A França vem sendo sacudida por uma onda de escândalos, comparada pela imprensa local à Operação Mãos Limpas da Itália. Embora de proporções menores, a comparação se apóia na revelação do envolvimento de empresários e políticos destacados num esquema de corrupção que começa com o financiamento de campanhas eleitorais e termina em concessões de serviços públicos e favorecimento em grandes compras feitas pelo Estado.

Centenas de figurões estão sob investigação criminal: homens de negócios poderosos, ministros de Estado, prefeitos, presidentes e tesoureiros de partidos políticos.

Em várias das investigações feitas por um pequeno (mas atuante e firme) grupo de juízes franceses, aparecem, entre os principais implicados em transações de repasses de recursos de empresas para partidos políticos, importantes dirigentes das mais poderosas empresas que atuam no mercado da água: a Compagnie Générale des Eaux, a Lyonnaise des Eaux e o grupo Saint Gobain.

Dois ministros já caíram: Gérard Longuet, da Economia e Negócios Externos, envolvido num esquema de financiamento de seu partido, do qual participou a Générale des Eaux, e Alain Carignon, ex-ministro das Comunicações, envolvido num esquema de financiamento eleitoral com a Lyonnaise des Eaux.
O caso que provocou maior impacto foi o de Alain Carignon, preso em 12 de outubro, pelo juiz Philipe Courryer, por acusação de abuso de bens sociais e corrupção passiva, num processo envolvendo a atribuição do contrato de privatização da água da cidade de Grenoble à Lyonnaise des Eaux.

A grande repercussão do caso se deve à notoriedade do preso, pois Alain Carignon, além do ex-ministro das Comunicações, é prefeito de Grenoble – uma das mais importantes cidades francesas, com cerca de 400 mil habitantes.

A ascensão de Carignon começou em 1983, quando, com apenas 34 anos, contrariando todos os prognósticos, derrotou o candidato socialista Hubert Dubedout nas eleições para a prefeitura de Grenoble, tornando-se a mais jovem e promissora revelação do neo-gaullismo, trunfo que a levou, em 1986, ao ministério do Meio Ambiente.

A carreira meteórica de Carignon não parou por aí; em 1989, ele deixou o ministério, foi reeleito prefeito de Grenoble, escolhido como presidente do Conselho Regional do Isère, região da qual Grenoble é uma espécie de capital. Dois anos depois, voltou ao ministério, desta vez para a pasta das Comunicações, onde permaneceu, acumulando o cargo com a Prefeitura de Grenoble, até julho de 1994, quando o escândalo o levou a pedir demissão.

Troca de favores?

As investigações que levaram Alain Carignon à prisão começaram pelo financiamento de uma revista que apareceu em Grenoble na época de sua campanha eleitoral em 1989, a Dauphiné News – uma revista luxuosa, de apoio aberto à sua candidatura. Passada a eleição, a revista mostrou-se deficitária e foi comprada pela SERECOM, filial da Lyonnaise des Eaux, que pagou as dívidas de 5,4 milhões de francos e fechou a publicação.

Na mesma época, em julho de 1989, os serviços de abastecimento de água de Grenoble foram privatizados, e o contrato entregue à Cogese, uma empresa formada por duas outras: a SDEI (Sociéte de Distribuition des Eaux Intercommunalles) e a SEREPI, outra filial da Lyonnaise des Eaux.

O juiz Phillipe Courryer tenta verificar que ligações existem entre a reeleição de Alain Carignon e as duas empresas de água. A história parece ter começado no período passado por Carignon no ministério do Meio-Ambiente, ao lado de Jean-Louis Dutaret, seu grande amigo e mais próximo assessor. Dutaret, além de assessor de Carignon no ministério, era ainda assessor jurídico da Prefeitura em Grenoble, e foi preso junto com Carignon, também acusado de abuso de bens sociais e cumplicidade de corrupção. A permanência dos dois amigos no ministério do Meio Ambiente foi extremamente proveitosa. Lá conheceram muita gente, muitas empresas, e farejaram um negócio promissor: a adaptação das empresas e serviços públicos ao labirinto das exigências ambientais da Europa unificada.

Nesse período, Jean Louis Dutaret criou a Whip, uma empresa de consultoria, especializada em contratos de água, transportes públicos, energia e estudos ambientais. E Dutaret passou a oferecer seus préstimos às empresas que conheceu nos tempos do ministério.

Uma dessas empresas, o grupo de consultoria Merlin, dirigido por Marc Michel Merlin, é um dos principais clientes da Whip e, em particular, uma das empresas do grupo, a SDEI (Société de Distribuition des Eaux Intercommunales). Em cinco anos de vida, a Wip faturou um total de 13 milhões de francos, sendo que 8 milhões de francos vieram de um único cliente, Marc Michel Merlin, dirigente da SDEI, e outros 2 milhões de outro cliente, a Lyonnaise des Eaux.

O grupo Merlin foi particularmente devotado a Alain Carignon. Em 1986, quando Carignon chegou ao ministério, os Merlin colocaram à sua disposição um apartamento de 280 metros quadrados no boulevard Saint Germain, a área nobre de Paris; foi feito um contrato de locação com a Whip, por 32 mil francos mensais, que nunca foram pagos. Em julho de 1988, a dívida foi formalmente negociada por 300 mil francos, e também nunca foi paga.

O Juiz estima que Carignon e Dutaret (o ex-ministro e seu assessor) tenham se beneficiado com cerca de 20 milhões de francos: com os 13 milhões de francos faturados pela Whip, com o pagamento da dívidas eleitorais da Dauphine News, além de pequenos favores, como os aluguéis não pagos do apartamento em Paris e cerca de 50 viagens aéreas realizadas por Carignon, pagas pelo grupo Merlin. Em troca, o prefeito teria dado a seus benfeitores a exploração dos serviços públicos de água da cidade.

As grandes da água no mar de lama

O serviço municipal encarregado de gerir a água e o saneamento em Grenoble funcionava muito bem até então. Pouco antes da privatização, em fevereiro de 1989, o próprio adjunto do prefeito, Pierre Gascon, apoiado em estudos, afirmava que não havia necessidade de fazer a concessão dos serviços, e que a privatização só faria aumentar o preço da água para os usuários.

Surpreendentemente, no entanto, o próprio Gascon apresentou ao conselho municipal o projeto de delegação do serviço a uma empresa privada, poucos meses depois, em julho do mesmo ano. A despeito da resistência e dos protestos dos trabalhadores do setor, da população e da oposição, o contrato acabou aprovado, sem passar por concorrência, em votação difícil que levou mais de cinco horas, e que já tinha destino certo: a Cogese, formada pela empresa de Merlin e pela Lyonnaise des Eaux.

“Outros escândalos revelam o envolvimento de dirigentes de poderosas empresas”

Poucos meses depois, justamente uma outra filial da Lyonnaise des Eaux, a SERECOM, comprou a editora da Dauphiné News e pagou as dívidas de Carignon.

Em janeiro de 1991, o dirigente máximo da Lyonnaise, Jérôme Monod, anunciou a compra do controle da SDEI de Merlin. E a Lyonnaise passou a reinar absoluta em Grenoble.

Além da prisão de Carignon, Dutaret e Marc Michel Merlin, preso pouco antes, o juiz Courryer determinou que os dirigentes das duas filiais da Lyonnaise des Eaux, SEREPI e SERECON, respectivamente Jean-Jacques Prompsy e Louis Bera, fossem investigados.

Outros escândalos investigados no bojo da Operação Mãos Limpas à francesa têm revelado o envolvimento de mais alguns grandes dirigentes das mais poderosas empresas de água do mundo. Guy Déjouany, o todo-poderoso diretor presidente da Générale des Eaux, até agora tido como um dos mais respeitados empresários franceses, foi ouvido por três dias consecutivos pelo juiz Renaud Van Ruymbecke, que investiga o financiamento da RPR, que resultou na queda de Gérard Longuet, para esclarecer detalhes de um contrato para exploração dos serviços de água em Saint-Denis-de-la-Réunion.

Outro grande grupo francês que atua no mercado da água, o grupo Saint Gobain, está envolvido em uma investigação sobre a doação de 830 mil dólares da Metalúrgica Barbará, no Brasil, para a sua matriz na França, a Pont-à-Mousson, uma das empresas do grupo. Jean Jacques Faust, dirigente no Brasil da Metalúrgica Barbará, enviou os dólares para a Suíça, segundo seu depoimento, a pedido da matriz francesa, através da Operação Uruguai, para uma conta suíça de um intermediário do grupo, René Trager, que está preso por ordem do juiz Ruymbecke, desde março de 1991, por envolvimento em outro escândalo.

O próprio Trager disse ao juiz Ruymbecke, que investiga há um ano as comissões pagas pela Pont-à-Mousson para a obtenção de contratos públicos, que o dinheiro havia sido pago pela Pont-à-Mouson na conclusão de um contrato de adução de água em Nantes.

“As empresas financiam partidos e recebem em troca diversos negócios públicos”

O juiz indiciou o diretor-presidente do grupo, Jean Louis Beffa, o ex-presidente da Pont-à-Mousson, Bernard Novel, e seu diretor geral Pierre Blayan por tráfico de influência. Eles se defendem dizendo que foram vítimas de chantagem de Trager e que, por isso, pagaram a comissão pedida. Também foi indiciado o conselheiro municipal Jean Pierre Lapégue, acusado de ter recebido uma comissão de 4,4 milhões de francos da Pont-à-Mousson.

Há mais implicados em outros casos: Jacques Médicin, ex-prefeito de Nice, é acusado de ter recebido uma comissão da Dégrémont, filial da Lyonnaise des Eaux, para entrega do contrato para o tratamento de água da cidade; e Pierre Botton foi acusado de receber 1,6 milhões de francos da SDEI, já depois de comprada pela Lyonnaise, para seu sogro, Michel Noir, prefeito de Lyon.

E não é por acaso que vários desse escândalos envolvem as maiores empresas de água francesas: elas parecem ser grandes financiadoras dos partidos, recebendo em troca negócios públicos de vários tipos.

Um levantamento preliminar feito pela revista francesa Le Nouvel Observateur revela que a “democracia na França se apóia em quatro grandes grupos de construção e serviços públicos: CGE (Compagnie Générale des Eaux), Lyonnaise des Eaux, Bouygues e Eiffage”. Juntos, esse grupos colocaram 38,1 milhões de francos nas mãos dos partidos (25% do total das contribuições eleitores), nas eleições de 1993. A Générale sozinha deu 13 milhões de francos, e a Lyonnaise 7,7 milhões, segundo o levantamento da Nouvel Observateur.

Os “benefícios” da privatização

Se antes da revelação desses esquemas já havia insatisfação dos usuários com preços praticados pelas companhias, agora as coisas devem piorar. O consumidor francês não consegue entender bem por que existe tanta disparidade nas tarifas, de um lugar para outro, e nem por que os preços sobem tanto quando o serviço é privatizado.

Em Grenoble, o preço do metro cúbico passou de 5,8 francos para 12, depois da privatização; em Toulon, depois da privatização em favor da Générale, o preço passou de 8 para 16,99 francos; há disparidades que podem variar entre 4,0 e 30,0 francos o metro cúbico, em alguns casos.

“O preço das tarifas de água, na França, está entre os mais altos do mundo”

Os preços médios das tarifas de água praticadas na França estão entre os mais altos do mundo; só perdem para os da Alemanha, Áustria e Bélgica, segundo levantamento da revista francesa L’Evénement du Jeudi. Dados oficiais do ministério do Meio Ambiente mostram que na França, o preço médio é de 11 francos; nos Estados Unidos, por exemplo, o metro cúbico custa em média 2,88 francos. E a tendência é que os preços aumentem ainda mais. Entre 1990 e março de 1994, os preços da água para o consumidor subiram 47,9%, e devem continuar em escalada ascendente – a Lyonnaise des Eaux prevê crescimentos anuais de 15% nos preços até o ano 2000, em função das exigências ambientais da Europa.

Além do preço, o setor de saneamento na França tem outras características que preocupam as autoridades. Há mais de cem anos existe naquele país um sistema de gestão delegada, mais conhecida no Brasil, simplesmente, como privatização. Há duas modalidades: o arrendamento, em que os bens são públicos e explorados pela empresa privada, que paga por essa exploração, e a concessão, em que a empresa privada faz obras e explora seus benefícios, através da cobrança de tarifas que incluem a amortização dos investimentos pelos serviços proporcionados.

Foi esse sistema de delegação da gestão das empresas privadas, na França, que permitiu o surgimento das duas maiores empresas mundiais de água, a Générale des Eaux e a Lyonnaise des Eaux, seguidas com alguma distância pelo grupo de construção Bouygues, com a SAUR, e pelo grupo Saint Gobain, com a CISE.

Embora a Générale seja maior do que a Lyonnaise (tem um faturamento anual de 147 bilhões de francos e 210 mil empregados, contra 94 bilhões de francos de faturamento anual e 120 mil empregados da Lyonnaise), é menos audaciosa em suas incursões fora da França. A Lyonnaise, por exemplo, entrou no mercado latino-americano com mais força: está em Buenos Aires e na cidade do México, assumindo a concessão total dos serviços na capital argentina e parcial na capital mexicana; está começando a atuar com mais vigor no Brasil, onde já tem uma filial há algum tempo, a Dégrémont; e agora começa a se associar a empreiteiras locais de porte, como a CBPO. É isso, provavelmente, o que aparece entre as cinquenta maiores empresas mundiais cujos trabalhadores estão fora do país de origem da empresa, num relatório recente da UNCTAD, organismo das Nações Unidas.

“Concentração do mercado nas mãos de poucas empresas: preços em alta”

A concentração nesse ramo de negócios preocupa os organismos fiscalizadores na França. Cristian Babousiaux, principal dirigente do DGCCRF (Direction Générale de la Concurrence, de la Consommation e de la Répression des Fraudes), diz que a concentração nesse mercado é grande há algum tempo, e não parou de crescer nos últimos dez anos.

Em seu relatório geral dos anos 1982-1984, o Comitê Central de Pesquisa de Custos e Rendimentos de Serviços Públicos francês insistia sobre a inconveniência do peso dessas sociedades de distribuição de água no mercado, sendo que as duas maiores empresas representavam, então, 75% dos negócios do setor, e eram responsáveis pelo atendimento de 44% da população da França. Entre as 32 maiores cidades francesas, 17 estão nas mãos de Générale des Eaux, 10 nas da Lyonnaise des Eaux e 5 da SAUR, do grupo Bouygues.

Com três quartos do mercado de distribuição de água potável na França e 35% da coleta e tratamento de esgotos, essas empresas adquiriram uma onipresença e uma onipotência que inquietam, diz o jornal francês Le Monde.

Gestão pouco ortodoxa

Além dos preços crescentes e da concentração do mercado nas mãos de poucas empresas, as práticas contratuais nesse mercado não são das mais rigorosas. Um relatório de 1989 do Tribunal de Contas da região central da França pedia às coletividades locais maior rigor na gestão financeira dos contratos de água e alertava para a aplicação muito parcial do princípio da “verdade dos custos e dos preços”. O Tribunal denunciava como práticas perversas nos contratos a subvalorização dos encargos, a ausência de amortização e a insuficiência de receitas, que invariavelmente terminam no recurso sistemático às subvenções; e afirmava que, do ponto de vista do interesse geral, a intervenção das empresas privadas não tem justificativa.

“Concorrência como instrumento de qualidade e preços baixos não existe mais hoje”

O relatório do Tribunal fez também uma lista de riscos da gestão delegada: 1) a duração excessiva dos contratos – contratos inicialmente firmados para 20 ou 30 anos são prolongados para 30 ou 40 sem nenhuma razão concreta, fugindo dos mecanismos de disputa no mercado; 2) o repasse para o poder local dos custos de obras que seriam seus – as empresas alegam que as obras são muito onerosas, e elas acabam sendo financiadas pela própria coletividade, muitas vezes em negócios arranjados para empreiteiras e coligadas; 3) a prática corrente de retardar o recolhimento ao Tesouro dos recursos provenientes de taxas que essas empresas cobram dos consumidores junto com as tarifas, representando ganhos financeiros indevidos; 4) e, por fim, a disparidade dos preços da água, que o Tribunal de Contas considerou pouco justificáveis.

Para diminuir o poder dessas empresas sobre os órgãos concedentes e restabelecer a prática da concorrência, foi aprovada, em 1993, a chamada lei Sapin, que estabelece regras mais rígidas para concessão de serviços públicos. Entretanto, graças ao poderoso lobby das grandes da água, o projeto aprovado abre uma brecha que isenta de concorrência os contratos com valor menor do que 1,3 milhões de francos, o que vem sendo considerado um instrumento para dividir a licitação em pedaços; as companhias de água alegaram que, com as facilidades criadas com a unificação da Europa para locomoção de trabalhadores de um país para outro, os grupos estrangeiros tomariam conta do mercado, prejudicando os trabalhadores e as empresas francesas.

Os falsos argumentos da “privatização”

Os escândalos que vêm sendo investigados, invariavelmente envolvendo as grandes empresas de água francesas, mais os problemas apontados pelos tribunais e órgãos fiscalizadores do país, lançam dúvidas sobre os benefícios da privatização, e balançam os argumentos dos que defendem como o melhor caminho para a superação dos déficits de saneamento no Brasil.

Em primeiro lugar, a concorrência, apontada como o grande instrumento para elevação da qualidade dos serviços com preços baixos, praticamente não existe no dia de hoje – é coisa dos primórdios do capitalismo, como fica patente nos dados apresentados sobre a concentração do mercado. Trata-se, além disso, de um serviço eminentemente monopolista, em cada cidade um monopólio natural. As críticas apresentadas no relatório do Tribunal de Contas francês e os fatos agora revelados pelas investigações de corrupção mostram que o que prevalece na atribuição do mercado a uma ou outra companhia é muito mais uma poderosa rede de influência e favores, e menos um efetiva competição em relação à qualidade e ao preço dos serviços oferecidos pelos interessados.

“Como esperar que tais empresas e suas associadas beneficiem o nosso Brasil?”

Em segundo lugar, o alegado controle do poder público sobre as empresas é, no mínimo, limitado. O domínio e o poder dessas gigantes da água dificilmente poderão ser contestados pelo poder municipal, enfraquecido e ainda mais desmantelado. Em que condições uma prefeitura que desmonta seu setor de saneamento, perdendo qualificação técnica especializada, poderá contestar estudos técnicos dessas companhias? E mesmo que quisesse contratar especialistas, que empresas consultoras poderiam ser contratadas para assessorar as prefeituras, se seus interesses se confundem com os dos supostos concorrentes? Veja-se outro exemplo francês: uma auditoria, determinada pelo Tribunal de Contas num contrato de concessão que a cidade de Orléans assinou com a Lyonnaise des Eaux em 1986, foi feita pela SDEI, de Marc Michel Merlin. Ora, como ela poderia ser isenta em suas avaliações, sendo sócia da Lyonnaise em Grenoble?

Em terceiro lugar, a tão decantada separação entre regulação e execução é só formal. Quem poderia imaginar que um prefeito, como no caso de Alain Carignon, vá impor sanções e controles severos sobre as empresas que viabilizam sua carreira política?

Depois, a idéia de que as empresas privadas trarão recursos para o setor pode ser ilusória, como demonstram as preocupações do Tribunal de Contas francês. Mesmo que, inicialmente, esses aportes sejam definidos por contrato, ao longo da execução as coisas podem mudar, e o poder concedente se vê no dilema de pagar ou não ver a obra realizada.

Se num país como a França, que vive há mais de cem anos esse tipo de experiência, o poder dessas companhias é enorme e incontrolável, os preços são aparentemente tão arbitrários, e utilizam expedientes de todos os tipos para contornar os controles públicos e as condições contratuais, como imaginar que, no Brasil, essas empresas ou suas associadas vão gerir os serviços visando à saúde pública e ao bem-estar da populações, a preços módicos?

EDIÇÃO 38, AGO/SET/OUT, 1995, PÁGINAS 58, 59, 60, 61, 62