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O mais amplo manifesto pró-democracia do Brasil

10 de agosto de 2022

Nesta quinta, 11 de agosto, dia do Estudante e do Advogado, serão lidos manifestos em defesa da democracia de amplos setores da sociedade brasileira. Manifestações com o mesmo teor se espalharão pelo país.

Nesta quinta, 11 de agosto, dia do Estudante e do Advogado, serão lidos manifestos em defesa da democracia de amplos setores da sociedade brasileira. Manifestações com o mesmo teor se espalharão pelo país.

Na véspera de sua divulgação pública à sociedade, a “Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito!” – o mais amplo manifesto pró-democracia na história do País – se aproxima da marca de um milhão de adesões. Organizado por professores da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), o documento repudia a escalada autoritária do governo Bolsonaro. Leia sua íntegra ao final.

Quatro juristas mulheres lerão a carta na sede da faculdade, nesta quinta-feira, 11 de agosto, aniversário dos primeiros cursos de Direito implantados no Brasil. Antes da leitura, o padre Júlio Lancellotti fará uma celebração ecumênica.

Na ocasião também será lido o manifesto em “Em Defesa da Democracia e da Justiça” organizado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). O documento foi assinado por mais de 100 entidades até o momento. 

Movimentos sociais, sindicais, estudantis, partidos políticos e as frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular, entre outras articulações, decidiram unificar as manifestações da campanha “Fora Bolsonaro” com atos públicos em todo o país neste mesmo dia. Com o mote “Voltar às ruas em defesa da democracia e de eleições livres”, a mobilização é parte de uma grande frente de toda a sociedade contra os constantes ataques à ordem democrática no Brasil e o golpismo do governo Bolsonaro.

Logo depois da leitura dos manifestos na USP, às 17 horas, no vão livre do Masp, na Avenida Paulista em São Paulo, acontece um ato público. Demais atos estão sendo organizados em todo o país e locais e horários serão definidos ao longo dos próximos dias. 

A União Nacional dos Estudantes (UNE), que completa 85 anos neste mesmo dia, já havia definido a data como uma “agenda de luta em defesa da democracia e das eleições livres e sem golpe”, durante seu 68º congresso realizado em julho.

Campanha eleitoral

Reunião em que Lula reafirmou compromisso com a democracia

Um dos novos signatários da Carta às Brasileiras e aos Brasileiros é o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que assinou o texto nesta segunda (8). Outros presidenciáveis, como Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (MDB) e Luiz Felipe d’Avila (Novo), também aderiram, enquanto o presidente Jair Bolsonaro (PL) esnoba e tenta ridicularizar o documento.

Em reunião nesta segunda-(8), em São Paulo, partidos do movimento Vamos Juntos pelo Brasil, que compõe a coligação Brasil da Esperança, de apoio à chapa Lula-Alckmin,  reforçaram o compromisso com o processo democrático no país e apoio à carta. A coligação Brasil da Esperança é formada pelas federações FE BRASIL (PT/PV/PCdoB) e PSOL/REDE, PSB, Solidariedade, Avante, PROS e o Agir (antigo PTC). Esta é a maior coligação das seis eleições disputadas pelo ex-presidente.

A presidenta nacional do PT e coordenadora da campanha, Gleisi Hoffmann (PR), contou que o foco da campanha é a geração de emprego e renda e o combate à fome, mas que todos estão firmes e comprometidos com a defesa da democracia.

“Nós todos estamos muito focados em defender o processo democrático brasileiro. Com certeza, queremos reforçar esse movimento da sociedade civil que saiu agora, com essa carta aos brasileiros e brasileiras. Não é partidarizar. Nós achamos muito importante para a democracia brasileira.”

Frente ampla

Na esteira da Carta, o isolamento de Bolsonaro só aumenta, até mesmo no agronegócio, uma de suas mais fiéis bases de apoio, e no empresariado industrial, que já sente os efeitos internacionais da instabilidade política e institucional provocada pelo presidente. A Coalizão Brasil, Clima, Florestas e Agricultura — que reúne mais de 300 entidades, empresas e lideranças ligadas ao agronegócio e a outros segmentos econômicos e financeiros  — lançou, na quarta-feira (3), um manifesto em defesa da democracia e do sistema eleitoral. Já a Fiesp divulgou, na quinta-feira (4), nos jornais de maior circulação no país seu manifesto a favor da democracia e agendou o ato de lançamento para o mesmo 11 de agosto, na Universidade de São Paulo. Em reação, Bolsonaro desmarcou a participação dele no encontro com candidatos da Fiesp, que era previsto para a mesma data.

Os proprietários dos principais veículos da grande mídia lançaram, nesta terça-feira (2), um manifesto próprio para se contrapor aos ataques do presidente às urnas eletrônicas, à democracia e à liberdade de imprensa. A nota é assinada pelas três associações nacionais do setor – a Abert (emissoras de rádio e TV), a ANJ (jornais) e a Aner (revistas). Com o manifesto, intitulado “Democracia e Liberdade de Imprensa”, a grande mídia diz “reafirmar seu compromisso com o Estado de Direito e as decisões soberanas das eleições. O texto lembra que os pleitos no Brasil são referendados por “uma Justiça Eleitoral cuja atuação tem sido reconhecida internacionalmente”.

Nos últimos dias, havia recebido ampla adesão o documento encabeçado pela Fiesp, entidade presidida por Josué Gomes da Silva, filho do ex-vice-presidente nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva, José Alencar, morto em 2011. O manifesto reuniu o apoio de associações empresariais até as centrais sindicais, incluindo universidades e organizações internacionais presentes no Brasil.

“O  futuro  que  queremos  depende  do  diálogo  entre  divergentes  e  do  respeito ao resultado das eleições. Este deve ser um ponto pacífico entre  todos os atores que se dispõem a representar a sociedade brasileira à frente de um Estado democrático de Direito”, diz a nota dos fazendeiros. O agronegócio também sofre impacto das medidas antiambientais, antiindígenas e a omissão em relação ao clima, que geram reações de importadores estrangeiros contra as empresas brasileiras.

Josué Gomes da Silva – Foto: Divulgação – Sinditexteil-SP

No texto, que faz referência ao Bicentenário da Independência do Brasil e aos 100 anos da Semana da Arte Moderna, as entidades signatárias defendem que a estabilidade democrática, o respeito ao Estado de Direito e o desenvolvimento são condições indispensáveis para o Brasil superar os seus principais desafios. Sem mencionar o nome do presidente, elas reforçam que esse é o sentido maior do 7 de setembro neste ano, data para a qual Bolsonaro agendou um ato no Rio de Janeiro com seus apoiadores.

O texto reforça ainda o papel da democracia na economia brasileira: “Nossa democracia tem dado provas seguidas de robustez. Em menos de quatro décadas, enfrentou crises profundas, tanto econômicas, com períodos de recessão e hiperinflação, quanto políticas, superando essas mazelas pela força das nossas instituições”. No documento, as entidades afirmam que “é importante que os Poderes da República – Executivo, Legislativo e Judiciário – promovam, de forma independente e harmônica, as mudanças essenciais para o desenvolvimento do Brasil”. E enfatizam, especialmente, o papel do STF e do TSE, que vem alvo de ataques por Bolsonaro.

“As entidades da sociedade civil e os cidadãos que subscrevem este ato destacam o papel do Judiciário brasileiro, em especial do STF, guardião último da Constituição, e do Tribunal Superior Eleitoral, que tem conduzido com plena segurança, eficiência e integridade nossas eleições respeitadas internacionalmente, e de todos os magistrados, reconhecendo o seu inestimável papel, ao longo da nossa história, como poder pacificador de desacordos e instância de proteção dos direitos fundamentais”, ressaltam.

No manifesto, a Fiesp e demais signatários fazem também um apelo à união do país: “Queremos um país próspero, justo e solidário, guiado pelos princípios republicanos expressos na Constituição, à qual todos nos curvamos, confiantes na vontade superior da democracia. Ela se fortalece com união, reformando o que exige de reparos, não destruindo, somando as esperanças por um Brasil altivo e pacífico, não as subtraindo com slogans e divisionismos que ameaçam a paz e o desenvolvimento almejados”.

A Coalizão do agronegócio assinala ainda que “nos últimos 37 anos, o Brasil dedicou-se  a edificar um regime cidadão, de instituições sólidas e calcado no respeito à lei e no equilíbrio de direitos e deveres. Em seu alicerce estão eleições  limpas, onde se manifesta a vontade popular”. 

O manifesto termina apontando: “Sem democracia não há desenvolvimento e sustentabilidade. Sem sustentabilidade não há futuro possível”.

A nota — que será entregue a instituições como o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF) — se soma a uma série de outros manifestos e ações que vêm procurando mobilizar a sociedade para estancar a escalada golpista de Bolsonaro e mostra que a situação do presidente vem piorando, atingindo segmentos que, até então, mostravam-se majoritariamente alinhados ao presidente. 

Ainda que não represente todo o setor e não cite o nome do presidente, o texto é um claro recado num momento em que se avolumam ataques de Bolsonaro às urnas eletrônicas, às instituições — em especial ao STF e ao TSE — e à democracia. 

Teste de fogo

A “Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado democrático de Direito” é considerada um teste que o país está fazendo para demonstrar “a força das suas instituições”. Para Tânia Maria de Oliveira, integrante da executiva da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), Bolsonaro tem conseguido unir a sociedade contra suas intenções golpistas.

O que inclui até mesmo quem apoiou a ruptura de seis anos atrás, com o impeachment de Dilma Rousseff. “Muitos segmentos patrocinaram o golpe de 2016 e agora enxergam uma ameaça à democracia formal”, diz a jurista.

Assim, até entidades como a Fiesp, que reúne a elite industrial paulista e foi entusiasta do impeachment, agora organizam documento em defesa do processo democrático, talvez receosas de possíveis consequências econômicas com a instabilidade insuflada pelo presidente. De qualquer forma, isso amplia o leque de forças que se opõem à “aventura golpista” de Jair Bolsonaro.

Atualmente, resume Tânia, a grande preocupação se concentra no Dia da Independência, em 7 de setembro. Existe o receio, inclusive, de que bolsonaristas promovam um atentado para tentar responsabilizar a oposição em geral e a esquerda especificamente. “Pelo menos o alerta está dado”, diz.

Acúmulo de agressões autoritárias

Estudo do instituto independente Laut (Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo) aponta que o governo de Jair Bolsonaro (PL) é responsável por 1.692 atos autoritários. A publicação “O caminho da autocracia – Estratégias atuais de erosão democrática”, realizada por pesquisadores da USP (Universidade de São Paulo), indica que os três primeiros anos do governo Bolsonaro foram marcados pelo avanço da autocracia em detrimento ao Estado Democrático de Direito.

De acordo com a pesquisa foram registrados 424 atos de redução de mecanismos de controle e/ou centralização; 198 de violação da autonomia institucional; 620 de construção de inimigos; 235 de ataque ao pluralismo e a minorias; e 215 de legitimação da violência e do vigilantismo. A soma desses atos dá os 1.692 atos autoritários sob o governo Bolsonaro que se dividem entre, executivo, legislativo, judiciário e ministério público.

Desregulamentação e criação de inimigos

Segundo os pesquisadores, o governo, ao invés de instaurar controles legítimos à atividade estatal, buscou reduzir a capacidade institucional de agências reguladoras e autarquias por meio de ingerências às suas competências.

Além disso, indicam que os “inimigos” construídos pelo governo são grupos sociais ou categorias profissionais específicas, como jornalistas, ativistas ambientais, cientistas e servidores públicos. Frequentemente associados a ideologias de esquerda e considerados “comunistas”. Assim como instituições e entidades ligadas as áreas como a ciência e a cultura também são alvo de descrédito.

Autocracia

O estudo revela que as estratégias de autocratas na Turquia, Polônia, Índia e Hungria, mais longevas, já permitem perceber como seus efeitos antidemocráticos se acumulam e se fortalecem no tempo. Nesse sentido, o relatório visa mostrar os efeitos potenciais da reeleição de Jair Bolsonaro à luz dessas experiências mais longevas de autocratização.

“Não há receita pronta para se interromper ou reverter o processo de autocratização. A retomada da marcha de aprofundamento da democracia ainda não está no horizonte. O que se sabe, com base nas experiências relatadas, é que a reeleição do autocrata põe em risco a própria manutenção da competição democrática”, traz o relatório.

Confira aqui a íntegra do trabalho: O caminho da autocracia – Estratégias atuais de erosão democrática.

Pelo país

Além de São Paulo, haverá centenas de atos públicos, incluindo mobilizações em ao menos outras 20 capitais. No Rio de Janeiro, por exemplo, a atividade será realizada simultaneamente em duas faculdades de Direito: a da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e a da PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), que foi palco de manifestações estudantis contra a ditadura militar em 1977. Às 16 horas, a Campanha #ForaBolsonaro promove protesto na Candelária.

Em Minas Gerais, o principal ato ocorre na Faculdade de Direito da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), em Belo Horizonte. À tarde, haverá caminhada em defesa da democracia até a Praça Sete de Setembro. A concentração será na Praça Afonso Arinos.

Leia a íntegra da carta

Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos Cursos Jurídicos no País, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.

A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o estado democrático de direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.

Temos os poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal.

Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para o País sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.

A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral.

Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em um País de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude.

Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando a convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.

Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.

Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional.

Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito. Aqui, também não terão.

Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar de lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.

Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.

No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições.

Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:

Estado Democrático de Direito Sempre!

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O documento está hospedado no site Estado de Direito Sempre! e pode ser assinado por qualquer pessoa interessada em defender a democracia brasileira.