado aos mesmos uma resposta exata e precisa.

O nosso país apresenta dois grupos de contradições. Um grupo de contradições é representado pelas contradições internas, que existem entre o proletariado e o campesinato. O outro grupo de contradições é representado pelas contradições externas que existem entre o nosso país, como país do socialismo e todos os demais países, como países do capitalismo.

Consideremos ambos os grupos de contradições, cada qual por sua vez.

Que existem algumas contradições entre o proletariado e o campesinato — isto, evidentemente, não se pode negar. Basta que nos lembremos de tudo o que aconteceu e acontece aqui em consequência da política de preços dos produtos agrícolas, em consequência dos limites, em consequência da campanha de redução de preços dos produtos manufaturados, etc., para que se compreenda toda a realidade destas contradições. Duas classes principais se apresentam diante de nós: a classe proletária e a classe dos proprietários privados, isto é, o campesinato. Daí decorre a inevitabilidade das contradições entre elas. Toda a questão reside em se saber se podemos, com as nossas próprias fôrças, superar estas contradições que existem entre o proletariado e o campesinato. Quando indagam: podemos construir o socialismo com as nossas próprias fôrças? — então com isto querem dizer: são superáveis ou são insuperáveis as contradições existentes entre o proletariado e o campesinato em nosso país?

O leninismo responde a esta pergunta afirmativamente: sim, podemos construir o socialismo e vamos construí-lo junto com o campesinato, sob a direção da classe operária.

Onde se acham as razões, os motivos para uma tal resposta?

Os motivos para uma tal resposta consistem em que, além das contradições entre o proletariado e o campesinato, há ainda os interesses gerais relativos às questões radicais do desenvolvimento que envolvem e, em todo caso, podem encobrir estas contradições e que constituem a base e os fundamentas da aliança, entre os operários e os camponeses.

Em que consistem estes interesses gerais?

A questão está em que existem dois caminhos de desenvolvimento da agricultura: o caminho capitalista e o caminho socialista. O caminho capitalista significa o desenvolvimento através do empobrecimento da maioria do campesinato em proveito do enriquecimento das camadas superiores da burguesia urbana e rural. O caminho socialista, pelo contrário, significa o desenvolvimento através do ininterrupto ascenso do bem-estar da maioria do campesinato. Tanto o proletariado como, em particular, o campesinato estão interessados em rue o desenvolvimento se processe pelo segundo caminho, pelo caminho socialista. Porque! este caminho constitui a única salvação do campesinato do empobreci-1 mento e de uma existência semi-faminta. Não é preciso dizer que a ditadura do proletariado, tendo em suas mãos os postos chave da economia, tomará todas as medidas no sentido de que vença o segundo caminho, o caminho socialista. É por si mesmo compreensível, por outro lado, o fato de que o campesinato se acha vitalmente interessado em que o desenvolvimento se processe por este segundo caminho. Daí decorre a comunidade de interesses d) proletariado e do campesinato que encobre até aqui as contradições entre eles.

Eis porque o leninismo afirma que podemos e devemos construir uma sociedade totalmente socialista juntamente com o campesinato, na base da união dos operários e dos camponeses.

Eis porque o leninismo afirma que podemos e devemos, apoiando-nos nos interesses gerais dos proletários e dos camponeses, superar, com as nossas próprias fôrças, as contradições existentes entre o proletariado e o campesinato.

É assim que o leninismo encara este problema.

Mas, evidentemente, não são todos os camaradas que concordam com o leninismo. Eis o que, por exemplo, afirma Trotski quanto à questão das contradições entre o proletariado e o campesinato:

“As contradições na situação do governo operário num país atrasado, com uma esmagadora maioria de população camponesa, poderão encontrar sua solução somente (O grifo é meu — J. St.) em escala internacional, na arena da revolução mundial do proletariado.” (Vide o prefácio ao livro de Trotski “O ano de 1905”).
Em outros termos, não temos fôrças e não estamos em condições de, com as nossas próprias fôrças, superar e anular as contradições internas do nosso país, as contradições entre o proletariado e o campesinato, uma vez que é somente como resultado da revolução mundial e só na base da revolução mundial que poderemos, como já se explicou, pôr fim a estas contradições e construir, finalmente, o socialismo.

Não é preciso dizer que esta tese não tem nada de comum com o leninismo.

O mesmo Trotski continua:

“A classe operária da Rússia não poderá se manter no poder e transformar o seu domínio temporário em prolongada ditadura socialista, sem um apoio estatal direto do proletariado europeu. Disto não se pode duvidar nem um minuto” (Vide “A Nossa Revolução”, página 278).
Em outras palavras, enquanto o proletariado ocidental não tomar o poder e não nos prestar um apoio estatal não poderemos nem sonhar com a manutenção do poder por um período algo prolongado.

E Trotski continua:

“É inútil pensar,— …que, por exemplo, a Rússia revolucionária possa se manter de pé perante a Europa conservadora”. (Vide Trotski. Obras, f.. III, parte I, pg. 90).
Em outros termos, nós, na realidade, não só não podemos construir o socialismo, mas não podemos até mesmo resistir, embora por um curto prazo, “perante a Europa conservadora”, embora todo o mundo saiba que não só nos mantivemos firmes mas também rechaçamos uma série de furiosos ataques da Europa conservadora contra o nosso país.

E, finalmente:

“Um autêntico ascenso da economia socialista na Rússia, — afirma Trotski — se tornará possível somente após a vitória (O grifo é meu — J. Stálin) do proletariado nos países mais importantes da Europa” (Vide a mesma fonte, pg. 93).
Está claro, ao que parece.

Fiz, camaradas, estas citações a fim de contrapô-las a citações das obras de Lênin e vos apresentar, desta forma, a possibilidade de captar a essência básica da questão da possibilidade da construção de uma completa sociedade socialista no país da ditadura proletária, cercada por países capitalistas.

Passemos, agora, a citações das obras de Lênin.

Eis o que escreveu Lênin, já em 1915, por ocasião da guerra imperialista:

“A desigualdade do desenvolvimento econômico e político é uma lei absoluta do capitalismo. Disso se conclui que é possível a vitória do socialismo em primeiro lugar em alguns poucos ou até mesmo num único país capitalista. O proletariado vitorioso deste país, após haver expropriado os capitalistas e após haver organizado dentro de suas fronteiras a produção socialista, se levantaria contra o resto do mundo capitalista, atraindo para o seu lado as classes oprimidas dos demais países, impulsionando neles a insurreição contra os capitalistas e, em caso de necessidade, intervindo até mesmo com a fôrça armada contra as classes exploradoras e seus Estados”… Porque “é impossível a livre união” das nações no socialismo sem uma luta mais ou menos prolongada e tenaz das repúblicas socialistas contra os Estados atrasados”(8).
Em outros termos, o país da ditadura do proletariado, cercado pelos capitalistas, pode, realmente, não só pôr fim, com as suas próprias fôrças, às contradições internas entre o proletariado e o campesinato, mas pode e deve ainda construir o socialismo, organizar dentro de suas fronteiras a economia socialista e pôr de pé a fôrça armada para ajudar aos proletários dos países circunvizinhos na sua luta pela derrocada do capital.

Tal é a tese fundamental do leninismo sobre a vitória do socialismo num único país.

O mesmo afirma Lênin, embora em forma um pouco diferente, no VIII Congresso dos Soviéts, realizado em 1920, relativamente à questão da eletrificação de nosso país:

“O comunismo é o poder Soviético mais eletrificação de todo o país. De outra forma o país continuará como um país pequeno-camponês e é preciso que nós reconheçamos isto claramente. Somos mais fracos do que o capitalismo, não só em escala mundial, mas também dentro do país. Isto é sabido de todos. Reconhecemos este fato e conduzimos as coisas de forma que a base econômica se transforme, de pequeno-camponesa em base da indústria pesada. Somente quando o país for eletrificado, quando a indústria, a agricultura e o transporte forem estabelecidos na base técnica da grande indústria atual, somente então é que venceremos definitivamente (O grifo é meu — J. Stálin)(9).
Em outros termos, Lênin reconhece integralmente as dificuldades técnicas da construção do socialismo em nosso país mas daí de forma alguma chega à conclusão absurda de que “um autêntico ascenso da economia socialista na Rússia somente se tornará possível após a vitória do proletariado nos países mais importantes da Europa” e considera que podemos, com as nossas próprias fôrças, superar estas dificuldades para conseguir uma “vitória definitiva” , isto é a construção total ao socialismo.

E eis o que afirma Lênin um ano depois, em 1921:

“10-20 anos de relações normais com o campesinato e estará assegurada a vitória em escala internacional (O grifo é meu — J. St.) (até mesmo com o atraso das revoluções proletárias que tomam ímpeto)”(10).
Em outros termos, Lênin reconhece integralmente as dificuldades políticas da construção do socialismo em nosso país, mas daí de forma alguma chega à conclusão de que “sem um apoio estatal direto do proletariado europeu a classe operária da Rússia não poderá se manter no poder” e considera que com uma política justa em relação ao campesinato poderemos conquistar totalmente “vitórias em escala internacional” no sentido da construção de um socialismo completo.

E o que é uma política justa em relação ao campesinato? Uma política justa em relação ao campesinato é algo que depende integral e completamente de nós e somente de nós, como Partido que dirige a construção do socialismo em nosso País.

O mesmo, mas ainda com uma precisão maior, é o que afirma Lênin em 1922 nas suas notas sobre a cooperação:

“Na realidade, todos os grandes meios de produção em poder do Estado, e o poder estatal em mãos do proletariado, a aliança deste proletariado com os muitos milhões de pequenos e muito pequenos camponeses; a garantia da direção do proletariado sobre o campesinato, etc. — acaso isto não é tudo o que é necessário para que com a cooperação, e nada mais do que com a cooperação, que antes desprezávamos como mercantilista e que agora, sob a NEP, continuamos a desprezar de certo modo; acaso isto não é tudo o que é necessário para a construção da sociedade socialista completa? (O grifo é meu — J. St.) ‘Não e ainda a construção da sociedade socialista, mas é tudo o que é necessário e o suficiente para esta construção.” (O grifo é pieu — J. St.)(11).
Em outros termos, possuímos, na vigência da ditadura do proletariado, conforme já se esclareceu, todos os elementos indispensáveis à construção de uma sociedade socialista completa, superando-se todas e quaisquer dificuldades internas uma vez que podemos e devemos superá-las com as nossas próprias fôrças.

Ao que parece, está claro.

A objeção de que o atraso econômico relativo de nosso país exclui a possibilidade da construção do socialismo, é combatida e refutada por Lênin como algo incompatível com o socialismo:

“O argumento que avançam apresenta uma vulgaridade sem limites — afirma Lênin — e que aprenderam de cor por ocasião do desenvolvimento da social-democracia da Europa Ocidental e que consiste em que ainda não estamos maduros para e socialismo e que não temos, segundo a expressão dos diferentes “sábios” senhores que se encontram entre eles, premissas econômicas objetivas para o socialismo”(12).
Em caso contrário não haveria por que tomar o poder em Outubro e organizar a Revolução de Outubro.

Porque se se exclui, por esta ou aquela razão, a possibilidade e a necessidade da construção de uma sociedade socialista completa, então pelo mesmo motivo a Revolução e*e Outubro perde a sua significação Quem nega a possibilidade da construção do socialismo num único país deve infalível mente negar a justeza da Revolução de Outubro. E vice-versa: quem não crê em Outubro não deve reconhecer a possibilidade da vitória do socialismo nas condições do cerco capitalista. A ligação entre falta de fé em Outubro e a falta de reconhecimento das possibilidades para o socialismo em nosso país — é completa e direta.

“Sei — afirma Lênin — que há, sem dúvida, sábios que se consideram muito inteligentes e que até mesmo se chamam socialistas que afirmam que não se deve tomar o poder enquanto a revolução não explodir em todos os países. Não suspeitam que, ao afirmar isto, afastam-se da revolução e se passam para o campo da burguesia Esperar que as classes trabalhadoras realizem a revolução internacional — significa manter a todos paralisados na expectativa. Isto é uma insensatez”(13).
É assim que se apresenta o problema em relação às contradições da primeira ordem, às contradições de caráter interno, à questão da possibilidade da construção do socialismo nas condições do cerco capitalista.

Passemos agora às contradições da segunda ordem, às contradições externas, que existem entre nosso país, como país do socialismo, e todos os demais países, como países do capitalismo.

Em que consistem estas contradições?

Consistem em que, enquanto houver um cerco capitalista, deve haver também o perigo de intervenção por parte dos países capitalistas e, enquanto houver esse perigo, deve haver também o perigo da restauração, o perigo do restabelecimento da ordem capitalista em nosso país.

Pode-se considerar estas contradições completamente superáveis para um único país? Não, não se pode. Porque os esforços de um país, mesmo que este país seja o país da ditadura proletária, são insuficientes para garanti-lo integralmente contra o perigo da intervenção. Uma completa garantia contra a intervenção, o que quer dizer também a vitória definitiva do socialismo, é possível, em vista disto, somente em escala internacional, somente como resultado dos esforços conjugados dos proletários de uma série de países, ou melhor, somente como resultado da vitória dos proletários de alguns países.

O que é a vitória definitiva do socialismo?

A vitória definitiva do socialismo é a completa garantia em relação as tentativas de intervenção e, por conseguinte, de restauração, porque qualquer tentativa algo séria de restauração só pode ter lugar na eventualidade de um sério apoio de fora, somente com o apoio do capital internacional. Por isso o apoio à nossa revolução por parte dos operários de todos os países e tanto mais a vitória destes operários, embora em alguns países, constitui a condição indispensável de uma integral garantia ao primeiro país vitorioso em relação às tentativas de intervenção e restauração, a necessária condição da vitória definitiva do socialismo.

“Enquanto a nossa República Soviética — afirma Lênin — permanecer cercada por todo o mundo capitalista, pensar, até então… no desaparecimento destes ou daqueles perigos seria fantasia e utopia completamente ridículas. Evidentemente, enquanto permanecerem contrastes tão radicais — permanecerão também os perigos e não se poderá de forma alguma evitá-los”(14).
E ainda:

“Vivemos não somente dentro de um Estado, mas num sistema de Estados e não se concebe a existência, por longo tempo, da República Soviética ao lado de Estados imperialistas. No final de conta, um dos dois vencerá”(15).
Eis porque Lênin afirma que:

“Somente em escala mundial e somente com os esforços conjugados dos operários de todos os países é que é possível vencer definitivamente”.(16)
É assim que se apresenta o problema em relação às contradições da segunda ordem.

Quem confunde o primeiro grupo de contradições, perfeitamente superáveis pelos esforços de um único país, com o segundo grupo de contradições que exigem para a sua solução os esforços dos proletários de alguns países — comete um erro grosseiro contra o leninismo, ou é um confusionista ou um oportunista incorrigível.

A carta de um camarada que me foi enviada em janeiro deste ano sobre a questão da vitória do socialismo num único país poderia servir de pequeno modelo de uma tal contusão. Escreve ele perplexo:

“Você afirma que a teoria leninista… consiste em que o socialismo pode vencer num único país. Lamento que não tenha encontrado indicações nos lugares correspondentes das obras de Lênin relativas à vitória do socialismo num único país.”

O mal, evidentemente, não está em que este camarada, que considero um dos melhores camaradas de nossa juventude estudantil, “não tenha encontrado indicações nos lugares correspondentes das obras de Lênin relativas à vitória do socialismo num único país”. Levará algum tempo até que ele leia e encontre, finalmente, essas indicações. O mal está em que confundiu as contradições internas com as contradições externas e se emaranhou finalmente nesta confusão. Não será supérfluo, talvez, vos dar a conhecer a minha resposta à carta deste camarada. Ei-la:

“Não se trata de uma vitória completa, mas da vitória do socialismo em geral, isto é, trata-te de expulsar os latifundiários e os capitalistas, tomar o poder, rechaçar os ataques do imperialismo e começar a construir a economia socialista — o proletariado de um único país poderá perfeitamente conseguir tudo isto, mas uma total garantia contra a restauração somente poderá ser assegurada como resultado “dos esforços conjuntos dos proletários de alguns países.” Seria estúpido iniciar a revolução de Outubro na Rússia com a convicção de que o proletariado vitorioso da Rússia, contando com a franca simpatia dos proletários de outros países, mas sem que se verifique a vitória em alguns países, “não poderá resistir à Europa conservadora”. Isto não é marxismo, mas o mais ordinário oportunismo, trotsquismo e tudo o que quiserem. Se a teoria de Trotski fosse certa, então Ilitch não teria razão ao afirmar que transformaremos a Rússia da NEP em socialista, e que temos “tudo o que é necessário para a construção de uma sociedade socialista completa” (Todos os grifos são meus — J. St.) (Vide “Sobre a Cooperação”).

O elemento mais perigoso na nossa atuação política é representado pela tentativa de considerar o país proletário vitorioso como algo passivo, somente capaz de marcar passo num mesmo lugar até o momento em que surja uma ajuda dos proletários vitoriosos de outros países. Admitamos que no decurso de cinco a dez anos de existência do regime soviético na Rússia ainda não tenha havido a revolução no Ocidente; admitamos que a nossa República continue, durante este período, a existir como República Soviética que constrói a economia socialista nas condições da NEP — acreditais que durante estes cinco a dez anos o nosso país ficará de braços cruzados e não cuidara da organização da economia socialista? Basta que se coloque esta questão para se compreender todo o perigo da teoria da negação da vitória co socialismo num único país.

Mas isto significa que esta vitória será integral e definitiva? Não, não significa… porque, enquanto houver o cerco capitalista haverá sempre o perigo da intervenção armada” (Janeiro de 1925).

É nestas condições que se encontra o problema dos destinos do socialismo em nosso país do ponto de vista da conhecida resolução da XIV Conferência de nosso Partido.

                                                       V – A Política do Partido no Campo

Passo ao quinto grupo de questões.

Antes de passar as resoluções da XIV Conferência que tratam da política do Partido no campo, desejaria dedicar algumas palavras ao barulho levantado pela imprensa burguesa em consequência da critica, feita pelo Partido, das nossas próprias debilidades no campo. A imprensa burguesa se embandeira em arco, apregoando por todos os lados que uma critica franca de nossas próprias debilidades constitui um indicio de fraqueza do Poder Soviético, um indicio de sua decomposição e ruína. Não é preciso dizer que todo este barulho é totalmente falso e mentiroso.

A autocrítica é um sinal de fôrça e não de fraqueza de nosso Partido, só um Partido forte que tem as suas raízes na vida e que marcha para a vitoria pode se permitir uma crítica tão impiedosa de suas próprias debilidades como a que se permitiu e sempre permitira, à vista de todo o povo. Um Partido que oculte a verdade do povo, um Partido que tema a luz e a crítica, não é um Partido, mas uma camarilha de charlatães condenados ao fracasso. Os senhores burgueses nos medem segundo os seus próprios padrões. Temem a luz e ocultam, cuidadosamente, a verdade ao povo, escondendo as suas debilidades sob o letreiro luminoso de um bem-estar fictício. E sem dúvida pensam que também nós, os comunistas, devemos ocultar a verdade ao povo. Temem a luz porque basta que permitam uma auto critica algo séria, uma critica um tanto que de seus próprios erros para que não reste do regime burguês pedra sobre pedra. E sem dúvida pensam que se nós, comunistas, permitimos a autocrítica, é sinal de que estamos acuados e pairamos no ar. Os respeitáveis burgueses e os social-democratas nos medem segundo os seus próprios padrões. Somente os Partidos que marcham para trás e estão condenados ao fracasso é que podem temer a luz e a crítica. Mas nós não tememos nem uma e nem outro, não tememos porque somos um Pai tido em ascensão, que marcha para a vitória. Eis porque a autocrítica que realizamos já há alguns meses constitui um indicio de fôrça grandiosa e não de fraqueza de nosso Partido, um meio do seu fortalecimento e não da sua decomposição.

E agora passamos ao problema da política do Partido no campo.

Quais são os novos elementos que se poderia observar no campo em consequência da nova situação interna e internacional?

Penso que se poderia assinalar quatro fatos fundamentais:

a modificação da situação internacional e o ritmo retardado da revolução que ditam a escolha dos caminhos menos difíceis, embora longos, para a integração do campesinato na construção socialista, para a construção do socialismo juntamente com o campesinato;
O progresso econômico do campo e o processo de divisão em camadas do campesinato que exigem a liquidação das sobrevivências do comunismo de guerra no campo;
a atividade política do campesinato que exige a modificação dos velhos métodos de direção e de administração no campo;
as reeleições aos Soviéts que revelaram o fato indubitável de que em toda uma série de distritos de nosso país o camponês médio se colocou ao lado do kulak contra o camponês pobre.
Em que consiste, em consequência destes novos fatos, a tarefa fundamental do Partido no campo?

Alguns camaradas, partindo do fato da diferenciação co campo, chegam a conclusão de que a tarefa fundamental do Partido é a de incentivar a luta de classes no campo. Isto é falso. Trata-se de uma tagarelice sem fundamento. »Não é esta atualmente a nossa tarefa principal. Trata-se de refrões de velhas cantigas mencheviques tiradas de uma velha enciclopédia menchevique.

O principal não é de forma alguma incentivar a luta de classes no campo. O principal está em se agrupar firmemente os camponeses médios em torno do proletariado, em conquistá-los novamente. O principal está em se unir estreitamente à massa principal do campesinato, elevar o seu nível material e cultural e avançar, juntamente com esta massa fundamental, no sentido do socialismo. O principal está em se construir o socialismo junto com o campesinato, obrigatoriamente junto com o campesinato e obrigatoriamente sob a direção da classe operária, uma vez que a direção da classe operária constitui a garantia fundamental do fato de que a construção se faça no sentido do socialismo.

Isto é atualmente a tarefa principal do Partido.

Talvez não seja supérfluo nos lembrarmos das palavras de Ilitch a esse respeito, pronunciadas por ele no momento da introdução da NEP e que conservaram até hoje toda a sua fôrça:

“Todo o problema está em que, para se avançar atualmente como uma massa incomparavelmente mais ampla e poderosa, só se poderá fazê-lo em conjunto com o campesinato”(17).
“Devemos nos unir estreitamente à massa camponesa, com o campesinato trabalhador comum e começarmos a avançar de maneira incomparavelmente e ilimitadamente mais lenta, do que imaginávamos, mas em compensação de forma que toda a massa se movimente realmente conosco. A aceleração deste movimento se processará, então, em ocasião oportuna e de forma que não podemos nem sonhar atualmente”(18).
Apresentam-se diante de nós, em consequência disto, duas tarefas fundamentais no campo.

1. Em primeiro lugar, é preciso conseguir que a economia camponesa seja incluída no sistema geral do desenvolvimento econômico soviético. Anteriormente a questão se apresentava de tal modo que tínhamos dois processos paralelos: a cidade marchava pelo seu caminho e o campo pelo seu. O capitalista se esforçava por integrar a economia camponesa no sistema do desenvolvimento capitalista. Mas esta integração se processou a custa do empobrecimento das massas camponesas e do enriquecimento da camada superior do campesinato. Sabe-se que este caminho apresentava o perigo da revolução. A inclusão da economia camponesa no sistema geral do desenvolvimento econômico soviético consiste, após a vitória do proletariado, em se criar condições para que possamos fazer a economia nacional avançar na base do ascenso gradual mas inflexível do bem-estar da maioria dos camponeses, isto é, pelo caminho oposto ao caminho pelo qual os capitalistas conduziram o campesinato e convidaram o campesinato a marchar antes da revolução.

Mas como incluir a economia camponesa no sistema da construção econômica? Por meio da cooperação. Por meio da cooperação crediária, da cooperação econômica, da cooperação de consumo e da cooperação de produção.

Estes são os caminhos e os meios através dos quais se deve incluir a economia camponesa, de modo lento mas seguro, no sistema geral da construção socialista.

2. A segunda tarefa consiste em se pôr em prática, gradualmente mas de maneira firme, a política de liquidação dos velhos métodos de administração e de direção no campo, a política de vivificação dos Soviéts, a política de transformação dos Soviéts em órgãos autenticamente eletivos, a política de implantação no campo dos princípios da democracia soviética. Ilitch afirmou que a ditadura proletária é o mais elevado tipo de democracia para a maioria dos trabalhadores. Ilitch afirmou que este elevado tipo de democracia só pode ser introduzido depois da tomada, do poder pelo proletariado e depois que tivermos a possibilidade de fortalecer este poder. Pois bem, esta fase de fortalecimento do poder Soviético e de implantação da democracia soviética já se iniciou. Devemos marchar por este caminho com cuidado e sem nos apressarmos, criando na marcha do trabalho e em torno do Partido um ativo numeroso constituído de elementos do campesinato sem Partido.

Se a primeira tarefa, a tarefa de integração da economia camponesa no sistema geral da construção econômica, nos der a possibilidade de conduzir o campesinato, estreitamente unido ao proletariado, pelo caminho da construção do socialismo, então a segunda tarefa, a tarefa da implantação da democracia soviética e da vivificação dos Soviéts na aldeia deve nos facultar a possibilidade de reorganizar o nosso aparelho estatal, ligá-lo às massas populares, torná-lo saudável e honrado, simples e barato, para se criar as condições que facilitem a transição gradual da sociedade, da ditadura do proletariado para a sociedade comunista.

Tais são as linhas fundamentais das resoluções aprovadas pela XIV conferencia de nosso Partido quanto a questão da política de nosso Partido no campo.

De acordo com isto deve-se modificar também o método de direção partidária no campo.

Há entre nós pessoas do Partido que afirmam que, enquanto houver a NEP e o capitalismo começar a estabilizar-se temporariamente, então a nossa tarefa consiste em pôr em pratica uma política de pressão máxima tanto dentro do Partido quanto dentro do aparelho estatal de forma a se manter todas as forças em estado de tensão. Devo dizer que esta política é errônea e nos conduziria à ruína. Necessitamos atualmente não de uma pressão máxima, mas de uma flexibilidade máxima tanto na política quanto na organização, uma flexibilidade máxima tanto na direção política como na organização. Sem isto não nos manteremos no leme, das atuais condições; complexas. Necessitamos da máxima flexibilidade para manter o leme em mãos do Partido e assegurar ao Partido uma direção total.

Prossigamos. É necessário que os comunistas do campo abandonem as formas errôneas de administração. Não se pode contar apenas com o estabelecimento de decretos em relação ao campesinato. É preciso que aprendamos a explicar pacientemente aos camponeses as questões que lhes são incompreensíveis, é preciso que aprendamos a convencer os camponeses, não poupando para isso nem tempo nem esforço. Evidentemente que é muito mais fácil e simples emitir decretos e insistir no seu cumprimento como o fazem frequentemente alguns de nossos presidentes dos comitês executivos dos distritos. Mas nem tudo 0 que é simples e fácil é bom. Recentemente o secretário de uma das células de distrito respondeu nos seguintes termos à pergunta do representante do comitê provincial relativamente à falta de jornais no distrito: “E para que jornais? Sem jornais é mais calmo e melhor; do contrário os mujiques começam a lê-los e começam a fazer perguntas e depois não se poderá evitar as encrencas com eles”. E este secretário se diz comunista! Não é preciso demonstrar que não se trata de um comunista, mas de uma calamidade. A questão está em que não se pode de forma alguma, dirigir atualmente sem “encrencas” e muito menos sem jornais. É preciso que se compreenda e se assimile esta simples verdade se quisermos assegurar para o Partido e o Poder soviético a direção no campo.

Prossigamos. Atualmente, para se dirigir, é preciso saber administrar, é preciso conhecer e compreender os problemas econômicos. Não se pode avançar muito atualmente só na base de intervenções sobre a “política mundial”, sobre Chamberlain e MacDonald. Estamos numa etapa de construção econômica. Por isso somente pode dirigir aquele que compreende a economia, que sabe dar ao mujique conselhos úteis relativamente ao desenvolvimento econômico, que pode ajudar o mujique na questão da construção econômica. Estudar a economia, unir-se estreitamente à economia, estudar todos os detalhes da construção econômica — tal é atualmente a tarefa dos comunistas no campo. Sem isto não se pode nem sonhar em dirigir.

Atualmente é impossível dirigir a maneira antiga, uma vez que a atividade política do campesinato se elevou e é necessário que esta atividade se funda na forma soviética, que ela passe através dos Soviéts e não acima dos Soviéts. Quem dirige e todo aquele que vivifica os Soviéts e cria em torno do Partido no campo um grupo de elementos camponeses ativistas.

Atualmente é impossível dirigir à maneira antiga, porque a atividade econômica na aldeia se elevou e é preciso que esta atividade se funda na forma da cooperação, que ela passe através da cooperação e não acima da cooperação. Quem dirige é todo aquele que cria no campo uma associação cooperativa.

Tais são em geral as tarefas concretas da direção partidária no campo.

                                                        VI – Sobre a Indústria Metalúrgica

Passo ao último grupo de questões estudadas pela XIV Conferência de nosso Partido.

O que há de novo e particular em nossa direção econômica?

Consiste em que os nossos planos econômicos começaram a se afastar do desenvolvimento real de nossa economia, são insuficientes e frequentemente não acompanham o progresso real da economia

O nosso orçamento estatal constitui uma das manifestações claras deste fato. Sabeis que no decurso de meio ano tivemos de modificar o nosso orçamento por três vezes em virtude do rápido aumento dos itens da receita de nosso orçamento, não previstos pelos nossos cálculos. Em outros termos, a nossa previsão orçamentária e os nossos planos orçamentários não acompanharam o aumento das rendas do Estado, em vista do que se verificaram excedentes no tesouro nacional. Isto significa que a seiva da vida econômica de nosso país jorra para cima com fôrça irrefreável, transtornando todos e quaisquer planos científicos de nossos especialistas em finanças. Isto significa que passamos por um surto de trabalho econômico não menos poderoso, senão mais, do que teve lugar, por exemplo, na América após a guerra civil.

O progresso de nossa indústria metalúrgica pode ser considerado a expressão mais brilhante deste novo fenômeno na vida de nosso Estado. A produção metalúrgica atingiu, no ano passado, a 191 milhões de rublos, de pré-guerra. O plano anual para 1924-1925 foi elaborado em novembro do ano passado, para a quantia de 273 milhões de rublos de pré-guerra. Este plano foi modificado e elevado à importância de 317 milhões de rublos em janeiro deste ano, em vista de não corresponder ao ritmo do aumento real da indústria metalúrgica. Em abril deste ano este plano ampliado se revelou novamente infundado em virtude do que tivemos que elevá-lo para a soma de 350 milhões de rublos.

Agora nos afirmaram que atualmente também este plano é insuficiente, daco que temos de ampliá-lo ainda mais, elevando-o a 360-370 milhões.

Em outros termos, a produção da indústria metalúrgica neste ano, em comparação com a produção do ano passado, aumentou quase do dobro. Já não falo do progresso colossal de nossa indústria leve, do progresso dos transportes, da industria de combustíveis, etc.

O que demonstram todos estes fatos? Demonstram que, no sentido da organização da indústria que representa a base fundamenta, do socialismo, já enveredamos por uma ampla estrada de desenvolvimento. no que diz respeito à indústria metalúrgica, que representa a verdadeira mola de toda a indústria em geral, verificamos que já nos afastamos do ponto morto e nossa indústria metalúrgica tem toda a base para marchar a passos acelerados, no sentido de um crescimento completo. O camarada Dzerjinski tem razão ao afirmar que o nosso país pode e deve se tornar um país metalúrgico.

Provavelmente não seria preciso demonstrar uma vez mais a imensa significação deste fato tanto para o desenvolvimento interno de nosso país quanto para a revolução mundial.

Está fora de dúvida que, do ponto de vista do desenvolvimento interno, do desenvolvimento de nassa indústria metalúrgica, é imensa a significação do seu progresso, uma vez que significa o progresso de toda a nossa indústria e de toda a nossa economia, porque a indústria metalúrgica é a base fundamental da indústria em geral, porque nem a indústria leve, nem os transportes, nem os combustíveis, nem a eletrificação, nem a agricultura podem ser postas de pé sem um poderoso desenvolvimento da indústria metalúrgica. O progresso da indústria metalúrgica é a base do progresso de toda a indústria em geral e da economia nacional em geral.

Eis o que fala Lênin sobre a “indústria pesada”, entendendo-se por indústria pesada principalmente a indústria metalúrgica.

“A salvação da Rússia não está apenas na boa colheita na agricultura — isto ainda é pouco — e não apenas na boa situação da indústria leve que fornece ao campesinato os artigos de consumo — isto também ainda é pouco — temos também necessidade da indústria pesada. E para se colocá-la em boas condições são necessários muitas anos de trabalho.”
E continua:

“Sem a salvação da indústria pesada, sem o seu restabelecimento não poderemos construir nenhuma indústria e sem ela em geral pereceremos como país independente”(19).
Quanto à significação internacional do desenvolvimento de nossa indústria metalúrgica, pode-se dizer que é imensa. Por que o que representa o progresso tempestuoso da indústria metalúrgica na vigência da ditadura do proletariado senão a prova direta de que o proletariado não só é capaz de destruir o velho, mas também construir o novo, que é capaz de construir, com as suas próprias fôrças, uma nova indústria e uma nova sociedade, livre da exploração do homem pelo homem. E provar isto na prática e não por argumentos tirados de livros — significa fazer avançar a causa da revolução mundial de maneira segura e definitiva. A peregrinação que os operários dos países ocidentais da Europa fazem ao nosso país não é uma casualidade. Tem uma grande significação agitativa e prática para o desenvolvimento co movimento revolucionário em todo o mundo. O fato de que somos visitados por operários que observam todos os recantos de nossas fábricas e usinas — esta circunstância atesta que não acreditam nos livros e querem se convencer, pela sua própria experiência, da possibilidade do proletariado construir uma nova indústria e criar uma nova sociedade. E quando se convencerem disto, podeis estar certos de que a causa da revolução mundial ire avançar a passos de gigante.

“Atualmente — afirma Lênin — é pela nossa política econômica que exercemos a nossa principal influência sobre a revolução internacional. Todos observam a República Soviética Russa, todos os trabalhadores de todos os países do mundo sem nenhuma exceção e sem nenhum exagero… Neste sentido a luta se desenvolve em escala mundial. Assim que solucionarmos este problema — então ganharemos em escala internacional de maneira segura e definitiva. É por isto que as questões da construção econômica adquirem par. nós uma significação inteiramente excepcional. Devemos conquista a vitória, nesta frente, de maneira lenta, gradual — não é possível fazê-lo rapidamente — mas por um firme ascenso e ininterrupto avanço”. (Todos os grifos são meus — J. St.)(20).
Tal é a significação internacional do progresso de nossa indústria em geral e da indústria metalúrgica em particular.

Há, atualmente, entre nós, cerca de quatro milhões de operários na indústria. Isto, evidentemente, é pouco, mas não obstante representa algo para se construir o socialismo e edificar a defesa de nosso pais para terror dos inimigos do proletariado. Mas não podemos e não devemos parar aqui. Necessitamos de milhões — quinze a vinte milhões — de proletários industriais, da eletrificação das regiões principais de nosso país, da agricultura cooperativa e e t uma indústria metalúrgica altamente desenvolvida. E então não teremos receio de nenhum perigo. E então venceremos em escala internacional.

A significação histórica da XIV Conferência consiste justamente em que indicou claramente o caminho que conduz a este grande objetivo.

E este caminho é o caminho certo porque é o caminho de Lênin, que nos conduz à vitória definitiva.

Tais são os resultados gerais dos trabalhos da XIV Conferência de nosso Partido.

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Notas de rodapé:
(1) A XIV Conferência do PC (b) da Rússia teve lugar em Moscou de 27 a 29 de abril de 1925. A conferência analisou as seguintes questões: a construção do Partido, a cooperação, o imposto agrícola único, a indústria metalúrgica, a legalidade revolucionária e os tarefas do Komintern e do PC (b) da Rússia em consequência do pleno ampliado do Comitê Executivo da Internacional Comunista. (Vide as resoluções aprovadas pela conferência em «O PC (b) da URSS nas decisões e resoluções dos congressos, das conferências e dos plenos do CC”, parte II págs. 4-31, edição russa, 1941, Moscou). (retornar ao texto)
(2) Vide V. I. Lênin — «O Imperialismo, Etapa Superior do Capitalismo», Ed. Vitória, Rio. (retornar ao texto)
(3) N.R.: Refere-se ao «plano Dawes». (retornar ao texto)
(4) A 26 de abril de 1925 teve lugar a eleição, para presidente da Alemanha, do marechal de campo Hindenburg, monarquista de quatro costados e porta-voz do imperialismo e do militarismo germânicos. (retornar ao texto)
(5) Verificou-se a 16 de abril de 1925 uma explosão na catedral «Semana Santa» em Sofia, onde se encontravam, na ocasião, os membros do governo fascista da Bulgária chefiado por Tsankov. Este endereçou aos Estados Unidos uma declaração caluniosa em que culpava o governo soviético de haver inspirado a explosão. A imprensa reacionária do estrangeiro empreendeu uma campanha contra a URSS, exigindo dos seus governos uma mudança de suas relações com a União Soviética. O III Congresso dos Soviets da URSS, realizado em maio de 1925, refutou os ataques caluniosos contra a União Soviética em proclamação aos trabalhadores do todo o mundo por motivo da sangrenta repressão desencadeada pelo governo de Tsankov contra os melhores representantes do povo búlgaro. (retornar ao texto)
(6) Refere-se às teses sobre a bolchevização dos Partidos da Internacional Comunista, aprovadas pelo V pleno ampliado do Comitê Executivo do Komintern, realizado em Moscou de 21 de março a 3 de abril de 1925. (retornar ao texto)
(7) Lênin — Obras, tomo XXVII, pág. 293, edição russa, Moscou (retornar ao texto)
(8) V. I. Lênin — Obras, tomo XVIII, págs. 232-233, edição russa, Moscou. (retornar ao texto)
(9) V. I. Lênin — Obras, tomo XXVI, págs. 46-47, ed. russa, Moscou. (retornar ao texto)
(10) V. I. Lênin — Plano e sumário do folheto “O Imposto em Espécie”, Obras, tomo XXVI, pág. 313, edição russa, Moscou. (retornar ao texto)
(11) V. I. Lênin — “Obras Escogidas”, tomo III, pág. 700, Ed. Problemas, 1946, B. Aires. (retornar ao texto)
(12) V. I. Lênin — Obras, tomo XXVII, pág. 399, edição russa, Moscou. (retornar ao texto)
(13) V. I. Lênin — Obras, tomo XXIII, pág. 9, edição russa, Moscou. (retornar ao texto)
(14) V. I. Lênin — Obras, tomo XXVI, pág. 29, ed. russa, Moscou. (retornar ao texto)
(15) V. I. Lênin — Obras, tomo XXIV, pág. 122, ed. russa, Moscou. (retornar ao texto)
(16) Idem — tomo XXIII, pág. 9. (retornar ao texto)
(17) V. I. Lênin — Obras, tomo XXVII, pág. 272, edição russa, Moscou. (retornar ao texto)
(18) Idem, págs. 231 e 232. (retornar ao texto)
(19) Idem — tomo XXVII, pág. 349. (retornar ao texto)
(20) Idem — Tomo XXVI, págs. 410-411.(retornar ao texto)