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Durval Noronha: As funções da diplomacia e o rompimento de relações

11 de outubro de 2024

Durval de Noronha Goyos Jr escreve sobre as relações diplomáticas entre Brasil e Israel.

A diplomacia demonstrou-se, há séculos, uma atividade necessária para a melhor condução e promoção dos interesses nacionais dos Estados. Naturalmente, ela evoluiu através dos tempos e hoje se encontra regulamentada pelas Convenções de Viena sobre Relações Diplomáticas, de 1961 (Viena 1961) e sobre a Lei dos Tratados, de 1980 (Viena 1980). As suas principais funções são a da promoção do diálogo e da negociação; a comunicação de posições governamentais; a promoção da cooperação dentro do Direito internacional; o desenvolvimento do comércio; a disseminação de expressões culturais nacionais; a assistência aos nacionais de um Estado residentes noutro; e o levantamento de informações.

            Evidentemente, a legitimidade das relações internacionais está assentada nos princípios da boa-fé, que compreende a honestidade, e do pacto sunt servanda no cumprimento das obrigações internacionais, conforme expresso no preâmbulo e no artigo 26 da Viena 1980. De fato, sem o cumprimento destas condições absolutas, ficariam invalidados os propósitos do exercício diplomático. O ato de estabelecimento de relações entre dois Estados tem natureza bilateral e normalmente compreende o estabelecimento de representações diplomáticas.

            Quanto as relações institucionais entre países apresentam crises ou fissuras, fica prejudicada a consecução dos objetivos diplomáticos. Duas são as reações do Estado ofendido, ambas de natureza unilateral: a primeira é o rebaixamento do nível de representação, com a retirada do chefe da missão, o embaixador. A segunda, mais grave, diz respeito ao rompimento das relações diplomáticas bilaterais. Conforme o artigo 63 da Viena 1980, o rompimento das relações diplomáticas não afeta as relações estabelecidas por tratados, de uma maneira geral.

            Desde a criação de Israel em 1948, a comunidade internacional, incluindo o Brasil, tem exercido tolerância nas relações diplomáticas bilaterais, muitas vezes deixando de reagir face aos sistemáticos crimes perpetrados pelo regime sionista contra a população palestina, assim como por violações à carta da ONU no tocante ao princípio basilar da proibição ao uso da força (artigo 2.4). Atualmente, 41 mil indefesos, em sua maioria mulheres e crianças, foram massacrados pelo ar e terra em Gaza, o que valeu condenações da ONU, do Tribunal Penal Internacional (TPI) e da Corte Internacional de Justiça (CIJ), por crimes de genocídio e contra a humanidade. A infraestrutura civil de Gaza foi deliberadamente destruída e assistentes humanitários mortos por Israel. Persiste o crime continuado.

            Há poucos dias, o Líbano foi novamente invadido. Sua população civil e infraestrutura civil estão a serem atacadas por ações militares, contrariamente às normas internacionais. É mais um desastre humanitário. O secretário-geral da ONU, António Guterres, denunciou as violações, pelo que foi considerado “persona non grata” por Israel, no que se juntou ao Presidente Lula (sic). Como acertada reação, foi o embaixador brasileiro repatriado, rebaixando as relações.

            Tal ação não basta. O Brasil ainda deve reagir ao genocídio e demais delitos praticados por Israel contra os povos palestino e libanês. Tais crimes violam os tratados internacionais de regência, foram denunciados pela ONU, e objeto de ordens do TPI e da CIJ. Ora, Israel, um país cujo governo acintosamente viola, desta forma, os requisitos da boa-fé e honestidade, para além do Direito internacional, é inidôneo para relações diplomáticas bilaterais. Cumpre ao Brasil rompê-las.

Durval de Noronha Goyos Jr é jurista e professor. Foi diplomata.

Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial dFMG