Abertura e Painel 1

Katharina Hofmann, da FES, abriu o evento. O primeiro painel teve como tema o impacto do governo Trump nas relações internacionais e contou com as presenças de Marco Aurélio Garcia, ex-assessor especial dos presidentes Lula e Dilma; Rafael Ioris, professor da Denver University, nos Estados Unidos; Sebastião Velasco, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenador do INEU; e Iole Ilíada, membro do Conselho Curador da FPA e do GR-RI, coordenando o debate.

O evento teve início por volta das 9h30 da manhã, e Katharina Hofmann, da FES, foi responsável pela abertura. Hofmann iniciou sua fala pontuando as diferenças históricas entre as relações dos EUA com seu país, a Alemanha, e com a América Latina.

Quanto ao tema do seminário, para Hofmann, Trump aproveita-se dos medos da população estadunidense para defender um mundo menos complexo, organizado em estados nacionais, comandados por homens brancos. “Não podemos ignorar o Trump porque ele está contra nossas normas cívicas, humanas e liberais”.

Hofmann afirma que Trump não deve ser pensado como caso isolado, pois representa um modelo de político que ganha cada vez mais espaço pelo mundo: o político que nega a política. Segundo ela, Trump é um empresário que usa as redes sociais para mentir acusar a mídia crítica de ser mentirosa; que lucra muito com o capitalismo global, mas se afirma contrário a sua dinâmica; que diz que não é político; que não aceita críticas e que ataca valores democráticos.

“Não temos nenhuma garantia de que permaneceremos com nossos direitos. A democracia precisa ser defendida a todo instante”, afirmou. Segundo Hofmann, é necessário estabelecer relações não somente entre países que defendem estes valores, como também entre instituições e movimentos engajados nesta defesa.

Rafael Ioris iniciou por apontar as pistas que a relação entre Trump, seus apoiadores e seu partido dão sobre postura que o novo governo deve manter em sua política externa. Segundo ele, a política externa liberal e subserviente que o governo golpista brasileiro tem encampado tem ainda menos chance de dar certo no cenário internacional que começa a se desenhar. Ioris deu pistas de alguns caminhos interessantes que o Brasil pode trilhar para construir uma política externa com alguma chance de trazer bons frutos.

Sebastião Velasco entende que é difícil pensar em uma era Trump apenas dois meses após sua posse, mas afirmou que há dois elementos inéditos que podem apontar o que esperar deste novo governo: a relação nada submissa e até de conflito entre o presidente e os caciques republicanos e a complicada relação dele com órgãos do Estado, em especial os de segurança e inteligência. Segundo Velasco, o governo e a direita estadunidense estão sendo disputados por dois grupo e, para aumentar a instabilidade, são constantes os movimentos pelo impeachment de Trump. “Eu não sei quanto vai durar a era Trump…”.

Marco Aurélio Garcia começou por lembrar da total incapacidade dos analistas, não só os brasileiros, de prever a possibilidade da eleição de Trump. Diante disso, louvou a iniciativa do seminário, mas afirmou que o fenômeno Trump precisa ser pensado para além das relações internacionais, a partir das ferramentas teóricas da ciência política. Garcia concordou com Velasco sobre a imprevisibilidade do novo governo, mas afirmou uma tendência estadunidense a combater multilateralismo e reforçar o protecionismo. Quanto aos impactos sobre o Brasil, Garcia afirmou que hoje falta ao país uma política externa, qualquer que seja, mas mesmo assim lembrou de algumas estratégias que deram certo antes e podem dar certo agora.

Assista à íntegra da abertura e do painel 1:

 

Painel 2

O segundo painel discutiu comércio e integração regional. Participaram da discussão Jane Kelsey, professora da University of Aukland, na Nova Zelândia; Michelle Ratton, professora da Fundação Getúlio Vargas (FGV); Thomas Palley, membro do Economics for Democratic & Open Societies Project, nos Estados Unidos; e Jocelio Drummond, da Rede Brasileira Pela Integração dos Povos (Rebrip), coordenando o debate.

Michelle Ratton começou tentando apontar o que já está claro que deve mudar nas regras e na postura do governo estadunidense quanto ao comércio internacional, sobretudo no que tange a acordos comerciais. Segundo Ratton, uma marca do novo governo deve ser um tipo de protecionismo que deve levar parte do setor produtivo do país a renacionalizar parte de seu capital e restringir a mobilidade da força de trabalho. Além disso, oferecer menos crédito a outros países, o que tende a diminuir a quantidade de dólares circulando no mercado internacional. Para ela, há também elementos que não devem mudar, como a total abertura para o capital financeiro.

Jane Kelsey tratou da turbulência internacional na qual os acordos comerciais multilaterais, como o Acordo Transpacífico de Cooperação Econômica (TPP), tem sido firmados. Segundo ela, antes mesmo de Trump decidir que não apoiaria o TPP, diversos países discordaram do acordo, motivo pelo qual em boa parte as expectativas sobre o acordo foram transferidas para o Acordo sobre o Comércio de Serviços (TISA), que também gerou grande desconfiança na comunidade internacional.

Thomas Palley iniciou sua fala tratando da relação entre o discurso de Trump acerca da globalização e sua pratica de tornar mais intenso o neoliberalismo, atacando toda a política regulatória do mercado. Para Palley, é difícil prever qual será a política econômica de Trump voltada ao mercado externo, entretanto, algumas decisões tomadas já no início do governo apontam caminhos, como a quebra de acordos internacionais (desejados por empresários estadunidenses de alguns setores), a mudança de postura em relação à China e o fortalecimento do protecionismo. Palley afirma que o ataque ao multilateralismo e o fortalecimento de um unilateralismo é uma tendência do pensamento neoconservador, que encontra em Trump seu principal expoente político.

Assista ao segundo painel:

 

Painel 3

O terceiro e último painel do dia discutiu migrações e trabalho. Participaram do debate Ana Avendaño, da Federação Americana do Trabalho e Congresso de Organizações Industriais (AFL-CIO); Deisy Ventura, professora da Universidade de São Paulo (USP); Kjeld Jakobsen, consultor em cooperação e relações internacionais; e Rubens Diniz, membro do Conselho Curador da Fundação Maurício Grabois, coordenando o debate.

Ana Avendaño lembra que o império de Donald Trump foi construído a partir de três elementos: a herança, recebida após a morte de seu pai; a superexploração de trabalhadores; e o desrespeito à política de impostos. Avendaño discordou dos palestrantes do primeiro painel, que avaliam Trump unicamente como fenômeno político e não como pessoa: uma pessoa racista, sexista, xenófobo e que se gaba de todas estas características, o que o torna muito perigoso tanto para os EUA como para o mundo. Ela lembrou que o perfil médio dos eleitores de Trump é de trabalhadores brancos apavorados com o desemprego e que tentam apontar culpados para a situação de crise, e o combate a isso deve orientar a política sindical estadunidense.

Deisy Ventura tentou interpretar o que significam as primeiras ações de Trump e que um homem como ele na presidência dos EUA representa. Para Ventura, o novo governo tem a xenofobia como política de governo, o que significa a completa negação dos direitos das pessoas estrangeiras ou descendentes. A pesquisadora apontou diversos atos de Trump no sentido de retomar ou reforçar privilégios de alguns grupos, demonizando as pessoas que não se enquadram no modelo de cidadão que o presidente defende. Ventura lembrou também da força das palavras que utilizamos diariamente que não dão conta de significar a complexidade política: “se nos referimos ao momento histórico em que vivemos como crise dos refugiados ou crise das migrações, como vemos diariamente nos jornais, então somos xenófobos”. 

Kjeld Jakobsen iniciou sua fala elencando as novas políticas de migração estadunidenses. Seguiu mapeando as origens e o perfil das pessoas que migram para os EUA, demonstrando que não há qualquer motivo para o medo do terrorismo; não há qualquer sustentação ao argumento de que imigrantes supostamente estariam tomando os empregos nas indústrias; e que o risco de perseguição e deportação, desrespeitando as relações construídas por pessoas que migraram e que vivem nos EUA há anos, desrespeitando qualquer perspectiva de dignidade, deve nos preocupar.

Assista ao último painel: