A desregulamentação da educação privada: afronta à Constituição.
No seu art. 209 a Constituição Cidadã determina que a educação é livre a iniciativa privada atendidas as seguintes condições: 1- cumprimento das normas gerais da educação Nacional e 2- autorização e avaliação de qualidade pelo poder público. Ou seja, a liberdade de atuação está condicionada a regulamentação.
Desde a aprovação da Constituição os setores privatistas atuam em duplo sentido: impedir a votação e implementação de políticas públicas que aumentem o controle do poder público e da sociedade sobre seus negócios e afrouxar os critérios de avaliação e de autorização do Estado e do Ministério da Educação.
Quando da aprovação da lei 10.861 de 2004 (SINAES) Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, o Lobby privatista, tentou de tudo para diminuir as exigências de qualidade na constituição do Sistema, atuou também fortemente na CONAES (Comissão Nacional de Avaliação) para impedir que os critérios de aferimento de qualidade dos cursos e instituições não ultrapassassem o que é previsto na Lei de diretrizes e Bases, ou seja, o mínimo.
Em todos os encontros realizados pela CONAES, o discurso do setor é o mesmo: os critérios rígidos aferidos pela avaliação e pela supervisão. Em nome do lucro e da liberdade de atuação, as empresas e seus representantes sempre atuaram contra a regulação.
Essa pressão aumentou com a entrada, após 2005, dos grandes grupos de capital aberto na educação superior brasileira.
Apesar de todo esse aparato de atuação política para desregulamentação, não só o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior foi colocado em prática, como tem gerado inúmeros processos contra cursos e instituições, que nas avaliações de forma sistemática, não atingem o mínimo exigido de qualidade.
Em 2017, apenas 1,6% das instituições de ensino superior privado obtiveram boas avaliações (dados do Inep), isso dentro de um universo de 2.066 instituições e mais de 50 mil cursos presenciais.
Com esses dados parece loucura pensar em auto-regulamentação do setor, não?
Aliás, a criação em 2011 da Secretaria de regulação (SERES) ocorreu, diante da imperiosa necessidade de provimento aos inúmeros processos gerados pela avaliação. Parece então um contrassenso defender a auto regulação tendo como argumento a incapacidade da Secretaria de cumprir o seu papel. O Secretario de regulação e supervisão, ao invés de defender a qualidade da educação superior, defende o contrário da razão da existência de sua secretaria. Defende publicamente a auto-regulação das instituições privadas.
O Secretario de regulação e supervisão ao invés de defender a auto-regulação, deveria estar reivindicando o fortalecimento de sua secretaria e a provação por parte do parlamento da lei do INSAES (Instituto Nacional de Avaliação da Educação Superior) que daria, não só maior condição para a supervisão, como garantiria para os(as) estudantes brasileiros o direito a um curso superior de qualidade.
Não existe nem mais a preocupação em disfarçar seus compromissos privatistas. A secretaria de supervisão e regulação não foi criada para defender o lucro do capital aberto as custas da qualidade da educação.
A Auto-regulação defendida pelo setor privatista, tendo à frente o Secretário de regulação e supervisão, fere o art. 209 da Constituição Federal. Mas isso parece não importar. O que esperar de um governo cujo objetivo principal é exatamente o de defender os interesses do capital financeiro, no caso, dos acionistas dos grandes grupos financeiros de educação, que não se importam com a qualidade formação dos futuros profissionais brasileiros.
O pouco que se conseguiu de regulamentação, desde a constituição de 1988, está sob risco, quem perde com isso é a educação brasileira.
*Prof.ª Dra. Madalena Guasco Peixoto
Diretora da Faculdade de Educação da PUC/SP, Secretaria Geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee)