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    Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento

    Novas dinâmicas do capitalismo e os desafios do Brasil

    A quarta parte da série analisa como globalização, financeirização e revolução científico-técnica moldam o capitalismo contemporâneo e impõem desafios ao desenvolvimento nacional.

    POR: Nilson Araújo de Souza

    20 min de leitura

    Gong Xianzu, pesquisador do Instituto de Física de Plasma da Academia Chinesa de Ciências (ASIPP) e responsável por um experimento de operação do ITER (Reator Experimental Termonuclear Internacional), desenvolvido pela China, um dos maiores e mais importantes projetos internacionais de pesquisa científica do mundo, é popularmente conhecido como “Sol Artificial”. Foto: Xinhua
    Gong Xianzu, pesquisador do Instituto de Física de Plasma da Academia Chinesa de Ciências (ASIPP) e responsável por um experimento de operação do ITER (Reator Experimental Termonuclear Internacional), desenvolvido pela China, um dos maiores e mais importantes projetos internacionais de pesquisa científica do mundo, é popularmente conhecido como “Sol Artificial”. Foto: Xinhua

    Aspectos novos da realidade mundial I: Capitalismo de Estado e nacional-desenvolvimentismo no Brasil – Parte IV

    Tratamos, nas duas últimas partes do artigo, mais a título de ensaio, de alguns aspectos novos que vêm realizando uma importante transformação na realidade do capitalismo. Obviamente, não dá simplesmente para copiar nossa experiência do capitalismo de Estado e do nacional-desenvolvimentismo. Mas, se queremos retomar o desenvolvimento por meio de um novo projeto nacional de desenvolvimento, para concluir a construção da nação brasileira e caminhar em direção ao socialismo, essa tarefa seria impossível se não incorporássemos elementos centrais do legado getulista, tais como: economia nacional sob controle nacional, Estado como protagonista do desenvolvimento, o trabalho como centro do desenvolvimento, o mercado interno como prioridade.

    Como o socialismo incorporou o mercado ao longo da história

    Temos que, evidentemente, incorporar as características novas da realidade mundial e do capitalismo dependente brasileiro — características que, no fundamental, reforçam e magnificam tendências anteriores. Destacam-se os seguintes elementos: “globalização” e transição geopolítica, a financeirização da economia, a revolução científico-técnica, a transição de um mundo monopolar para um multipolar, a desindustrialização precoce da periferia, a desregulamentação da força de trabalho e do capital, e os extremos climáticos.

    Examinemos de passagem, nesta seção, algumas dessas características, a saber: “globalização” e transição geopolítica, a financeirização da economia, a revolução científico-técnica.

    “Globalização” e transição geopolítica

    Mapa-mundi invertido, com Brasil no centro, lançado pelo IBGE. Imagem: Reprodução

    Mapa-múndi lançado pelo IBGE em maio de 2025 apresenta o Brasil no centro e o Sul no topo, invertendo a orientação tradicional norte-sul. A proposta convida a repensar as hierarquias geopolíticas e a romper com visões eurocêntricas do mundo.
    Crédito: Reprodução/IBGE – Ministério do Planejamento e Orçamento

    Na verdade, o fenômeno que vinha se desenvolvendo estava mais para uma inaudita internacionalização da economia capitalista, que atingiu níveis inéditos e entrou numa crise estrutural. Depois de várias crises desde os anos 1990, culminou com a grande crise de 2007-2009.

    Iniciou-se, então, um processo de fechamento econômico das grandes potências que, no caso dos EUA, se exacerbou ao limite no governo de Donald Trump; o contrário ocorre na China, com a criação de seu projeto Cinturão e Rota, que já reúne 148 países espalhados pelo mundo inteiro. Em 10 anos, foram investidos mais de US$ 1 trilhão em projetos de infraestrutura.

    Isto suscita uma outra questão: a transição de um mundo monopolar para um multipolar (devido à ascensão da China e ao declínio dos EUA). Essa transição está bastante avançada, ainda que com muitas tensões que, pelo andar da carruagem, tenderão a se exacerbar.

    O Brasil, como país de capitalismo dependente e que experimentou todas as mazelas da internacionalização violenta do capital — chamada de “globalização” —, a exemplo da desnacionalização, da desindustrialização, do desemprego e da agressão à natureza, havia decidido, por meio do governo e da “ideologia” do Itamaraty, permanecer “neutro” entre esses dois centros e respectivos caminhos. No entanto, a retórica e a prática de Donald Trump — por exemplo, taxando violentamente o aço e o alumínio — estão empurrando o Brasil para uma aproximação da China: além de manter-se nos BRICS, assinou um conjunto de acordos com Xi Jinping.

    O Brasil deve, portanto, buscar aproveitar-se de uma crise internacional de transição geopolítica, assim como Getúlio o fizera em outra crise de transição: da Inglaterra para os EUA. A diferença é que, naquela época, tratava-se da transição de uma potência imperialista para outra potência imperialista (os conflitos e guerras não foram entre elas, mas entre elas e um novo polo: o do Eixo Alemanha, Japão e Itália).

    Hoje, a transição é mais complexa: da unipolaridade sob domínio do imperialismo estadunidense para uma multipolaridade com um peso decisivo da China socialista. Como sabemos, os conflitos — inclusive bélicos — já começaram. A guerra dos EUA/OTAN contra a Rússia, que foi o caminho perseguido pela administração Biden para isolar a China, e que, na administração Trump, se transformou no objetivo de ir direto para o confronto com a China, iniciou-se sob a forma de “guerra fria” e guerra tecnológica (já iniciadas) para depois, usando um pretexto qualquer, baseado em algum fato por ela mesma criado, iniciar uma “guerra quente”.

    Financeirização da economia

    O primeiro pesquisador do assunto no Brasil, José Carlos Braga, prefere hoje designar como “dominância financeira”. Há uma diferença entre o capital financeiro formado na virada do século XIX para o XX, conforme examinado por Hilferding e, sobretudo, Lenin, e a financeirização atual? Vejamos então. O capital financeiro, para Lenin (que definiu melhor a categoria formulada por Hilferding), é a fusão dos capitais monopólicos industriais e comerciais com os monopólios bancários.

    Ou seja, o dinheiro que estava no banco não ficava flutuando na esfera puramente financeira, mas circulava dos bancos para a indústria e o comércio e retornava aos bancos, e assim sucessivamente. E assim ia-se financiando a acumulação na “esfera produtiva” (das grandes empresas que faziam parte do “cartel”, obviamente).

    Esse aspecto permanece, no entanto, submetido a um aspecto novo, desenvolvido a partir da década de 1970: a criação de imensas massas de capitais fictícios (no dizer de Marx), ou seja, o capital que se valoriza (D-D’) sem passar pelo processo produtivo que gera mais-valor. O sonho irrealizável dos capitalistas: obter seus lucros sem contratar os verdadeiros produtores de valor e, por conseguinte, de mais-valor – os donos da força de trabalho, os trabalhadores e trabalhadoras. Isso é impossível no capitalismo, que morre se não obtiver lucro.

    E como o capital fictício obtém essa massa incomensurável de lucro? Da “esfera real” da economia. Vejamos como se dá esse processo. O que alavancou esse processo foi a crescente dívida pública estadunidense e outras que, securitizadas, serviam de lastro à emissão de títulos derivativos. Só que foram cada vez mais exacerbando esse processo de distanciamento da “economia real”, emitindo o derivativo do derivativo do derivativo — uma verdadeira pirâmide financeira1.

    Mas, no momento em que a percepção de que esses títulos não passam de “capital fictício” — e isso ocorre normalmente quando a economia real, lastro desses títulos, entra em crise — começa a se generalizar entre os “homens do mercado”, a pirâmide desaba. Foi isso que ocorreu na crise de 2007-2009. Foi taxada de explosão da “bolha imobiliária” porque os mutuários que haviam adquirido imóvel não estavam conseguindo pagar suas hipotecas (em face da profunda contenção salarial que vinha desde a era Reagan). Elas começaram a se desvalorizar, e os cidadãos passaram a entregar seus imóveis aos bancos. Então, os derivativos fundados nessas hipotecas desabaram, quebrando bancos e grandes empresas (por estarem fundidos), não só nos EUA, como na Europa (que também havia adquirido derivativos dos derivativos estadunidenses).

    E sempre nessas circunstâncias os Estados dos países centrais, mas também os da periferia, ligam a máquina de imprimir dinheiro — que têm de compensar com aumento da produção — para salvar os bancos e demais instituições financeiras de si mesmas, salvando, ao mesmo tempo, a financeirização da economia. Ademais, nesses momentos, boa parte dos capitais antes fictícios baixa para a planície, adquirindo empresas públicas ou privadas da área produtiva, isto é, que produz valor e mais-valor.

    Socialismo chinês e a superação do ineficiente capitalismo monopolista financeirizado

    O Brasil tem entrado cada vez mais nessa “corrente”, à medida que grandes bancos e grandes empresas aqui instaladas na indústria, no comércio e no agronegócio obtêm seus lucros imorais aplicando seus “excedentes”, não na sua atividade operacional, mas no mercado financeiro. Pesquisa feita pela FIESP na época do governo FHC constatara algo assim: as 500 maiores empresas instaladas no país auferiam cerca de 50% de seus lucros em atividades não operacionais, ou seja, de aplicações financeiras.

    Além disso, a transnacionalização da financeirização nos países centrais, depois da liberalização do movimento dos capitais em nível internacional, atingiu de cheio o Brasil, provocando uma taxa de juros básicos (a Selic) anormalmente elevada, sempre disputando o campeonato mundial de taxas de juros reais mais altas. Para isso, os diretores do Banco Central — e agora, mais ainda, com a “autonomia” — são pessoas com fortes vínculos com o mercado financeiro.

    Isso significa que a financeirização da economia pode ser qualificada como subordinada. Essa casta financeira do Brasil junta-se à mundial, sobretudo à dos EUA, para, sob a forma de renda financeira obtida com títulos da dívida pública, esmagar a produção real de riqueza e superexplorar o trabalhador brasileiro. Essa casta financeira é, portanto, inimiga da nação.

    Existe a ideia de que, como o Brasil não construiu um capital financeiro próprio, não teria dinâmica própria na financeirização. Ora, sabemos que a financeirização nasceu da dívida pública dos EUA, cujos títulos serviam de lastro para a emissão de derivativos. E daí se generalizou para outros ativos, setores e países. É o que revela o caso da explosão da bolsa de hipotecas.

    É correta a avaliação, que vem desde o livro de Conceição Tavares dos anos 1960 (“Da substituição de importações ao capitalismo financeiro”), de que no Brasil ainda não se criaram as condições para a formação do capital financeiro, à medida que não se formaram os capitais monopolistas das várias dimensões do capital: bancário, industrial, comercial — e incluiríamos hoje o agronegócio. No entanto, deu passos importantes à época das privatizações.

    Ora, se o Brasil é um país dependente, também e sobretudo o é na esfera financeira. Assim, mesmo que o impulso à financeirização venha de fora, para integrá-la à nossa dinâmica interna, o fazem integrando, de forma subordinada, os grandes capitais locais que, ainda que não tenham formado o capital financeiro próprio, devido à situação de dependência, haviam crescido o suficiente para que, ainda que de maneira subordinada, possam participar desse botim financeiro. É como se, em função de sua subordinação ao financeirismo externo, os financeiristas internos tenham dado o salto de um embrionário capital financeiro para a financeirização.

    Resenha: Temporalidade da Riqueza – A atualidade de José Carlos Braga 25 anos depois

    Existe a percepção de que a financeirização não opera em função da taxa de juros porque, mesmo com taxas de juros mais baixas, ela se fortalece nos EUA. Claro, capitalista conhece sua experiência e seu poder de pressão. Lembremo-nos da intervenção do governo dos EUA na crise de 2007-2009: emitiu carradas de dólares, comprou os títulos podres e salvou, mais uma vez, os homens das finanças deles mesmos. No caso do Brasil, os juros são elevados porque o Banco Central se submete a esses mesmos financeiristas (nacionais e estrangeiros) e estabelece a taxa Selic que, por meio da pesquisa Focus, eles decidiram.

    Mas a solução não é criar o capital financeiro e fundi-lo com o Estado, conformando uma sorte de capital monopolista de Estado. Mas, ao contrário, colocar os monopólios sob controle do Estado, cabendo às empresas privadas a área concorrencial. A solução não é avaliar que não existe financeirização da economia brasileira, mas entender que ela existe de forma subordinada e criar as condições para transitar esses recursos para a área produtiva. Segue vigente a proposição de que o desenvolvimento da produção, particularmente a industrial, depende umbilicalmente do combate sem quartel ao rentismo da financeirização.

    Revolução científico-técnica

    As revoluções industriais têm como fundamento as mudanças nas fontes e formas de energia: a primeira, ocorrida, no fundamental, de 1770 a 1840, teve como base energética a máquina a vapor, que usava o carvão mineral como fonte; nesse período, a produtividade do trabalho cresceu violentamente e consolidou-se o capitalismo nascente, particularmente a partir da Inglaterra, que possuía então as maiores reservas de carvão mineral.

    A segunda, entre fins do século XIX e começo do XX, fundou-se na eletricidade e no motor a explosão, que usa como fonte de energia o petróleo; nesse período, além de haver aumentado significativamente a produtividade do trabalho, contribuiu para a consolidação do imperialismo e assentou as bases para a transição da hegemonia mundial do imperialismo inglês para o imperialismo estadunidense, beneficiado que foi pelas imensas reservas de petróleo no seu território (quem não se lembra dos filmes que mostravam cenas em que um pequeno sitiante, ao acessar a terra, ia cavar um poço para obter água e jorrava petróleo?).

    A partir da segunda metade dos anos 1970, com a emergência de nova crise estrutural do capitalismo, começou-se a falar em revolução científico-técnica, que seria a terceira revolução tecnológica, inicialmente na União Soviética2. Funde a ciência com a tecnologia, com a ciência sendo elaborada nos institutos de pesquisa públicos e privados e nas universidades, particularmente as públicas, e colocada à disposição das empresas — estatais ou privadas — diretamente ou por meio dos institutos tecnológicos, sob a forma de inovações.

    Leia mais: Setor privado e estatal no socialismo de mercado

    As fontes de energia permanecem literalmente na “idade da pedra”, pois o petróleo (óleo de pedra) continua sendo a principal fonte de energia, e o carvão mineral (pedra) segue tendo um peso importante nas matrizes energéticas de vários países. A RCT ainda não produziu sua própria forma e fonte de energia. Foi dado um passo importante ao descobrir que a fissão de átomos engendrava não apenas a bomba atômica, mas também energia nuclear. No entanto, essa forma de geração não conseguiu generalizar-se, não apenas pelo bloqueio do acesso à tecnologia, mas também porque não garante a segurança das pessoas que trabalham ou vivem nas suas proximidades e ameaça seriamente o meio ambiente com seus dejetos3.

    Existem avanços importantes nas áreas de energia solar, eólica e biomassa, mas isso não dará conta das gigantescas necessidades de energia que as novas tecnologias exigem.

    Muita gente critica a utilização pacífica da energia nuclear baseada na fissão do átomo. No entanto, esse foi um caminho que possibilitou encontrar uma forma de gerar energia limpa, segura e que usa uma matéria-prima de existência infinita: o hidrogênio, que, ao contrário da forma anterior, libera energia por meio da fusão nuclear. Por enquanto, só está gerando a capacidade de construir bombas — aliás, muito mais poderosas que as bombas atômicas.

    Leia também: Crise climática e civilização ecológica – debate entre marxismo e ecologia

    Ocorre que vários países estão pesquisando a energia do hidrogênio, ou seja, a “domesticação” da bomba H. Havia três problemas a enfrentar: encontrar um material (natural ou sintético) para a construção da “caldeira” onde se dará a explosão, que fosse suficientemente resistente para conter a força da energia dispendida; lograr que a energia gerada na fusão seja muito superior à energia utilizada; e conseguir manter a estabilidade do plasma obtido com a fusão. Resolvido isso, o custo da matéria-prima tenderia a zero: o hidrogênio existe em quantidades incomensuráveis na água e no ar.

    Apesar de vários países estarem pesquisando a energia obtida por fusão nuclear do hidrogênio, um dos que mais avançou foi a China socialista. O primeiro problema — o do material para construir a “caldeira” — parece já ter sido equacionado. Quanto ao segundo, há fortes indicações de que a China já conseguiu experimentos em que gerou mais energia do que a consumida — ainda que insuficiente. O terceiro, a estabilidade do plasma, é o ponto em que a China está na dianteira4.

    Acreditamos que essa seja a fonte e a forma de energia da terceira revolução industrial-tecnológica, a revolução científico-técnica. E só então poderemos afirmar que superamos essa fase e adentramos na quarta revolução. A Indústria 4.0 não é mais do que o aprofundamento espetacular das tecnologias da informação, típicas da terceira revolução industrial. É óbvio que tem havido avanços tecnológicos incomensuráveis em várias áreas: inteligência artificial, internet das coisas, big data, certa disseminação da robotização, inclusive humanoides. Essas tecnologias eram controladas pelas big techs5, mas a China socialista vem progressivamente furando esse cartel e, em alguns casos, já os superou. Mas isso ainda está no terreno das tecnologias da informação, que, obviamente, experimentaram um formidável avanço. Esse processo, no entanto, demanda muita energia, que só poderá ser proporcionada pela energia baseada na fusão nuclear.

    Queremos abordar um outro aspecto: a geração de valor e o trabalho nesse processo. Diz-se que a substituição acelerada do ser humano pelas máquinas por ele próprio construídas (a chamada automação), característica típica do capitalismo, tenderia a um custo zero de salário, ou seja, seria anulado o trabalho no processo econômico. Respondemos como Lênin em outro caso⁶: existe uma tendência teórico-abstrata do trabalho zero, mas isso jamais aconteceria no capitalismo. Por uma razão simples: quem gera valor e mais-valor, que se transforma no lucro capitalista, é o trabalho humano. Sem trabalho, sem valor. Por outro lado, sem trabalho, sem renda para realizar as mercadorias. O que está ocorrendo cada vez mais, para reduzir o “custo do trabalho”, é a desregulação, a terceirização, a precarização, a uberização do trabalho.

    Nesse quadro, como o Brasil poderia se inserir nesse mundo com um novo projeto nacional de desenvolvimento? Obviamente, não pode se subordinar a qualquer projeto. Tem que ter o próprio projeto. Isso significaria, em princípio, manter equidistância entre os dois polos em disputa? É óbvio que, como disse Paulo Nogueira Batista Júnior, o Brasil é muito grande para caber no quintal de alguém e deve, portanto, praticar uma política externa independente, isto é, não alinhada, no espírito da Conferência de Bandung, onde nasceu o Movimento dos Países Não-Alinhados — espírito que norteia, por outro lado, a política externa chinesa.

    Isso significa que, mesmo mantendo uma política externa independente, a nossa proximidade com a China e os BRICS é maior; além disso, a atual política externa estadunidense, ao hostilizar o Brasil com a tarifação do aço e do alumínio, fez aumentar essa proximidade, já intensificada com os acordos feitos durante a Conferência do G20 realizada no Brasil, e que deverá aumentar mais ainda para que o Brasil possa incorporar as tecnologias de ponta para sua reindustrialização em novas bases tecnológicas e modernizar sua infraestrutura.

    Na próxima e última parte desta série, trataremos de outros aspectos da realidade mundial contemporânea que impactam diretamente os países da periferia do sistema: a desindustrialização precoce, a desregulamentação da força de trabalho e do capital e os extremos climáticos.

    Perdeu alguma das partes anteriores? Confira os textos já publicados da série Capitalismo de Estado e nacional-desenvolvimentismo no Brasil:

    Notas:

    1 Segundo o Bank for International Settlements (BIS), em junho de 2023, o mercado de derivativos tinha um valor estimado em mais de 700 trilhões de dólares. 

    2 Lembramos que, nessa época, quando estávamos estudando no México, o coordenador do Doutorado em Economia da UNAM e também um dos fundadores da Teoria Marxista da Dependência, Theotônio dos Santos, montou um grupo de pesquisa dedicado ao estudo da RCT, a partir dos avanços teóricos e práticos que começaram a ocorrer na União Soviética.

    3 É certo que se tem avançado bastante na construção de depósitos para esses dejetos, mas eles ainda não garantem segurança plena.

    4 CHINA quebra recorde mundial com “sol artificial”. Exame, São Paulo, 20 maio 2024.

     “O Tokamak Supercondutor Avançado Experimental (EAST), conhecido como “sol artificial”, alcançou 1.066 segundos de confinamento de plasma em alta eficiência — superando o recorde anterior de 403 segundos, também estabelecido pela China. O experimento busca replicar o processo de fusão nuclear do Sol, oferecendo energia limpa, infinita e sustentável.

    5 Grandes empresas de tecnologia que dominam o mercado mundial e atuam nos setores de comunicação, internet e soluções eletrônicas.

    6 Esquecem da resposta de Lênin a Kautsky, quando este propôs que havia uma tendência de o capitalismo atingir a etapa do ultraimperialismo — imperialismo unificado e, portanto, sem conflitos. Lênin respondeu que essa era uma tendência teórico-abstrata, mas que, na realidade concreta, antes de essa “tendência” se efetivar, as contradições desse sistema já o teriam feito desaparecer.

     

    Nilson Araújo de Souza é pesquisador do GP 1: Desenvolvimento nacional e Socialismo – Economista, Mestre em Economia pela UFRGS, Doutor em Economia pela Universidad Nacional Autónoma de Mexico (UNAM), com pós-Doutorado em Economia pela USP; professor aposentado pela UFMS, professor visitante voluntário do Programa de Pós-Graduação em Integração Contemporânea da América Latina da UNILA; membro do Comitê Central e da Comissão Política Nacional do PCdoB, Diretor da Fundação Maurício Grabois e do Instituto Claudio Campos, presidente do Sindicato dos Escritores no Estado de São Paulo; autor de vários livros, antigos e ensaios sobre economia brasileira, latino-americana e mundial, destacando-se “Economia brasileira contemporânea – de Getúlio a Lula” e “Economia internacional contemporânea – da depressão de 1929 ao colapso financeiro de 2008”, além de haver organizado vários livros com diversos autores.

    *Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial dFMG.