O “salve-se quem puder” instaurado por Bolsonaro na pandemia
Em entrevista à equipe do portal Vermelho, o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), falou sobre o cenário nacional e as perspectivas do Brasil, fazendo uma retrospectiva do ano de 2020 e seus desafios.
Sobre a atuação do governo na pandemia, ele falou de sua preocupação com o “salve-se, quem puder” instaurado em relação às medidas sanitárias de todos os tipos, que levaram os governadores e prefeitos a fazerem “justiça com as próprias mãos”, sem poder esperar por uma resposta do Governo Federal. Agora, com a aproximação das vacinações, a preocupação continua, embora ele torça para que o Ministério da Saúde assuma suas prerrogativas nacionais nesse assunto.
Para ele, Bolsonaro pode ser criticado por quase tudo, “menos por ser uma pessoa incoerente na insensatez”. Flávio o define como uma pessoa “coerente nos seus equívocos”, ou seja, “ele começa errando e continua errando até o fim”. Para isso, ele pontuou com os exemplos que se somam desde o início da pandemia. “É histeria, é gripezinha, não é problema meu, não vale nada, não precisa de nada, coisa de maricas, todo mundo vai morrer um dia, não sou coveiro, não estou nem aí para a vacina”, citou ele, as falas mais famosas de Bolsonaro durante a crescente de letalidade da doença.
Assim, ele observa que há um fio condutor entre a primeira entrevista no exterior, quando o vírus ainda não chegara no Brasil, e ele disse que era uma histeria, com a tragédia atual, em que, mais uma vez, assiste-se o governo federal com dificuldade de exercer o papel que lhe cabe, constitucional e legalmente, ou seja, o de coordenação do pacto federativo para enfrentamento conjunto da pandemia.
“Estabeleceu-se um salve-se quem puder no que se refere a luvas, máscaras, respiradores, medidas preventivas, e, agora, o salve-se quem puder em relação às vacinas vai se formando. Eu tenho lutado contra isso. Eu continuo defendendo o plano nacional de imunização, porque isto é o certo. Não podemos fragmentar o Brasil. Imaginemos criar migração de pessoas entre os estados em busca de vacinas… não é desejável!”, indignou-se.
Como governador, ele diz que tem feito dois movimentos: primeiro cobrar que o governo federal faça o que tem que fazer, que é exercer o comando do plano nacional de imunização. A lei 6259, de 1975, fixa as obrigações da União em gerenciar o plano nacional de imunização. “São 45 anos em que ninguém nunca discutiu isso, mas o Bolsonaro é espantoso! Como eu disse: coerente em sua insensatez. Ninguém nunca quis ficar com as atribuições do Ministério da Saúde, porque o plano nacional é o correto”.
Flávio lembra que foi feito um pacto entre o governo federal e os governadores em 20 de outubro, mas Bolsonaro rasgou o pacto e disse que quem mandava era ele, e desautorizou o ministro da saúde. “A partir daí, cada um vai buscar um caminho. O [governador de São Paulo, João] Dória tem dinheiro e o Butantã em São Paulo, uma instituição do Brasil, mas pertencente administrativamente ao governo de São Paulo. Fez um acordo, está comprando [vacinas] e vai ser condenado por isso. A meu ver, não deve”, opinou.
No caso do Maranhão, o governador entrou com ação judicial no Supremo Tribunal Federal, para ter autorização de comprar vacina diretamente, inclusive do Butantã. “Porque se o plano nacional de imunização não andar, temos uma espécie de plano B. Este é o sentido da movimentação que fiz e de outras que temos feito para garantir que possamos com nossos meios”.
“Se o governo federal continuar nessa confusão sem fim, vai se instalar o salve-se quem puder. Luto para que isso não ocorra, participo de reuniões com o governo federal, converso sobre isso, mas vamos ver…”, diz ele, cauteloso.
Em sua opinião, reina, nesse momento, uma grande insegurança quanto a isso. Ele pretende continuar acompanhando o que acontecerá, inclusive no que refere a decisões do Supremo e do Congresso Nacional. Se Bolsonaro não consegue coordenar seu governo para comprar vacina, ele acredita continuar conseguindo nos outros poderes, decisões que possam levar o Brasil a ter um plano nacional rápido e eficiente. “Se não, vamos ter vários planos estaduais, inclusive do Maranhão”, antecipou.
A baixa mortalidade no Maranhão
Levantamento do consórcio da imprensa observa que dos nove estados do Nordeste, só o Maranhão não apresenta aceleração de mortes nos últimos dias. Ele apontou o que o governo do Maranhão tem feito para garantir estes resultados e evitar uma segunda onda de contágios e como tem funcionado a integração entre os governos do Nordeste para reagir conjuntamente a uma nova crise intensa do coronavírus.
Ele contou que os governos nordestinos continuam a conversar conjuntamente no âmbito do Consórcio do Nordeste, assim como, em cada estado, há também comitês científicos. “Este diálogo entre os profissionais da área e aqueles que têm a responsabilidade de adotar os caminhos tem garantido boas decisões”, afirmou.
No caso do Maranhão, observa ele, tem havido transparência e investimento em rede. Ele conta que ampliou a rede de saúde, chegando a inaugurar 13 unidades de saúde em doze semanas, no auge da pandemia. Aumentou em 30% a 40% dos gastos com saúde, durante a pandemia. “Hoje, temos uma oferta de rede de atendimento bastante ampla. Notamos uma melhoria da qualidade do manejo desses casos pelos profissionais de saúde com a curva de aprendizado dessa situação nova”.
No hospital de referência para Covid-19, Carlos Macieira, ele diz ter ouvido o diretor contar que faz oito dias que não morria uma única pessoa desta doença. “Chegamos a ter dez óbitos em um dia, neste hospital, o que mostra que há um aprimoramento e qualificação dos profissionais”, analisa.
Mas ele diz que não está acomodado com o que fez. Acabou de autorizar turnos ininterruptos de 24 horas e sete dias na semana para inaugurar uma obra hospitalar em janeiro, em vez de fevereiro. “Estou sendo prudente, porque se vejo que o mapa do Brasil está ficando todo revelador de trajetória de crescimento, tenho que me preparar para o pior. Nunca parei de inaugurar obra de saúde, desde abril”, garante o governador maranhense.
Flávio Dino fez um depoimento pessoal ao confessar o esforço para salvar vidas. “Deus é testemunha do meu esforço desesperado, obstinado, noites e noites que fiquei sem dormir atrás de leito, imaginando como requisitar hospital, como fazer parceira com setor privado. Aluguei três UTIs aéreas para ficar voando, cortando o Maranhão, transportando paciente de um lado para outro. Consegui UTIs móveis, ambulâncias do setor privado. Conseguimos um resultado que não é perfeito, mas reconhecido nacionalmente como sério”, declarou.