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    Comunicação

    Fêmea e Castigo

    À Lúcia Rincon   Em procissão, dez cães. No agreste, uma cadela no cio. De prazer e cansaço, um palmo de língua para fora dos lábios. Nas ruas, ninguém, exceto um jumento. Louca de languidez, julgava, assim, apenas ela e os machos. Dominada por uma paixão tamanha, entregava-se a planejar meios de atrelar-se àquele de […]

    POR: Adalberto Monteiro

    À Lúcia Rincon

     

    Em procissão, dez cães.

    No agreste,

    uma cadela no cio.

    De prazer e cansaço,

    um palmo de língua

    para fora dos lábios.

    Nas ruas, ninguém,

    exceto um jumento.

    Louca de languidez,

    julgava, assim,

    apenas ela e os machos.

    Dominada por uma paixão tamanha,

    entregava-se a planejar meios

    de atrelar-se

    àquele de cabelos castanhos

    e olhos claros.

     

    Enquanto assim refletia,

    curumins açulados

    pelo padre, pelas beatas

    marcharam para persegui-la.

     

    Às primeiras pedras,

    fugiram os machos.

    Exausta de saciá-los,

    faltava-lhe forças à fuga.

     

    Implacável a caçada.

    Quando cruzaram o açude,

    ela, sedenta, inclinou o

    l

    o

    n

    g

    o

    pescoço

    e os pelos eriçaram

    e a garganta ainda orvalhou-se.

    E veio uma avalanche de pedras

    E a mão esquerda

    E as mamas

    E o focinho sangravam.

    E os seus lindos olhos azuis

    indagavam

    o porquê daquela determinação

    animalesca de assassiná-la.

     

    Ela reuniu o que lhe restava

    e com unhas, patas, caninos,

    uivos e lábios

    conseguiu amedrontá-los.

     

    Mas os donos das bodegas

    haviam fixado como recompensa

    enormes pedaços de rapadura.

    Aos moleques,

    o vigário e as beatas

    haviam prometido o Céu.

    Então, o bando agia

    com a ferocidade

    de uma cavalaria das Cruzadas.

    Vontade fêmea,

    lasciva,

    de viver.

    Correu, correu,

    ainda mais correu;

    andou, andou,

    andou o quanto pode.

    Arrastando-se,

    ocultou-se

    debaixo da ponte de um rio seco.

     

    O bando em chacina

    e algazarra

    − incessantemente −

    uma pedra

    mais outra

    mais outra

    mais outra

    mais outra

    muitas outras

    uma outra mais

    até

    o estouro

    do

    crânio.

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