Em matéria de Plano Nacional de Educação não posso furtar-me de manifestar a impressão de que nos encontramos ainda no nível do diagnóstico do “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova” de 1932: “todos os nossos esforços, sem unidade de plano e sem espírito de continuidade, não lograram ainda criar um sistema de organização escolar” à altura das necessidades do país. Há uma dinâmica na sociedade que faz com que, com plano ou sem plano, algumas pressões tenham de ser atendidas. Houve aumento de recursos e alguns avanços, mas não por estar em vigor um PNE. O plano que vigorou entre 2001 e 2011 foi solenemente ignorado.

No início de 2010, dados de um estudo realizado a pedido do MEC mostraram que só 33% das metas do PNE foram atingidas. Mas como foi feito esse estudo? Ele tomou como referência as metas e foi verificar o que aconteceu. Então, havia uma meta de colocar 50% das crianças de 0 a 3 anos nas creches até 2010, que não foi atingida, pois é reiterada no novo PNE. Mas se verificou que houve um aumento no atendimento.

A questão é a seguinte: o aumento ocorreu porque o governo estava guiando-se pelo PNE? Não. Nem os municípios evocavam o plano para tomar suas decisões, nem o MEC fazia isso quando formulava algum programa. No caso citado das creches, a decisão de aumentar a oferta era tomada por causa da pressão da população. Os prefeitos usavam isso com fins eleitorais e faziam aquele discurso de que a educação era prioridade e que iriam criar mais creches. Por sua vez, o MEC repassava os recursos ou inseria o município em algum programa de ampliação das creches.

Em suma, é possível assinalar vários avanços como a ampliação da cobertura educacional com a expansão de vagas nas escolas de educação infantil, no ensino fundamental e médio, destacando-se, no plano federal, a criação de novas unidades tanto no nível médio como no nível superior. Igualmente observam-se mudanças positivas ocorridas nessa década de vigência do PNE como a aprovação, em dezembro de 2006, do Fundeb, a instituição do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) em 2007 e a criação do Ideb também em 2007.  No entanto, essas mudanças não têm a ver com a vigência do Plano Nacional de Educação. Este não passou de uma carta de intenções e a lei que o instituiu permaneceu letra morta, sem nenhum influxo nas medidas de política educacional e na vida das instituições escolares.

Entre as várias razões explicativas dessa inoperância do plano, podemos mencionar: a) os vetos às metas orçamentárias, o que privou o PNE do instrumento de ação sem o qual a maioria das demais metas não podia ser viabilizada; b) a complexidade da peça legal traduzida nas informações técnicas que dão base ao texto e na excessiva quantidade de metas, o que dificulta o acompanhamento e fiscalização de sua execução; c) a cultura política enraizada na prática de nossos governantes, avessa ao planejamento e movida mais por apelos imediatos, midi¬áticos e populistas do que pela exigência de racionalidade inerente à ação planejada.

Temos, assim, uma grande batalha pela frente: mudar a cultura política vigente por meio da pressão das bases da sociedade e por um forte movimento dos educadores que se revele capaz de se sobrepor à sem-cerimônia dos empresários que, tendo como linha auxiliar suas organizações ditas não governamentais, vêm procurando hegemonizar o campo educacional. É essa a tarefa que se nos impõe na hora presente: converter os discursos enaltecedores da educação em prática política efetiva, o que objetivamente se traduz na implantação de um verdadeiro sistema nacional de educação articulado a um consistente plano nacional de educação.

Série de dez artigos publicados no Jornal “A Fonte”, de São Sepé (RS), entre 19 de julho e 27 de setembro de 2014.
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