Não existe mais que um internacionalismo de ação: o trabalho abnegado no desenvolvimento do movimento revolucionário e da luta revolucionária no próprio país, o apoio (por meio da propaganda, por meio da ajuda matéria! ou moral) a esta mesma luta, uma mesma linha e só essa em todos os países, sem exceção”(1).
Em 1917 Lenin caracterizou com estas palavras inequívocas, em seu trabalho “As tarefas do proletariado em nossa revolução”, o autêntico internacionalismo e, ao mesmo tempo, o abismo que o separava do “internacionalismo” dos Kautsky, Grimm, Adler e tantos outros. Lenin assinalava que não era

“fácil ser internacionalista de ação na época da terrível guerra imperialista. Desses homens, existem poucos; mas SOMENTE eles representam o futuro do socialismo, SOMENTE eles são os DIRIGENTES das massas e não os corruptores das massas”(2).
Karl Liebknecht foi qualificado por Lenin como o representante mais conhecido da corrente dos internacionalistas de ação. Em uma conferência que pronunciou a 27 de maio de 1917, num distrito da cidade de Petrogrado, Lenin declarou:

“Dizem-nos: parece que, numa série de países está tudo adormecido. Na Alemanha todos os socialistas, como um só homem, são partidários da guerra. Unicamente Liebknecht está contra. A isto respondo eu; esse Liebknecht representa a classe operária, nele em seus partidários o proletariado alemão deposita todas as suas esperanças. Não acreditais nele? Neste caso, continuai a guerra! Porque não há outro caminho. Se não tendes confiança em Liebknecht, se não acreditais na revolução dos trabalhadores, na revolução que está em gestação, se não acreditais em nada disto, então acreditai nos capitalistas!”(3)
A fé na classe operária e a profunda e inquebrantável consciência da revolução ainda em gérmen, que animavam essas palavras de Lenin, se apoiavam no conhecimento das condições do desenvolvimento e da correlação de forças que, naquele período, correspondiam à luta de classes proletárias. Lenin, que havia descoberto como ninguém a relação existente entre o desmoronamento da II Internacional oportunista e o desenvolvimento do capitalismo podre e parasitário; Lenin, crítico implacável e adversário de toda tentativa de escamoteação ou eufemismo sobre a decadência dos partidos social-democratas reformistas do velho tipo e do deslizamento de seus dirigentes reacionários para o campo da burguesia, sabia que era preciso ter confiança em Liebknecht, embora este, considerado superficialmente, estivesse “sozinho”, e embora, aparentemente, as amplas massas se encontrassem ainda aprisionadas pela burguesia e seus agentes social-imperialistas. Lenin, dirigente do único partido da classe operária internacional, que, sem vacilar nem contemporizar, pôs em prática os fundamentos do internacionalismo e da luta de classes revolucionária, desde o primeiro dia da guerra mundial imperialista, e que levava adiante, consequentemente, em seu próprio país, a luta contra essa guerra, reconheceu, com segurança, em Liebknecht o expoente de uma nova força que buscava um caminho através dos escombros oportunistas. E ademais não se desorientou com as falhas, com a insuficiente clareza de que se ressentiam ainda os representantes desta corrente. Sabia que tudo isso seria vencido, se o proletariado fosse conduzido à vitória. Mas precisamente por isso prestou ajuda aberta e tenaz aos melhores representantes desta corrente do internacionalismo em ação. Precisamente por isso, preveniu-os séria e pacientemente, em suas críticas, como, por exemplo, em seu importante artigo “Sobre o folheto de Junius”, contra as conseqüências dessas faltas e dessas obscuridades, e explicou-lhes os novos conhecimentos teóricos, que haviam sido elaborados pelo partido dos bolcheviques, ampliando audazmente e aplicando na prática as doutrinas de Marx e Engels. Somente um partido consequentemente marxista como o partido bolchevique, somente continuadores geniais da doutrina de Marx e Engels, como Lenin e Stalin, eram capazes de atitude tão estimulante como a que mantiveram para com o pequeno grupo de Karl Liebknecht. O fato de qua recordação viva da luta que Karl Liebknecht, Rosa Luxemburgo e seus amigos sustentaram valentemente, sob o signo do internacionalismo, contra a guerra imperialista, esteja sempre associada, no coração das massas proletárias, à memória desses dois combatentes assassinados pelos guardas brancos a soldo do governo social-democrata de Ebert—Scheideman, em janeiro de 1919 — esse fato representa um mérito do Partido de Lenin e Stalin, mas não é o último. Se agora os nomes de Karl Liebknecht e Rosa Luxemburgo são para o proletariado um símbolo de fidelidade abnegada à causa da classe operária internacional, fracassadas que foram as cínicas tentativas dos falsificadores oportunistas e contra-revolucionários de profanar a memória dos dois grandes mortos para esconder sua mercadoria de contrabando, deve-se agradecer isto, em primeiro lugar, ao fato de que, no crisol da crítica bolchevique, tudo o que ficou do transitório da vida e da atuação dos dois grandes lutadores, foi incorporado ao tesouro da classe operária internacional.

Quando se considera hoje a atuação de Liebknecht, Luxemburgo e seus amigos do “Grupo Internacional, mais tarde denominado “Spartakusbund”, durante todo o transcurso da primeira guerra mundial imperialista, predomina a impressão de que eles realizaram um trabalho intensivo e tenaz de esclarecimento das massas trabalhadoras. Certamente esse trabalho não teve, de modo algum, o caráter de propaganda e de agitação que teve o trabalho do partido dos bolcheviques na Rússia. Mas ainda assim é certo também que atuou sobre as massas em proporção crescente. Era realizado por homens entregues, apaixonadamente, à causa do proletariado e que, durante a guerra, fizeram as primeiras tentativas sensíveis para organizar o trabalho ilegal do Partido. Em lugar de uma atividade conspirativa cuidadosamente preparada, o que mais se revelava nesse trabalho era a capacidade de sacrifício e o heroísmo dos que o realizavam. E em vez de completar este trabalho e dá-lo por terminado, massas cada vez mais amplas acabavam por abrasar-se na mesma ação, a ação se convertia num exemplo, e a emulação chegava a ser uma questão de honra entre as forças mais avançadas, entre as melhores forças da classe operária.

Imediatamente depois de começar a guerra verificou-se, no terreno político e organizativo, como era difícil, sob as condições agravadas no estado de sítio, alcançar e superar o que a esquerda da social-democracía alemã deixou de fazer na luta de princípios contra os oportunistas abertos ou encobertos:

“A maior falta de todo o marxismo revolucionário na Alemanha é a falta de uma organização ilegal bem enlaçada, que siga sistematicamente sua linha e que eduque as massas no espírito das novas tarefas; tal organização devia ocupar uma posição clara, tanto em faca do oportunismo como em face do kautskysmo”(4).
Com essas palavras, Lenin mostrou, em seu artigo “Sobre o folheto da Junius”, onde fraquejavam principalmente os internacionalistas na Alemanha. As conseqüências dessa falta, que não eram “puramente de organização” mas que tinham raízes políticas mais profundas, apareceram já na sessão do Reichstag de 4 de agosto de 1914. Quando, nesse dia, a fração social-democrata do Reichstag votou os créditos de guerra, Karl Liebknecht, que na reunião prévia da fração do Reichstag havia intervindo violentamente contra o voto favorável, encontrou-se sem um caminho claro que o conduzisse à posição justa. O próprio Liebknecht escreve a este propósito:

“Eu também me limitei. . . quando foram apresentados os primeiros créditos, a combatê-los na fração, sem que, por muitos motives (ainda não se notava claramente a decomposição interna do Partido; parecia ainda que estávamos apenas ante um caso de confusão; a disciplina da fração ainda conservava para mim muito prestígio) levasse logo a luta à sessão do Reichstag. Mandando ao diabo a disciplina da fração que destruía o programa, mais tarde, no pleno de dezembro do Reichstag, me opus abertamente à aprovação dos créditos”(5).
Na votação de 2 de dezembro de 1914, Liebknecht apresentou à fração social-democrata do Reichstag uma declaração que foi rechaçada e cuja inclusão nas atas das sessões do Reichstag foi denegada igualmente. Nessa declaração histórica, Karl Liebknecht caracteriza a guerra como uma guerra imperialista, que:

“não foi desfechada para a prosperidade do povo alemão”.
Liebknecht desmascarou o intento de falsear esta guerra, fazendo dela

“uma guerra por uma cultura mais elevada” sob “a falsa bandeira de uma guerra pela nacionalidade e pela raça”.
Atacava também especialmente a palavra de ordem “contra o tzarismo”, lançada pelos dirigentes oportunistas social-democratas como uma “justificação” de sua atitude, e que — segundo suas palavras — não tinha outro objetivo que o de

“mobilizar os mais altos instintos do povo alemão, sua tradição revolucionária, em benefício dos objetivos de guerra, do ódio entre os povos”.
Segundo Karl Liebknecht,

a “Alemanha, que estava disposta a ajudar militarmente aos tzares sanguinários contra a grande revolução russa; a Alemanha, onde a massa do povo está explorada economicamente e oprimida politicamente, onde as minorias nacionais estão juguladas por leis de exceção; a Alemanha não tem vocação nenhuma de libertadora de povos”.
E profèticamente disse ele, mais adiante, na referida declaração:

“A libertação do povo russo deve ser sua própria causa, assim como a libertação do povo alemão não pode ser conseqüência do favor benévolo de outros Estados, senão sua própria obra”(6).
As predições de Liebknecht foram confirmadas pelo desenvolvimento da guerra, da grande Revolução Socialista de Outubro na Rússia e dos demais acontecimentos políticos.

A linha em que havia entrado Karl Liebknecht com sua audaz declaração, como porta-voz do internacionalismo de ação, foi defendida pessoalmente por e!e, tanto no Parlamento como entre as massas, desprezando todas as medidas brutais de opressão da burguesia, de seus funcionários militares e de seus lacaios social-democratas, desprezando os golpes de Noske e Scheidmann. Enquanto pôde dispor da possibilidade, por menor que fosse, de salientar, com o levantamento de questões no Reichstag, a política imperialista de guerras e anexações e para fazer ouvir as reivindicações das massas trabalhadoras, utilizou incansavelmente essas possibilidades. Suas acusações, suas reivindicações, que foram asfixiadas medrosamente pela censura militar e pela própria censura da direção do partido social-democrata, encontraram, contudo, o caminho que as levou até às massas. Cartas de informação, oitavilhas e, por último, as “Cartas de Spartakus” espalharam a verdade no país, difundiram-se entre as massas. Num trabalho marcado de sacrifícios, em muitos lugares atuavam incansavelmente numerosos lutadores para difundir as palavras de Karl Liebknecht, para difundir a verdade sobre a guerra imperialista e sobre a luta do movimento operário internacional.

Em abril de 1915, apareceu o primeiro caderno de uma nova revista mensal, “Die Internationale” (A International), publicada por Rosa Luxemburgo e Franz Mehring. Em realidade este número, como conseqüência da imediata intervenção das autoridades, foi o único que a revista pôde publicar durante a guerra, apesar do que teve uma grande importância no processo do desenvolvimento das lutas revolucionárias dos internacionalistas. Rosa Luxemburgo, que havia sido encarcerada pouco antes do aparecimento da revista, defendeu num artigo a continuação da luta de classe durante a guerra imperialista. Excluía, porém, os social-chauvinistas declarados e aqueles social-democratas no estilo de Kautsky, falsificadores do marxismo que qualificavam A Internacional “principalmente como um instrumento de paz”, embora “não um instrumento efetivo na guerra”(7) e que assim tentavam “declarar” sua capitulação ante a própria burguesia que dirigia a guerra. Contra as falsificações do marxismo feitas por Kautsky e outros, Rosa Luxemburgo escrevia:

“Quer dizer que, segundo aceita Marx, nem a luta de classes nem a guerra caem do céu, mas são conseqüências de profundas causas econômicas e sociais e, portanto, não podem desaparecer periodicamente, como se suas causas ta houvessem dissipado no ar. Mas a luta proletária de classes não é mais do que a conseqüência necessária das relações de salários e do predomínio político de classe da burguesia E, durante a guerra, não só não desaparece a relação de salários, senão que, pelo contrário, sua pressão aumenta violentamente pela especulação e a febre de empresas que florescem no terreno fertilíssimo da indústria de guerra, assim como a pressão da ditadura militar sobre os operários. Não termina tão pouco durante a guerra o domínio político da burguesia como classe, ao contrário, em virtude da supressão dos direitos constitucionais transforma-se numa franca ditadura de classe. E portanto se as fontes econômicas e políticas da luta de classes se agitam na sociedade com força dez vezes maior durante a guerra, como pode ter fim sua conseqüência imediata, a luta de classes? Pelo contrário, as guerras se produzem no período histórico atual pelos interesses rivais entre os grupos capitalistas e pelas necessidades de expansão do capital. As duas causas são molas que funcionam não somente quando troam os canhões, mas também no tempo de paz, com o que, precisamente, preparam a eclosão da guerra e a tornam inevitável. Mas a guerra é. . . somente “a continuação do política per outros meios”. A fase imperialista do predomínio capitalista com sua corrida armamentista não só tornou a paz ilusória como, no fundo, implantou a ditadura do militarismo, a guerra permanente”(8).
Franz Mehring, em seu artigo “Nossos mestres e a política legalista”, esclareceu a incompatibilidade das doutrinas de Marx e Engels com a conduta do legalismo oficial na guerra, adotada pelo partido social-democrata. Com marcante agudez, arremetia contra a divisa da “política de legalidade”, que traduzia nesta fórmula:

“A guerra é a guerra; na guerra trata-se da existência nacional; a classe operária deve sacrificar à existência nacional toda política independente e, sem vontade própria, renunciando a seus próprios interesses, deve navegar a reboque das classes dominantes”(9).
Em face desta divisa do legalismo do partido social-democrata, Mehring levantava o ponto de vista de Marx e Engels sobre a questão da guerra com estas palavras:

“Para sua política de classe não havia nenhuma diferença entre a guerra e a paz, e ainda mais: na guerra, exigiam da classe operária uma atenção muito mais vigilante para seus interesses e uma intervenção, sem mais rodeios, em favor desses interesses”(10).
Mehring assinala que o ponto de vista decisivo, com o qual Marx e Engels coordenavam sempre sua atitude numa guerra determinada, consistia em precisar

“. . . como essa guerra determinada pode ser utilizada mais a fundo para a luta do proletariado por sua emancipação”(11).
Depois de situar profundamente a posição concreta de Marx e Engels ante uma determinada guerra, Mehring chega a esta conclusão:

“A política legalista representa a renúncia completa à herança espiritual de nossos mestres, a toda história e a tudo o que constituiu até agora os fundamentos da social democracia alemã. Sua conseqüência lógica seria um partido operário social-nacional, que se pusesse de acordo com o militarismo e com a monarquia e que se resignasse ao número de reformas que o proletariado pudesse alcançar no terreno da sociedade capitalista. Os representantes da política legalista que estabelecem estas repulsivas conclusões, são suas cabeças mais esclarecidas e, ao mesmo tempo, mais inofensivas.
Em compensação, se a fenda aberta entre o presente e o passado pudesse ser fechada e dissimulada com palavras de ordem sonoras, se as massas trabalhadoras pudessem ser lançadas numa decepção que haveria de sorver-lhes o sangue das veias e o tutano dos ossos, isto equivaleria ao envenenamento do movimento operário por tempo imprevisível”(12).
Estas frases de Mehring deixam ver como, no processo de desenvolvimento da luta contra a guerra imperialista e contra a política social-democrata de armistício e conciliação nas lutas parlamentares, os representantes mais avançados do internacionalismo na Alemanha começavam a compreender que a total ruptura ideológica e organizativa com os traidores do marxismo era inadiável e necessária, antes que o movimento operário se convertesse num apêndice da burguesia.

Clara Zetkin, que no primeiro número da revista “Die Internationale”, aparecido em 1915, publicou um artigo que muito esclareceu aos operários alemães e especialmente às mulheres trabalhadoras sobre o movimento internacional contra a guerra imperialista, tinha as seguintes frases expressivas sobre a luta do proletariado russo contra a burguesia que dirigia a guerra:

“O toque de matinas vem-nos do Este, onde um proletariado incipiente, já em princípios do século, em 1905, tocava a rebate pela liberdade. A social-democracía russa alcançou lauréis imarcescíveis com sua, negativa decidida e reiterada à concessão de créditos na “puramente patriótica” Duma, com sua oposição audaz a toda a violência do tzarismo”(13).
Clara Zetkin considerava admirável a atitude do Partido Operário Social-Democrata da Rússia, isto é, o partido dos bolcheviques, e mostrava em seu artigo as dificuldades que os revolucionários russos e os internacionalistas tinham que vencer na luta que então sustentavam, e citava o “Bremer Burgerzeitung” (órgão da esquerda social-democrata, que naquele tempo mantinha uma posição semelhante à do Grupo Spartakus), onde um delegado russo informava aos operários alemães e lhes dava, de passagem, uma idéia do trabalho revolucionário do Partido nas condições da ilegalidade.

Seria errôneo querer negar que esses trabalhos de Rosa Luxemburgo, Franz Mehring e Clara Zetkin, não refletiam ainda naquele tempo a opinião geral, simbolizada pelos internacionalistas alemães, e até essas mesmas opiniões, verdadeiramente internacionalistas, não eram totalmente claras. Sem dúvida, Lenin se referia a isto quando, em seu artigo sobre o folheto que Rosa Luxemburgo escreveu no cárcere e que foi publicado e difundido ilegalmente em 1916 com a assinatura de “Junius”, dizia o seguinte:

“É indubitável que “Junius” está decididamente contra a guerra imperialista e decididamente PELA tática revolucionária . Mas, em primeiro lugar, “Junius” não se libertou ainda per completo do ambiente dos social-democratas alemães, inclusive dos de esquerda, que temem uma cisão, que têm medo de levar até o fim as palavras de ordem revolucionárias. . . No folheto de “Junius” percebe-se que o autor se ENCONTRA ISOLADO, que não tem nenhum camarada numa organização ilegal que esteja acostumado a pensar em palavras de ordem revolucionárias até c fim e que eduque as massas em seu espírito. Mas esta falta. . . não é uma falta pessoa! de “Junius”, mas o resultado da debilidade de TODAS as esquerdas alemãs, que em todas as partes estão asfixiadas pela ignóbil rede da hipocrisia kautskyana, pelo pedantismo e o “pacifismo” dos oportunistas”(14).
Quer dizer, Lenin, que, por meio de sua teoria do imperialismo como fase superior do capitalismo, desenvolveu a doutrina de Marx e Engels e deu ao proletariado os fundamentos teóricos para a luta, viu com toda clareza as debilidades das esquerdas alemãs. Na “História do Partido Comunista (bolchevique) da URSS”, diz-se sobre este particular:

“Lenin criticava os erros dos internacionalistas pouco conseqüentes dentro das fileiras dos social-democratas de esquerda, tais como Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht, ao mesmo tempo em que os ajudava a adotar uma posição acertada”(15).
Lenin realizou este trabalho com grande tenacidade, com notável paciência, como se poder ver pelos seus artigos dedicados aos internacionalistas alemães e, muito especialmente, por sua luta perseverante contra seus erros, contra suas falhas na maneira de tratar a questão nacional. Lenin preveniu Rosa Luxemburgo e seus amigos contra a estreiteza de vistas nesta questão e contra a subestimação da importância que, para a luta da classe operária por sua libertação, tinha a luta das nacionalidades oprimidas pelas grandes potências imperialistas.

“Seria um erro — escreve Lenin em “SOBRE O FOLHETO DE JUNIUS” — querer. . . esquecer os movimentos nacionais CONTRA o imperialismo”(16).
Observou igualmente que é preciso evitar esta atitude “reacionária de completa indiferença ante os movimentos nacionais”, que chega ao patrioteirismo, “quando os súditos das grandes nações européias declaram… com um ar de suficiência: Já não pode haver guerras nacionais!” Uma vez mais Lenin salienta:

“As guerras nacionais CONTRA as potências imperialistas não possíveis e verossímeis, como são inevitáveis, são PROGRESSISTAS e REVOLUCIONÁRIAS, embora naturalmente, para seu ÊXITO, sejam necessários tanto os esforços conjuntos de uma imensa quantidade de súditos dos países oprimidos. . . tanto uma situação internacional ESPECIALMENTE favorável… quanto o levante SIMULTÂNEO do proletariado de uma das grandes potências contra a burguesia”(17).
Lenin manifestou então sua esperança de que os social-democratas de esquerda da Alemanha se libertaria do temor injustificado de levar até o fim as palavras de ordem revolucionárias.

“O desenvolvimento de sua própria luta contra os social-patrioteiros os conduzirá a isso”(18).

Esta luta adquiriu, de fato, formas cada vez mais agudas, proporções cada vez mais amplas: isto é, na mesma medida em que os internacionalistas de ação conseguiam fortalecer suas relações com as massas proletárias, as massas manifestavam sua verdadeira vontade por meio de suas ações nas empresas e nas ruas.

De pouco serviu à burguesia e a seus funcionários militares e policiais o se haverem entregue a uma perseguição raivosa dos principais dirigentes da corrente internacionalista e que os encarcerassem, um após outro. Rosa Luxemburgo esteve no cárcere quase durante toda a guerra; Karl Liebknecht, depois de seu heróico aparecimento na Praça de Potsdam, em Berlim, a 1.° de maio de 1916, foi condenado a dois anos e meio de prisão e, na revisão do processo, a quatro anos; Franz Mehring e Clara Zetkin foram presos preventivamente. Wilhelm Pieck, que se achava entre os dirigentes e organizadores da instrução revolucionária dos operários, foi encarcerado. Mas enquanto em Berlim, na região do Reno, na costa, na Saxônia, na Alemanha central e meridional, os beleguins enxameavam e detinham os propagadores das “Cartas de Spartakus” e os organizadores das manifestações de massas, sempre havia lutadores abnegados que ocupavam logo os claros temporariamente abertos. Com uma exaltação crescente, com um entusiasmo febril prosseguia o trabalho. Quando, depois da sentença contra Liebknecht, em Brunswick e em outros lugares, mais de 55.000 operários escolheram a arma da greve política de massas, foi que se comprovou quanta fogueira havia sido acesa pelas palavras de ordem de Liebknecht de “Abaixo a guerra; abaixo o Governo!” Esta onda crescente da luta de massas contra a guerra imperialista, este protesto ativo contra o armistício na luta parlamentar dos social-patrioteiros, foi uma contestação magnífica às palavras de Liebknecht ante o conselho de guerra:

“Presídio, perda dos direitos de honra. . . Bem! Vossa honra não é a minha. Eu vos digo que nunca um general vestiu com tanta honra um uniforme como vou eu vestir o uniforme de presidiário. . . Estou aqui para acusar e não para defender-me!. . . O acusador chamou o povo contra mim. . . Ah! Não se limitem a dizê-lo em palavras, não se limitem a dizê-lo só neste processo que, sob dez ferrolhos, se oculta ao povo. Tirem do povo a mordaça e as algemas do estado de sitio. Reúnam o povo, aqui ou onde os senhores queiram, e os soldados da frente, também onde queiram! E deixemos aparecer diante deles reunidos, diante de VOSSO tribunal, de um lado todos os senhores, toda a sala, os acusadores e também os cavalheiros que estão atrás, os senhores do Estado Maior, do Ministério da Guerra, do Departamento da Imprensa Militar, todos os cavalheiros que os senhores queiram. Do outro lado, eu sozinho ou sem um de meus amigos. NÃO TENHO DÚVIDA sobre de que lado se situará a massa do povo quando se descerrar diante de seus olhos o véu da mentira; se com os senhores ou comigo!”
Liebknecht estava com a razão. Não podia duvidar. E Lenin tinha razão quando considerou “esse tal Karl Liebknecht” como a expressão da autêntica vontade do proletariado. O fato de que, quando a corrente dos trabalhadores rompeu, por fim, os muros de contenção do estado de sítio, a burguesia, com ajuda da social-democracía, conseguiu de novo levar ao mau caminho as massas que já estavam em movimento, depois que dezenas de milhares de seus melhores homens foram assassinados ou encarcerados — esse fato nada representa contra Liebknecht e seus companheiros de luta, nem tão pouco contra a caracterização feita por Lenin. Pelo contrário, este fato demonstra a justeza das perspectivas de Lenin e Stalin em suas críticas positivas às falhas e insuficiências da esquerda alemã.

Para a classe operária internacional, têm uma especial significação os atos e a doutrina da luta em que Karl Liebknecht e Rosa Luxemburgo se empenharam durante a primeira guerra mundial sob a divisa de “O inimigo principal está dentro do próprio país”. Em muitos países, desde os dias sangrentos e janeiro e 1919, os operários revolucionários se reúnem para renovar seu juramento em memória de Karl e Rosa, os quais, com sua vida, selaram sua fidelidade à causa da classe operária. E embora as circunstâncias atuais tragam consigo enormes diferenças, precisamente tais circunstâncias fazem com que os pensamentos de muitos operários se dirijam para a luta que os internacionalistas de ação sustentaram contra a guerra imperialista. Agora, precisamente, mais do que nunca os operários revolucionários de todos os países se consideram os legatários do valor heróico dos lutadores contra o imperialismo dos tempos da primeira guerra mundial. Entretanto, hoje quando assistimos às novas traições dos dirigentes socialistas de direita, aliando-se à reação e ao imperialismo, a classe operária, lutando e conseguindo vitórias, pode repetir as palavras de Karl Liebknecht: “Apesar de todos eles”. E este “Apesar de todos eles” tem hoje uma vibração toda especial, quando o proletariado de todo o mundo luta decididamente contra as ameaças de uma nova guerra, contra o imperialismo, no caminho do socialismo.

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Notas:
(1) Lenin — Stalin “O Ano 1917”, pág. 54-1939. 
(2) Lenin — Stalin: “O Ano 1917”, pág. 58-1939. 
(3) Lenin; “Guerra e Revolução”, pág. 28. 
(4) Lenin: “Obras Escolhidas”, tomo V, pág. 266. 
(5) Karl Liebknecht: “Discursos e Artigos”, pág. 133. 
(6) Karl Liebknecht: ” Discursos e Artigos “, pág. 134. 
(7) “Die Internationale'”‘, abril de 1915, caderno I, pág. 5. 
(8 (“Die Internationale”, abril de 1915, caderno I, pág. 60. 
(9) “Die Internationale”, abril de 1915, caderno I, pág. 6. 
(10) “Die Internationale”‘, abril de 1915, caderno I, pág. 61. 
(11) “Die Internationale*’, abril de 1915, caderno I, pág. 61. 
(12) “Die Internationale”, abril de 1915, caderno I, pág. 36. 
(13) “Die Internationale”, abril de 1915, caderno 1, pág. 36. 
(14) Lenin: “Obras Escolhidas”, torno V, págs. 278-279. 
(15) “História do Partido Comunista (bolchevique) da URSS”, página 232 — Editorial Vitória — Rio. 
(16) Lenin: “Obras Completas”, tomo V, pág. 268. 
(17) Lenin: “Obras Escolhidas”, tomo V, pág. 272. 
(18) Lenin: “Obras Escolhidas”, tomo V, pág. 278. 

Um Governo Democrático e Progressista

“A instauração no país de um governo efetivamente democrático e progressista capaz de iniciar a solução dos grandes problemas da revolução agrária e antiimperialista — este o nosso objetivo estratégico e fundamental, que só poderá ser alcançado através da criação de um amplo e sólido bloco das forças democráticas e populares.”
                                                                                                                                                                                    Prestes