Coletânea organizada com os objetivos de desencadear, através da Fundação Anísio Teixeira, o processo de retomada das contribuições daquele que é considerado um incansável batalhador pela universalização da escola pública brasileira; torná-lo conhecido como “(…) um homem de seu tempo, mas com os olhos sempre voltados para o futuro” (p. 17) e chamar a atenção para a necessidade de se recuperar a totalidade de seus trabalhos. Lançada em 1991, quando se completavam vinte anos de sua morte, tem também o sentido de uma homenagem ao intelectual brasileiro, desaparecido no auge da ditadura militar, da qual também foi vítima direta.

Ao todo, são 31 textos, nove dos quais de autoria do próprio Anísio Teixeira. Os demais, assinados por destacadas figuras ligadas à educação e à cultura e incluindo matérias jornalísticas, tratam de suas idéias e de sua ação, de sua vida pública e de aspectos de sua intimidade. A obra traz também (em apêndice) dispositivos legais que absorveram propostas do pensador, revelando sua preocupação com a escola pública, a autonomia para a educação, o fomento à ciência e à tecnologia no Brasil.

Os textos estão organizados em três partes. Na primeira – Permanente atualidade: a luta pela escola pública – que começa com um discurso do próprio Anísio sobre a autonomia para a educação, são reunidos artigos e depoimentos enaltecendo tanto sua vida e obra quanto a importância da fundação que leva seu nome, no sentido de divulgar, pesquisar e atualizar mais contribuições. Têm a palavra, aí, figuras como Florestan Fernandes, Antonio Houaiss, Darcy Ribeiro, Hildérico Pinheiro de Oliveira, Jorge Hage, Luís Felippe P. Serpa, Maria José R. Lima, Afrânio Coutinho e João Augusto L. Rocha, o organizador.

A segunda parte – Esboço cubista de retrato – procura formar um retrato múltiplo de Anísio Teixeira, com fatos e detalhes (alguns curiosos) de sua vida, segundo as diferentes maneiras de ver dos autores, a partir da convivência que com ele tiveram. Destaque, nesta parte, para o depoimento de Haroldo Lima, sobrinho de Anísio, ao lado dos de Carlos Eduardo da Rocha, Thales de Azevedo, Iva W. Bonow, Diógenes Rebouças, Luís Henrique D. Tavares, Iracy Picanço e Artur da Távola.

A terceira parte – Tempos e contratempos – apresenta amostras da trajetória de Anísio, numa espécie de autobiografia ou auto-retrato, trazendo situações em que ele fala de si mesmo, e ilustrando diferentes momentos de sua produção, numa disposição cronológica de textos “(…) não muito conhecidos do grande público” (p. 185). Constam dessa parte: a entrevista concedida a Odorico Tavares, falando dos ciclos de sua vida; o discurso proferido na abertura do 12º Congresso da UNE (em Salvador, 1949), seguido da polêmica por ele provocada, expressa em editoriais do jornal A Tarde, com a réplica de Anísio e a tréplica dos editores; além de textos em que ele fala, ora de suas decisões e convicções pessoais, ora dos valores que deseja ver preservados, ora sobre suas preocupações com os destinos da Pátria brasileira, em meio a reflexões sobre educação, cultura, ciência, tecnologia, necessidades de escola pública, importância e papel da universidade etc.

A obra interessa, em geral, a todos os que pretendem ter uma idéia de quem foi Anísio Teixeira e quais as suas principais contribuições e, em particular, aos diretamente preocupados com questões educacionais. Tanto nas palavras dos diversos autores quanto nas amostras dos textos selecionados do próprio Anísio, o livro situa o caráter progressista de sua obra, expresso não só nos pensamentos, mas também na ação concreta voltada para viabilizá-los. E o faz num sentido histórico: ao destacar sua marcante “(…) presença na renovação da educação brasileira”, não deixa de evidenciar que sua visão de sociedade, de democracia, de escola, atém-se aos limites de uma concepção liberal, reconhecida, no entanto, como avançada para a época, a ponto de alguns chegarem a chamá-lo de comunista (Florestan Fernandes, p. 96).

Mostra, enfim, que “Anísio Teixeira viveu a seu tempo, sustentando as posições progressistas da época e constituindo-se o polarizador principal na luta educacional, na luta dos estudantes, na luta pela escola pública e pela democratização da escola no Brasil”. (Haroldo Lima, p. 170).

A partir dessa coletânea, é possível que o leitor sinta-se estimulado a estudar outras obras do autor – bem como de outros autores ligados ao movimento da Escola Nova – recomendável, aliás, aos que se ocupam em investigar prováveis relações entre a concepção liberal de escola e as propostas pedagógicas das experiências socialistas.
Nereide Saviani

Em tempo: Esta resenha estava pautada já para o n. 29. Sua publicação apenas neste número se deveu a problemas de disponibilidade da resenhista. Portanto, é apenas coincidência o fato de ela ter saído imediatamente após o anúncio da homenagem a Anísio Teixeira, figurando-o na próxima cédula de mil cruzeiros reais.

A formação da classe operária – o bairro de São Miguel Paulista

ROCHA, Antonia Sarah Azis. O bairro à sombra da chaminé. Tese de mestrado apresentada à PUC-SP, 1992.

“E foi mais ou menos assim, moça, que esta fábrica cresceu e inundou São Miguel, com sua negra fumaça, seu ácido, seu asco”. Depoimento de Severino Barbosa de Sousa, ex-operário da Nitro Química.

Explicitando que seu estudo “(…) é fruto de uma postura política científica partindo de um olhar marxista”, a autora apresenta na tese O bairro à sombra da chaminé a história “(…) da formação da classe trabalhadora da Companhia Nitro Química Brasileira (1935 a 1960)”. História esta que se confunde com o próprio desenvolvimento do bairro de São Miguel Paulista,

EDIÇÃO 31, NOV/DEZ/JAN, 1993-1994, PÁGINAS 80