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Em memória dos cento e dez anos de nascimento de João Amazonas

3 de janeiro de 2022

Liderança destacada da segunda geração de dirigentes do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), e principal referência da terceira geração, Amazonas se notabilizou também como teórico, ideólogo e organizador. Na passagem do centenário do Partido, sua gigantesca e inestimável contribuição para as conquistas democráticas do povo e do país precisa ser avaliada na sua verdadeira dimensão.

Neste dia 1º de janeiro de 2022, transcorre o 110º aniversário de nascimento de João Amazonas. Nascido em Belém do Pará, Filho de João de Souza Pedroso, imigrante português, e de Raymunda Leal, nascida na Ilha de Marajó, recebeu o sobrenome Amazonas como homenagem do pai ao local em que veio morar no Brasil. Cedo Amazonas foi trabalhar e, na juventude, começou a participar da vida política do país.

Sua primeira experiência se deu na “Ala Moça” da União Popular do Pará (UPP), uma frente única organizada para participar das eleições municipais em 30 de novembro de 1935. O passo seguinte seria o ingresso no Partido Comunista do Brasil, tendo como caminho a Aliança Nacional Libertadora (ANL), organizadora do Levante de 1935. Ingressou também na União dos Proletários de Belém.

Quando a ANL surgiu com força no país, Amazonas participou de uma ação ousada ao içar, à noite, uma bandeira da organização nos mastros dos reservatórios da Lauro Sodré, com ampla visibilidade na cidade. O jornal Folha do Norte de 19 de dezembro de 1935 noticiou o fato notado pelo público desde a manhã do dia anterior. Os participantes do protesto escreveram, segundo a Folha do Norte, com tinta arroxeada, várias inscrições – como “Viva Luiz Carlos Prestes”, “Viva a ANL” e “Viva o comunismo”.

Na repressão que se instalou no país após o Levante, Amazonas foi preso na Cadeia de São José, descrita pela Folha do Norte como “um antigo e inqualificável pardieiro, uma ignomínia”. Um ano depois, a Justiça mandou soltá-lo, quando terminou o estado de guerra. Mergulhou na clandestinidade, mas logo seria preso novamente.

Segundo o inquérito que determinou sua prisão, nas palavras da Folha do Norte, “João Amazonas agia no preparo de matrizes e boletins subversivos da propaganda moscovita, matrizes que eram entregues a Pedro de Araújo Pomar, detido há dias passados”, encarregado “de mimeografá-los em grande quantidade para os espalhar sorrateiramente pelos bairros da cidade”. Eram “pouquinhos, mas teimosos os adeptos do credo sinistro”.

Foram para a prisão de Umarizal, em Belém, de onde fugiram e, numa longa e penosa viagem, chegaram ao Rio de Janeiro para se juntar aos comunistas que reconstruíam o Partido – destruído pela ditadura do Estado Novo –, liderados por Maurício Grabois. A decisão foi tomada após a informação de que a Alemanha nazista invadira a União Soviética, em 22 de junho de 1941. Fugiram em 5 de agosto. Chegaram ao Rio de Janeiro e se integraram à Comissão Nacional de Organização Provisória (CNOP).

Amazonas empregou-se como auxiliar de contabilidade, no centro da cidade. Era uma forma de fazer algum recurso enquanto a CNOP pavimentava os caminhos para o início de uma nova jornada. Logo foi para Minas Gerais. Recebeu alguns mil-réis e a passagem de trem que o levaria para as terras onde deveria fazer rebrotar as raízes comunistas. Outro ponto visitado por Amazonas foi a Bahia, de onde partiu o dirigente Diógenes Arruda para Câmara para se integrar à CNOP.

O objetivo era realizar uma Conferência Nacional para eleger um Comitê Central. Na Conferência da Mantiqueira, de 1943, Amazonas assumiu a Secretaria Sindical e de Massas. Naquele processo, o encontro de Amazonas, Pomar, Grabois e Arruda representou as fundações de uma nova fase do Partido Comunista do Brasil. Luiz Carlos Prestes, ainda nos cárceres da ditadura, foi eleito secretário-geral. Era o surgimento da segunda geração de dirigentes comunistas.

Os comunistas ressurgiram com forças, presentes em organizações como a União Nacional dos Estudantes (UNE), a Associação Brasileira de Escritores (ABDE), além da Liga de Defesa Nacional – uma frente com vários departamentos, entre elas a sindical, assumida por Amazonas, embrião do Movimento Unificador dos Trabalhadores (MUT). O Partido priorizava a organização de células nas empresas, formando uma grande base de trabalhadores.

A meta era enterrar a ditadura do Estado Novo e liquidar o nazifascismo. Em 28 de novembro de 1943, o governo do presidente Getúlio Vargas decidiu organizar a Força Expedicionária Brasileira (FEB). Segundo Amazonas, os comunistas foram os primeiros a reivindicar a participação militar do Brasil na Segunda Guerra Mundial. “E o fizemos de maneira consequente”, constatou.

De 1941 a 1945 foram anos de luta aguda contra o liquidacionismo – os que pretendiam liquidar o Partido, dissolvendo-o numa frente contra o nazifascismo –, disse Amazonas. “É preciso dizer que a desvantagem era grande. Vencemos porque a verdade estava do nosso lado”, afirmou. A nova equipe que assumia a defesa do Partido — registrou Amazonas — eram pessoas desconhecidas quase completamente. “Afinal, essa nova equipe — Arruda, Grabois, Pomar, eu etc. — eram pessoas que não tinham nenhuma posição no Partido, na época, a não ser locais, naqueles lugares onde tínhamos atuado.”

Os comunistas lideraram grandes manifestações de massa para redemocratizar o país, defendendo uma Assembleia Nacional Constituinte, principalmente após a legalidade, em meados de 1945. Amazonas foi eleito deputado constituinte pelo Rio de Janeiro. Em 1947, seria candidato ao Senado. O jornal do PCB Tribuna Popular de 16 de janeiro anunciou em letras garrafais a “Grande festa eleitoral” que encerraria a campanha no Campo do São Cristóvão.

Era o comício “O primeiro lugar para o Partido de Prestes”, que falaria “a linguagem dos morros esperançosos de dias melhores”. Na capa do jornal, Amazonas e Prestes apareceram com punhos cerrados em grandes ilustrações. Prestes falou sobre a obra, o trabalho e o esforço do “jovem trabalhador João Amazonas, que ao lado de Diógenes Arruda, Pedro Pomar, Maurício Grabois e outros, tudo sacrificou, percorrendo o Brasil de lado a lado, na ilegalidade, a fim de manter a organização do Partido”. “E é por isso que hoje temos um Partido de duzentos mil membros, em marcha para um Partido de um milhão de militantes.”

Depois da cassação do registro do Partido – em 1947 – e dos mandatos comunistas – em 1948 –, Amazonas voltou à clandestinidade e organizou um comando que, com três veículos, conduziu Prestes a um esconderijo para protegê-lo da ameaça de prisão. Na rearticulação do Partido na clandestinidade, viajou para participar do IX Congresso do Partido Comunista da Tchecoslováquia, em abril de 1949. Além de saudar o evento em nome de Prestes e dos comunistas brasileiros, fez um breve comentário sobre a conjuntura do país e estabeleceu contato com dirigentes comunistas internacionais.

No começo da década de 1950, quando se iniciou os preparativos para o IV Congresso do Partido, Amazonas encarregou-se da Comissão que elaborou a proposta de Estatutos. Também liderou a segunda delegação de quarenta e dois comunistas que foram participar de um curso intensivo de marxismo-leninismo na União Soviética, com duração de mais de um ano, que saiu do Brasil clandestinamente em setembro de 1953.

Após o Congresso, realizado em 1954, o Partido se aproximou da candidatura presidencial de Juscelino Kubitschek. Amazonas conta que ele e Lincoln Oest – também membro do Comitê Central – conversaram com o candidato. “Vocês têm no Brasil o que: trezentos mil votos? Numa eleição presidencial trezentos mil votos não têm importância nenhuma. Agora, se eu for eleito vou mandar suspender essa perseguição jurídica que há aí contra vocês. Eu vou parar com isso”, disse Juscelino, segundo Amazonas. Juscelino acabou eleito com menos de trezentos mil votos de diferença em relação ao segundo colocado, Juarez Távora, da UDN.

Os comunistas voltaram à semilegalidade, o que permitiu atividades como a “1ª Conferência Nacional sobre o Trabalho do Partido entre as Mulheres”, com a participação de Amazonas, realizado em junho de 1956. No discurso de encerramento, ele ressaltou a importância do entendimento do assunto pelos comunistas.

No debate no Partido deflagrado pelas mudanças do Partido Comunista da União Soviética (PCUS) em seu XX Congresso, realizado em 1956, Amazonas foi um dos primeiros a se pronunciar. Seu primeiro artigo, intitulado “As massas, o indivíduo e a história”, publicado no jornal Voz Operária em 26 de janeiro de 1957, contestou duramente a base dos argumentos daqueles que iniciaram os ataques ao PCB. Disse que eram as massas que faziam a história, mas “não se pode concluir que seja nulo ou insignificante o papel das personalidades”.

Amazonas voltaria a escrever em 2 de fevereiro de 1957 para defender a ideia de que “o Partido Comunista elabora sua orientação e enriquece seus princípios coletivamente”. “Isso dá ao Partido do proletariado uma grande vantagem sobre os partidos burgueses”, asseverou.

Nos debates do V Congresso, em 1960, também inovou ao abordar o desenvolvimento do capitalismo no Brasil pela via prussiana (as análises de Marx e Engels sobre o desenvolvimento capitalista no espaço da Prússia e do que viria a ser a Alemanha sem alterações na propriedade da terra).

Segundo ele, as Teses do Congresso se equivocavam ao definir “que as contradições entre o desenvolvimento do capitalismo e o monopólio da terra são antagônicas”. “O capitalismo, seguindo o caminho prussiano, pode se desenvolver no campo, conservando o latifúndio. Pode também o capitalismo crescer, substituindo a dependência do país ao imperialismo”, escreveu. “Não é o crescimento do capitalismo que leva à independência e às transformações democráticas, como se afirma implicitamente nas Teses.”

Os debates do V Congresso evoluíram para o “racha” e a reorganização do Partido, liderada por Amazonas, Grabois, Pomar e Arruda, em fevereiro de 1962, numa Conferência Nacional Extraordinária. Amazonas e Grabois, passado algum tempo, visitaram Diógenes Arruda Câmara, que, no processo de debates entre 1956 e 1960, se afastara da militância.

Amazonas descreveu o encontro: “Fomos até lá e na casa do Arruda tivemos uma conversa. O Arruda, de cara fechada com a gente… no começo discutimos. E eu digo: ‘Você tem importância para o Partido. E, olha, o teu lugar é aqui, não fora daqui’. E o Arruda conversou, conversou, e foi mudando a fisionomia. E na hora que nós saímos da casa dele, lá vem ele andando a pé conosco — uma distância grande até que nós pegássemos o ônibus. Então, o Arruda tinha reencontrado o seu Partido. E já deixava isso claro: ‘É com vocês que a gente tem de reconstruir o Partido.’ Foi assim, companheiros, que puxamos o Arruda. E ele deu uma grande ajuda para nós nesse terreno.”

Em abril de 1962, Amazonas e Grabois visitaram Cuba. Conversaram com Fidel Castro e Che Guevara, e participaram das solenidades do “Primeiro de Maio”. Encontraram-se também com dirigentes comunistas da Coreia, da Albânia e da China. Eram ações importantes, naquele momento, para a retomada de contatos em âmbito internacional, pelos dirigentes que reorganizaram o Partido Comunista do Brasil.

Logo em seguida, Amazonas e Lincoln Oest sairiam pelo mundo, começando pela América Latina, para estabelecer laços de solidariedade internacional. Chegaram à China, onde foram recebidos por Mao Tse-tung. Na volta, relataram que, em muitos países, sentiram um clima hostil pela propagação da versão do novo PCB sobre as divergências entre os comunistas brasileiros.

Após o golpe militar de 1964, o Partido, agora com a sigla, PCdoB, começou a estudar o caminho da guerra popular. “Em toda parte, em especial no campo, é preciso discutir os problemas da luta armada e, guardadas as normas de trabalho conspirativo, tomar medidas visando à sua preparação prática”, diz o texto da VI Conferência, de 1966. O PCdoB saiu a campo à procura dos melhores lugares para instalar a guerrilha, com três grupos de trabalho — um dirigido por Amazonas e Grabois, outro por Pedro Pomar e Ângelo Arroyo, e um terceiro por Carlos Danielli.

Amazonas se integraria ao Araguaia, Sul do Pará, onde Grabois e outros militantes do PCdoB desenvolviam o trabalho da guerra popular – entre Osvaldo Orlando da Costa (Osvaldão) e Elza Monnerat. Na ocasião, Amazonas e Grabois escreveram dois importantes documentos: Cinquenta anos de luta, sobre a história do Partido Comunista do Brasil, e A atualidade do pensamento de Lênin, segundo Amazonas a primeira manifestação pública de divergências com o Partido Comunista da China a respeito da tese do “Pensamento de Mao Tse-tung” como uma “nova etapa do marxismo”.

Quando a repressão atacou a Guerrilha do Araguaia, Amazonas estava em São Paulo, o que não impediu a ditadura de tentar assassiná-lo na Chacina da Lapa, em 16 de dezembro de 1976, durante uma reunião do Comitê Central. Dias antes, fora para o exterior, numa viagem programada para ser de Pomar que, devido a problema de saúde com a esposa, Catharina, propôs a troca. Morreram, além de Pomar, Ângelo Arroyo – também dirigente da Guerrilha do Araguaia – e João Batista Drummond. Outros membros do Comitê Central foram presos e torturados.

Em depoimento ao jornal Tribuna da Luta Operária, Amazonas disse que receber a notícia da morte dos companheiros na Chacina da Lapa foi um choque profundo. Ao falar sobre o Cemitério de Perus, em São Paulo – onde os torturadores enterraram Pomar, Arroyo e Drummond –, Amazonas afirmou que o local ficaria conhecido como a colina dos mártires.

Em 1979, com a anistia, Amazonas retornou ao Brasil. De Paris, França, onde estava exilado, emitiu a seguinte nota: 

Solicitei ao consulado brasileiro em Paris meu passaporte, documento imprescindível a quem se encontra no exterior. Até há pouco, abusivamente, o governo militar negava-o aos cidadãos perseguidos pela ditadura. Agora, já não o pode fazer. O regime está em crise e manobra tentando sair das dificuldades em que se acha.

Pretendo retornar o mais breve possível ao país, após quase três anos de exílio forçado. Mantenho a mesma disposição política que tinha quando saí do Brasil. Ou seja: levar adiante, juntamente com os trabalhadores e as forças democráticas e populares, a luta sem conciliação contra o regime arbitrário que teima em subsistir. Esse regime já causou, e continua causando, imensos danos à nação.

Sou comunista e não pretendo passar à clandestinidade, a menos que a isso seja forçado pelas injunções da luta de classes. Defendo o legítimo direito à vida legal do meu partido, o Partido Comunista do Brasil, uma organização que representa interesses fundamentais da classe operária e das massas populares. 

Amazonas desembarcou no aeroporto do Galeão, Rio de Janeiro, em 24 de novembro de 1979, alguns meses depois de Diógenes Arruda Câmara, que retornou num avião do Alto Comissariado da Organização das Nações Unidas (ONU), fretado especialmente para trazer refugiados. Com ele estava outro dirigente comunista, Renato Rabelo, que saíra do país com Amazonas, em 1976.

Arruda morreria no dia seguinte à chegada de Amazonas, em São Paulo, no trajeto entre o aeroporto de Congonhas, onde o principal dirigente do PCdoB foi recepcionado por um representativo ato político, e o Sindicato dos Metalúrgicos, local marcado para o término da celebração. Seu corpo foi velado por centenas de pessoas no salão nobre da Assembleia Legislativa de São Paulo.

Amazonas teria papel decisivo na redemocratização do país, após a memorável campanha por eleições direitas, ao falar com Tancredo Neves sobre a importância da sua candidatura no Colégio Eleitoral da ditadura para encerrar o regime arbitrário instaurado com o golpe de 1964. O fim do regime possibilitou a volta do PCdoB à legalidade.

Amazonas explicou que na verdade o requerido foi a reorganização do Partido registrado com o número 1.280 no dia 31 de maio de 1922 no Cartório do 1º Ofício do Rio de Janeiro. “Não fizemos nenhum desmanche, para legalizar o Partido, enquanto existiu o regime militar”, disse. A Emenda Constitucional aprovada para a liberdade partidária estabelecia o direito a fundação de partidos e o de reorganização dos que tiveram o registro eleitoral cancelado. Esse detalhe permitiu aos dirigentes do PCdoB ingressar com o Programa e os Estatutos como reorganizadores do Partido.

Nos estados, militantes e simpatizantes comunistas festejaram a legalidade. João Amazonas participou de um ato na cidade de São Paulo e declarou: “O Brasil amanheceu em toda a extensão de seu território em festa, não apenas a festa dos comunistas, mas de todos os democratas sinceros que lutaram contra o regime militar.” “Penso que a democracia surgiu desta vez no Brasil para valer porque ela não nasceu como dádiva do alto mas foi conquistada por milhões de brasileiros em praça pública. Instalando esta sede estamos convencidos de que a presença legal, legítima, autêntica, do Partido será para um longo período da vida brasileira”, disse.

No dia 11 de junho de 1985, o presidente José Sarney – o vice de Tancredo Neves, que morrera de infecção generalizada pouco antes da posse, após uma agenda de campanha extenuante com fortes dores abdominais e de ser submetido a sete cirurgias – recebeu Amazonas no Palácio do Planalto, que comentou a necessidade de uma Assembleia Nacional Constituinte para remover o entulho autoritário ainda existente. Na Constituinte, Amazonas teve ativa participação, ao lado da bancada do PCdoB.

Na comemoração dos 64 anos do Partido, em 25 de março de 1986, Amazonas disse que estava “profundamente emocionado”. “Durante muito e muitos anos comemoramos o aniversário do Partido na clandestinidade, defrontando as forças da reação contrárias a qualquer menção ao nosso Partido. Mas hoje mudou a situação. A roda da história ninguém consegue deter. O futuro da humanidade são as grandes transformações sociais intimamente ligadas à luta e ao nome do Partido Comunista do Brasil”, disse ele.

Nas primeiras eleições presidenciais diretas, após a ditadura, Amazonas foi um ardoroso defensor da unidade das forças progressistas e um dos artífices da “Frente Brasil Popular” (PT, PCdoB e PSB), que lançou Luiz Inácio Lula da Silva candidato a presidente da República, derrotado pelo candidato da direita, Fernando Collor de Mello.

O fim da experiência socialista iniciada pela União Soviética representou outro grande desafio para Amazonas. A situação era tão grave que o Partido decidiu antecipar o VIII Congresso para 1992 – que estatutariamente deveria ocorrer em 1993. O Partido saiu do evento com nova formulação sobre a luta pelo socialismo, elaborada sob a inspiração de Amazonas e sua longa experiência de dirigente e teórico comunista. Ao mesmo tempo, o PCdoB se revigorou politicamente para enfrentar o projeto neoliberal, primeiro tendo à frente Collor e depois Fernando Henrique Cardoso (FHC).

O PCdoB chegou ao seu 10º Congresso, em 2001, com um fato marcante. Amazonas, sabiamente e de forma experimentada, vinha pavimentando a mudança — assumiu a presidência Renato Rabelo. Não foi uma transição abrupta, ou uma ruptura, mas um processo de desenvolvimento que envolveu o coletivo dirigente. Amazonas continuou presente na transição e na nova direção, que levou em conta o trabalho coletivo e colegiado.

Na ocasião, Amazonas declarou: “Tenho sido, desde 1962, o principal dirigente do Partido Comunista do Brasil. Era um partido pequeno e perseguido, cuja direção coletiva era formada por homens como Maurício Grabois, Pedro Pomar, Luís Guilhardini, Carlos Danielli, Lincoln Oest e tantos outros que pagaram com a vida a ousadia de contrapor-se à ditadura militar. É com saudade, respeito e emoção que me recordo desses camaradas. Com seus desaparecimentos, couberam-me maiores responsabilidades de direção.”

Em abril de 2002, ele completaria 67 anos de militância ininterrupta no Partido e, no dia 1º de janeiro, 90 anos de idade. “Sempre procurei ser um militante esforçado, e procurei desempenhar, da melhor forma possível, minhas tarefas. Já não tenho condições físicas para continuar à frente do principal cargo na direção do Partido, sendo seu presidente. Não se trata de uma questão de princípios. O Partido Comunista do Brasil não tem cargos vitalícios. Peço, por isso, aos camaradas, que me liberem desta tarefa. Não peço aposentadoria. Continuo lutando no nosso glorioso e heroico PCdoB. Continuarei membro do Comitê Central do Partido e em minha mesa de trabalho exercendo, como sempre, as tarefas que me forem atribuídas. Mas não tenho condições físicas de continuar exercendo a principal função da direção partidária”, afirmou.

A intervenção de Amazonas foi interrompida por aplausos dos congressistas quando ele apresentou o nome de Renato Rabelo, então vice-presidente, para substituí-lo. “Um bom camarada, que vem se destacando, seguindo as tradições de luta do nosso Partido. Quero destacar que esta substituição se faz normalmente, como é devido. Quero também agradecer o grande apoio que sempre tive nas fileiras do nosso glorioso e heroico Partido Comunista do Brasil”, disse.

Uma de suas principais preocupações era a tática para as eleições presidenciais de 2002. João Amazonas tinha um ponto de vista que expunha desde a primeira campanha, em 1989. Era o de que, nas condições brasileiras, inseridas na conjuntura da América Latina e do mundo, seria muito difícil a esquerda sozinha, ou uma frente de esquerda, ganhar uma eleição presidencial. Daí a insistência para que se procurasse ampliar a frente, com pessoas honestas, brasileiros de nascimento e de espírito.

Ficou contente quando soube que Lula, na articulação de sua quarta campanha, procurava ampliar a frente. Disse-lhe pessoalmente, na sede do PCdoB, em São Paulo — provavelmente a última vez que avistou Lula —, que a escolha de José Alencar para seu vice era uma boa decisão.

Amazonas não chegou a ver a vitória de Lula nas eleições de 2002 — faleceu, cinco meses antes, de causas naturais, no dia 27 de maio de 2002. Deu uma inequívoca demonstração de imensa ligação com o seu povo, com seu estado natal, com seus camaradas de armas, ao fazer, de próprio punho, o pedido para que seus restos mortais fossem cremados e as cinzas espalhadas na região do Araguaia. “As cinzas devem ser espalhadas na região do Araguaia, onde houve a Guerrilha. É uma forma de juntar-me aos que lá tombaram.”

Artigo de Osvaldo Bertolino