Manifesto ataca política fiscal neoliberal para sair da crise
Apresentado pela jornalista Cynara Menezes, autora do blog Socialista Morena, falaram os representantes das fundações signatárias, Aloizio Mercadante (Perseu Abramo/PT), Alexandre Navarro (João Mangabeira/PSB), Renato Rabelo (Maurício Grabois/PCdoB), Manoel Dias (Leonel Brizola-Alberto Pasqualini/PDT), Francisvaldo Mendes (Lauro Campos-Marielle Franco/PSol), Nilson Araújo (Cláudio Campos), além de lideranças partidárias. As fundações integram o Observatório da Democracia e ainda incluem entre os signatários do manifesto a Fundação da Ordem Social/PROS, que não pode comparecer.
O presidente da Fundação Maurício Grabois, Renato Rabelo, ressaltou o fato das fundações não se ausentarem em função da realidade dramática do país. Segundo sua análise, estamos vivendo múltiplas crises numa cadeia complexa de efeitos causada pelo atual presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
“Oferecemos uma síntese de medidas que combinadas possam enfrentar a emergência sanitária e econômica para salvar a vida dos compatriotas e manter a economia funcionando”, disse ele sobre o conteúdo do manifesto.
Ele destacou como uma linha de força do manifesto a necessidade de buscar novos caminhos e novas soluções. Segundo ele, o projeto de Bolsonaro não serve ao Brasil e ao seu povo. “A mortandade podia ser evitada, mas ele respondeu com negacionismo e obscurantismo”, observou.
Em sua opinião, o governo não tem agenda para estimular a atividade econômica nem visa seu crescimento. “Para enfrentar uma crise dessa dimensão, em profundidade, só com a ação do estado para financiar o investimento e o gasto público”, apontou.
“O Estado terá papel central na indução e retomada dos empregos e da renda em parceria com o setor privado”, defendeu Renato. Para isso, ele acredita que há formas de financiar os gastos sem elevar o endividamento, na medida em que o Tesouro pode emitir títulos e vender ao Banco Central para financiar o investimento público.
De acordo com o dirigente comunista, é urgente uma reforma tributária progressiva que distribua renda e financie o investimento. Ele também salientou do manifesto a defesa de uma estratégia sanitária de vigilância epidemiológica, que foi usada com sucesso em outros países. “O SUS [Sistema Único de Saúde] tem condições de bloquear o contágio”.
Para ele, este é o centro do manifesto e um caminho totalmente distinto do que tem tomado o presidente da República.
A presidenta nacional do PCdoB, e vice-governadora de Pernambuco, Luciana Santos, começou calculando como “vidas, histórias e dores”, os 122 mil óbitos que se somam no Brasil pela pandemia de Covid-19, nesta data. “Vimos descaso, desrespeito, descompromisso e desgoverno com uma situação considerada tão importante no mundo todo. Bolsonaro usou a pandemia não para cuidar das vidas, mas como estratégia eleitoral”, lamentou Luciana.
Para ela, o Brasil precisa de um projeto alternativo para superar a maior crise econômica desse novo século, referindo-se ao manifesto que ela considera uma síntese de elaboração de inteligências de diferentes setores políticos.
Ela mencionou a gravidade da crise econômica, em que 715 mil empresas fecharam no setor produtivo. “Temos mais gente recebendo recursos do auxílio emergencial do que da carteira assinada”, comparou.
Em sua opinião, Bolsonaro e Guedes não possuem um plano para enfrentar essa crise. “Mais que em qualquer momento, precisamos do papel do estado como indutor do desenvolvimento para minimizar os impactos”, defendeu.
O diretor da Fundação Claudio Campos, Nilson Araújo, afirmou que o manifesto não está sendo lançado “num momento qualquer”, mas numa verdadeira tragédia histórica e humanitária. “Estávamos entrando em depressão e na pandemia se perdeu 2 milhões de empregos. Esses 120 mil mortos poderiam ter sido evitados e a responsabilidade disso tem RG e CPF”, disse ele, referindo-se ao presidente Bolsonaro.
Ele justificou sua percepção citando o modo como o presidente retardou medidas econômicas e sabotou abertamente as medidas sanitárias. “Teria sido pior se o Congresso não houvesse agido”, disse ele, referindo-se à aprovação do auxilio emergencial contra a vontade de Bolsonaro, entre outras medidas de socorro à economia e à saúde.
“Mesmo durante as medidas emergenciais, este governo já deveria estar pensando em propostas para a retomada da economia”, defendeu Araújo. “Em vez de desmontar o estado, deveria haver um estado pujante para realizar o investimento público em infraestrutura de qualidade, retomar a industrialização do país, a partir do complexo de saúde”, propôs ele, aludindo ao conteúdo do manifesto.
“Dinheiro há”, declarou. Ele defendeu, como outros economistas heterodoxos, que, em momentos de crise, o governo pode emitir moeda, que não gera inflação. “O mundo inteiro está fazendo isso”.
“O Brasil é bem maior que essa crise, maior que esse vírus e as ameaças à democracia colocadas a todo momento. Por isso estamos construindo a mais ampla frente em defesa da democracia da vida e do emprego”, concluiu.
O presidente da Fundação Perseu Abramo, Aloizio Mercadante, começou homenageando o jornalista Luiz Nassif pela censura recente sofrida pelo seu jornalismo. Decisão judicial exigiu a retirada de seu site GGN, de denúncias contra o Banco BTG Pactual.
Sobre o manifesto, Mercadante considerou que há um significado de iniciativa inovadora para a esquerda e o campo progressista neste documento. Ele diagnostica um grave crise política, ameaça a democracia, perversa crise sanitária, crise econômica de grande proporção, investimentos “no buraco” e a capacidade de consumo das famílias que desabou. Ele mencionou as 40 milhões de pessoas que queriam trabalhar e não tem condições.
Para ele, isto tudo é resultado de um governo negacionista e obscurantista, que não providenciou testagem, não coordenou o SUS, não estimulou o distanciamento social. “Estamos dizendo com este manifesto que os partidos de esquerda têm história. Nossas bancadas têm agido de forma unitária em relação aos desafios. As únicas respostas eficientes são resultado das bancadas desses partidos que estão aqui”, celebrou, mencionando a aprovação do auxílio emergencial como uma vitória da oposição.
“Se com R$ 251 bi destinados ao auxílio emergencial, estamos com queda de 12,5% no PIB, para onde iremos retirando esse instrumento se a pandemia nem está controlada”, indaga o petista.
Ele ainda sugeriu que é preciso garantir bolsa família de 600 reais, criar empregos emergenciais no serviço público, garantir água e luz durante a pandemia, sem cortes e gás subsidiado por preço de custo.
O economista criticou a irresponsabilidade de Bolsonaro em se manifestar contra o distanciamento social e a vacina, como fez esta semana. Também defendeu que não deve haver retorno às aulas sem que parâmetros mínimos de segurança contra o vírus sejam garantidos
“Não há saída da crise com teto de gastos e arrocho fiscal”, resumiu. Ele citou a queda dramática em investimentos em Ciência e Tecnologia, Ministério que comandou no governo anterior, assim como o estrangulamento de investimentos em saúde e educação.
“Não há saída com esta visão de estado mínimo neoliberal”, atacou. Para ele, tem que ter imposto sobre fortunas, “como a Argentina está fazendo”, entre outros impostos que ele mencionou que atingem diretamente os mais ricos. “Por isso, somos frontalmente contra esse governo e essa política fiscal”, concluiu.
O presidente da Fundação João Mangabeira, Alexandre Navarro, considerou um “fato inédito no país”, que, desde 2017, as fundações se juntem, “apesar de suas divergências e das diferenças eleitorais”, para discutir políticas públicas. Ele lembrou que as fundações exerceram um papel importante com a fundação do Observatório da Democraica em 31 de janeiro de 2019, assim como com a realização de 21 lives sobre temas fundamentais para o país no período da pandemia.
Ele também considera a queda de 9,7% no PIB uma tragédia que o manifesto trata e procura discutir soluções. “Não é um som do passado, como diz o ministro da Economia, mas a morte do futuro”, rebateu.
Navarro lamentou que o Brasil seja, hoje, o país que nega a ciência e não investe em tecnologia. Embora seja um país competente na agricultura, ele acredita que o Brasil não possa se limitar a ser um país exportador de commodities. “A China quando caiu de 9% para 6% de crescimento do PIB, investiu ainda mais em pesquisa, desenvolvimento, ciência e tecnologia”, comparou.
Finalmente, ele questionou como vão ficar as 120 milhões de famílias impactadas pelo auxílio emergencial, quando ele não mais existir. “Não se discute tributar o andar de cima”, criticou ele a ausência de uma reforma tributária progressiva.
O presidente da Fundação Leonel Brizola/Alberto Pasqualini, Manoel Dias, considerou importante reeditar a unidade das fundações para resistir à ditadura que tenta se impor com o atual governo, em defesa do estado brasileiro.
Ele observou como a pandemia fez com que a elite tivesse que enxergar 60 milhões de pessoas sem saneamento básico, sem casa, sem comida, sem emprego e acesso à educação. “Não há solução, enquanto essa população não souber das coisas. A imprensa desinforma e os coloca como aliados dessa família maluca no governo”, criticou, falando da necessidade de politizar o trabalhador brasileiro.
“Precisamos garantir sobrevivência antes de divergir. Bolsonaro sempre defendeu fascismo e retrocesso”, defendeu ele, sobre a necessidade de superar diferenças partidárias para se unir pela deposição do atual governo.
Ele também atacou a política neoliberal para onde Paulo Guedes quer continuar levando o país. “Diziam que o estado zero e o deus mercado ia resolver tudo. Onde está o deus mercado? Se não fosse o SUS estaríamos numa calamidade ainda pior”, constatou.
Para ele, é fundamental retomar o diálogo com a periferia e politizar a população. “Essa população que esta apoiando Bolsonaro não tem discernimento do que está acontecendo pelo erro cometido por nós ao não reforçarmos a consciência política do trabalhador”, lamentou.
O presidente da Fundação Lauro Campos/Marielle Franco, Francisvaldo Mendes, destacou que o debate que veio com esta pandemia foi de “qual o modelo de estado que queremos”.
“Este é o modelo do projeto neoliberal de colocar o mercado acima de tudo; e a pandemia veio escancarar a diferença entre quem ganha muito e quem não ganha nada. Hoje temos estado apropriado por uma minoria de banqueiros e donos do poder”, criticou.
Ele observou que, hoje, há um “exército” de pessoas que nem estava cadastrado no estado para receber o auxílio emergencial, referindo-se aos milhões que dependem da ajuda do governo para se sustentar e que sequer dispunham de bolsa família. “Precisamos de uma reforma tributária que tire dos que têm muito e não precisam disso”, defendeu.
Ele também considera que o campo progressista precisa defender o salário mínimo elaborado pelo Dieese, que está acima de R$ 4 mil reais, “que deveria ser o mínimo para a sobrevivência de uma família”.
Os deputados federais Paulo Teixeira (PT-SP) e Alessandro Molon (PSB-RJ) também comentaram o lançamento do manifesto. Teixeira disse que Bolsonaro é o governo da morte dos empregos, dos mais pobres. “Liberou um trilhão para os bancos e ínfimos e tardios recursos para as pequenas empresas que empregam milhões de trabalhadores”, disse. Para ele, o único acerto desse governo não foi dele, mas do Congresso, ao exigir e aprovar o auxílio emergencial de R$ 1200.
Molon considera que o manifesto sinaliza que a oposição ao governo tem um projeto para o país. “Como tirar o país do fundo do poço? Estamos mostrando a luz para quem olha pra cima, já que o governo não sabe como tirar o Brasil dessa cilada”, comparou.
Para o socialista, o manifesto é “um sinal de união e um passo dado num caminho que não é fácil de ser trilhado”.
Assista aqui a íntegra do lançamento do manifesto das fundações:
Leia o ‘Manifesto em defesa da vida, da democracia e do emprego’
O manifesto baseia-se no surgimento de documentos elaborados por diversos setores com propostas de combate à crise sanitária. São documentos que se completam e foram elaborados por um amplo leque de forças políticas e entidades da área de saúde, entre eles “Sugestão de agenda econômica mínima”, aprovado pelo movimento Direitos Já!, que reúne lideranças de 17 partidos; o “Plano nacional de enfrentamento à pandemia da Covid-19”, aprovado pela Frente pela Vida, que reúne 14 das principais entidades de saúde do país; além de documentos assinados por PDT, PT, PSB e PCdoB com propostas contendo medidas econômicas e sanitárias para combater a crise. O texto completo está disponível neste link.