Critica-se com razão, a prática de retirar das fotografias o rosto de pessoas que se tornaram "indesejáveis". Em contrapartida, encena-se uma operação gigantesca para retirar da história um período de meio século, de construção do socialismo.

Esta edição de Princípios circula exatamente nos dias em que a revolução socialista de 1917 completa 74 anos. E quando se assiste à comemoração dessa data, na URSS, sendo substituída pelo enforcamento simbólico de Lênin, e aos estandartes da escravidão czarista serem hasteados no lugar da bandeira vermelha da liberdade. O que se pretende afastar da foto histórica?

Não apenas Lênin, gênio da elaboração teórica e da tática, comandante político audaz que jamais vacilou em confiar na capacidade inventiva e na disposição de luta das massas trabalhadoras.

Não apenas um povo de desmedido heroísmo que ousou arrebentar as tradições para desvendar um outro modo de vida sob a direção do partido.

Procura-se arrancar da trajetória do mundo os acontecimentos maiores do século XX e da própria humanidade.

No dia 7 de novembro de 1917, os disparos dos canhões do Aurora foram ouvidos por todos os oprimidos do planeta como um hino de liberdade e um chamado à luta. Marx dizia que o comunismo superava a pré-história e inaugurava a história propriamente da humanidade.

Hoje, um funcionário do Departamento de Estado norte-americano, vestido de filósofo, proclama que o liberalismo é o teto da história. E, nas ruas, como "demonstração" deste final feliz, meninos matam outros meninos para roubar um par de tênis.

As jornadas de 1917 deram origem à maior e mais influente organização revolucionária do mundo, a III Internacional – que difundiu a idéia marxista e impulsionou a formação de destacamentos políticos operários em todos os quadrantes do Globo.

Em 7 de novembro, a Rússia faminta, inculta e atrasada cedeu lugar à URSS poderosa, próspera, com um povo capaz de dominar a ciência e as artes. Nasceu em 1917 um sistema socialista capaz de contrapor-se, na Segunda Guerra, às hordas do nazismo, produto sofisticado dos laboratórios burgueses.

Os méritos e defeitos dessa obra grandiosa do proletariado são inapagáveis. É evidente que os erros, as debilidades e as deformações existiram, a tal ponto de facilitarem brechas para os ataques de inimigos.

Mas a história julga pelos resultados alcançados. Por mais elaborada e por mais poderosa que seja a propaganda capitalista, não é possível esconder a riquíssima experiência e as conquistas atingidas – apesar dos tropeços, das sabotagens, das distorções. A história não se deixa iludir pelo truque de apontar os erros e deformações como o produto essencial do socialismo.

Talvez, na URSS, os que pretendam comemorar essa primeira tentativa de virar o mundo a favor de quem trabalha, o façam na clandestinidade. Sem nenhuma pretensão, os editores de Princípios assinalam que estão solidários com essa gente. Lá e em toda parte da Terra. E que encaram as coisas da mesma forma que Lênin, ao observar em 1922: "Nosso aparelho de Estado é francamente mau. Que importa! Ele foi criado, é uma imensa obra histórica, um Estado de tipo proletário foi criado"!

EDIÇÃO 23, NOV/DEZ/JAN, 1991-1992, PÁGINAS 3