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De Olho no Mundo

16 de março de 2021
Pedro Castillo e Keiko Fujimori disputam o segundo das eleições presidenciais no Peru

A cientista política Ana Maria Prestes analisa os fatos mais significativos da conjuntura internacional. Destaque para a disputa presidencial no Peru, cujo segundo turno ocorrerá no dia 6 de junho. Ainda na América Latina, Ana Prestes analisa os protestos na Colômbia, que completaram um mês no dia 28 de junho. Também são analisados o encontro presencial entre Joe Biden e Vladimir Putin, previsto para ocorrer no dia 12 de junho, e o reconhecimento, pela Alemanha, das atrocidades cometidas contra o povo da Namília.

Peruanas e peruanos vão às urnas no próximo domingo 6 de junho para decidir quem será o novo ou nova presidente do país. Concorrem: Pedro Castillo, candidato pelo partido Perú Libre e Keiko Fujimori, pelo partido Fuerza Popular. Ontem (30) ocorreu o único debate da campanha de segundo turno que durou quase dois meses, considerando que as eleições de primeiro turno se deram no dia 11 de abril. Assim que terminou o primeiro turno, as primeiras pesquisas de opinião davam 20% de vantagem de Castillo sobre Fujimori. Passados dois meses de intensa campanha contra o candidato da esquerda, Castillo, a diferença diminuiu e alguns institutos falam de empate técnico. São vários os institutos com pesquisas, escolhi a pesquisa do Ipsos para partilhar aqui os divulgados por eles em 28 de maio: Castillo aparece com 52,6% e Keiko Fujimori com 47,4%. Se forem considerados apenas os votos válidos, Castillo fica com 45% e Keiko com 40,7%, votos brancos e nulos ficariam com 14,3%. De fato, o que se sabe é que 15% da população ainda estaria indecisa sobre quem votar. A candidata Keiko Fujimori é filha do ditador Alberto Fujimori e sobre ela pesam uma série de denúncias de corrupção. No começo da campanha ela não podia viajar pelo país por estar em restrição de liberdade imposta pela justiça, justamente pelos julgamentos que enfrenta. Apesar do fujimorismo ter se isolado muito no último período com grandes perdas no parlamento e na opinião pública em geral, ele foi reativado pela direita peruana justamente no intento de barrar a chegada de Pedro Castillo à presidência. Já Castillo é um sindicalista da área da educação rural, tendo se projetado nacionalmente em 2017 durante a Greve Nacional da Educação. Ele participa do partido Perú Libre, que se identifica como marxista-leninista-mariateguista e foi fundado por um médico, Vladimir Cerrón, um médico neurocirurgião e que é o governador da região peruana de Junín. Uma das formas de tentar desestabilizar a campanha de Castillo, operada pela direita e pelo governo, via forças armadas, foi atribuir a ele relação com um atentado ocorrido na região de Vraem no dia 23 de maio, com a morte de 16 pessoas, incluindo menores. Ao lado dos corpos foram encontrados folhetos pedindo boicote à eleição. Nas eleições de 2011 e 2016, houve atentados semelhantes no exato dia da véspera da eleição. Voltando um pouco ao tema do debate de ontem, os pontos de maior destaque ficaram por conta das diferenças de perspectivas em torno da pandemia, gestão da saúde, gestão da educação, investimento externo, tecnologia e concepção geral de estado. Claramente uma aposta de Keiko em mais neoliberalismo e de Castillo no desenvolvimento sustentável e centralidade do papel do Estado. A polêmica que mais ganhou as redes foi quando Keiko acusou Castillo de não citar as mulheres em seus discursos e Castillo revidou dizendo que ela devia desculpas ao país pelas mulheres esterilizadas ao longo do mandato presidencial de seu pai, Alberto Fujimori. Castillo também fez menções às torturas sofridas pela mãe de Keiko com a anuência dela, para se referir ao tema das mulheres. O debate pode ser visto na íntegra neste link:

https://youtube.com/watch?v=TGtdCK08oYw%3Ffeature%3Doembed

Na Colômbia, na última semana completou-se um mês dos protestos iniciados em 28 de abril com a convocatória de um Paro Nacional. Importante ressaltar que não são lutas que vêm desse mês apenas, mas um histórico de tensão entre movimentos populares e o governo Duque, assim que esse tomou o poder e em perspectiva maior das últimas décadas de neoliberalismo e incapacidade do Estado de implementar os Acordos de Paz. Os protestos se agudizaram em 21 de novembro de 2019. Depois em setembro de 2020, quando 14 pessoas foram mortas em Bogotá pela polícia e agora em abril de 2021. O que está ocorrendo agora é um “estalido social”, como se chamam os movimentos que ultrapassam as pautas reivindicatórias pontuais. Uma demonstração de cansaço frente ao modelo neoliberal. E na Colômbia há o agravante da violência promovida pelo Estado. Passado esse um mês, a discordância entre governo, movimentos e ongs sobre o número de mortos, desaparecidos, presos, mulheres sexualmente violentadas é gritante. Governo e polícia falam em 17 civis e 2 policiais mortos, 9 casos em verificação, 129 pessoas desaparecidas. Uma das organizações que tem feito esse acompanhamento se chama Temblores e reporta 43 homicídios certos e outros 34 em verificação se tem relação com os protestos e 3405 atos de violência policial. Outra organização é o Indepaz que fala em 65 mortos, sendo 45 pelas forças de segurança do exército, 358 desaparecidos, 47 pessoas com lesões oculares, 27 vítimas de agressão sexual. Outra organização, a Unión por la libertad, fala em 59 mortos, 346 desaparecidos, 87 vítimas de violência de gênero, 51 pessoas com lesões oculares. Tal discrepância demonstra um total descontrole do país, através de uma política agressiva e violenta do governo Duque contra os manifestantes. Chegou a haver um pré-acordo entre governo e comitê dos manifestantes no dia 24 de maio, para pactuar segurança nas manifestações, para daí sim começar algum tipo de negociação de pautas, mas mesmo esse acordo caiu por terra no último final de semana. Ontem, domingo (30), haveria uma oitava rodada de conversas, mas o governo fez “ajustes” nos pré-acordos, tirando seu compromisso de desmilitarização e não uso de força militar contra os protestos, autonomia das autoridades locais na relação com os manifestantes, não uso de armas de fogo, excepcionalidade e limites para intervenção da Esmad (força de segurança especial), abertura de um debate sobre reforma da Polícia, aplicar instrumentos do acordo de paz para avançar na solução do conflito, condenação da violação de direitos humanos e estigmatização dos protestos, formação de uma comissão para acompanhar os acordos e outros. O governo alega que não é possível avançar nas negociações se não houver levantamento dos bloqueios de vias, um dos mais potentes instrumentos do movimento. O governo quer negociar sem paralisações e bloqueios, o que obviamente não é aceitável por parte de quem protesta. Outra denúncia que a oposição a Duque tem feito é quanto ao decreto 575/2021 que dá ao governo o direito de se apoiar em uma “assistência militar” para desbloquear vias e conter protestos. Na verdade é uma ainda maior militarização do país. Desde o começo das manifestações, a cidade de Cali tem sido a região mais tensa. A cidade de mais de 2 milhões de habitantes tem sido palco de ataques e assassinatos das forças de segurança governamentais e dos paramilitares. Ontem (30), a Alta Comissária da ONU para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, se pronunciou pedindo que sejam levantados dados sobre violação aos direitos humanos em Cali e rápida punição dos responsáveis.

Bandeiras dos Estados Unidos e Rússia

Vai acontecer no próximo dia 12 de junho o primeiro encontro presencial entre Biden e Putin, desde a posse do democrata em janeiro. Nos últimos dias houve anúncios por parte do governo dos EUA de que serão levantados temas de direitos humanos na reunião. A reação pública da chancelaria do governo russo foi de que os americanos receberão “mensagens desagradáveis”, sobre o episódio de 6 de janeiro no Capitólio, caso não haja clareza e compromisso sobre a pauta. Sabe-se que uma reunião de chefes de Estado de alto nível é muito bem preparada e com antecedência. Na prática, a reunião é para a foto oficial de coisas já decididas entre as partes, portanto, se há trocas de farpas através de anúncios públicos e entrevistas à imprensa é porque as coisas não estão tão azeitadas.

Namíbia

A Alemanha reconheceu formalmente as atrocidades cometidas durante a colonização da Namíbia. A colonização ocorreu entre 1884 e 1915. Durante esse período, foi promovido um verdadeiro genocídio do povo do país africano, em especial do povo Herero e do povo Nama por terem se revoltado contra a colonização em 1904 o primeiro e, na sequencia, em 1905 o segundo. Perto de 100 mil pessoas foram mortas. Muitas ossadas dessas pessoas foram enviadas para a Alemanha na época para experimentos científicos que embasaram teses racistas de superioridade da raça branca. Junto ao pedido de desculpas, o chanceler alemão Heiko Maas informou que será pago à Namíbia um valor de 1,1 bilhão de euros para ajudar no desenvolvimento e reconstrução do país. No entanto, esse valor será distribuído em contribuições ao longo dos próximos 30 anos. Segundo o porta-voz do presidente da Namíbia, em entrevista à France-Press, Alfredo Hengari, “a aceitação por parte da Alemanha de que um genocídio foi cometido é um primeiro passo na direção correta. É a base da segunda etapa, que consiste em pedir desculpas e prever uma reparação”.