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As chances das candidatas com as novas regras eleitorais em 2022

16 de setembro de 2022
Clara Araujo

Pode-se indicar um impacto inicial positivo sobre as mulheres em razão das alterações na legislação.

Pode-se indicar um impacto inicial positivo sobre as mulheres em razão das alterações

Por Clara Araújo, Lucas Okato e Marcus Chevitarese*

Nos últimos anos foram aprovadas leis visando tornar as cotas de gênero nas candidaturas legislativas mais eficazes. Foram instituídas ainda regras destinadas a reduzir a fragmentação partidária. 

Em 2021 foram transformadas em leis e incorporadas à Constituição (EC 111) resoluções do STF e do TSE sobre a distribuição de no mínimo 30% dos recursos dos fundos eleitoral e partidário e do tempo de horário de propaganda gratuita eleitoral às candidaturas femininas e negras. Aprovou-se, também, lei definindo que votos dados às mulheres e pessoas negras nas eleições de deputado federal contarão em dobro na distribuição de recursos do fundo eleitoral e do tempo da propaganda gratuita partidária.

Quanto ao sistema partidário e à representação parlamentar, está em andamento a cláusula de barreira, que ampliou exigências de desempenho partidário no número de votos válidos e de parlamentares a serem eleitos.

Como essas medidas podem impactar as candidaturas femininas?

Dados recém-divulgados pelo TSE permitem análise preliminar sobre aspecto específico da seleção de candidaturas: o fator “capital eleitoral” na disputa para a Câmara dos Deputados e as chances de eleição segundo esse tipo de capital. Aqui, a categoria “capital eleitoral” abarca candidatos detentores de cargos eletivos: os que tentam reeleição e os que têm outros cargos políticos eletivos – senadores, deputados estaduais, vereadores e prefeitos – e disputam vaga para deputado federal. 

Primeiro, houve aumento geral das candidaturas aos cargos legislativos no período e maior entre candidaturas femininas. No Senado, comparando-se 2022 com 2014 (renovação de 1/3 dos cargos), o total de candidatos aumentou em 26,2%. As candidaturas de mulheres corresponderam a 18,9% do total em 2014 e a 23,1% em 2022. Cabe lembrar que a lei não prevê cotas de gênero para o Senado.

Nas assembleias legislativas e Câmara dos Deputados, as porcentagens mínimas de candidaturas por gênero só foram de fato alcançadas no ano de 2018. É um provável efeito de maior rigor na fiscalização eleitoral e das resoluções sobre a aplicação dos 30% na distribuição dos recursos financeiros.

Nas assembleias legislativas, o total de candidatos aumentou 12,8% entre 2014 e 2018, mas apenas 2,2% entre 2018 e 2022.  As mulheres responderam por 29,1% em 2014, 31,1% em 2018 e em 2022 são 33,1% do total de candidatos.

Para o cargo de deputado federal, entre 2014 e 2018 o total de candidatos cresceu 30,3% e entre 2018 e 2022 aumentou 36,4%. As mulheres foram 29,4% dos candidatos em 2014 e 31,7% em 2018. Em 2022 elas são 34,7% dos candidatos ao cargo de deputado federal.  

Proporcionalmente, as candidaturas de pessoas pretas foram as que mais cresceram. Em relação ao Senado, em 2014 tivemos 8,6% de candidatos pretos. Em 2022, esse percentual foi de 9,4%. Em 2014, tivemos 9,6% e 8,8% de candidaturas de pessoas pretas à Câmara Federal e assembleias legislativas, respectivamente. Já em 2022 os valores percentuais foram de 13,9% e 14,2%. Esse crescimento foi maior entre mulheres pretas. 

Segundo aspecto a destacar é que o maior crescimento de candidaturas deu-se para o cargo de deputado federal entre 2018 e 2022 e, comparativamente, o aumento foi maior entre as mulheres. Chama atenção ainda que esses crescimentos ocorrem após nova regra eleitoral (Lei 14.211/2021) que, em tese, reduziu em 50% ou mais o número total de candidatos a serem lançados por cada partido (ou federação).

Como se sabe, as candidaturas para esses cargos tendem a ser mais onerosas do que para as disputas legislativas estaduais. São também mais seletivas, exigem maior nível de articulação política e são mais competitivas. Como então ler essas tendências e possíveis efeitos sobre as mulheres?

Nestas eleições os partidos necessitam de muitos votos a fim de alcançarem o quociente eleitoral. Há proibição das coligações proporcionais. Com exceção das três federações criadas – Federação Brasil da Esperança, com PT, PC do B e PV; Federação PSDB Cidadania; e Federação PSOL Rede –, nestas eleições os partidos necessitarão de bem mais votos para eleger um parlamentar. 

Relacionada com os dois itens está a distribuição de recursos financeiros futuros, que depende da performance eleitoral dos partidos. Ao mesmo tempo, os recursos do fundo eleitoral cresceram consideravelmente entre 2018 e 2022 – de R$ 1,7 bilhão para 4,9 bilhões, o que tende a tornar as campanhas individualmente menos custosas. Por fim, vale lembrar que os cálculos formais para esses requisitos terão por base os resultados dos partidos para a Câmara dos Deputados. 

Logo, obter muitos votos nas disputas federais e eleger o máximo de candidatos possíveis é questão de sobrevivência partidária. Votações expressivas dependerão de vários fatores, não possíveis de serem detalhados ainda. Mas analisando apenas sob o ângulo das candidaturas “já testadas” (com “capital eleitoral”), pode-se dizer que esses candidatos têm vantagens comparativas em relação à média dos concorrentes. Nesta eleição cresce a importância de tais perfis e é esperado que mulheres selecionadas como candidatas respondam também a essa lógica. A seguir apresentamos os dados para as três categorias segundo o gênero nas últimas três eleições gerais:

A proporção de mulheres “sem cargos” é sistematicamente maior do que a de homens “sem cargos”, assim como a de concorrentes à reeleição é sistematicamente menor.  

A distribuição interna a cada gênero mostra que, em 2018, o número de candidatas “sem cargos” aumentou, provavelmente em razão da determinação do STF sobre recursos financeiros. Em 2022, crescem as categorias “outros cargos” e “reeleição”. Candidatos que detinham outros cargos eletivos decrescem em 2018, mas voltaram a crescer em 2022 para ambos os gêneros. A “reeleição” cresce também, mas na proporção de cerca de cinco candidatos para uma candidata. 

A distribuição dos “com capital” por gênero e segundo os anos de eleição mostra aumento considerável no perfil das candidaturas “outros cargos”, mais expressivo entre mulheres do que entre homens. 

Pode-se indicar um impacto inicial positivo sobre as mulheres em razão das medidas mencionadas. Como sugerido, as chances de eleição desses perfis de candidaturas tendem a ser mais elevadas do que a média. Em 2014 e 2018 as taxas de sucesso entre aqueles que detinham cargos eletivos foram elevadas para ambos os sexos, embora mais elevadas para os homens.

Em 2014, entre aqueles que concorriam “sem cargos” essas taxas foram de 3,6% para homens e 1% para mulheres. Entre os que concorriam ao cargo de deputado federal e eram detentores de outros cargos, as chances foram, respectivamente, de 14,5% e 13,1% e entre os candidatos à reeleição as chances foram 74,3% e 60%.

Em 2018, entre aqueles que concorriam sem cargos, as taxas de sucesso dos homens eram de 4,5% e das mulheres de 1,8%. Entre aqueles que concorriam aos cargos de deputado federal e eram detentores de outros cargos, essas taxas foram, respectivamente, de 5,6% e de 6% e entre aqueles que concorriam à reeleição, a taxa de sucesso dos homens foi de 61,7% e a das mulheres de 65%. Quando concorreram sem cargos, os homens tiveram bem mais chances do que as mulheres nos dois pleitos, mas em 2018 há uma inversão entre aqueles detentores de cargos. 

Com o estímulo da contagem do voto das mulheres em dobro para a distribuição de recursos do fundo, em que medida essa taxa de sucesso repetirá os padrões anteriores? Podemos esperar resultados mais promissores para as mulheres diante dos contextos e das novas regras? Resta verificar como os partidos irão ou não investir nessas candidaturas em termos de recursos financeiros e estratégicos e qual será o impacto nas eleições.

Clara Araújo é doutora em Ciências Sociais e professora do PPCIS/UERJ;

Lucas Okato é doutor em Ciência Política e professor da UFPa;  

Marcus Chevitarese é doutor em Ciência Política e analista de dados na Câmara dos Deputados.

Este artigo é uma colaboração entre IPOL-UnB e Observatório Nacional da Mulher na Política da Câmara dos Deputados. Foi elaborado no âmbito do projeto Observatório das Eleições 2022, uma iniciativa do Instituto da Democracia e Democratização da Comunicação. Sediado na UFMG, conta com a participação de grupos de pesquisa de várias universidades brasileiras. Para mais informações, ver: www.observatoriodaseleicoes.com.br

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