A “falácia” da flexibilização trabalhista defendida por Paulo Guedes
O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse hoje (8), em Brasília, que o país tem que encontrar mecanismos para incluir no mercado de trabalho 40 milhões de “invisíveis” identificados pelo governo durante a pandemia do novo coronavírus. Ele defendeu a flexibilização da legislação trabalhista e citou a Carteira de Trabalho Verde Amarela como uma das ferramentas para a inclusão dos vulneráveis na economia.
Sindicalistas e especialistas em regulação trabalhista consideram o argumento falacioso, por retirar direitos e garantias do trabalhador sem qualquer garantia e dado concreto de melhor no emprego ou no salário. Na última semana, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin votou pela inconstitucionalidade do contrato intermitente, estabelecido em 2017 pela reforma trabalhista de Michel Temer. As manifestações sobre o assunto refletem a posição dos trabalhadores sobre a argumentação de Guedes, feita hoje (leia abaixo).
“Temos que reconhecer o direito à existência desses brasileiros. Eles não conseguiram sobreviver com o quadro de legislação trabalhista existente. Eles foram excluídos. Então, não vamos tirar direitos de ninguém na legislação trabalhista que existe aí, mas pelo menos como é que a gente cuida deles? Será que precisamos de um regime extraordinário para eles por um, dois anos? Nós temos que raciocinar sobre isso”, disse o ministro durante participação em um seminário do Instituto de Estudos Jurídicos Aplicados (Ieja).
Segundo Guedes, a iniciativa necessita de consenso com os outros poderes. Ele citou a ação do Legislativo na mudança de marcos regulatórios de diferentes setores, como o gás. “Isso jamais será feito sem estarmos juntos, sentarmos juntos”, afirmou.
Jornada de trabalho
Durante sua fala, o ministro da Economia citou ainda a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que manteve a eficácia da regra da Medida Provisória (MP) 936/2020.
A medida autorizou a redução da jornada de trabalho e do salário ou a suspensão temporária do contrato de trabalho por meio de acordos individuais em razão da pandemia do novo coronavírus, independentemente da anuência dos sindicatos da categoria.
O ministro voltou a afirmar que o Brasil pode encerrar o ano com perda zero de empregos no mercado formal.
Ele disse que a retomada da economia está ocorrendo em “V” [termo usado por economistas para relatar uma retomada intensa depois de uma queda vertiginosa na atividade econômica] e citou dados como a retomada da produção industrial e do consumo de energia elétrica e da indústria para justificar a afirmação. “Estamos vendo a reação do Brasil e o país surpreendendo de novo”, disse.
Precarizar para gerar emprego
A secretária de Políticas Sociais da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Vânia Marques Pìnto, considera falaciosa a afirmação de que a flexibilização da legislação trabalhista, reformas trabalhistas e permissão de contratação intermitente de trabalhadores visam regular a informalidade no mercado de trabalho e gerar emprego.
“Os resultados estão aí para todo mundo ver. A precarização do trabalho e o desemprego só crescem no país, mesmo com toda essa flexibilização dos direitos trabalhistas”. Ele lembra dados do IBGE de que a contratação intermitente representou 1% de todos os contratos com carteira assinada em 2019. “O desespero toma conta de quem fica sem o emprego e os patrões abusam dessa realidade”, afirma Vânia.
Vânia defende a revogação total da reforma trabalhista e flexibilizações da legislação trabalhista que “minam a resistência do movimento sindical e com isso põe fim aos direitos trabalhistas conquistados com muita luta pela classe trabalhadora”.
Além de que “todas as promessas feitas na exposição de motivos para a aprovação da reforma trabalhista não se cumpriram, nem mesmo a tentativa de mascarar os dados através do contrato intermitente” isso porque “cada trabalhadora e trabalhador precisa de quatro, cinco vínculos empregatícios para obter uma renda minimamente razoável”, acentua Valdete Souto Severo, juíza do Trabalho e presidenta da Associação Juízes para a Democracia (AJD).
A Reforma Trabalhista, Lei 13.467, entrou em vigor no dia 11 de novembro de 2017 “estraçalhando a Consolidação das Leis do trabalho (CLT) e resgando a Constituição de 1988”, diz Vânia. Com a promessa de criar novos postos de trabalho com a redução dos encargos sociais pagos pelos patrões. O resultado, no entanto, foi bem diferente. Três anos depois, o Brasil amarga 14,6% da população economicamente ativa no desemprego. E a pandemia agravou ainda mais essa triste situação.
De acordo com Adilson Araújo, presidente da CTB, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do IBGE, de agosto, mostra que “O Brasil alcançou o número de 79 milhões de pessoas em idade ativa fora da força de trabalho” e, pior, “sem perspectiva de melhorias. Muita gente está vivendo de bicos e trabalho precário”, muitas vezes “análogo ao trabalho escravo”.
Esse é o resultado apresentado pela reforma trabalhista e pelas políticas favoráveis aos patrões e aos muito ricos do governo de Jair Bolsonaro. “A CTB espera que o STF sepulte o contrato intermitente”, assinala Vânia. “Continuaremos na resistência até a reforma trabalhista e demais leis criadas pelos governos neoliberais contra os interesses nacionais e da classe trabalhadora serem revogadas”.