As plataformas digitais, a lei e o lucro
Durval de Noronha Goyos Jr apresenta argumentos em favor do PL das Fake News
O advogado Durval de Noronha Goyos Jr apresenta argumentos em favor do PL das Fake News
Por Durval de Noronha Goyos Jr., no Diário da região
A existência da lei é uma conquista da civilização. Sem a existência da norma legal, viveríamos na barbárie, no caos social e no mundo da iniquidade, do abuso, e da institucionalização da injustiça. No vácuo da lei, teríamos um amplo número de conflitos sociais entre grupos, comunidades e nações. A prevalência do império da lei, portanto, é essencial para o funcionamento do Estado. Da mesma forma, o direito internacional é de fundamental importância para a afirmação da igualdade jurídica das nações e bem assim, para o reconhecimento dos valores universais reconhecidos pela carta das Nações Unidas, como os direitos humanos, a dignidade individual, o valor da pessoa, da sociedade e o princípio amplo da isonomia.
O extraordinário desenvolvimento tecnológico do último século veio desacompanhado de um igual progresso ético e moral. Isso ocorreu de uma maneira geral, como são tristes e veementes exemplos a virulência do uso militar, a destruição do meio ambiente e a própria exploração humana, das mais diversas maneiras. Isso também ocorreu com o uso da internet. Aquilo que poderia ter sido apenas mais um instrumento para a promoção do conhecimento, para a disseminação da educação e para a democratização do acesso à informação, foi sequestrado por aquele velho e impiedoso inimigo da humanidade: o lucro denominado por John Stuart Mill como “o ganho sem merecimento”.
Um dos mais característicos abusos da internet tem se verificado, no curso das duas últimas décadas, por meio das chamadas plataformas digitais. Devido ao caráter transfronteiriço do meio digital, o controle jurídico do seu conteúdo se torna altamente difícil, pela burocracia e custos envolvidos na busca da cooperação internacional. Assim, o meio passou a ser utilizado em grande escala por elementos criminosos para a prática ou indução ao delito, com a cumplicidade das grandes operadoras dos serviços das plataformas, pela rentabilidade que traz o seu uso.
Assim, reiteradas manifestações de práticas sancionadas universalmente como crime tem sido levadas a efeito, quase que impunemente. Desta maneira, o tráfico de drogas, a pedofilia, o canibalismo, o incesto, o tráfico de armas e de pessoas, o estupro, o racismo, a homofobia, o nazi-fascismo, o terrorismo, a incitação ao homicídio, o jogo ilegal, o contrabando, os maus tratos aos animais, dentre outros crimes capitulados nos ordenamentos jurídicos, tem transito nas plataformas digitais, sem reação dos seus responsáveis.
Isso se deve a ganância sem limites pelo lucro, uma das aberrações mais funestas e danosas do capitalismo. Sempre que pressionadas ao controle das ações criminosas e à cooperação com as autoridades nacionais diversas, as empresas responsáveis pelas plataformas digitais elencam uma série de argumentos insubsistentes para não o fazer. Dentre eles está a negativa a sujeição ao ordenamento jurídico do país onde o crime foi ou está sendo praticado. Dentre eles, alegam que os respectivos servidores estão noutro país.
Recentemente, em reação as tentativas de normatização da conduta das plataformas, levadas a efeito e inspiradas por princípios básicos e leis dos países onde desenvolvem suas atividades, passaram as empresas a alimentar um movimento de resistência. Esse é inspirado, dentro outros, pelo argumento falacioso, falso e cínico de que o controle do crime já previsto nas normas dos países seria uma limitação ao direito de livre expressão. Na defesa de seus interesses comerciais, não hesitam as operadoras a procurar solapar a base democrática de ordem interna. Que ultraje!
É por tais relevantes motivos que devem prosperar os projetos de lei de controle da observância da ordem jurídica pelas plataformas digitais. Eles buscam, única e tão somente, a defesa do individuo, da sociedade, do estado de direito e da democracia contra o abuso ensandecido pelo lucro estéril, desprovido de qualquer compromisso moral. Dentre tais iniciativas, no Brasil está o projeto de lei 2630/2020 o qual, por seus muitos méritos merece o apoio da Nação e da cidadania.